Elisio Macamo
Caros amigos do Facebook,
A reflexão sobre a nossa policia continua na segunda-feira. Aproveitei um intervalo de aulas hoje para redigir um texto (longo) que vai fazer a ponte. É importante que o leiam, sobretudo os parágrafos finais. Um bom fim de semana!
Delírios
Alguém colocou num dos textos desta reflexão um texto que ele julga interessante. O “link” está na minha segunda reflexão com o títu...lo “a polícia e o que aconteceu”. Também, por acaso, considero o texto interessante, embora tratando-se de artigo de opinião ele caia um pouco fora do âmbito da reflexão que faço aqui. De qualquer maneira, porque considero o texto interessante, achei que seria oportuno incluir uma breve análise aqui para deixar ficar a minha leitura do mesmo e, ao mesmo tempo, aproveitar para fazer uma espécie de purificação de fileiras (para usar terminologia do passado).
O texto é interessante por ser representativo do muito que está errado no tipo de jornalismo praticado por algumas pessoas. Fico arrepiado só de pensar que haja pessoas em Moçambique, pessoas com formação, razoálvemente inteligentes que conseguem ler este texto sem se sentirem insultados na sua inteligência pela pobreza da argumentação e pelos saltos de imaginação que sustentam o seu teor. A minha breve consideração do texto concentra-se apenas nos aspectos que dizem respeito à polícia para não me espalhar (e mesmo assim o texto ficou longo!). Começo por reproduzir os trechos relevantes (para quem não quer ler o texto na íntegra; aparecem no início e no fim do artigo de opinião em questão) e depois faço uma lista dos principais pontos e indico, sem entrar em detalhes e entre parênteses, porque acho que o texto é pobre. O meu problema com este tipo de texto é que estou convencido de que nem como propaganda política serve, mas o facto de passar na nossa esfera pública revela quão pobre é a nossa cultura política. Não vejo como este tipo de oposição pode constituir alternativa à Frelimo. Não vejo como um “povo” que pensa assim pode merecer melhor governo do que o que tem agora.
Eis então os trechos:
“Quem ordena ataques policiais à oposição?
Beira (Canalmoz) – Repetem-se em escala cada vez maior os ataques protagonizados por agentes da PRM e da FIR contra manifestantes pacíficos em vários cantos de Moçambique.
Esta situação tem alguma origem e obedece a algum comando. Quem age contra manifestantes pacíficos em ano eleitoral só pode ter em vista amedrontar os potenciais eleitores.
Quem orienta e emana instruções de ataque puro e simples contra a oposição política em Moçambique só pode estar a agir em cumprimento de uma estratégia que vise a manutenção do poder, subjugando a vontade popular.
A intolerância policial face às actividades políticas de partidos da oposição precisa ser entendida na sua verdadeira dimensão sob o risco de avaliar-se incorrectamente a situação nacional.
Submeter-se ao veredicto popular está fora das contas de alguns políticos neste país.
Tendo em conta pesquisas de opinião, é possível concluir que um conjunto de factores desfavoráveis dá razão ao que os políticos da oposição vêm advogando como seus trunfos para baterem-se nos próximos pleitos eleitorais.
(...)
Sem afastar a PRM/FIR das ruas, na sua caça aos que não aceitam a imposição e a repressão de sua vontade, não existem condições para a construção de consensos que façam a democracia afirmar-se no país.
Afinal quem afirma que a FIR é um braço do partido Frelimo não deixa de ter razão, analisando-se o que esta faz cada vez que manifestantes pacíficos saem à rua apresentando suas reivindicações
Engana-se quem supõe que o fortalecimento da FIR ou das FADM irá criar uma atmosfera de segurança no país (...)”.
Aqui vão os pontos principais do “argumento” do artigo. Não consigo compreender como um autor, em apenas sete parágrafos curtos, pode produzir dez argumentos! Mas, como se diz, é o “País do Pandza”... O que me incomoda neste texto, só para resumir, é o facto de não se sustentar em nada senão em suposições que bradam aos céus. Vejamos:
1. Ataques contra manifestantes pacíficos repetem-se em escala cada vez maior (não duvido que muitos manifestantes sejam pacíficos. Mas lá está. Quem fez a contabilidade da repressão policial para saber que as manifestações reprimidas foram pacíficas e que essas, e não outras, é que estão a aumentar? Reparem: o articulista pode ter razão, mas o seu texto dá isto por adquirido quando ele devia proporcionar evidências. Eu, que sou mesquinho, não aceito uma afirmação desta natureza. E desconfio da sanidade de todo o leitor que aceita uma afirmação destas sem nenhuma inquietação).
