«Moçambique em Concerto», que decepção!
Assinantes: Bitone Viage & Ivan Maússe
Há sensivelmente cinco meses, publicámos, através deste espaço um artigo de opinião intitulado «Quando a nossa televisão deixa de sê-lo: a TVM está a perder o sentido de pertença?», no qual discutíamos a volta de alguns fenómenos, diga-se atípicos, assistidos na grelha programática da Televisão de Moçambique – TVM.
Naquele artigo de opinião, após realizarmos uma abordagem histórica sobre o surgimento e evolução deste canal público de televisão, teríamos apontado que o mesmo, nos últimos tempos parecia estar a realizar, a título forçoso, um notável divórcio com os seus telespectadores espalhados pelo território nacional e não só.
Dentre vários motivos que acreditámos estarem por detrás do divórcio, alistamos a crescente promoção de promiscuidade entre os programas de entretenimento passados pela televisão nos dois canais que actualmente possui, nomeadamente, TVM1 e TVM2, agindo em contramão a sua missão, visão e objectivos.
Destacámos também o facto desta televisão, em programas referentes a análises sobre o quotidiano da política doméstica, convidar “analistas” que diabolizam as forças políticas opositoras do regime-do-dia, quebrando, muitas vezes, o direito à réplica por parte daquelas conforme aponta o nº2 do artigo 49 da CRM.
Em terceiro momento, destacámos a frouxidão da nossa televisão na emissão de programas referentes ao desporto, em que vezes sem conta, a nossa televisão furtar-se em transmitir campeonatos desportivos com a presença do combinado nacional em diferentes modalidades, mesmo possuindo dois canais desde 2012.
1. Exposição do objecto em análise:
Na tarde deste Domingo, 16 de Outubro de 2016, durante o programa “Moçambique em Concerto” transmitido aos Domingos pela Televisão de Moçambique, geralmente a partir das 17 horas, com a apresentação de Gabriel Júnior, os moçambicanos foram surpreendidos com uma insólita entrevista.
Conforme vimos, a entrevistada era ex-esposa do jovem músico Mr. Bow, popularmente chamada por “Dona Lurdes”. A visada teria sido convidada pela equipa desta programa de entretenimento para “desabafar” a volta dos contornos da sua antiga relação com o visado músico, agora numa nova relação.
Na referida entrevista, Dona Lurdes, ex-esposa de Mr. Bow, não poupou esforços para falar dos defeitos e manias do seu antigo parceiro. Com o semblante de uma mulher indignada, enganada e abandonada, Lurdes falava impropérios do seu ex-marido, num claro acto de lavagem de roupa-suja em plena televisão pública.
Lurdes, nalguns casos, usando palavras inadequadas, lançava duras críticas ao jovem músico Mr. Bow, seu ex-marido, bem como à sua actual parceira, a jovem cantora Liloca, que junto de Mr. Bow gravaram a música «Number One», um verdadeiro sucesso entre o repertório da música jovem actual do nosso país.
2. Missão, Visão e Objectivos da TVM enquanto televisão pública:
Conforme é sabido, em sede do Direito Administrativo, a Televisão de Moçambique afigura às pessoas colectivas públicas do tipo empresarial, que naturalmente são criadas por iniciativa pública, dadas corpo por lei, sendo que a sua existência visa, fundamentalmente, a prossecução de um interesse público específico.
A TVM foi criada através do Decreto nº 19/94 do Conselho de Ministros, de 16 de Junho, com o objectivo de «contribuir na consolidação da unidade nacional, NA EDUCAÇÃO DOS MOÇAMBICANOS, (…) apresentando uma programação MAIS IDENTIFICADA com os INTERESSES E VALORES CULTURAIS dos moçambicanos (…)».
Além disso, notamos ainda, que na sua página oficial, no tópico referente a «Missão e Visão», a TVM se considera comprometida a trabalhar para, dentre vários aspectos: (i) trabalhar para a audiência; (ii) ser aberto e crítico; (iii) respeitar as diferenças; (iv) assentar na democracia; (v) SER UM ÓRGÃO SÉRIO, FIÁVEL.
