A explicação de Conceita
Por que a Educação vai optou pagar mais pela impressão dos exames extraordinários de 2018
Na semana passada, o anúncio de uma adjudicação de 4 milhões de Mts do Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano (MINEDH) à Brithol Michcoma causou alarido. O valor suplantava em mais de metade a proposta financeira de uma firma concorrente, a Sisonke. A menção do facto nas redes sociais não abanou Conceita. Após a divulgação nesta plataforma, a Ministra recebia-me no seu gabinete no nono andar do edifício da 24 de Julho, na Polana. Assertiva, Conceita Sortane explicou o racional daquela adjudicação. O Ministério estava a fazer uma transição nos procedimentos relevantes: exames devem ser impressos cá dentro do país, por gráfica reputada e com a garantia de supervisão por inspectores do MINEDH. Tratava-se também de fazer a transição de "impressāo de copy shop" para impressão com altos padrões de segurança.
A Sisonke não gostou. A empresa tinha um "quase" acordo de exclusividade. Ela forneceu todos os exames finais e extraordinários nos últimos sete anos (no ano passado, sua factura para os "finais" ascendeu os 60 milhões de Mts) mas fez sempre suas impressões na África do Sul, em 4 gráficas diferentes. Técnicos do MINEDH acompanhavam o processo, mas nunca ficaram satisfeitos. Trabalhadoras sazonais era arregimentadas para o empacotamento, alegaram. O referido acordo, e um memorando como anexo, datado do consulado do ex-Ministro Zeferino Martins, nomeadamente desde 2011, enquadra uma relação entre a Sisonke e o Ministério nos termos do qual o MINEDH cedeu um antigo Parque de Viaturas na Avenida do Trabalho para a empresa montar lá uma gráfica, e produzir exclusivamente os exames. A gráfica só seria montada em 2016. Sāo três impressoras "made in China" para 10 mil cópias por hora e equipamento complementar. Nunca foram usadas, alegadamente porque o MINEDH nunca quis produzir os exames em Moçambique. Por isso, a Sisonke recorreu sempre a África do Sul.
Quando chegou ao MINEDH, há pouco menos de dois anos, Conceita Sortane procurou compreender a razão de se imprimir exames fora do país. Ela se deu conta duma coisa: as adjudicações por ajuste directo que o MINED dava a Sisonke nos referidos acordo e memorando já estavam a causar problemas com o Tribunal Administrativo (TA). Os contratos de adjudicação dos últimos dois anos não foram visados e o Ministério (na pessoa do Secretário Permanente) foi multado. Por regra, o ajuste directo nāo pode ser uma opção recorrente. Nas boas práticas de procurement, ele é uma excepçāo. Sortane avaliou o contrato com a Sisonke e notou que o documento, incluindo seu memorando, nāo estavam devidamente exarados. Contratos de fornecimento ao Estado tinham de receber um visto do TA e sua duração não devia exceder um ano. Ou seja, no entender do MINEDH, a exclusividade da Sisonke assentava em pés de barro.
Para o Ministério, havia margem para mudança e, sobretudo, para garantir o envolvimento, por concurso, doutros fornecedores. Mas uma das coisas que Sortane estabeleceu como meta era conseguir que os exames fossem feitos em Moçambique. Bastava haver garantia da qualidade. Tratava-se também de moçambicanizar o processo. O caderno de encargos para o concurso referente aos exames extraordinários da Décima Segunda Classe deste ano faz jus a esse desiderato. Os exames tinham de ser impressos cá, eliminando quaisquer riscos de segurança (na impressão em gráficas sul-africanas de segunda linha, que empregam moçambicanos nas suas operações; no empacotamento envolvendo sazonais; e no transporte para o país). Numa vasculha do mercado local, o MINEDH deu de caras com os trabalhos da Brithol Michcoma, que inaugurou há quase 6 anos uma gráfica de impressāo de segurança de alto padrão, empregando cerca de 100 trabalhadores moçambicanos e apenas um trabalhador estrangeiro ja naturalizado.
Ao invés de fazer um ajuste directo à Brithol, o Ministério convidou as duas empresas a submeterem suas propostas mas frisou que a impressão e empacotamento dos exames tinham de ser realizados em Moçambique. Apesar disso estar indicado como um dos critérios de peso na avaliação, a Sisonke voltou a propor realizar os trabalhos na África do Sul, apresentando um custo menor que o da Brithol. E foi chumbada. Mas, no fundo, o que pesou para a adjudicação foi a necessidade da realização dos exames cá dentro. E outra coisa: o elevado padrāo de segurança dos trabalhos da Brithol. No racional da tomada de decisão, os factores segurança, qualidade e acompanhamento de todo o processo por parte dos técnicos do MINEDH foram determinantes. Na verdade, os padrões da Brithol sāo imbatíveis. Ela é um verdadeiro case study de internacionalização de uma empresa moçambicana. Para além de produzir livros de cheques para todos os bancos locais, a Brithol faz os de 90% dos bancos angolanos e 75% dos bancos da Tanzania. Fornece também produtos com alto padrão de segurança para a Zâmbia e Cabo Verde e tem certificaçāo de 5 bancos centrais.
Depois do alarido que esta adjudicação causou, Conceita Sortane diz-se de consciência tranquila e alinhada com a necessidade de controlar directamente os processos de exames, na ausência de uma autoridade independente como acontece noutros países. Ela vai tentar chegar a um acordo amigável com a Sisonke, para se romper um contrato que, no entender dos técnicos do MINEDH, não tem força do lei. A Sisonke, por sua vez, espera continuar a ter acesso a contratos do Ministério para "recuperar o investimento feito". Mas é provável que, se a experiência com a Brithol sair bem, o MINEDH nunca se vai permitir contratar serviços de "copy shop" para gastar 60 milhões da reprodução de exames na RAS, como gastou em 2017.
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