O acordo de paz celebrado nesta quinta-feira, 23, em Havana entre o governo da Colômbia e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARCs) é muito mais do que o fim do mais longo conflito armado no planeta que, em 52 anos, deixou 250 mil pessoas mortas e desaparecidas e provocou o deslocamento interno de 5 milhões de colombianos.
Para o professor de História Contemporânea da Universidade Federal Fluminense (UFF) Daniel Aarão Reis, o pacto é, antes de mais nada, uma vitória da política sobre a guerra.
"A guerra é a negação da política, porque a política se baseia no pluralismo, na persuassão e no diálogo e se decide pelo voto: as maiorias prevalecem com o respeito das minorias, que podem se tornar majoritárias em um outro momento. A guerra não visa a persuadir, a dialogar, mas sim eliminar o adversário transformado em inimigo. Isso vai ter um impacto positivo para a Colômbia e o conjunto da América do Sul."
Reis diz que a Colômbia é um país que viveu durante muitos anos uma verdadeira guerra entre conservadores e liberais, e a partir dos anos 60 guerrilhas com perspectiva de criação de um regime popular. Essas guerrilhas sofreram um impulso com a vitória da revolução cubana e tinham várias tendências, desde as do Partido Comunista, passando pelos castristas até aos maoistas, que chegaram a ter uma relevância muito considerável nos anos 60 e 70, depois foram declinando até que restou apenas as FARCs.
O professor da UFF lembra um outro momento importante na Colômbia ha 15, 20 anos, quando uma guerrilha importante foi formada pelo Exército de Libertação Nacional (ELN), que era muito próxima da linha cubana. A ELN se legalizou como partido e os resultados foram desastrosos, porque uma parte importante de suas liderança foi assassinada por paramilitares a soldo dos grandes interesses econômicos.
© FOTO: MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO DA COLÔMBIA
"Agora estamos diante de uma nova tentativa protagonizada pelo governo colombiano e pelas FARCs, e esperamos que essa reinserção se realize sem maiores danos. Trata-se de legalizar as FARCs como um partido político que vai dusputar o voto dos colombianos como os demais."
Reis observa que há muito tempo, embora a guerrilha não fosse destruída pelas forças do governo, também já não conseguia ampliar o circuito da sua audiência. Segundo ele, setornou evidente para a guerrilha que era necessário trabalhar numa paz dos bravos — como o general De Gaulle chamava por ocasião da independência da Argélia — sem humilhações ou capitulações vergonhosas para nenhum dos lados. Agora isso passa pela institucionalização do acordo.
"Outro aspecto a ser salientado no acordo é o protagonismo diplomático assumido por Cuba. Todas as conversações aconteceram em Havana, também com o beneplácito de outros atores,conferindo um protagonismo diplomático ao governo de Cuba que é muito benvindo pelos cubanos nesse momento de restabelecimento de relações com os Estados Unidos."
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