Por último, a Televisão de Moçambique, na sua página oficial, vai ainda mais longe ao revelar que está comprometida em “trabalhar para ser a MAIS IMPORTANTE fonte de informação em Moçambique, e tornar-se, por excelência em um canal público dos moçambicanos”; o que naturalmente orgulhar-nos-ia a todos.
3. Crítica à TVM face ao incidente do «Moçambique em Concerto»:
Não temos nada contra a Televisão de Moçambique, nem tampouco contra o Programa Moçambique em Concerto, como também contra a pessoa do seu apresentador, o senhor Gabriel Júnior. Pelo contrário, a meio a tantas peripécias, somos apreciadores do trabalho realizados por estes. Vão aqui as nossas vénias!
É natural que, à partida, muitas pessoas saiam em defesa do “incidente” ocorrido hoje durante aquele programa, alegadamente porque a sua emissão é paga por um privado, sendo que não vai ao ar em função dos impostos pagos pelo povo moçambicano, pelo que goza de certa liberdade no seu agendamento.
Entretanto, a nosso humilde ver, independentemente de o programa ir ao ar através ou não do erário público, a TVM permanece um canal de televisão pública, com as suas devidas ATRIBUIÇÕES, MISSÃO, VISÃO e OBJECTIVOS, que teríamos referido no ponto 2 do presente texto de opinião, que redigimos em chiadeiras.
Em nosso entender, tomando em consideração o cunho da Televisão de Moçambique, consideramos infeliz e irresponsável a atitude do Programa «Moçambique em Concerto» de levar a ex-esposa do músico Mr. Bow para que denunciasse os seus problemas conjugais, em directo, para mais de 25 milhões de moçambicanos.
A Televisão Pública, sem se furtar de promover programas de entretenimento, não pode servir de lugar para a promoção de promiscuidade e nem de lavagem de roupa-suja sobre diferendos conjugais, pior ainda, com recurso a uma linguagem descuidada e que lesa, sobremaneira, à moral pública e aos bons costumes.
A Televisão Pública, do gabarito da TVM, com missão, visão e objectivos claramente definidos, não pode servir de um local para ampliação de ódio entre as pessoas, de inimizade, de promoção de linchamento ao bom nome e reputação das pessoas, a favor de ambições de carácter mercenário. Apela-se ao bom senso!
Hoje, nós, na qualidade de telespectadores assíduos do Programa «Moçambique em Concerto», como de admiradores do respectivo apresentador o qual, carinhosamente, apelidámos de “Filho do Povo”, estamos decepcionados pelo incidente registado. Hoje, Moçambique não esteve em Concerto, mas em DESCONCERTO, isto é, em absurdo, em desordem, em disparate, infelizmente.
4. Considerações finais:
Numa altura em que muitos artistas, desde artesões, humoristas, cantores, músicos, etc., queixam-se de falta de oportunidade para exibirem seus trabalhos em televisão, o que seria uma forma de exaltarmos a nossa moçambicanidade e de promover nossos talentos, a nossa televisão é assaltada por promiscuidade.
À Televisão de Moçambique, apelamos reposicionamento. Ser televisão pública acarreta consigo muita responsabilidade. É neste canal de televisão que nos espelhamos como moçambicanos. A nossa TVM não deve agir conforme os outros órgãos de comunicação social de âmbito privado. Há-de pautar pelo exemplo.
Bem-haja Moçambique, nossa pátria de heróis!
1 comentário:
A TVM e RM sempre foram propriedade privada do presidente do dia:
1. Na era Guebuza – espalhava a propaganda da primeira-dama, já que o presidente era bastante conhecido;
2. Na era do Nyusi, se repararem bem querido telespectadores vão notar que toda dança tradicional é relacionada com mapiko, dança da tribo do presidente;
3. Diria ainda mais que desde que acompanho o Moçambique em concerto, vejo que ele só vai nos municípios governados pelo partido no poder, talvez eu tenha ficado despercebido, mas nunca ouvi que foi fazer Moçambique em concerto na Beira, Quelimane, Nampula ou Gurue. Será que estas cidades não tem dia do Município?
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