segunda-feira, 23 de julho de 2018

Renúncia de Manuel de Araújo é "golpe muito duro para o MDM"


A decisão causou alvoroço. Manuel de Araújo deixou de ser cabeça de lista pelo MDM em Quelimane, e esta não é a primeira baixa no partido. Analista Fernando Lima prevê dificuldades nas autárquicas.
    
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Renúncia de Manuel de Araújo não ajuda o partido, que já estava em crise
Se a situação no Movimento Democrático de Moçambique (MDM) já era difícil, não ficou melhor. Com a saída de Venâncio Mondlane para a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) já se falava num partido em crise. Agora, Manuel de Araújo anunciou que já não será cabeça de lista pelo partido no município de Quelimane. Segundo a imprensa local, o político prepara-se para ingressar na RENAMO.
A DW África falou com o jornalista e analista político moçambicano Fernando Lima, que concorda que este é um "golpe duro para o MDM". Para o analista, o principal problema é que a saída de altos quadros do MDM para a RENAMO põem em causa possíveis coligações para derrotar a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) nas eleições. Contudo, Fernando Lima defende que os partidos não podem depender de pessoas de importância, e que o MDM ainda tem uma forte base de apoiantes com que ainda pode contar.
Fernando Lima (DW)
Fernando Lima: "Partido perde pessoas notáveis num momento particularmente complicado"
DW África: O que se passa o MDM?
Fernando Lima (FL): O que se passa é que tem havido uma grande deserção de pessoas conhecidas, de pessoas colunáveis, mas também de militantes de base. E o último nome a ser conhecido é o de Manuel de Araújo. Penso que é um duro golpe para o MDM, porque perde pessoas notáveis, com grande capacidade, num momento particularmente complicado, porque estamos à beira das eleições autárquicas. Mas, tal como disse recentemente o líder do MDM [Daviz Simango], os partidos não se podem formar na base de pessoas colunáveis, têm de ser formados por militantes, pessoas que fazem o trabalho do partido, que se devotam a uma causa partidária, que acreditam nas diretivas e ideologia do partido. É isso que o MDM tem de fazer.
DW África: Qual o futuro do MDM? O que se pode esperar do partido?
 
Ouvir o áudio03:32

Renúncia de Manuel de Araújo é "golpe muito duro para o MDM"

FL: É um teste muito duro que o MDM vai ter de enfrentar. O MDM poderia ter feito uma coligação com grande potencial com a RENAMO, uma coligação entre os dois principais partidos da oposição. Penso que, neste momento, com estas deserções e com o facto de a grande maioria das deserções ter apenas um único destino, a RENAMO, duvido que esta possível coligação ainda possa acontecer, mesmo, nos casos pontuais em que se chegar à conclusão que, num determinado município, deveria haver uma coligação para enfrentar o candidato do partido FRELIMO. É um golpe muito, muito duro para o MDM.
DW África: Sem essa possibilidade de coligação, o cenário para as eleições autárquicas é mesmo negativo?
FL: Eu diria que é difícil, mas também diria que o MDM tem de aprender das suas lições de luta política, ou seja, compreender que a política não se faz apenas de pessoas que chegam diretamente para ocupar cadeiras disponíveis em termos de poder, em termos de Parlamento, em termos de autarquia, mas que devem corresponder a um outro tipo de luta e de militância mais profundo, o que não é o caso destas pessoas que abandonaram o MDM, porque são pessoas de militância e de adesão recente ao MDM.
Mosambik, politische Parteien bereiten Kandidaten für Kommunalwahlen in Quelimane vor
Falta democracia interna no MDM?
DW África: Tem alguma ideia das motivações que levam estas pessoas, como Manuel de Araújo, a sair do MDM para a RENAMO?
FL: De acordo com essas pessoas, todos eles falam em falta de democracia interna no MDM. Há, claramente, um problema interno no MDM em termos do debate de ideias, do próprio funcionamento das estruturas, o que terá levado ao descontentamento destes indivíduos. O MDM, também pela natureza dos próprios estatutos, é muito centrado na figura de Daviz Simango, o atual edil da cidade da Beira. Este é outro desconforto para estas pessoas que gostariam de sentir mais democracia interna no MDM. Mas, a questão de fundo, claramente, são problemas ligados com a própria natureza das personalidades que abandonaram o partido.
DW África: Acha que Daviz Simango está a ficar isolado na liderança do partido?
FL: Não, não penso que ele esteja isolado. Não confundo o partido com o facto de meia dúzia de figuras sonantes terem abandonado o partido. São golpes políticos significativos no MDM, mas o MDM tem centenas de milhares de pessoas que votam MDM e não me parece que a existência de tantos milhares de apoiantes do MDM torne o engenheiro Daviz Simango solitário na liderança. 

