Os credores das chamadas dívidas ocultas querem ficar com 3% das futuras receitas de gás natural, em troca do aligeiramento das condições de pagamento dos títulos de dívida a Moçambique, escreve esta semana o Wall Street Journal (WSJ).
A proposta dos credores foi enviada esta semana ao Governo moçambicano, que estará a analisar o documento, de acordo com um artigo escrito por Matt Wirz do WSJ. Basicamente, o texto apresentado pelos detentores dos títulos de divida de Moçambique difere significativamente do programa de reestruturação da dívida que o executivo moçambicano apresentou em Março,
De acordo com o WSJ, a proposta das autoridades moçambicanas geraria perdas para os investidores dos títulos cujo crédito vence em 2034. O plano de reestruturação do governo moçambicano também não envolvia as receitas de gás natural na equação da dívida.
Citando fonte próxima do processo, o WSJ refere que um grupo de credores que detém 60% dos 10,5% títulos que vencem em 2023 propôs a troca dos seus direitos por novos instrumentos com taxas de juro mais baixas c com prazo de amortização mais longo.
O acordo, caso seja aceite pelo Governo moçambicano, dará aos detentores dos títulos novas garantias que serão pagas por 3% das futuras receitas de gás natural liquefeito. O documento prevê que o Governo não tenha de pagar 80% do valor previsto no acordo inicial até 2023. “A proposta oferece um alívio de liquidez financeira substancial até 2023, o que corresponde ao período em que esse alívio foi pedido”, explicou a fonte.
O grupo de credores inclui a Farallon Capital Management LLC, Franklin Templeton, Greylock Capital Management LLC e Mangart Capital Advisors and Pharo Management.
Com o plano de restruturação apresentado pelos credores, Moçambique deixa de pagar quase mil milhões de dólares nos próximos cinco anos, o que corresponde a 80% do serviço da dívida até à maturidade dos títulos, em 2023.
A proposta dos credores mantém a exigência do pagamento total da divida pública emitida em 2016, e que resulta da reconversão dos títulos de dívida corporativa da Ematum em títulos de dívida soberana, mas alarga o prazo de pagamento e mais importante, vai ao encontro do pedido de Moçambique, que assegura não ter capacidade financeira para honrar os compromissos financeiros internacionais a curto prazo. No fundo, a proposta afasta o cenário de perdão de dívida, mas vai no sentido de alargamento do prazo de pagamento e uma recuperação, a partir de 2023, do alívio financeiro disponibilizado nestes próximos cinco anos.
"A recuperação será feita através de um instrumento financeiro ligado às receitas fiscais no sector do gás natural liquefeito, e o volume e os prazos dos pagamentos; dependerão dos montantes realmente recebidos em receitas fiscais”, refere a fonte.
Governo fica com 97% das receitas de gás
De todo o modo, o Governo ficará sempre com pelo menos 97% das receitas de gás natural liquefeito, ajudando assim o desenvolvimento económico do país, garantem os credores.
O documento "oferece um roteiro para Moçambique normalizar as relações com os mercados financeiros internacionais e obter o financiamento de que o país precisa no futuro para garantir os objectivos de desenvolvimento económico e social".
No seguimento da descoberta de dois empréstimos contraídos por empresas públicas, no valor de cerca de 1,4 mil milhões de dólares, à margem das contas oficiais, a situação financeira de Moçambique degradou-se, ao mesmo tempo que os doadores internacionais cortaram o apoio orçamental, o que coincidiu com a descida do preço das matérias-primas, e atirou o país para o incumprimento financeiro (“default”), que, na prática, arredou o país de financiamento internacional.
As negociações para a reestruturação da divida duram desde a primeira reunião oficial em Londres, em Março, e têm decorrido em vários momentos desde então, nomeadamente, à margem das reuniões da Primavera do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial.
Moçambique poderá começar a arrecadar as receitas de gás em 2023, de acordo com um relatório preparado pelo Governo moçambicano e pelos seus conselheiros financeiros e legais Lazard e White & Case LLP.
As projecções apontam para proventos de cerca de 174 biliões de dólares durante os próximos 30 anos, segundo a cópia do relatório, a que a WSJ teve acesso.
O Governo de Moçambique já tinha anunciado diversas vezes que se não houvesse acordo até final de Agosto ou Setembro não teria como efectuar pagamentos aos credores durante o próximo ano, já que nenhum valor iria ser inscrito no Orçamento para 2018, cujo prazo de elaboração termina em Setembro. Moçambique está em incumprimento em relação aos encargos das dívidas ocultas desde Janeiro de 2017.
O Governo tem recorrido ao endividamento interno para financiar as suas despesas, desde a perda do apoio financeiro internacional em 2016.
SAVANA – 10.08.2018
Sem comentários:
Enviar um comentário