Imprensa internacional revelou em abril dois empréstimos garantidos pelo Estado e fora das contas públicas. Há mais um.
As revelações de dívidas ocultadas nas contas públicas geraram choque e alarme na vida política de Moçambique e minaram a confiança dos doadores. Num país que ainda depende do exterior para o financiamento do Orçamento do Estado, a ameaça de derrapagem da dívida pública tornou-se assunto dominante, ofuscando a crise económica, o conflito com a Renamo e ainda o desastre provocado pela seca.
A imprensa financeira internacional revelou em abril dois empréstimos garantidos pelo Estado e fora das contas públicas, para compras militares, e que o governo não só já confirmou como entretanto adicionou um terceiro crédito ao Ministério do Interior, elevando o total da dívida para 1,4 mil milhões de dólares ocultados.
Quando as primeiras notícias rebentaram, o Fundo Monetário Internacional (FMI) cancelou uma missão a Maputo, prevista para meados de abril, e suspendeu o pagamento da segunda tranche de um financiamento a Moçambique.
Vários parceiros internacionais de Moçambique deram conta da sua estupefação e admitem rever os seus desembolsos, enquanto aguardam mais explicações tanto do governo como do FMI.
A própria Frelimo, partido no poder, deliberou, na última reunião do Comité Central, que o governo deve esclarecimentos, embora antes, na mesma semana, a bancada do partido maioritário tenha recusado uma convocatória da oposição para elucidar os deputados.
O primeiro-ministro deslocou-se a Washington a 19 de abril expressamente para explicar este caso à diretora-geral do FMI, Christine Lagarde, ao Banco Mundial e ao governo norte-americano.
Segundo um comunicado do FMI, Agostinho do Rosário reconheceu um valor superior a mil milhões de dólares da dívida externa que não tinha sido previamente comunicado e a instituição iniciou reuniões com equipas técnicas do executivo moçambicano, visando uma análise completa da situação e a "restauração da confiança", enquanto referia que os novos acontecimentos trazem uma alteração da análise das perspetivas económicas de Moçambique.
A 26 de abril, o porta-voz do Conselho de Ministros admitiu três empréstimos no âmbito do setor da defesa e até então por confirmar: 622 milhões, em 2013, à empresa Procindus, 535 milhões à Mozambique Asset Management no ano seguinte, a que se soma um terceiro crédito de 221 milhões envolvendo o Ministério do Interior, entre 2009 e 2014 - tudo antes da posse do atual executivo e justificado pela segurança de recursos estratégicos, a começar pelo gás, embora sem prestação pública.
Reestruturação da Ematum
A revelação de novos empréstimos aconteceu logo após o governo ter realizado a reestruturação bem-sucedida da dívida da Ematum (Empresa Moçambicana de Atum), empresa participada pelo Estado e pela secreta e que em 2013 se financiou no exterior, com aval do governo e manteve 850 milhões de dólares fora das contas públicas. Por pressão dos doadores, os chamados "títulos do atum" ficaram entretanto inscritos nos números do Estado e, após a reestruturação em março do empréstimo junto dos credores internacionais, o montante foi convertido em dívida soberana.
Enquanto o primeiro-ministro apela para que se resista ao "pânico", vozes emblemáticas dentro da Frelimo, como Graça Machel, avisam para os riscos de degradação da imagem de Moçambique e o influente Teodato Hunguana alerta para a "colonização por uma troika", por via de um eventual resgate.
A dívida pública moçambicana já se encontrava perto dos 40%, que as instituições internacionais consideram uma "linha vermelha", levando o diretor do Banco Mundial para Moçambique a prevenir para a perda de financiamentos indexados ao endividamento.
Organizações da sociedade civil pediram explicações públicas do governo e também uma investigação criminal a um caso que, segundo o prospeto confidencial do governo moçambicano aos investidores da Ematum, poderá disparar a dívida pública de 40% em 2012 para uns inquietantes 73% do PIB.
Os 24 atuneiros comprados pela Ematum estão parados no porto de Maputo e se há algo difícil de se encontrar na capital é atum fresco.
Maputo, serviço especial da Lusa para o DN
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