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“Do alpinismo de Venâncio Mondlane à falta de ética na política”, a polémica do Magazine Independente

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O jornal Magazine Independente publicou, no seu último editorial, datado do dia 24 de Abril do corrente ano, um texto com o título “Do alpinismo de Venâncio Mondlane à falta de ética na política”

EM DEFESA DE VENÂNCIO MONDLANE

Por: Edgar Barroso
“Alguns homens vêem as coisas como são e perguntam: ‘porquê?’ Eu sonho com o que não existe e digo: ‘porquê não?’”
(George Bernard Shaw)
O jornal Magazine Independente publicou, no seu último editorial, datado do dia 24 de Abril do corrente ano, um texto com o título “Do alpinismo de
Venâncio Mondlane à falta de ética na política”. Um texto entulhado de equívocos, inverdades e subjectividades, que a seguir passam a ser a escrutinadas e rebatidas.
1.O editorial (se assim o podemos chamar) mostra uma ausência de
honestidade intelectual estrondosa quando afirma que Venâncio Mondlane teve cerca de 20.000 votos nas autárquicas 2013. Venâncio Mondlane teve 120.000 votos, tendo sido o segundo candidato a edil mais votado do País. Por esta razão, o jornal Zambeze apelidou-o de “figura política revelação” em 2013.
2. Para além da imprecisão e falsidade de dados numéricos da votação, o redactor do editorial mostra uma cultura
bastante ingénua em conhecimentos
de ciência política, quando diz que o MDM e a Renamo têm ideologias diferentes. Ao que é público, estes dois partidos fazem parte da mesma família política e da mesma corrente ideológica: a centro-direita. Isto é inequivocamente
assumido pelos seus próprios fundadores. Ademais, em contextos políticos estruturalmente atípicos como o moçambicano, o rigor ideológico (ou a
inflexibilidade de pertença partidária) exigido ao Venâncio Mondlane pelo
articulista do Magazine Independente não encontra racionalidade lógica. Nenhuma disciplina (ou cegueira) partidária se pode sobrepor ao imperativo categórico de se lutar sempre, com todos os meios necessários, contra toda e qualquer manifestação de injustiça social, de opressão ou de descalabro do bem comum, onde e como se justificar necessário.

