Monday, April 27, 2015

EMATUM: um negócio obscuro que só Guebuza pode explicar

 Matias Guente 
A Empresa Moçambicana de Atum, abreviadamente designada EMATUM, SA, pode ser uma fraude financeira muito mais grave do que até aqui se sabe. Uma investigação aturada do Canal de Moçambique Moçambique cuja primeira parte publicamos aqui, constatou que a EMATUM, SA, empresa criada em nome do Estado pelo então Presidente da República Armando Guebuza, o ex-ministro das Finanças Manuel Chang e Filipe Nyusi, então ministro da Defesa, tem uma outra sede na capital da Holanda, Amesterdão. Mas lá a empresa está registada de uma outra forma. Chama-se “Mozambique EMATUM Finance 2020”. Está localizada no seguinte endere- ço físico: Herikerbergweg 238 Luna Arena. Tem a caixa postal 1101 CM, no bairro Amstell. Segundo os registos da Câmara de Comércio de Amsterdão, a EMATUM está registada como empresa privada, com o número 58587314. Estes dados podem ser consultados através do motor de busca comercial holandês “Drimble”. Segundo os registos depositados em Amsterdão, na Holanda, a “Mozambique EMATUM Finance 2020” faz parte de uma “holding” internacional de finanças denominada “TMF Group HoldCo BV”, com a mesma localização que a EMATUM. A EMATUM é, portanto, um terceiro nível dentro da estrutura corporativa da TMF Group. Em linguagem corporativa holandesa equivale a um escalão mais abaixo da filial. Toda esta informação não foi trazida para Maputo nem pelo então Presidente da República, Armando Guebuza, nem por Manuel Chang, então ministro das Finanças, que esteve com Guebuza na assinatura dos contratos de contratação da dívida (“eurobonds”) e do contrato de fornecimento dos barcos com a empresa “Construction Mecanique de Normandie” (CMN), localizada em Chersbourg, na França. O que faz a “Mozambique EMATUM Finance”? A “Mozambique EMATUM Finance” é a empresa através da qual se fizeram as operações financeiras do recebimento dos “bonds” (o dinheiro emprestado). Segundo o relatório de Setembro de 2014 do PICTET Group (grupo financeiro privado suíço que inclui o PICTET bank), a que o “Canal de Mo- çambique” teve acesso, e que analisa as principais operações financeiras na praça europeia, o juro da dívida da EMATUM, representada pela “Mozambique EMATUM Financial” era de 6,305%, o que, em termos nominais, equivalia a 7,9 milhões de dólares por ano. Um outro relatório do Nordea (outro banco suíço) também comprova operações da EMATUM por via da “Mozambique EMATUM Financial”, para demonstrar as atractivas taxas de juro da dívida. Directora da EMATUM, SA diz que não conhece a “Mozambique EMATUM Finance” O de Moçambique Moçambique contactou os escritórios da EMATUM em Maputo, para saber o que a empresa tem a ver com a EMATUM da Holanda e porque é que essa informação nunca foi tornada pública. Falámos com a directora-geral da EMATUM, Cristina Matavele, que se mostrou surpreendida com o facto da existência de uma outra EMATUM, domiciliada em Amsterdão. “Eu não conheço essa empresa. Estou a ouvir falar pela primeira vez hoje, convosco. Contactem essa empresa, para saberem dela. Certamente que deve ter endereço”, disse a directora-geral da EMATUM em Moçambique. O primeiro relatório de contas da EMATUM e as omissões do PNB Paribas e do banco VTB Moscovo O relatório de contas da EMATUM lavrado pela