… Quando Mondlane, no seu livro Lutar por Moçambique, na página 91, diz: «A resistência teve de início uma expressão puramente cultural»; na página 94 diz: «Nessa época, eles não estavam em melhor posição para forjar um verdadeiro movimento nacional do que estavam os camponeses das cooperativas de Lázaro Nkavandame.» E na página 96: «Quando a Frelimo se estabeleceu na região de Lourenço Marques, em 1962-63, os membros de NESAM foram os primeiros a ser mobilizados e organizaram uma estrutura de apoio ao partido», reconhece que foi a Frelimo quem influenciou o NESAM, e não o contrário, para a luta armada.
8. Mondlane visitou Moçambique em 1961 como funcionário das Nações Unidas porque não era hostil à política portuguesa. Se fosse, os portugueses não lhe concederiam o visto de entrada. Por isso mesmo, ao deixar Moçambique para as Nações Unidas, declarou à imprensa que «partia para a América mais português do que era». Daqui se deve concluir apenas que ele queria cristalizar e acelerar o processo de consciência unitária para com Portugal, o que está do lado oposto de separação forçada por meio de armas.
9. Foi a acção das quatro pessoas citadas no «processo da fundação da Frelimo» que concorreram grandemente para a união de Manu e Udenamo na ausência de Mondlane e de quem não pertencia a nenhum dos três partidos citados.
Atribuir a Mondlane, às pessoas e aos grupos que não estavam integrados nestes partidos é distorcer completamente a história do nosso povo. É negar a autoria da obra da gente de Inhambane e do Norte do rio Save, entregando-a injustamente à gente de Gaza e da província de Lourenço Marques.
10. É uma verdade inegável que no seio da Frelimo havia pessoas que tinham vindo da Unami, Manu e Udenamo, porque ela foi formada por gente procedente destes três partidos e não por indivíduos provenientes dos grupos do interior. Umas delas tinham famílias no estrangeiro, enquanto outras tinham ainda dentro de Moçambique. Por isso recebiam notícias de Moçambique regularmente, o que não acontecia com Mondlane.
Colocar Quénia na lista de Tanganica, Niassalândia, Rodésia do Norte e Rodésia do Sul, onde na verdade havia organizações não violentas, é ignorar o movimento dos MAU-MAU, que foi a inspiração encorajante mais próxima da luta armada no Sul do Equador.
Afirmar, porém, que Mondlane não estava em contacto directo com a situação real em Moçambique, estava nos Estados Unidos, cuja estratégia para as organizações era a de organizar vastas massas que, através de manifestações, greves e outras acções não violentas, procurasse conseguir alguma coisa de valor; por isso, estava contra a guerra armada em Moçambique, é correcto.
11. Conheci pessoalmente Baltazar Chagonga, da Unami, Mathew Michinji Mmole e Lawrence Mallinga Millinga, da Manu, em Dar-es-Salaam, em 1962. Todos estes nacionalistas moçambicanos sabiam que a independência de Moçambique seria somente adquirida por meio de luta armada. Só Mondlane, como expliquei extensivamente, é que acreditava que seria possível obtê-la por via pacífica, como acontecia nos Estados Unidos, em algumas colónias inglesas ou francesas por meio de greves e demonstrações para o alcance de direitos cívicos.
Foi na condição de não estabelecer campos de treinos militares no território tanzaniano que Nyerere aceitou a vinda de Mondlane para Dar-es-Salaam. Adelino Gwambe, que era aliado de Kwame Nkrumah, que queria libertar à força o que não era possível negociar, foi expulso e declarado persona non grata do Tanganica. A inimizade entre os dois chefes de Estado continuou até à morte deste último.
Quando alguns militares e civis tanzanianos observaram que Mondlane tinha soldados e carros militares no seu território, tentaram fazer um golpe de Estado, que se malogrou por causa da intervenção da marinha britânica em Janeiro de 1964. …
In MEMÓRIAS DE UM REBELDE de António Disse Zengazenga(págs. 407,408,409)
1 comentário:
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