Do livro: RENAMO, EM DEFESA DA DEMOCRACIA EM MOÇAMBIQUE. por Sibyl W. Cline, pp. 71ss
Afonso Macacho Marseta Dhlakama Presidente e Comandante Supremo
Afonso Macacho Marseta Dhlakama Presidente e Comandante Supremo
P. Qual é o apoio que o senhor recebe da população?
Acha que a RENAMO está a crescer? Por quanto tempo
ainda a RENAMO continuará a luta?
R. As guerras de guerrilha são guerras prolongadas. A
situação, porém, parece estar devidamente amadurecida para
se colherem os frutos. Presentemente a FRELIMO está-se a
debater com dificuldades políticas e económicas. Do ponto
de vista militar parece-me ganha. Se não tivessem sido os
conselheiros estrangeiros e a tropa, a RENAMO estaria no
Maputo. A FPLM, cujo comandante supremo é o Presidente
da FRELIMO, não luta, os soldados fogem. Apenas as tropas
estrangeiras permanecem e lutam. A FPLM não quer lutar e
os estrangeiros estão desmoralizados. A população é a favor
da RENAMO; então, por que razão a guerra deverá continuar?
O apoio económico externo à FRELIMO
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— Inglaterra, Estados Unidos, França, Itália e
Alemanha — todos prolongam a destruição. Deixou de
ser uma guerra. Os ingleses treinaram milhares de
habitantes do Zimbabwe que, assim que chegaram a
Moçambique, depuseram as armas e fugiram; assim, o
esforço britânico constituiu uma anedota.
P. Qual a parte de Moçambique que a RENAMO
controla?
R. A RENAMO controla praticamente Moçambique
todo, com excepção das maiores cidades e de
algumas mais pequenas que estão cercadas. Qualquer
cidadão poderá deslocar-se até sete quilómetros de
Maputo e em seguida entrará no território controlado
pela RENAMO. Em todas essas áreas a RENAMO
possui uma administração civil.
P. A RENAMO tem qualquer auxílio do exterior,
governamental ou privado?
R. Não há qualquer auxílio governamental, mas é
certo que algumas organizações Europeias particulares
nos auxiliam. Existem alguns partidos nos Estados
Unidos que nutrem por nós uma certa simpatia, mas
sem que nos auxiliem. Não existe qualquer ajuda do
governo, quer de Oman, quer de Marrocos. Trata-se
apenas, puramente, de propaganda feita pela FRELIMO,
quando afirma que a RENAMO recebe auxílio destas
fontes.
P. Qual é o papel dos Zimbabwianos e a sua repercussão?
Já ouviu dizer que eles querem abandonar o
barco?
R. A intenção original dos Zimbabwianos em 1984
era eliminar a RENAMO. Presentemente, mudaram de
atitude e têm feito uma política de contenção. A
repercussão tem-se feito sentir na população de
Moçambique. Bombardeamentos e intimidação
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são a estratégica seguida para alienar a população civil
da RE N AM O. Conscientemente, estão a criar um
problema de refugiados. O Zimbabwe pela sua própria
experiência com a guerra de guerrilha que teve na
Rodésia sabe muito bem que as guerrilhas confiam na
população. Mugabe declarou há dois anos que lutaria
uma guerra de guerrilha, mas até agora apenas tem
utilizado as técnicas de alienação da população. O
Zimbabwe possui 8000 soldados no Corredor da Beira e
60 quilómetros de ambos os lados. O Zimbabwe tem,
também, guarnições militares nas outras províncias,
com excepção do norte que abandonaram em 1987.
Controlam o corredor de Tete e estão quase perto da
fronteira de Malawi. A sua presença constitui um
pagamento de dívida de guerra à FRELIMO, pelo que
Mugabe enfrenta dificuldades em retirar-se.
Tal deve ser economicamente difícil para o Zimbabwe.
Em 1985 e 1986 transportaram os corpos e os
feridos para o seu país. Agora deixam os corpos e
alguns dos feridos. A RENAMO, uma vez por semana,
leva a cabo uma acção contra o caminho de ferro ou a
conduta do petróleo no corredor da Beira.
A Tanzânia não retirou os seus homens. Apenas
1500 foram retirados de Quelimane devido a um
conflito existente com a FPLM. Existem, no entanto,
7700 homens da Tanzânia permanentemente na
Zambézia, Niassa, Cabo Delgado e províncias do Norte.
