Temer assumiu a presidência do PMDB com o objetivo de controlar a destinação de recursos doados a políticos do partido para campanhas eleitorais, acusa Sérgio Machado
Por Redação – de Brasília e São Paulo
Presidente de facto, Michel Temer viu escorrer por entre os dedos a chance de celebrar o primeiro mês do governo golpista, após notícias de que poderá ser preso a qualquer momento, diante das denúncias de que recebeu propina do ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado. O líder paulista do PMDB foi aconselhado a cancelar, na manhã desta quinta-feira, o pronunciamento que faria à nação, na noite de sexta-feira, em cadeia de rádio e TV, temendo panelaços e outras manifestações, Brasil afora.
Em meio a uma entrevista coletiva convocada, às pressas, no Palácio do Planalto, Temer repercutiu a notícia de que teria pedido doação de recursos ilícitos para a campanha a prefeito de São Paulo do professor Gabriel Chalita, em 2012. Aos jornalistas, o líder golpista classificou a denúncia como “muito ruim para a governabilidade”.
No final da tarde desta quarta-feira, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República distribuiu nota oficial, dizendo ser “absolutamente inverídica a versão de que (Temer) teria solicitado recursos ilícitos ao ex-presidente da Transpetro”. Machado revelou o teor da conversa mantida com o atual inquilino do Planalto, às escondidas na Base Aérea de Brasília, para pedir o repasse de R$ 1,5 milhão.
O delator afirmou, aos delegados da Polícia Federal, que Temer assumiu a presidência do PMDB com o objetivo de controlar a destinação de recursos doados a políticos do partido para campanhas eleitorais. O conteúdo da delação foi revelado nesta quarta-feira, pela manhã, após homologação do Supremo Tribunal Federal (STF). Em troca da colaboração, Machado e seus parentes poderão ter a pena reduzida, se condenados por alguns dos crimes dos quais são apontados.
Na entrevista, Temer chamou de “irresponsável, leviana, mentirosa e criminosa” a declaração do ex-presidente da Transpetro, de quem era amigo pessoal, até a deflagração da Lava Jato.
— Eu quero fazer uma declaração a respeito da manifestação irresponsável, leviana, mentirosa e criminosa do cidadão Sérgio Machado. E quero dizer aos senhores e as senhoras que eu falo, em primeiro lugar como homem, como ser humano, para dizer que a nossa honorabilidade está acima de qualquer outra função ou tarefa pública que exerça no momento ou venha a exercer”, disse o presidente de facto.
No depoimento à PF, no âmbito da Operação Lava Jato, Machado detalhou o encontro com Temer em setembro de 2012, no qual pediu R$ 1,5 milhão para a campanha de Chalita, pagos pela construtora Queiroz Galvão ao diretório do PMDB. Temer ameaçou processar Machado, após afirmar que não deixaria as denúncias “passarem em branco”.
— E ao falar como ser humano, eu quero me dirigir à minha família, aos muitos amigos e conhecidos que tenho no Brasil, quero me dirigir ao povo brasileiro, que não deixarei passar em branco essas afirmações levianas que acabei de mencionar. (…) Enquanto alguns deixam passar em branco, eu não deixarei. Devo revelar com palavras indignadas, ao meu estilo, para registrar que esta leviandade não pode prevalecer” — ameaçou.
Sem festa
para Temer
Diante do ambiente de absoluta insegurança jurídica e econômica em que se encontra o país, com o risco de o presidente de facto, em meio a um golpe de Estado, ser preso em consequência das delações de Sérgio Machado e das demais provas buscadas nas investigações, Temer ouviu de seus principais assessores que esta não é a melhor hora para falar à nação. O pronunciamento planejado para esta sexta-feira, portanto, estaria cancelado.
A divulgação da volumosa delação premiada do ex-senador Sérgio Machado, após sua passagem pela empresa estatal Transpetro ao longo de mais de uma década, sob a indicação do PMDB, arrastou Temer e outros 19 políticos para o turbilhão daOperação Lava Jato. Opositores, correligionários e aliados decisivos do peemedebista estão no esquema descrito por Machado à Justiça, que movimentou mais de uma centena de milhões de reais em propinas, divididas entre “mesadas” e doações de campanha eleitorais feitas sob uma falsa legalidade.
Machado é um dos principais colaboradores do Ministério Público e suas gravações, então vazadas à imprensa, derrubaram dois ministros até agora. A avaliação no meio político é a de que a citação a Temer pelo delator é extremamente grave para a continuidade de Temer no poder. A luz vermelha foi acesa na decisão de se encastelar no gabinete e governar por meio de ofícios e notas oficiais. O que vem pela frente, na avaliação de importante assessor, ouvido pela reportagem do Correio do Brasil, “é uma surpresa atrás da outra”.
— Ninguém aguenta tanta emoção — afirmou o servidor federal, sob pedido de sigilo da identidade.
Temer, porém, não está sozinho no mar de lama no qual afunda, sob o peso das denúncias de Machado. Com ele estão os senadores peemedebistas Renan Calheiros (presidente da Casa), Romero Jucá (ministro demitido da pasta do Planejamento), Eunício Oliveira, Garibaldi Alves e Jader Barbalho, além de Aécio Neves, que também é senador e preside o PSDB, o principal partido de sustentação ao Governo interino.
