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Escrito por Adérito Caldeira em 27 Julho 2018 |
Apesar do Presidente Filipe Nyusi ter anunciado o início do “pós-crise” e ter garantido que economia moçambicana está a recuperar a realidade desmente-o, agora até os bancos comerciais deixaram de comprar Títulos do Tesouro que têm sido usados pelo Governo para financiar o Orçamento de Estado cada vez mais deficitário desde a descoberta das dívidas da Proindicus e MAM. O @Verdade apurou que, para além da descida das taxas de juro e da falta de liquidez, os principais bancos comerciais estão a ressentir-se dos calotes internos do Executivo.
Quando Filipe Nyusi começou com a retórica dos moçambicanos passarem a viver só com o que dispõem internamente, no seguimento da suspensão do Programa financeiro do Fundo Monetário Internacional em Abril de 2016 e do apoio directo ao Orçamento de Estado pelos Parceiros de Cooperação, na verdade em vez de aumentar a produção e produtividade o seu Governo deu início a uma escalada da Dívida Pública Interna, principalmente através da emissão de Títulos do Tesouro, pois está quase totalmente impossibilitado de contrair créditos no exterior.
Com remuneração indexada às galopantes taxas de juro dos produtos de crédito os Títulos do Tesouro moçambicano a 3 meses chegaram a pagar 25,87 por cento, a 6 meses 28,42 por cento e a 1 ano geraram dividendos de 29,74 por cento, tornando-se num investimento apetecível principalmente para os principais bancos comerciais que obtiveram lucros bilionários inéditos e reduziram o crédito ao sector privado produtivo.
Paralelamente a Dívida Pública Interna, que Armando Guebuza havia deixado em 6 por cento do Produto Interno Bruto (PIB), tem crescido exponencialmente estando cifrada em mais de 105 biliões de meticais, o que corresponde a 12,1 por cento do PIB de acordo com o Banco de Moçambique (BM), criando um fenómeno que os economistas denominam de crowding out.
Títulos do Tesouro com procura muito baixa
Mas embora o pico da crise parece ter sido atingido em 2017 a economia mais do estar em recuperação “já não está a oscilar tanto e tão descontroladamente”, como explicou ao @Verdade o professor de Economia Carlos Nuno Castel-Branco.
“A taxa de crescimento da economia baixou para menos de metade, estando agora ao nível aproximado da taxa de crescimento da população (isto é, o PIB per capita não vai subir); a dívida pública, incluindo a interna, que pesa muito sobre o sistema financeiro doméstico, continua a subir; o sistema financeiro não está nem interessado nem capaz de apoiar a transformação da base produtiva” aclarou Carlos Nuno Castel-Branco.
No entanto, nos últimos meses, o sistema financeiro dá sinais de também não estar interessado em continuar a financiar o Orçamento do Estado de Filipe Nyusi, que anunciou recentemente o início do “pós-crise”.
A 22 de Maio o Executivo colocou na Bolsa de Valores de Moçambique (BVM) a 4ª Série de Obrigações do Tesouro 2018 para obter 1,5 bilião de meticais. A procura ficou por 225 milhões de meticais, com taxas de juro de 17,50 e 19 por cento, e o Estado “não deliberou proceder com a emissão”, pode-se ler no comunicado da BVM.
Sem opções de financiamento no exterior, o @Verdade sabe que a emissão dos Títulos do Tesouro está a financiar a execução do deficitário Orçamento de Estado até mesmo para pagar salários dos funcionários públicos, o Executivo de Nyusi voltou à Bolsa de Valores para um novo leilão das mesmas Obrigações do Tesouro e diante da pouca oferta contentou-se com 260 milhões de meticais, para uma expectativa de 1,5 bilião de meticais.
No dia 26 de Junho o Governo de Filipe Nyusi, que este ano pretende emitir Títulos do Tesouro num valor global de 84,2 biliões de meticais que é montante em défice no seu Orçamento, regressou à Bolsa de Valores para obter mais 1 bilião de meticais através da emissão de Obrigações do Tesouro 2018 - 5ª Série.
“De acordo com as propostas apresentadas pelos Operadores Especializados em Obrigações do Tesouro, a procura foi de 12.000.000,00MZN, e as respectivas taxas de juro situaram-se em 17,50%, pelo que, o Estado na sua qualidade de Emitente, não deliberou proceder com a emissão”, pode ler no comunicado da BVM.
Governo de Nyusi estará a dar calote também à banca nacional
Um banqueiro ouvido pelo @Verdade na condição de anonimato explicou que por um lado as taxas de juro oferecidas pelo Estado deixaram de ser aliciantes e os bancos preferem fazer dar crédito a alguns novos projectos do sector produtivo, mas também os principais bancos comerciais estão a aplicar novas normas contabilísticas que obriga-os a constituir imparidades sobre a Dívida Pública Interna.
Mas um segundo banqueiro entrevistado pelo @Verdade alertou que a política monetária do Banco de Moçambique de “reduzir a liquidez do sistema bancário pode ter enxugado tudo, até porque o banco central considera que o endividamento interno atingiu o limite. Havia um compromisso de não ultrapassar os 10 por cento do PIB mas já vai em 12 por cento”, como aliás o Rogério Zandamela enfatizou após a última reunião do Comité de Política Monetária.
Além disso o banqueiro revelou que o Governo, que está a dar calotes a bancos estrangeiros, está também a dar calote às instituições financeiras nacionais citando a título de exemplo que em 2015 foi financiar-se em cerca de 3 biliões de meticais para amortizar a dívida que tinha para compensação às gasolineiras com o compromisso de devolver no ano seguinte. “Em 2016 renegociaram para amortizar em 4 anos e no ano passado voltaram a pedir para reestruturar agora para pagarem em 8 anos”, revelou o banqueiro.
O @Verdade contactou na quarta-feira (25) a assessoria de imprensa do Ministério da Economia e Finanças para saber qual o impacto na execução orçamental está a ter a dificuldade de financiamento através de Títulos do Tesouro e confirmar a reestruturação da dívida contraída à banca para pagar as gasolineiras mas até ao fecho desta edição não obteve nenhuma resposta.
Entretanto inúmeros funcionários públicos reportaram ao @Verdade que ainda não tinham recebido o salário referente ao mês de Julho.
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sexta-feira, 27 de julho de 2018
Bancos comerciais ignoram “pós-crise” em Moçambique e param de comprar Títulos do Tesouro
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