Podem vir reforços a caminho. Há muito poucos
homens do Malawi, perto de 350. Existem, também,
alguns mercenários que trabalham para a FRELIMO,
sendo muito provavelmente, Cubanos. Desde 1984-
1985, os brancos ficaram nas áreas dos
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quartéis generais, principalmente em Tete ou então
pintaram as caras de preto.
P. O programa de amnistia da FRELIMO teve
algum efeito na moral e poder dos seus homens ?
R. Não me preocupo absolutamente nada com o
problema da amnistia. Desde a declaração feita em
Janeiro de 1988 até ao final do primeiro período foram
muito poucos os soldados da RENAMO que a
abandonaram. Se o programa tivesse sido eficaz, os
dirigentes da FRELIMO não o teriam prolongado, mas
fizeram-no. Janeiro de 1988 foi um período de máxima
pressão por parte do governo, uma vez que o programa
de amnistia era uma forma de convencer as pessoas de
que as coisas iam melhorar. A FRELIMO disse que
3000 lutadores da RENAMO tinham abandonado esta,
seguidamente disseram que 2000 da RENAMO
atacaram alguns lugares. A propaganda é contraditória.
Os dirigentes da FRELIMO nunca, sequer, admitiram
que existem áreas libertadas em Moçambique; no
entanto, a senhora, está aqui, caminhou dez dias ao
longo de um território da RENAMO absolutamente em
paz. Negam que nós tenhamos uma administração civil,
mas de facto têmo-la.
P. Gostaria de comentar o Relatório de Gersony?
R. O Relatório de Gersony limitou-se ao exercício
para desacreditar a RENAMO. Foi feito com esse
espírito. Se a RENAMO fosse culpada conforme a
acusa, não estaríamos na posição em que nos encontramos
agora. Todas as guerrilhas vivem do auxílio e
do apoio que a população civil lhes dá. Não faz
qualquer sentido destruir a população. E a RENAMO
estaria cega se alienasse o povo. É evidente que os
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refugiados falariam nos campos que estão infiltrados e
controlados pela FPLM. Assim que os jornalistas se
fossem embora, a FPLM castigaria todos aqueles que
tivessem falado contra eles.
O Relatório Minter entrevistou 32 pessoas que
supostamente tinham anteriormente pertencido á
RENAMO; nem uma única só tinha estado na RENAMO.
Foram devidamente preparados pelo serviço
secreto e apresentaram-se como sendo da ex--
RENAMO.
Uma prova evidente: Todos disseram que não
conheciam o presidente. Ora bem, todo o verdadeiro
membro da RENAMO sabe tudo acerca do presidente e
a maior parte das minhas tropas me têm visto. Todos
afirmaram unanimemente que tinham sido recrutados à
força — pelo menos 90%. Explique--me como é que
10% podem controlar uns infelizes 90%? Talvez
pudéssemos atá-los e então dar-lhes uma arma, mas de
certeza que não iriam lutar muito bem daquela forma. A
propaganda é a única arma de que a FRELIMO pode
dispor. Dizem que treinamos as nossas crianças para
matar, fumarem droga e outras coisas. O Ocidente
acredita cegamente nisto tudo.
P. Quais são as suas condições para as conversações
de paz?
R. Não existem quaisquer condições prévias.
Queremos sentar-nos à mesa com a FRELIMO para
discutirmos a paz. Previamente tínhamos desejado que
as tropas estrangeiras retirassem, mas chegamos à
conclusão de que tal destruiria completamente a
FRELIMO. Desejamos, portanto, discussões sérias para
tratar da paz e não amnistia. Podemos,
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até mesmo, começar hoje. Chegou a altura de conversarmos.
P. E o que me diz sobre o envolvimento estrangeiro?
R. Quanto a mim, uma solução africana para o problema
Moçambicano seria a melhor, pois seria importante para a
história de Moçambique. Há muitas nações africanas que
acreditam que deve haver paz em Moçambique, que devem
iniciar as negociações para se alcançar a mesma.
P. Com a mudança de Chester Crocker para Herman
Cohen, qual é o papel que resta aos Estados Unidos ?
