O esclarecimento pleno do uso do dinheiro da dívida oculta é essencial
O Fundo Monetário concluiu, no dia 5 de Março, a consulta sobre o Artigo IV com Moçambique. Ao abrigo do Artigo IV, o FMI realiza encontros anuais bilaterais com os membros, uma equipa técnica visita o país, recolhe informação económica e financeira e discute com os responsáveis as políticas e os desenvolvimentos económicos do país. Apesar de estar suspensa a ajuda, o FMI analisou o caso de Moçambique, e, para já, não foi abordada a questão da retomada do programa. Mais uma vez, no seu comunicado final, o FMI insiste que é preciso esclarecer os contornos da dívida oculta e a competente responsabilização.
“O esclarecimento pleno do uso dos recursos dos empréstimos não revelados contraídos por três empresas públicas será essencial para restabelecer a confiança”, lê-se no comunicado do FMI.
No seu comunicado, o FMI endureceu a linguagem sobre a corrupção, tendo dito que, apesar de Moçambique ter um enquadramento legal anticorrupção consistente, a implementação ainda deixa muito a desejar, e é recomendado que a aplicação dessas leis, daqui para a frente, é fundamental para combater a corrupção.
Os directores do FMI recomendam que haja um esforço para fortalecer o ambiente de negócios e a governação, para impulsionar o investimento privado e a criação de emprego, para apoiar o crescimento inclusivo e reduzir ainda mais a pobreza e a desigualdade. Apontaram que a reestruturação das empresas públicas em dificuldades será fundamental para melhorar a eficiência e reduzir as perdas financeiras.
Na avaliação macro-económica do país, o FMI considera que, nos últimos anos, a economia de Moçambique tem sido afectada de forma adversa pela queda dos preços dos produtos de base, por condições climatéricas adversas e pela questão das dívidas ocultas e subsequente suspensão do apoio dos doadores. “O crescimento diminuiu para 3,8% (de 6,6%, em 2015) e os dados mais recentes mostram que a economia cresceu em 3,7% em 2017, impulsionada por uma recuperação na actividade agrícola e mineira (devido a um aumento na produção do carvão).
Uma política monetária apertada, aliada a uma apreciação da taxa de câmbio, conduziu a uma queda acentuada da inflação para 6,3% (ano a ano) em Janeiro de 2018, de um pico de 26%, em Novembro de 2016. Todavia, estima-se que o défice fiscal de 2017 calculado numa base de caixa modificada (ou seja, incluindo os atrasados externos e internos) tenha aumentado para cerca de 8,2% do PIB em comparação com 7,6% do PIB em 2016, devido principalmente a pressões continuadas sobre a despesa, incluindo uma maior folha salarial e custos elevados do serviço da dívida. O défice da conta corrente externa continuou a estreitar em 2017. Isto deveu-se a uma forte alta nas exportações mineiras e a uma contracção na importação de serviços pelos megaprojectos.
Outro factor foi o influxo pontual no rendimento associado ao imposto sobre as mais-valias da venda da parte da ENI no campo de gás natural Coral Sul à Exxon Mobil. A dívida continua insustentável com o ‘stock’ da dívida do sector público em relação ao PIB a atingir 128,3% no final de 2016, com vários pagamentos falhados da dívida, incluindo do Mozam Eurobond”, lê-se na avaliação.
Perante este cenário, o FMI diz que, sem acções de políticas adicionais, o crescimento real do PIB deverá decrescer ainda mais ao longo do tempo, com a inflação a manter-se nos níveis actuais.
CANALMOZ – 08.03.2018
OS CRIMES E A MÁ GESTÃO DE ISABEL DOS SANTOS NA SONANGOL
Isabel dos Santos, Mário Silva e Sarju Raikundalia foram autores de várias manobras na Sonangol que se coadunam com os crimes de abuso de confiança, burla e branqueamento de capitais. Isto mesmo foi declarado por Carlos Saturnino, presidente do Conselho de Administração da Sonangol, em conferência de imprensa no dia 28 de Fevereiro de 2018. Consequentemente, os três indivíduos em questão devem ser investigados e julgados.