2. Situação tem alguma origem e obedece a algum comando (isto é do reino da feitiçaria. O articulista pode ter fortes razões para supor que haja por detrás do tal “aumento da repressão de manifestações pacíficas” alguém a dar ordens nesse sentido. Mas o texto não diz donde vem essa suposição, trata-se apenas duma suposição que é apresentada como facto. Porque é que essa “repressão” não pode ser o resultado duma polícia desorganizada que não sabe o que faz?Porque não pode ser a acção de agentes policiais com o nível de cultura política do articulista? Por acaso, até penso que a hipótese de desorganização é muito melhor do que a da mão externa); ano eleitoral, acção contra manifestantes pacíficos para amedrontar (mais uma vez, apenas suposições que não são sustentadas por nenhuma evidência. Não há gente dentro da Frelimo quem acha que amedrontar o eleitorado pode não ser a melhor estratégia? A opinião do articulista sobre a Frelimo é assim tão negativa ao ponto de não contemplar a possibilidade de haver no interior desse partido gente que pensa como o articulista? E se esse for o caso, como é que o articulista fundamenta essa opinião que tem da Frelimo?)
3. Ataques cumprem uma estratégia – manter o poder (pode ser, de facto, que a sede do poder seja tão grande ao ponto de pôr a polícia atrás do povo; pode não ser. Daí que seja importante argumentar a favor desta hipótese, de preferência com evidências)
4. Intolerância policial tem uma verdadeira dimensão (o que é que habilita o articulista a ter acesso especial à verdadeira dimensão da “intolerância policial”? Porque é que outras pessoas sensatas não têm consciência dessa dimensão? Somos parvos? Estamos feitos com o “regime”? somos lambe-botas?)
5. Poder não quer eleições (como é que ele fundamenta esta hipótese? Se ele fundamentar com base nas suspeitas que levantou mais acima, então, está a ser circular; está a fazer aquilo que em lógica se chama de petitio principii)
6. Pesquisas de opinião a favor da oposição (Quais? Feitas por quem? Em que circunstâncias? Que resultados exactamente produziram?)
7. PRM/FIR está na rua a caçar quem é contra o poder (Pode ser. Pode não ser. O articulista podia facultar mais dados sobre essa acção dos agentes da lei e da ordem e, sobretudo, mostrar que provas tem de eles estarem a “caçar” quem é contra o poder)
8. Tem razão quem afirma que FIR é braço do partido Frelimo – repressão de quem se manifesta contra a Frelimo (Pode ser. Pode não ser. De momento estamos em presença duma afirmação simplesmente gratuita)
9. Fortalecimento da FIR e das FADM não vai criar atmosfera de segurança no país (Sim e não. Tudo depende do sentido em que esse fortalecimento está a ser feito e para quê; o articulista não diz, logo, difícil de avaliar a afirmação).
Este texto é, para mim, o exemplo da pobreza do debate público em Moçambique. Não culpo o autor por isso. Ele sabe o que faz. Culpo o leitor que aceita um texto desta natureza sem nenhuma interpelação crítica. Culpo o leitor que considera que um texto desta natureza constitui contribuição para o debate político e público em Moçambique. Considero todo o indivíduo que lê um texto desta natureza sem se ofender, sem se sentir insultado na sua inteligência como investimento educacional perdido. O Ministério da Educação poderia ter investido esse dinheiro de forma mais útil. Muito pior do que um funcionário do MINED simplesmente pegar nesse dinheiro e ir financiar a compra dum “dubaizinho” que pelo menos ajudaria a aliviar o seu problema de transportes.
Eu tenho medo dum Moçambique governado por gente assessorada por articulistas que escrevem este tipo de textos. Muito medo. E, já agora, aproveito para fazer uma advertência intolerante. A minha lista de amigos no Facebook é longa, repleta de gente que não conheço de lado nenhum (o que, em princípio, não é problema apesar de as felicitações de aniversário me custarem muitos minutos todos os dias...). Tento purificar a lista retirando todos aqueles que curtem páginas pornográficas ou colocam imagens dessa natureza. AVISO: a partir de hoje vou excluir também aqueles que acham que textos como o que acabo de discutir aqui fazem sentido. Basta para esse efeito escreverem isso aqui ou tentarem defender o texto. Aceito a interpelação das razões que apresento para considerar o texto pobre; não aceito, no meu murral, que alguém celebre o texto como contribuição para o debate. Curtam esse tipo de textos noutros murrais, não neste. Não quero ficar mais burro do que já sou. E como também não estou em campanha política, no meu murral só quero conversar e discutir com gente que honra o investimento que se fez na sua formação. Espero que compreendam. Enburreçam-se noutros murrais, não no meu.