R. Ainda é cedo para falar, mas ouvi dizer que Herman
Cohen deseja conversações sobre a paz e prudentemente
conservo-me optimista. Seria com a maior satisfação que
veria uma justa participação dos Estados Unidos nas
negociações. A altura parece-me boa para que se iniciem as
mesmas.
P. Como está a situação no que respeita à sua
representação exterior?
R. Aceito e reconheço uma enorme falta de meios para
combater a propaganda da FRELIMO. Existem cinco
pontos:
1. Estamos a lutar com um governo reconhecidamente
Marxista com a história de uma luta anticolonial. O
entendimento internacional é que a FRELIMO
ganhou a guerra colonial e presentemente encontrase
em luta com bandidos.
2. A observação internacional é que a RENA-MO é
uma criação de Smith da Rodésia e Botha da África
do Sul.
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3. Todos os estados dos países da Linha da Frente
locais incluindo a África do Sul se aliaram para
desacreditar a RENAMO.
4. A RENAMO não possui meios de radiodifusão.
Os correspondentes estrangeiros dos estados
vizinhos não podem escutar o lado da
RENAMO.
5. A nossa representação externa é fraca. Existem
problemas de comunicação entre os representantes
e a comunicação entre a RENAMO
e eles é fraca. Alguns têm estado mais
interessados nas suas próprias intrigas pessoais
do que na RENAMO. Ainda o ano passado me
encontrei com os meus representantes e tenho
esperança de que a situação melhore. O inimigo,
porém, no exterior, tem vantagem sobre a
RENAMO.
Dhlakama fez em seguida estas observações
de grande acuidade.
A RENAMO não é de forma alguma aquilo que a
«pintam» lá fora. Desde 1977 temos estado a lutar,
jovens e velhos, fracos e fortes porque lutamos por
aquilo que o povo deseja. Se fôssemos tal como a
FRELIMO nos descreve, já teríamos desaparecido há
muito. Não passa de pura e simples propaganda a
acusação de que a RENAMO foi formada por Smith na
Rodésia. Somos uma organização de carácter
genuinamente popular. A RENAMO nas suas fases
iniciais recebeu, de facto, alguma ajuda da Rodésia, mas
é moçambicana. A própria FRELIMO foi fundada na
Tanzânia, mas ninguém vai dizer que ela pertence à
Tanzânia. A RENAMO possui os seus próprios
objectivos democráticos: sistema polí-
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tico multipartidário, eleições livres e justas, uma assembleia
que represente os interesses do povo, liberdade
de expressão e direitos humanos. Tudo isto inexistente
na FRELIMO. O povo de Moçambique criou a RE
NAMO e continua a apoiá-la.
Não somos unicamente uma organização militar;
somos uma organização politica. No fim da guerra
colonial falámos com a FRELIMO sobre o sistema, a
fim de substituir o sistema colonial; a FRELIMO
respondeu com violência e matou muitos dos nossos
políticos que se atreveram a discordar da política da
FRELIMO. Assim, para que não desaparecêssemos, não
tivemos outra alternativa senão ir para a luta armada.
Somos, no entanto, um partido político com um
exército. A força militar foi criada para alcançar os
nossos objectivos políticos. Não queremos destruir a
FRELIMO. Esse não é o nosso objectivo. Queremos,
sim, uma mudança política. Se a FRELIMO quiser falar
e discutir o assunto da paz honestamente connosco,
deporemos as armas.
A RENAMO é uma força central forte implantada
no país. A FRELIMO verificará que é impossível
destruir a RENAMO. A RENAMO é pela paz, mas uma
paz real em que o povo possa escolher livremente a
forma de governo que lhe interessa. O poder em
Moçambique deve estar com os 14 milhões de pessoas e
não com a minoria militar. O partido deve pertencer ao
povo e não vice-versa. Infelizmente existem forças no
Ocidente que não aceitam a RENAMO.
(Nota da Autora; Dhlakama falou em português.
Os seus comentários foram traduzidos pe-
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lo jornalista Nicholas Della Casa. O sr. Della Casa
foi educado na África do Sul e fala excelente
português. Dhlakama compreende e fala bastante
inglês, mas prefere o português no que concerne às
suas observações oficiais.)