filial moçambicana da auditora Ernest & Young, a que o “Canal de Moçambique” teve acesso, indica que toda a linha de cré- dito da EMATUM foi através do banco Crédit Suisse International. Refere o relatório que, a 5 de Maio de 2013, foi negociada uma linha de crédito (“Facility Agreement”) com o Crédit Suisse International, no valor global de 850 milhões de dólares, o equivalente a 25,5 triliões de meticais ao câmbio do dia 5 de Maio. O financiamento tem uma maturidade de 7 anos (ou seja, vence a 9 de Novembro de 2020), e vai ser remunerado a uma taxa de 6,7% com o aval do Ministério das Finanças. Em termos práticos, até 2020 os bancos vão ganhar da EMATUM, ou seja, do Estado moçambicano, 56,9 milhões de dólares por ano.
Segundo os auditores, os primeiros juros vencem a 13 de Maio de 2014 e a amortização inicia-se a 11 de Setembro de 2015. Desta operação, segundo os auditores os intermediários (que não foram especificados), tiveram uma comissão de 13,6 milhões de dólares.
Mas um relatório da Bloomberg (agência financeira norte-americana com sede em Nova Iorque) acrescenta um outro Banco na operação EMATUM. Segundo a Bloomberg, dos 850 milhões de dólares, 500 milhões são da Crédit Suisse e do PNB Paribas, e 350 são do banco russo VTB Moscovo, o segundo maior banco da Rússia.
Se os auditores nacionais dizem que as taxas de juro sobre as quais os “bonds” foram contratados são de 6,7%, as agências internacionais falam de 8,5% (mais 1,8% em relação à taxa oficial), o que obviamente coloca a emissão muito mais apetecível para os bancos. O “site” “Transparent Sea” diz que “os ‘bonds’ para a EMATUM providenciaram aos investodores um retorno de 8,5% com o prazo de amortização [pagamento] até 2020”. A Bloomberg também fala de 8,5%, que, na sua leitura, está a
seis pontos percentuais das habituais obrigações. Um economista especializado em mercados financeiros, contactado pelo de Moçambique, disse que, no caso EMATUM, fica claro que a preocupação de Moçambique não era a sustentabilidade da dívida, mas sim conseguir a maior quantidade de dinheiro possível. “A entidade que gere a dívida pública em Moçambique, que é o Banco de Moçambique, o conselheiro financeiro do Estado, que é o FMI, não foram contactados nesta operação, exactamente por ser um negócio obscuro e privado”. O comentário do economista coincide com a leitura da Bloomberg, que diz que, no negócio da EMATUM, “os investidores [bancos] trocaram a transparência pelos altos juros que a EMATUM se propôs a pagar”.
A falta de transparência e possibilidade de importação
de material de guerra
Ainda segundo a Bloomberg,
o conjunto de barcos
que a EMATUM encomendou
à CMN francesa pela
alta quantia de 300 milhões
de euros também inclui barcos
de patrulha contra piratas
(segundo o Ministério do
Comércio Exterior francês).
Segundo a agência Bloomberg,
os referidos barcos são
equipados com canhões e
“drones” militares. Segundo a
Stratfor, uma empresa de consultoria
de segurança global, a
Crédit Suisse negou entretanto
que o seu financiamento tenha
também sido usado para aquisição
de material de guerra. “O
documento que recebemos de
pedido de financimento referia-
se apenas à compra de material
de pesca”, disse Marco
Ruijer, que ajuda a supervisionar
cerca de 8 biliões USD em
títulos de mercados emergentes
(tal como Moçambique) na