A reflexão sobre a nossa policia continua na segunda-feira. Aproveitei um intervalo de aulas hoje para redigir um texto (longo) que vai fazer a ponte. É importante que o leiam, sobretudo os parágrafos finais. Um bom fim de semana!
Delírios
Alguém colocou num dos textos desta reflexão um texto que ele julga interessante. O “link” está na minha segunda reflexão com o títu...lo “a polícia e o que aconteceu”. Também, por acaso, considero o texto interessante, embora tratando-se de artigo de opinião ele caia um pouco fora do âmbito da reflexão que faço aqui. De qualquer maneira, porque considero o texto interessante, achei que seria oportuno incluir uma breve análise aqui para deixar ficar a minha leitura do mesmo e, ao mesmo tempo, aproveitar para fazer uma espécie de purificação de fileiras (para usar terminologia do passado).
O texto é interessante por ser representativo do muito que está errado no tipo de jornalismo praticado por algumas pessoas. Fico arrepiado só de pensar que haja pessoas em Moçambique, pessoas com formação, razoálvemente inteligentes que conseguem ler este texto sem se sentirem insultados na sua inteligência pela pobreza da argumentação e pelos saltos de imaginação que sustentam o seu teor. A minha breve consideração do texto concentra-se apenas nos aspectos que dizem respeito à polícia para não me espalhar (e mesmo assim o texto ficou longo!). Começo por reproduzir os trechos relevantes (para quem não quer ler o texto na íntegra; aparecem no início e no fim do artigo de opinião em questão) e depois faço uma lista dos principais pontos e indico, sem entrar em detalhes e entre parênteses, porque acho que o texto é pobre. O meu problema com este tipo de texto é que estou convencido de que nem como propaganda política serve, mas o facto de passar na nossa esfera pública revela quão pobre é a nossa cultura política. Não vejo como este tipo de oposição pode constituir alternativa à Frelimo. Não vejo como um “povo” que pensa assim pode merecer melhor governo do que o que tem agora.
Eis então os trechos:
“Quem ordena ataques policiais à oposição?
Beira (Canalmoz) – Repetem-se em escala cada vez maior os ataques protagonizados por agentes da PRM e da FIR contra manifestantes pacíficos em vários cantos de Moçambique.
Esta situação tem alguma origem e obedece a algum comando. Quem age contra manifestantes pacíficos em ano eleitoral só pode ter em vista amedrontar os potenciais eleitores.
Quem orienta e emana instruções de ataque puro e simples contra a oposição política em Moçambique só pode estar a agir em cumprimento de uma estratégia que vise a manutenção do poder, subjugando a vontade popular.
A intolerância policial face às actividades políticas de partidos da oposição precisa ser entendida na sua verdadeira dimensão sob o risco de avaliar-se incorrectamente a situação nacional.
Submeter-se ao veredicto popular está fora das contas de alguns políticos neste país.
Tendo em conta pesquisas de opinião, é possível concluir que um conjunto de factores desfavoráveis dá razão ao que os políticos da oposição vêm advogando como seus trunfos para baterem-se nos próximos pleitos eleitorais.
(...)
Sem afastar a PRM/FIR das ruas, na sua caça aos que não aceitam a imposição e a repressão de sua vontade, não existem condições para a construção de consensos que façam a democracia afirmar-se no país.
Afinal quem afirma que a FIR é um braço do partido Frelimo não deixa de ter razão, analisando-se o que esta faz cada vez que manifestantes pacíficos saem à rua apresentando suas reivindicações
Engana-se quem supõe que o fortalecimento da FIR ou das FADM irá criar uma atmosfera de segurança no país (...)”.
Aqui vão os pontos principais do “argumento” do artigo. Não consigo compreender como um autor, em apenas sete parágrafos curtos, pode produzir dez argumentos! Mas, como se diz, é o “País do Pandza”... O que me incomoda neste texto, só para resumir, é o facto de não se sustentar em nada senão em suposições que bradam aos céus. Vejamos:
1. Ataques contra manifestantes pacíficos repetem-se em escala cada vez maior (não duvido que muitos manifestantes sejam pacíficos. Mas lá está. Quem fez a contabilidade da repressão policial para saber que as manifestações reprimidas foram pacíficas e que essas, e não outras, é que estão a aumentar? Reparem: o articulista pode ter razão, mas o seu texto dá isto por adquirido quando ele devia proporcionar evidências. Eu, que sou mesquinho, não aceito uma afirmação desta natureza. E desconfio da sanidade de todo o leitor que aceita uma afirmação destas sem nenhuma inquietação).