Victor Anselmo
Chefe do Departamento de Ideologia
P. Qual é a função do Departamento de Ideologia?
R. O objectivo do Departamento de Ideologia é
difundir através das massas os objectivos políticos da
RE NAMO e explicar-lhes a razão por que continuamos
com a luta. O nosso principal problema é querermo-nos
opor à propaganda da FRELIMO. Existe um serviço
central e delegados provinciais. Se a área for
suficientemente grande tem um director regional.
Abaixo das regiões existem os distritos, localidades e
zonas, cada uma das quais possui delegados. Os
delegados, de um modo geral, são gente local que
conhece particularmente bem a área. Uma outra função
principal é transmitir problemas das gentes locais à
hierarquia superior.
Trata-se de um canal de comunicações com duas
direcções: os problemas sobem, a política é adaptada e
desce. São, principalmente, os problemas com
interacção entre civis e soldados são tratados através
destes canais.
Os encontros são realizados pelos delegados locais
a fim de espalharem a palavra ideológica. Não têm
rádios. Existem apenas alguns panfletos a fim de
orientarem os delegados. A mensagem é feita em
conformidade com o tempo em que a área foi liberta-
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da. Em áreas de longe permanência há uma propagação
política muito pequena. Em novas áreas convocámos uma
reunião, a fim de avaliar a natureza da população, pois
muitas pessoas fogem das áreas controladas pela FRELIMO
para o território da RENAMO, pelo que é evidente que a
população está a nosso favor. Ninguém recusou vir a uma
reunião; mesmo que sejam convidados não são obrigados a
vir.
P. Antes de uma operação militar o senhor prepara a
população?
R. Não preparamos uma zona, mas dispomos de alguns
membros infiltrados nas áreas inimigas para um determinado
trabalho. A FRELIMO possui rádios e jornais, porque a sua
arma de propaganda é mais forte.
P. Depois da libertação, tem problemas com quaisquer
dos povos? Talvez aqueles que escutam a FRELIMO pela
rádio?
R. A FRELIMO informou a população de que seriam
mortos se a RENAMO chegasse. Quando verificam que não
são mortos começam a ver que a FRELIMO espalha
mentiras. As pessoas podem ver por si e decidem-se.
P. As pessoas distinguem entre comunismo e
democracia?
R. As massas não sabem a diferença entre um comunista
e um democrata, mas têm visto os resultados desastrosos da
política da FRELIMO; por exemplo, não há alimentos,
multiplicaram-se os refugiados, etc, pelo que são a favor da
RENAMO. A ideologia da RENAMO baseia-se naquilo que
o povo quer. Somos grandemente a favor do Ocidente, mas
não queremos impor um sistema exterior ao nosso
80
povo. Queremos um sistema especificamente Moçambicano
modernizado, que responda às necessidades, desejos e
tradições do povo.
P. Nesse contexto, que importância tem para si o
contexto Ocidental de «um homem, um voto» e as eleições
em geral?
R. De um modo geral, o sistema Africano do governo é
democrático. Os chefes são eleitos, mas na realidade, não se
trata de um processo nacional, a política Africana não tem
sido tradicionalmente nacional. Ora o que, na realidade,
pretendemos é mudar o conceito de voto para um contexto
nacional.
P. Na sua opinião tema certeza de que a RENAMO
ganhará as eleições?
R. Lutamos por eleições livres. Se outro governo ganhar
que assim seja. A RENAMO quer que o povo faça a sua
escolha. As reformas sociais e económicas da FRELIMO
têm sido a resposta à pressão internacional. Os dirigentes da
FRELIMO estão-se aproximando da política da RENAMO.
Pelo que, se a FRELIMO convidar a RENAMO para tomar
parte no processo político como partido da oposição e
mantiver eleições livres, não haverá mais luta. A FRELIMO
está agora a mudar para a RENAMO. Na altura das eleições
a guerra acabará.
P. Se as eleições ocorrerem, como é que o senhor pode
assegurar que sejam livres e justas?
R. Terá que haver um período pré-eleitoral para
organização — recenseamento e registo do votante. Uma
comissão conjunta da RENAMO e da FRELIMO
supervisará tal acto. Igualmente se requer a inspecção
internacional.
81
António Alfainho Chefe do Departamento de
Educação e Cultura
P. Qual é de facto o papel do Departamento de
Educação e Cultura?