ING Investment Management
em Haia, e comprou um pedaço
da dívida do VTB Capital
(o tal banco russo), porque
o investimento [EMATUM]
tem retornos elevados. Mas
a Bloomberg comenta no seu
relatório que a aquisição mili-
Entretanto, Filipe Nyusi e o
primeiro-ministro, Agostinho do
Rosário, estiveram ausentes na
noite de quinta-feira no evento
da apresentação de oportunidades
de negócio na Empresa Moçambicana
de Atum (EMATUM),
que seria a apresentação pública
da empresa fraudulenta que
o próprio Nyusi ajudou a criar.

Entretanto, Filipe Nyusi e o primeiro-ministro, Agostinho do Rosário, estiveram ausentes na noite de quinta-feira no evento da apresentação de oportunidades de negócio na Empresa Moçambicana de Atum (EMATUM), que seria a apresentação pública da empresa fraudulenta que o próprio Nyusi ajudou a criar.
Os organizadores vinham, há mais de uma semana, anunciando que a cerimónia teria as presenças de Filipe Nyusi e de Agostinho do Rosário, mas com o evento já quase a iniciar, a Presidência da República e o Gabinete do Primeiro-Ministro mandaram informar que o Presidente da República e o primeiro-ministro não estariam presentes por “incompatibilidade de agenda”. Também nenhum empresário idóneo esteve presente no evento.
A falta de comparência de Nyusi foi vista como uma tentativa mal conseguida de se afastar de uma fraude que ele próprio ajudou a criar. A EMATUM foi avalizada positivamente pelo Estado a um crédito de 850 milhões de euros sem que tivesse NUIT nem rosto da direcção.
Até ao primeiro semestre do ano passado, mesmo depois de ter o crédito, a EMATUM não tinha sede. A sede foi improtar deve também estar ligada aos projectos de gás e minerais que colocam Moçambique na rota do comércio internacional.
De facto, com a chegada da primeira frota dos equipamentos da EMATUM, começaram a sobrevoar Maputo visada nos finais do primeiro semestre, na Avenida Amílcar Cabral, n.o 1512, na cidade de Maputo. Na altura, só estava lá o edifício. Segundo a lei moçambicana, para emissão duma licença de actividades, os requerentes devem primeiro receber uma equipa de inspecção do Estado, para fazer vistoria à sede.
Mas a EMATUM já tinha sido avalizada no ano passado a um crédito milionário sem ter sede. Os interesses do Estado por detrás da EMATUM A EMATUM é uma entidade participada pelo Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE) e foi constituída no dia 2 de Agosto de 2013, em Maputo.
São accionistas da EMATUM o IGEPE (Instituto de Gestão das Participações do Estado), com 34%, a Emopesca (Empresa Moçambicana de Pesca), com 33%, e a GIPS (Gestão de Investimentos, Participações e Serviços, Limitada), com 33%. É na GIPS onde reside uma das principais obscuridades do negócio que vai custar milhões ao Estado até 2020, sem que tenha havido concurso público nem aval da Assembleia da República. A GIPS é uma entidade unicamente participada pelos Serviços Sociais aparelhos militares estranhos, que foram classificados como “drones”. Foi no mesmo período que o conflito armado com a Renamo agudizou-se, com o governo a expedir para Sofala grandes quantidades de equipamento bélico.

do Serviço de Informação e Segurançado Estado (oficialmente
abreviado como SERSSE). A sua
escritura aconteceu no dia 26 de
Fevereiro de 2013, em Maputo.
A GIPS não possui NUIT nem
NUEL, segundo apurou a nossa
investigação. Em menos de sete
meses após a sua constituição,
a GIPS juntou-se ao IGEPE e à
EMOPESCA, para constituir a
EMATUM, uma empresa até
aqui fantasma e que faz empréstimos
sob garantias do Estado.
A EMATUM é uma das maiores
burlas engendradas pelo Governo
do partido Frelimo, em que
até os ministros mentem de forma
descarada. Por exemplo, aquando
da visita da delegação de alto nível
do Fundo Monetário Internacional
a Maputo, o ministro das
Finanças, Manuel Chang, um dos
cabecilhas da empreitada, chegou
mesmo a informar que a EMATUM
foi submetida à Assembleia
da República. É mentira. A EMATUM
não passou pelo parlamento,
nem passou pelo processo de
“procurement”. Alguns países
que financiam o Orçamento do
Estado já vieram a público questionar
a legalidade da EMATUM.
A Dinamarca foi mais contundente,
e exige explicações claras
sobre a operação. Mas o Governo
continua sem dizer nada.


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