2. Situação tem alguma origem e obedece a algum comando (isto é do reino da feitiçaria. O articulista pode ter fortes razões para supor que haja por detrás do tal “aumento da repressão de manifestações pacíficas” alguém a dar ordens nesse sentido. Mas o texto não diz donde vem essa suposição, trata-se apenas duma suposição que é apresentada como facto. Porque é que essa “repressão” não pode ser o resultado duma polícia desorganizada que não sabe o que faz?Porque não pode ser a acção de agentes policiais com o nível de cultura política do articulista? Por acaso, até penso que a hipótese de desorganização é muito melhor do que a da mão externa); ano eleitoral, acção contra manifestantes pacíficos para amedrontar (mais uma vez, apenas suposições que não são sustentadas por nenhuma evidência. Não há gente dentro da Frelimo quem acha que amedrontar o eleitorado pode não ser a melhor estratégia? A opinião do articulista sobre a Frelimo é assim tão negativa ao ponto de não contemplar a possibilidade de haver no interior desse partido gente que pensa como o articulista? E se esse for o caso, como é que o articulista fundamenta essa opinião que tem da Frelimo?)
3. Ataques cumprem uma estratégia – manter o poder (pode ser, de facto, que a sede do poder seja tão grande ao ponto de pôr a polícia atrás do povo; pode não ser. Daí que seja importante argumentar a favor desta hipótese, de preferência com evidências)
4. Intolerância policial tem uma verdadeira dimensão (o que é que habilita o articulista a ter acesso especial à verdadeira dimensão da “intolerância policial”? Porque é que outras pessoas sensatas não têm consciência dessa dimensão? Somos parvos? Estamos feitos com o “regime”? somos lambe-botas?)
5. Poder não quer eleições (como é que ele fundamenta esta hipótese? Se ele fundamentar com base nas suspeitas que levantou mais acima, então, está a ser circular; está a fazer aquilo que em lógica se chama de petitio principii)
6. Pesquisas de opinião a favor da oposição (Quais? Feitas por quem? Em que circunstâncias? Que resultados exactamente produziram?)
7. PRM/FIR está na rua a caçar quem é contra o poder (Pode ser. Pode não ser. O articulista podia facultar mais dados sobre essa acção dos agentes da lei e da ordem e, sobretudo, mostrar que provas tem de eles estarem a “caçar” quem é contra o poder)
8. Tem razão quem afirma que FIR é braço do partido Frelimo – repressão de quem se manifesta contra a Frelimo (Pode ser. Pode não ser. De momento estamos em presença duma afirmação simplesmente gratuita)
9. Fortalecimento da FIR e das FADM não vai criar atmosfera de segurança no país (Sim e não. Tudo depende do sentido em que esse fortalecimento está a ser feito e para quê; o articulista não diz, logo, difícil de avaliar a afirmação).
Este texto é, para mim, o exemplo da pobreza do debate público em Moçambique. Não culpo o autor por isso. Ele sabe o que faz. Culpo o leitor que aceita um texto desta natureza sem nenhuma interpelação crítica. Culpo o leitor que considera que um texto desta natureza constitui contribuição para o debate político e público em Moçambique. Considero todo o indivíduo que lê um texto desta natureza sem se ofender, sem se sentir insultado na sua inteligência como investimento educacional perdido. O Ministério da Educação poderia ter investido esse dinheiro de forma mais útil. Muito pior do que um funcionário do MINED simplesmente pegar nesse dinheiro e ir financiar a compra dum “dubaizinho” que pelo menos ajudaria a aliviar o seu problema de transportes.
Eu tenho medo dum Moçambique governado por gente assessorada por articulistas que escrevem este tipo de textos. Muito medo. E, já agora, aproveito para fazer uma advertência intolerante. A minha lista de amigos no Facebook é longa, repleta de gente que não conheço de lado nenhum (o que, em princípio, não é problema apesar de as felicitações de aniversário me custarem muitos minutos todos os dias...). Tento purificar a lista retirando todos aqueles que curtem páginas pornográficas ou colocam imagens dessa natureza. AVISO: a partir de hoje vou excluir também aqueles que acham que textos como o que acabo de discutir aqui fazem sentido. Basta para esse efeito escreverem isso aqui ou tentarem defender o texto. Aceito a interpelação das razões que apresento para considerar o texto pobre; não aceito, no meu murral, que alguém celebre o texto como contribuição para o debate. Curtam esse tipo de textos noutros murrais, não neste. Não quero ficar mais burro do que já sou. E como também não estou em campanha política, no meu murral só quero conversar e discutir com gente que honra o investimento que se fez na sua formação. Espero que compreendam. Enburreçam-se noutros murrais, não no meu.
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