R. Em 1977, o Departamento começou a preparar
as crianças para a revolução. À medida que a guerra
progredia, e se expandia e nos encontramos agora em
todas as localidades do país, a nossa primeira prioridade
é treinar professores que são mandados vir dos distritos
para os centros de treino. A nível de distrito existe uma
preparação de período por período nas duas semanas
que precedem cada período para os professores. Quando
uma área é libertada os professores ficam. Alguns vêm
também das áreas da FRELIMO para as áreas da
RENAMO; usamos, em geral, estes professores
profissionais para treinar professores mais jovens.
A RENAMO possui 20 744 professores dos quais
4250 são professores da escola secundária. Existem 3
786 177 estudantes que assistem às escolas com ensino,
tanto elementar como secundário. Há 950 escolas
secundárias e 9775 escolas primárias. Qualquer pessoa
que tenha uma instrução do sétimo ou oitavo grau é
imediatamente recrutado como professor. Estas pessoas
são enviadas para áreas onde os professores escasseiam,
pelo que, muitas vezes, os professores não são dos
locais onde estão a ensinar.
As crianças começam a assistir à escola quando têm
seis anos de idade. Aprendem português aos cinco. Aos
dez ou onze anos vão para as escolas secundárias. Os
professores ensinam até ao sétimo grau. A RENAMO
não possui professores qualificados que ensinem até ao
nono grau.
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P. Quanto tempo levam os professores a serem
treinados e como é que vivem?
R. Os professores do ensino primário recebem três a
quatro meses de treino. Os professores do ensino secundário
recebem seis a sete meses de treino. Os centros provinciais
providenciam a instrução. Se a população que existe nas
províncias é bastante, então fazemos centros de treino
distritais.
Os professores estão alojados com os residentes locais e
são suportados pelos residentes locais até poderem construir
as suas próprias casas e conseguirem o seu próprio alimento.
A maior parte das vezes o administrador local alojará o
professor até que o mesmo se torne independente. Os
professores recebem vestuário da RENAMO, mas não
recebem qualquer ordenado.
P. Qual o curriculum ?
R. Biologia, Geografia, Ciências Naturais e Português,
estão incluídos no curriculum. Tanto os rapazes como as
raparigas são tratados igualmente.
(Nota da Autora: estou certa que na maior parte dos
casos se trata apenas de um curriculum irreal e fantasioso.
As escolas que me foi dado ver não tinham nem livros, nem
lápis, nem papel. A maior parte das crianças cantavam os
números ou as letras do alfabeto).
P. Qual é o alvo da instrução que as crianças recebem?
Que escolha têm essas crianças se não regressarem ao
campo?
R. Damos trabalho noutro departamento às crianças que
consideramos terem mais capacidade. Treinamo-las no
departamento da saúde ou da agricultura e damos-lhes
emprego. Esta é a razão por que as crianças não ficam
desapontadas pelo esque-
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ma educacional nem sentem que não lhes dão quaisquer
oportunidades.
P. Vejo que têm pouco material escolar nas suas
escolas. Do que é que necessita mais?
R. Precisamos de lápis, giz, papel e borrachas.
Paris Raul Baza
Chefe do Departamento da Agricultura
P. Qual é o papel que o Departamento da Agricultura
desempenha?
R. O nosso principal objectivo é treinar técnicos
civis. A agricultura em Moçambique é, de momento, de
tipo de subsistência. Estamos a tentar dar à população
uma forma de aumentar a produção. Estamos a tentar
melhorar as qualidades de subsistência ao não
desenvolver a agricultura comercial. Uma única
excepção a isto é o algodão pois que é possível exportá-
lo comercialmente.
Possuímos centros distritais de instrução na
educação básica e voluntária de como melhorar a
produção. É enorme a procura destas aulas, uma vez
que as pessoas vêem como os seus vizinhos aumentam a
produção, e, infelizmente, é-nos impossível fazer frente
à procura que temos.
O curso básico tem a duração de dois meses e trata
do cultivo básico da terra: não misturar colheitas num
campo, usar a rotação de colheitas, deixar os campos
sem serem cultivados não os fustigar nem queimar.