Contra todos eles pesam acusações de receber propina disfarçada de doações eleitorais. A delação levou a consultoria de risco Eurasia emitir um boletim extra a seus clientes, na manhã desta quinta-feira, no qual procura tranquilizar os investidores interessados no prosseguimento do golpe: Machado, no fim das contas, “não tem uma arma fumegante” e, na avaliação da Eurasia, o compêndio não altera as chances de que o impeachment de Dilma seja aprovado pelos senadores (80%). A nota não cita, porém, as últimas pesquisas de opinião, nas quais a presidenta eleita melhora seu posicionamento junto ao eleitorado, enquanto negocia a mudança de votos de oito senadores para a votação final do processo, no Senado. Não seria o primeiro erro de avaliação dos consultores.
Novos delatores
Se a delação contra Temer acabasse no depoimento de Machado, os analistas político-econômicos teriam razão ao imaginar que nem tudo está perdido para as forças que embalam o golpe de Estado, em curso no país. Mas o problema aumenta quando; além de Sérgio Machado, outros três filhos dele fizeram acordos de delação premiada. Todos, sem exceção, em algum momento ajudaram a receber parte da propina paga pelas empreiteiras que mantinham negócios com a Transpetro. O detalhe que chamou mais atenção foi aquele revelado por Expedito Machado da Ponte Neto o único dos filhos do ex-senador que tinha interesse em seguir carreira política.
Neto admitiu aos investigadores que, no período entre 2007 e 2013, recebeu em nome de seu pai propinas que atingiram o montante aproximado de R$ 72 milhões em contas na Suíça, depositado em um trust. O valor teria sido pago, segundo suas declarações, por empreiteiras como Queiroz Galvão, Camargo Corrêa e Galvão Engenharia, todas com executivos investigados na Lava Jato. Parte desses recursos seriam usados para o ex-senador concorrer em 2010 ao cargo de governador do Ceará, o Estado onde fez carreira política. A candidatura não foi adiante, mas os recursos foram realocados durante o período, de forma a manter o círculo de poder intacto.
Operação Lava Jato mantém governo Temer na mira
Presidente é envolvido diretamente em esquema de propina por delator, em denúncia que tem potencial para arranhar a já desgastada imagem do governo e embaralhar jogo político antes da votação do impeachment
Por Redação, com DW – de Brasília:
A divulgação da extensa delação do ex-senador Sérgio Machado, que presidiu uma ramificação da Petrobras por mais de uma década, colocou o presidente Michel Temer pela primeira vez diretamente no centro da Operação Lava Jato. A revelação mostra que as investigações têm potencial para desestabilizar o governo interino assim como ocorreu com Dilma Rousseff.
Ex-presidente da Transpetro, Machado envolveu mais de 20 políticos de oito partidos, entre eles Temer e toda a cúpula do PMDB, num esquema de propina que teria movimentado mais de R$ 100 milhões. O dinheiro, segundo ele, foi dividido em “mesadas” e doações de campanha eleitorais feitas sob uma “falsa legalidade”.
Temer é particularmente acusado pelo delator de pedir R$ 1,5 milhão em doações para a campanha de Gabriel Chalita, candidato do PMDB à prefeitura de São Paulo em 2012. O dinheiro teria sido pago pela construtora Queiroz Galvão.
O presidente interino chamou a delação de “absolutamente inverídica” e afirmou que sempre buscou recursos para campanhas eleitorais dentro da lei.
Cúpula do PMDB e aliados
Machado é, há cerca de um ano, o maior colaborador do Ministério Público. Suas delações, quando vazadas à imprensa, causaram a queda de dois ministros do governo interino, Romero Jucá, do Planejamento, e Fabiano Silveira, da recém-criada pasta da Transparência.
A delação divulgada na quarta-feira pela Justiça brasileira chega como mais uma bomba para o governo Temer, que começava a deixar uma impressão positiva no mercado e mostrava ter obtido melhoras na relação entre o Planalto e o Congresso.
Isso porque as gravações envolvem a alta cúpula do PMDB: o presidente do Senado, Renan Calheiros, por exemplo, teria recebido R$ 32 milhões, o maior valor; o ex-ministro de Minas e Energia e atualmente senador Edison Lobão outros R$ 24 milhões; e o ex-presidente José Sarney, mais R$ 18,5 milhões.
Na delação, Machado envolveu ainda políticos-chave para o governo Temer, como o senador Aécio Neves, presidente do PSDB, que teria organizado um grande de arrecadação de recursos ilícitos para eleger deputados, em 1998, e garantir sua eleição à presidência da Câmara três anos depois. Ele teria recebido R$ 1 milhão em dinheiro de propinas.
Mais bombas à vista
Embora a avaliação do Planalto seja de que as consequências diretas para Temer não serão graves, a delação tem potencial de aumentar a desconfiança da sociedade perante um governo que já nasceu com a sua legitimidade questionada.
Pesquisa divulgada na semana passada mostrou que 54,5% dos brasileiros consideram que o desempenho de Temer está igual ao de Dilma, ou seja, ruim. E apenas 11,3% avaliam o governo interino como positivo.
A situação pode piorar com as delações de executivos de duas empreiteiras que aceitaram colaborar com a Lava Jato, os da Odebrecht e da OAS, duas das gigantes no setor no Brasil. Além disso, há chance de as denúncias embaralharem o jogo político no Congresso, influenciando a votação final do impeachment no Senado.
Os fatos negativos do último mês fizeram com que a imprensa brasileira lançasse dúvidas sobre o julgamento do impeachment de Dilma, apontando que alguns senadores já estariam reavaliando suas posições.
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