Edgar Kamikaze Barroso
PORQUÊ É QUE EU ACHO QUE ARMANDO GUEBUZA ESTÁ A ASSASSINAR A FRELIMO?...
O partido Frelimo, no poder em Moçambique desde a sua independência, em 1975, sofreu profundas alterações político-ideológicas com a ascensão de Armando Guebuza à sua máxima liderança. Com efeito, e segundo a opinião generalizada dos nossos mais proeminentes pensadores políticos, muito do que a Frelimo hoje é, em termos de s...olidez e pujança política, deve precisamente ao papel mobilizador que Guebuza teve, desde os preliminares para a sucessão de Joaquim Chissano na liderança do partido e do Estado moçambicano. Ele fez um trabalho muito exaustivo de resgate das massas militantes e simpatizantes dos períodos áureos da revolução anti-colonial (antigos combatentes, OMM), de mobilização juvenil e de atracção do eleitorado desiludido com as formações políticas da Oposição, facto que mereceu o “retumbante” triunfo para si e para o seu partido nos pleitos eleitoriais de 2004 e de 2009. Durante a sua governação, Guebuza alimentou expectativas generalizadas assentes sobretudo em slogans como o combate à pobreza, à corrupção e ao “deixa-andar”, insinuando uma ruptura com o período transitório de reconstrução nacional do pós-guerra civil e uma aposta na aceleração do desenvolvimento sócio-económico do país. Era chegado, segundo ele, o “tempo de correr”. Guebuza apostou numa estratégia de marketing político que privilegiava o populismo - as suas “presidências abertas e inclusivas” de natureza puramente retórica e propagandista, bem como os “7 milhões” alocados aos distritos mas que no fundo têm sido uma retribuição monetária à troco de apoio eleitoral e conservação da lealdade política local, são disso exemplo. Guebuza transformou-se na cara mais sonante (senão a única) da Frelimo, chegando nos últimos tempos a tornar-se pessoalmente muito mais forte do que a sua estrutura partidária. Este facto também institucionalizou-se ao nível do Aparelho de Estado, onde a “divinização” do mais alto magistrado da nação e a “adopção” de células do seu partido como estruturas locais de exercício de poder paralelo têm sido os exemplos mais paradigmáticos.
Nos últimos tempos, uma facção cada vez mais crescente de cidadãos têm expressado o seu profundo descontentamento com a “promessa Guebuziana”. Com efeito, a sua governação tem sido desastrosa e decepcionante a quase todos os níveis. Guebuza não soube manter os elevados índices de popularidade nem responder de modo satisfatório às altas expectativas que criou junto do seu eleitorado (principalmente dos maiores centros urbanos do país, maioritariamente junto a uma juventude cada vez mais formada e informada). A sua governação, particularmente a partir do segundo mandato, entrou em colapso e, pese embora tenha capitalizado o sector das infra-estruturas, a vertente social das suas políticas públicas tem andado em contramão: manifestações populares sucessivas (em 2008, em 2010 e mais recentemente, em Outubro de 2013), greves no sector da saúde, a educação em descrédito, a eterna crise nos transportes, a corrupção impune, os níveis de desemprego em ascensão espiral, o sector agrícola morribundo, a captura do erário público por interesses privados associados ao partido no poder, a ordem e segurança pública em colapso, a criminalidade urbana e a perniciosa tensão político-militar em que actualmente o país se encontra, dentre outros factos, espelham o catastrófico “status quo”. A perda dos municípios da Beira e de Quelimane expressam, igualmente, o abismo político em que o partido no poder parece estar a entrar de cabeça.
A popularidade e a legitimidade de Guebuza está, literalmente, em queda livre. O mesmo se pode dizer da Frelimo, que tem nos últimos tempos andado funcionalmente à reboque do “todo-o-poderoso” Guebuza. Por essa via, e com o intuito de se manter no poder, o regime tem presentemente lutado à todo o custo pela operacionalização de uma desesperada estratégia de resgate da imagem do seu rosto - o “guia incontestável” Guebuza – através de uma contra-ofensiva nos órgãos de comunicação social pública (reformando os órgãos dirigentes de alguns)e privada (destacando quadros de estrita confiança para o seu corpo de direcção), infestando-lhes de “esquadrões de propaganda” escolhidos a dedo e com termos de referência muito claros e objectivos: difundir até à saciez nacional as boas obras do “filho mais iluminado da nação”, divinizando e atribuindo exclusiva e inquestionavelmente à ele os louros do desenvolvimento nacional, bem como exterminar toda e qualquer manifestação de descontentamento, repúdio ou oposição ao pensamento de orientação única apregoado pelo sistema.