3. Venâncio Mondlane, ao ter passado da
Assembleia Municipal de Maputo para
a Assembleia da República, não traiu nenhum eleitorado-mãe, mas optou por um escalão de luta política com armaduras e alcance político maior, mas
ninguém tem dúvidas que foi até hoje o deputado que mais batalhas travou à
favor dos Maputenses: mercado Wankakana, mercado mukoreano, Campo do Zixaxa, Campo da Khodamo….etc; é inúmera a lista de casos de intervenção
de Venâncio Mondlane bem sucedidas. É notável que Venâncio Mondlane é uma
das maiores figuras da política nacional, aliando um discurso político informado, bem estruturado e documentado com um trabalho de base e de campo insuperável. Por conseguinte, personalidades da craveira de Venâncio
Mondlane não escravizam as suas convicções políticas à ditadura do conforto e mordomias da Assembleia da República, nem à insensibilidade elitista dos nossos políticos que se exibem nos media e nas redes sociais e assobiam
para os lados perante a miséria indigna dos munícipes que os circundam. Ao
pretender renunciar a Assembleia da República e concorrer para Edil de
Maputo, se se confirmar, Venâncio Mondlane terá como supremo objectivo a resolução ou a minimização da sua condição indigna, degradante e inadmissível. Ele sempre deu essa indicação, pública e abertamente.
4. Venâncio Mondlane alavancou a imagem do MDM não só na Cidade de Maputo como também no país inteiro, daí que foi o MDM que mais “lucrou” com
Venâncio Mondlane do que o contrário. Não é por acaso que o marketing
político mais notável do MDM está
intrinsecamente associado às várias
iniciativas de Venâncio Mondlane de dimensão nacional, tanto a nível
discursivo no Parlamento bem como a nível dos trabalhos práticos corpo-a-corpo nos bairros, bem como da sua
participação em marchas, manifestações e protestos populares… coisas transcendentes à tradicional forma de exercício político nacional. Venâncio
Mondlane pode querer maximizar o seu inquestionável capital político colocando-o ao serviço de uma cidade como a de Maputo que, apesar de estar no século XXI, ter como habitantes pessoas que vivem imensuravelmente
pior do que como se vivia no tempo colonial: acantonados, sem apelo nem
agravo, à pobreza urbana aguda, em casas degradadas e com saneamento e
salubridade atentatórias à sua saúde, sem nada para comer, sem acesso à educação de qualidade e sem trabalho digno. Essas pessoas não são culpadas
da sua pobreza, como diz o discurso oficial do governo do dia. São pobres
por consequência directa da inacção de quem administra os destinos da cidade. Há muitos Maputos dentro da cidade de Maputo, e é precisamente isso que Venâncio Mondlane poderia (e deveria) energicamente combater, fora do conforto das salas da Assembleia da República ou da rigidez de alavancas partidárias inflexíveis. Venâncio
Mondlane pode ter se dado conta de que os maputenses sem emprego, a viverem
como ratos em esgotos e transportados como animais, mesmo ao lado de ilhas
de prosperidade de pessoas que enriquecem pornograficamente à custa da sua pobreza, merecem e esperam mais dele do que os insensíveis opressores a quem se dirigia incansável e heroicamente no Parlamento nacional.
5. Venâncio Mondlane foi o único deputado da oposição, na Comissão Parlamentar de Inquérito, que teve uma
performance reconhecida até internacionalmente. Não é só acaso que, desde o ano que tomou posse, em
2015, é sistemática e sucessivamente
considerado o “melhor deputado do ano”
nas redes sociais e pela população em geral. Mas tais qualidades e atributos não lhe deturpam a visão e o comprometimento perante causas
consideradas “inferiores”. Não admira, por conseguinte, que sempre que
alguém do seu estatuto se levantar contra a gestão catastrófica do
Município em que reside, mentes tacanhas como a do articulista do editorial do Magazine Independente levantem nuvens de descontentamento, de inveja e de incompreensão. Com efeito, ele não só mostra que é possível ter na política moçambicana homens decentes e íntegros, capazes de ver e consertar o errado, ou de identificar o sofrimento e combate-lo. Resgatar a cidade de promessas vazias, de soluções cosméticas e de medidas meramente reactivas que atacam apenas as consequências e deixam andar as causas estruturantes do descalabro urbano e suburbano de Maputo, com recurso ao sacrifício e entrega sem paralelo na nossa política, revela imponentemente a clarividência e o sentido de missão de Venâncio Mondlane. Provavelmente por
aí é que ele se diferencia e evidencia. De facto, quem quer fazer mudanças sociais como a que se tem propalado, com a
eventual candidatura de Venâncio Mondlane a Edil do Município de Maputo, corre sempre riscos. O risco de ser criticado pela sua irreverencia e o seu modo iconoclasta de fazer política
é um deles, não surpreendendo a ninguém os delírios de incompreensão de que parece padecer o editorialista do jornal Magazine Independente.
6. O editorial fala de “falta de ética” mas a saída (neste caso suposta) de
um político de um partido para o outro faz parte das possibilidades de uma
democracia plena. Só se pode coarctar esse direito se estivermos perante
uma autocracia ou na circunscrição de um regulado. Aliás, é estúpido argumentar, por exemplo, que Venâncio
Mondlane teria a obrigação moral de
não sair de um partido político para o outro. Em que é que se basearia ou
se fundamentaria tal argumento? Nenhum moçambicano tem a prerrogativa de se imiscuir na faculdade discricionária de que o Venâncio Mondlane se assiste para exercer livre e soberanamente os seus direitos civis. Nem de lhe impor obrigações de qualquer espécie, como parece ser o
caso do articulista do editorial do referido jornal. Se Venâncio Mondlane efectivamente materializar essa mediatizada vontade de se candidatar, com o apoio de quem quer que seja (de forma individualizada ou partidária), tal gesto só teria de ser efusivamente celebrado e glorificado. O povo da cidade de Maputo já demonstrou, vezes sem conta, o seu apreço e devoção por ele. Honestamente, até parece ser opinião generalizada de que só com ele é que se poderia ter uma cidade de Maputo diferente para a próxima geração de maputenses. As soluções para o caos em que Maputo hiberna ou vegeta, actualmente, podem não ser fáceis ou imediatas mas, claramente, devem ser outras distintas das actuais. Venâncio Mondlane pode, muito acertadamente, constituir a única esperança para a cidade. Se ele concorresse às eleições autárquicas como candidato a Edil da cidade de Maputo, apoiado por qualquer partido que seja, eu indubitavelmente votaria nele.

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