Encorajamos a não queimarem as árvores, mas a utilizá-
las como combustível. Ensina-se, igualmente, a criação
de animais no que respeita a galinhas, patos e cabras. Os
que recebem o treino,
84
por sua vez, treinam igualmente nas suas localidades. O
nosso maior problema é a mosca tsé-tsé (do sono).
Extermina os animais.
P. Possui um programa de conservação de caça?
R. A caça é controlada tanto para os civis como
para os soldados. Se uma área tem necessidade de
carne, destinamos determinado número de animais para
serem mortos.
P. Como é que as pessoas adquirem a terra?
R. Através dos chefes principais, a terra é distribuída
para limpeza e formarem clareira. A terra que
produz madeira preciosa é reservada para o futuro. Os
camponeses não podem simplesmente chegar ali e
limparem aquilo que querem ou gostam.
P. Quais são as medidas que o seu departamento
toma para evitar a fome?
R. Destacamos de forma inequívoca o conceito de
que o rendimento deve ser dividido entre: 1) uma
reserva para a colheita do ano seguinte, 2) usar e 3) o
excesso para venda.
O estado aconselha isto, mas não existe qualquer
controlo sobre o que se semeia. O excesso de produção
é usado para trocas que é o único comércio que subsiste.
O departamento informa sempre que uma área
tenha déficit e outra tenha excedente, mas deixa o resto
a cargo dos camponeses no que respeita ao transporte e
comércio. Durante a crise do abastecimento de 1987, o
departamento assegurou que o cereal da Zambézia fosse
enviado para Sofala. Os chefes impuseram a sua
autoridade para implementarem este facto, usando o
transporte civil. Foi a primeira vez que se importou e
plantou mandioca em Sofala.
85
P. Como alimenta os soldados da RENAMO?
R. A grande maioria dos pedidos vem da população.
Algumas bases possuem plantações que apenas
suprimem uma pequena parte das suas necessidades.
Cada família põe de lado uma certa porção da sua
produção para os soldados. Trata-se de um acto
voluntário uma vez que não se estabelecem quantidades.
Por consentimento popular, cada grupo de várias
casas seleciona um indivíduo para colher a produção e
levá-la para um centro de «controlo». Existe um centro
de «controlo» por zona. Os soldados que trabalham pela
área são tratados como convidados, talvez como
convidados surpresa. Os camponeses não retêm a sua
contribuição uma vez que não a podem esconder ou
comê-la em segredo. Assim, as pessoas apresentam-se
com o seu excedente.
P. Na sua opinião, qual é o seu maior problema?
R. Sofremos da falta de utensílios e sementes.
Felipe Soares
Chefe do Departamento de Saúde
P. Diga-me, como é que o Departamento de Saúde
se encontra estruturado?
R. Existem dois ramos do Departamento de Saúde:
civil e militar. O ramo militar segue a estrutura dos
militares: província, região, sector, zona e grupo. O
ramo civil é organizado de uma forma diferente, por
província, região, distrito, localidade e zona. O ramo
militar ocupa-se principalmente dos soldados. Todas as
unidades da RENAMO possuem pelo menos um grupo
de médicos. Do mesmo modo,
86
o ramo militar faz algum tratamento civil sempre que se
torne necessário.
Todas das áreas civis possuem pelo menos um
representante do Departamento de saúde. O recrutamento
civil de pessoas que já tenham tido experiência
médica é usado como um aparelho de treino. Em cada
província existe um instituto civil e militar para
instrução onde estas pessoas ensinam. Os residentes
locais seleccionados pelos chefes são enviados para os
cursos.
Existem três níveis: um curso de seis meses, um
curso de três meses e um curso de um a dois meses. O
curso mais pequeno apenas abrange os primeiros
socorros. Os cursos de três e seis meses incluem cuidados
básicos de obstetrícia, cirurgia e pediatria, assim
como cuidados profilácticos de saúde e de cuidados a
ter antes do nascimento. Existe uma organização
separada de trabalhadores de saúde profiláctica
preventiva. A cirurgia é limitada, mas tratamos de
amputações e hérnias, assim como de remoção de
baldes e estilhaços.
P. De quantos trabalhadores da saúde dispõe?
R. Dispomos de 1800 trabalhadores de saúde civis
de todos os graus, tanto homens como mulheres. Há
400 que receberam a instrução à pressa. Existem 5000
médicos militares treinados e 2000 recrutas que
recebem treino, a maior parte como auxílios médicos ao
nível de primeiros socorros.