Hoje em dia, Guebuza é tão forte quanto a Frelimo. Nalgumas vezes é até mais forte. É precisamente esse excessivo poder nas suas mãos, real ou artificial (pode até ser uma construção mental criada pelos seus subordinados, correligionários e admiradores) que tem estado a fragilizar institucionalmente este partido. Pelo que temos vindo a assistir, nas suas intervenções públicas, esta ilusão de poder parece estar a encegá-lo. Guebuza, quando em contacto directo com pessoas por fora do seu círculo restrito de socialização - particularmente os jornalistas – tem aparecido desorientado e isolado, retoricamente confuso e focado sobretudo em lançar farpas e adjectivos politicamente desaconselháveis aos seus mais fervorosos críticos. Com efeito, os “lambe-botas” das suas relações o hipnotizam, os ideólogos seniores do partido o criticam abertamente e fora das “estruturas” partidárias, os eternos companheiros da revolução como Joaquim Chissano remetem-se a um silêncio ensurdecedor, os membros e militantes jovens se têm decepcionado em frequência literalmente diária, os pesos-pesados do partido como Graça Machel têm exigido muito mais dele e da sua governação, as massas urbanas e a larga escala da opinião pública nacional o contestam, desrespeitam, ridicularizam e responsabilizam directamente pelo colapso governativo.
Hoje, mais do que o escudo proteccionista de Chefe de Estado, Guebuza é ele mesmo a Frelimo. Politicamente, ter deixado isto acontecer pode ter sido um erro colossal deste partido e para cuja correcção o tempo parece estar a ser extremamente exíguo. Nestes dois mandatos da governação e da liderança partidária de Guebuza, a Frelimo parece ter-se esquecido que em qualquer organização política os líderes passam mas as instituições permanecem. Isto pode trazer consequências desastrosas para o partido, nos pleitos eleitorais que se avizinham e constitui, para mim, o maior desafio de sobrevivência para o partido. Com efeito, Guebuza é actualmente um “órgão” vital da Frelimo e a sua há muito anunciada morte política pode matar (ou está mesmo a matar) paulatinamente este partido. (In)felizmente. — with Américo Matavele and 13 others.See more
O partido Frelimo, no poder em Moçambique desde a sua independência, em 1975, sofreu profundas alterações político-ideológicas com a ascensão de Armando Guebuza à sua máxima liderança. Com efeito, e segundo a opinião generalizada dos nossos mais proeminentes pensadores políticos, muito do que a Frelimo hoje é, em termos de s...olidez e pujança política, deve precisamente ao papel mobilizador que Guebuza teve, desde os preliminares para a sucessão de Joaquim Chissano na liderança do partido e do Estado moçambicano. Ele fez um trabalho muito exaustivo de resgate das massas militantes e simpatizantes dos períodos áureos da revolução anti-colonial (antigos combatentes, OMM), de mobilização juvenil e de atracção do eleitorado desiludido com as formações políticas da Oposição, facto que mereceu o “retumbante” triunfo para si e para o seu partido nos pleitos eleitoriais de 2004 e de 2009. Durante a sua governação, Guebuza alimentou expectativas generalizadas assentes sobretudo em slogans como o combate à pobreza, à corrupção e ao “deixa-andar”, insinuando uma ruptura com o período transitório de reconstrução nacional do pós-guerra civil e uma aposta na aceleração do desenvolvimento sócio-económico do país. Era chegado, segundo ele, o “tempo de correr”. Guebuza apostou numa estratégia de marketing político que privilegiava o populismo - as suas “presidências abertas e inclusivas” de natureza puramente retórica e propagandista, bem como os “7 milhões” alocados aos distritos mas que no fundo têm sido uma retribuição monetária à troco de apoio eleitoral e conservação da lealdade política local, são disso exemplo. Guebuza transformou-se na cara mais sonante (senão a única) da Frelimo, chegando nos últimos tempos a tornar-se pessoalmente muito mais forte do que a sua estrutura partidária. Este facto também institucionalizou-se ao nível do Aparelho de Estado, onde a “divinização” do mais alto magistrado da nação e a “adopção” de células do seu partido como estruturas locais de exercício de poder paralelo têm sido os exemplos mais paradigmáticos.