Face à denúncia pública dos factos, espera-se a actuação imediata do procurador-geral da República.
Além disso, são inúmeras as situações apresentadas por Saturnino que confirmam a gestão incompetente da equipa liderada por Isabel dos Santos enquanto esteve à frente da Sonangol.
As revelações de Saturnino são múltiplas, mas têm destaque as seguintes, que se enquadram nos tipos criminais enunciados:
- Criação de empresas de fachada para facturarem à Sonangol valores milionários. É o caso da Wise Intelligence, DMCC, Matter e outras, devidamente detalhadas por Carlos Saturnino, que supostamente prestavam consultoria à Sonangol, mas não tinham trabalhadores, e operavam a partir do mesmo endereço. O seu director ou participante principal era o português Mário Silva, que simultaneamente exercia funções dirigentes na Sonangol e era o braço direito de Isabel dos Santos. Por via deste expediente, saíram 135 milhões de USD da Sonangol.
- Pagamento da dívida da Exem (empresa estrangeira propriedade de Isabel dos Santos) à Sonangol em kwanzas, quando esta tinha sido contraída em euros, sendo tal alteração aprovada pelo Conselho de Administração presidido por Isabel dos Santos, em claro prejuízo para a Sonangol.
- Constituição de uma Assembleia Geral falsa para dissolução da Esperaza, accionista da Galp portuguesa, em que a Sonangol é maioritária.
- Transferência por parte do CFO Sarju Raikundalia de 38 milhões de dólares para uma empresa de consultoria no Dubai, quando Raikundalia já tinha sido exonerado. Essa transferência foi feita pelo Banco BIC de Portugal, pertença de Isabel dos Santos, que se tornou um dos principais bancos da Sonangol.
- Caixa n.º 2, não autorizada, para pagar salários a um grupo restrito de administradores e colaboradores.
- Conflito de interesses relativamente à contratação da PWC, o que, dependendo do trabalho levado a cabo pela consultora, pode também constituir crime.
- Conflito de interesses na utilização primordial do EuroBic em Portugal e do BIC e BFA em Angola. Também aqui, dependendo dos factos concretos, poderá haver crime.
Note-se que, no meio da apresentação de Carlos Saturnino, surge o nome do escritório de advogados portugueses Vieira de Almeida. Torna-se de grande importância averiguar até que ponto esta sociedade portuguesa é cúmplice dos eventuais crimes cometidos, ou se apenas foi mais uma beneficiária da generosidade de Isabel dos Santos.
Refira-se também que estas situações já foram atempadamente denunciadas pelo Maka Angola.
A gravação da conferência de imprensa de Carlos Saturnino é a notícia dos crimes, e deve servir de base à actuação da PGR.
Além da parte criminal, o quadro que Saturnino traça relativamente à gestão de Isabel dos Santos é demolidor. Quando chegou à empresa, no seu primeiro dia de trabalho como presidente do Conselho de Administração, foi confrontado com manifestações de trabalhadores que não recebiam os seus salários por incumprimento da Sonangol. De seguida, verificou que os elevadores não funcionavam por falta de manutenção. Deparou-se com inúmeros e novos contratos de prestação de serviços em substituição dos antigos, sempre com valores mais elevados. Por isso, em termos de contenção de custos, a gestão de Isabel dos Santos foi igual a zero, afirma Saturnino.
Mesmo a famosa redução de dívida que Isabel anunciara ter feito, de 13 mil milhões para 6 mil milhões, afinal não foi resultado de nada mais do que uma injecção de capital do Estado. Também não foi encontrado qualquer plano estratégico ou instrumento de gestão provisional.
Sejamos muito claros: o quadro descrito por Carlos Saturnino em relação a Isabel dos Santos, Mário Silva e Sarju Raikundalia é devastador, quer na perspectiva criminal, quer na perspectiva reputacional enquanto gestores. As declarações de Saturnino não podem ficar no vazio. Exigem acção e esclarecimento.
Aguarda-se que as autoridades competentes tomem as medidas necessárias face à gravidade das revelações oficiais do presidente do Conselho de Administração da Sonangol.
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