P. Quais são os outros problemas importantes que
o afligem?
R. Temos falta de medicamentos e instrumentos,
assim como de material educacional. A Cruz Vermelha
não nos trouxe qualquer excedente.
87
(Nota da Autora: As clinicas que visitámos
apresentavam-se limpas e ordenadas, mas tragicamente
com falta dos suprimentos mais elementares. Não têm
medicamentos, ligaduras, pomadas nem sequer tintura
de iodo.)
P. Quais são as doenças mais importantes?
R. Malária, bexigas e doença do sono. Não temos
qualquer tratamento curativo ou preventivo contra a malária.
Só o ano passado na Zambézia perdemos 200 crianças com
bexigas. A diarreia infantil constitui também um problema.
Durante a fome nos anos de 1986-87 a anemia foi também
um problema, mas agora as coisas estão a melhorar. Do
mesmo modo, os vermes intestinais são igualmente outro
problema.
P. E o que me diz sobre a alimentação?
R. A fome não é um problema, mas a sub-alimentação
é. As pessoas da saúde preventiva dão instruções ao povo de
como variarem a sua dieta, evitando comerem apenas farinha
grossa.
(Nota da Autora: A farinha grossa sudza é o alimento
princial da dieta que entra na alimentação
Moçambicana. É feita com farinha de cereal ou milho
miúdo ou sorgo e a que se junta água. Coloca-se tudo
isso numa grande panela e deixa--se ferver, mexendo-se
com um toro até que fique parecido com a argamassa
fina utilizada nas casas de banho. Come-se em seguida.
P.E o que me diz sobre os cuidados a ter antes e depois
do nascimento?
R. Tentamos entrar em contacto com as grávi-
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das e dar-lhes algumas instruções. Ensinamos os
métodos anti-diarreicos para os bebés. O nosso maior
problema é a ignorância. A maior parte das mulheres
não querem ter os filhos nos hospitais. São, em geral, as
mulheres mais idosas que ajudam ao parto. Tentamos
identificar estas parteiras e dar--lhes alguns
ensinamentos. Acontece, também, que temos pessoas
que podem ajudar a um parto se soubermos com
antecedência que haverá problemas.
P. E quanto ao controlo de nascimentos?
R. As pessoas da saúde preventiva dão instruções,
mas tem sido uma luta difícil. Todos querem ter
imensos filhos.
P. Têm Sida?
R. Não a temos identificado especificamente por
não termos qualquer forma de o fazer. Temos observado
algumas pessoas que a podem ter. As nossas áreas
têm hábitos sexuais tradicionais que são absolutamente
conservadores e não possuímos estradas de camiões ou
prostituição, de maneira que, talvez, a Sida ainda não
tenha aqui chegado.
A concluir, gostaria de apelar para a Organização
Internacional de Saúde para que nos ajude. Não vêm até
nós porque a FRELIMO não tem deixado, mas temos
estruturas para tratar com eles e necessitamos
muitíssimo do seu auxílio.
Vicente Zacarius Ululu
Chefe do Departamento de Administração Interna
P. Qual o papel a desempenhar pelo Departamento
de Administração?
R. O Departamento trata da administração da
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população. Tentamos estar a par do padrão de vida do
nosso povo, a fim de nos certificarmos de que tenham
escolas e hospitais, encorajá-los a trabalhar nas grandes
herdades e evitar a doença e assegurarmo-nos de que os
chefes tradicionais tenham a liberdade de resolver os
seus próprios problemas. Esforçamo-nos, também, pela
implementação dos programas dos outros
departamentos. Igualmente, realizamos um
recenseamento das crianças em idade escolar, assim
como das mulheres. No total, existem 7 283 000
pessoas controladas pela RENAMO, nas áreas
libertadas. Evidentemente que tal exclui as zonas de
combate, assim como as cidades.
P. Qual é a estrutura?
R. Temos um quartel-general e um secretariado que
subdivide em cinco áreas:
1. Administração.
2. Trabalho social.
3. Serviços secretos — além dos serviços secretos
militares, também temos serviços secretos
políticos.
4. Recrutamento — recrutamos pessoas para a
instrução nas diversas áreas.