Nos últimos tempos, uma facção cada vez mais crescente de cidadãos têm expressado o seu profundo descontentamento com a “promessa Guebuziana”. Com efeito, a sua governação tem sido desastrosa e decepcionante a quase todos os níveis. Guebuza não soube manter os elevados índices de popularidade nem responder de modo satisfatório às altas expectativas que criou junto do seu eleitorado (principalmente dos maiores centros urbanos do país, maioritariamente junto a uma juventude cada vez mais formada e informada). A sua governação, particularmente a partir do segundo mandato, entrou em colapso e, pese embora tenha capitalizado o sector das infra-estruturas, a vertente social das suas políticas públicas tem andado em contramão: manifestações populares sucessivas (em 2008, em 2010 e mais recentemente, em Outubro de 2013), greves no sector da saúde, a educação em descrédito, a eterna crise nos transportes, a corrupção impune, os níveis de desemprego em ascensão espiral, o sector agrícola morribundo, a captura do erário público por interesses privados associados ao partido no poder, a ordem e segurança pública em colapso, a criminalidade urbana e a perniciosa tensão político-militar em que actualmente o país se encontra, dentre outros factos, espelham o catastrófico “status quo”. A perda dos municípios da Beira e de Quelimane expressam, igualmente, o abismo político em que o partido no poder parece estar a entrar de cabeça.
A popularidade e a legitimidade de Guebuza está, literalmente, em queda livre. O mesmo se pode dizer da Frelimo, que tem nos últimos tempos andado funcionalmente à reboque do “todo-o-poderoso” Guebuza. Por essa via, e com o intuito de se manter no poder, o regime tem presentemente lutado à todo o custo pela operacionalização de uma desesperada estratégia de resgate da imagem do seu rosto - o “guia incontestável” Guebuza – através de uma contra-ofensiva nos órgãos de comunicação social pública (reformando os órgãos dirigentes de alguns)e privada (destacando quadros de estrita confiança para o seu corpo de direcção), infestando-lhes de “esquadrões de propaganda” escolhidos a dedo e com termos de referência muito claros e objectivos: difundir até à saciez nacional as boas obras do “filho mais iluminado da nação”, divinizando e atribuindo exclusiva e inquestionavelmente à ele os louros do desenvolvimento nacional, bem como exterminar toda e qualquer manifestação de descontentamento, repúdio ou oposição ao pensamento de orientação única apregoado pelo sistema.
Hoje em dia, Guebuza é tão forte quanto a Frelimo. Nalgumas vezes é até mais forte. É precisamente esse excessivo poder nas suas mãos, real ou artificial (pode até ser uma construção mental criada pelos seus subordinados, correligionários e admiradores) que tem estado a fragilizar institucionalmente este partido. Pelo que temos vindo a assistir, nas suas intervenções públicas, esta ilusão de poder parece estar a encegá-lo. Guebuza, quando em contacto directo com pessoas por fora do seu círculo restrito de socialização - particularmente os jornalistas – tem aparecido desorientado e isolado, retoricamente confuso e focado sobretudo em lançar farpas e adjectivos politicamente desaconselháveis aos seus mais fervorosos críticos. Com efeito, os “lambe-botas” das suas relações o hipnotizam, os ideólogos seniores do partido o criticam abertamente e fora das “estruturas” partidárias, os eternos companheiros da revolução como Joaquim Chissano remetem-se a um silêncio ensurdecedor, os membros e militantes jovens se têm decepcionado em frequência literalmente diária, os pesos-pesados do partido como Graça Machel têm exigido muito mais dele e da sua governação, as massas urbanas e a larga escala da opinião pública nacional o contestam, desrespeitam, ridicularizam e responsabilizam directamente pelo colapso governativo.
Hoje, mais do que o escudo proteccionista de Chefe de Estado, Guebuza é ele mesmo a Frelimo. Politicamente, ter deixado isto acontecer pode ter sido um erro colossal deste partido e para cuja correcção o tempo parece estar a ser extremamente exíguo. Nestes dois mandatos da governação e da liderança partidária de Guebuza, a Frelimo parece ter-se esquecido que em qualquer organização política os líderes passam mas as instituições permanecem. Isto pode trazer consequências desastrosas para o partido, nos pleitos eleitorais que se avizinham e constitui, para mim, o maior desafio de sobrevivência para o partido. Com efeito, Guebuza é actualmente um “órgão” vital da Frelimo e a sua há muito anunciada morte política pode matar (ou está mesmo a matar) paulatinamente este partido. (In)felizmente. — with Américo Matavele and 13 others.See more
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