5. Finanças — cobramos dinheiro, a fim de auxiliar
todos os administradores a instalarem--se
nas suas sedes.
No secretariado encontram-se os directores provinciais,
os directores distritais e os administradores
locais. Os chefes, subchefes e encarregados tradicionais
tratam da politização do povo. O administrador local
trata com os chefes. O director provincial trata
directamente comigo.
Estes directores são seleccionados pela sua ca-
90
pacidade e nível do seu grau escolar. A maior parte dos
administradores distritais são idosos e trabalharam
durante os dias coloniais.
P. Têm polícia?
R. Sim. A polícia civil trabalha em turnos para o
departamento. São controlados pelos administradores.
Os chefes têm a sua própria polícia. A polícia da
administração não está armada.
P. Como é o vosso sistema judicial?
R. Na realidade, não existem crimes muito graves
que necessitem de uma acção do tribunal. A maior parte
dos crimes ocorre nas zonas militares, onde são tratados
pelos militares. Os chefes tradicionais tratam quase
todos os casos civis. A RENAMO fez reviver o sistema
tradicional de chefes e sistemas de justiça local. A
FRELIMO tentou eliminar o sistema tradicional.
Quando um caso é tão grave que não possa ser resolvido
pelos chefes é levado ao administrador. Em cada distrito
existe um grupo de anciãos e chefes que trabalham
como administradores, a fim de resolver os problemas.
91
Administração da RENAMO referida
a Maio de 1989
Presidente e Comandante Supremo
Afonso Machado Marseta Dhlakama
Chefe do Protocolo do Presidente
José Augusto
Departamento de Ideologia
Victor Anselmo
Departamento de Relações
Externas
Artur Janeiro da Fonseca
Departamento de Defesa e Segurança
General António Pedro
Departamento de Agricultura
Paris Raul Baza
Departamento de Saúde e Assuntos Sociais
Filipe Soares
Departamento de Educação e Cultura
António Alfainho
Departamento de Informação e Propaganda
Francisco Moisés Nota
Departamento de Finanças
Sebastião Temporário
Departamento de Estudos
Ascêncio de Freitas
Liga das Mulheres
Latifa Gão Bene
93
Liga da Juventude
Mário Luís Gonzaga
Departamento de Administração Interna
Vicente Zacarias Ululu
Primeiro Congresso
A RENAMO realizou o seu primeiro congresso na
Gorongosa, de 5 a 9 de Junho de 1989. Depois de
Dhlakama ter feito um breve resumo da história de
Moçambique, desde a sua independência, o congresso
— com 105 membros a assistir— reelegeu Dhlakama
como presidente, por escrutínio secreto.
De conformidade com o procedimento administrativo,
o congresso elege o conselho nacional; foi
decidido, porém, que em circunstâncias de guerra se
deve permitir ao presidente nomear pessoas que ele
conheça para o conselho e que sirvam como corpo de
assessores presidenciais.
Conselho Nacional
O presidente nomeou os seguintes membros do
conselho, cada um representando as províncias de sua
origem, e o conselho nacional de administração:
Manuel Lisboa Tristão Zambézia
Edne Clara Enoch Maputo
Agostinho S. Murial Inhambane
Vicente Z. Ululu Cabo Delgado
Raul Manuel Domingos Tete
General Usufu Momaded Nampula
94
General Albino Faife Dukuze Manica
Valeriano Macame Niassa
Mário Macuacue Gaza
Samuel Simango Sofala
Executivo
Presidente e Comandante Supremo
Afonso Machado Marseta Dhlakama
Chefe do Protocolo do Presidente
José Augusto
Ajudantes de Campo do Presidente
João Almirante
António Alfainho
Departamentos
Departamento de Assuntos Políticos
Victor Anselmo
Departamento de Relações Externas
Raul Manuel Domingos
Departamento de Defesa e Segurança
General António Pedro
Departamento de Agricultura
Paris Baza
Departamento de Saúde e Assuntos Sociais
Filipe Soares
Departamento de Educação e Cultura
Agostinho Murial
Departamento de Informação e Propaganda
Vicente Z. Ululu
Departamento de Finanças
Sebastião Temporário
Departamento de Estudos
Ascêncio de Freitas
Liga das Mulheres
Latifa Grau Bene
Liga da Juventude
Mário Luís Gonzaga
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