No momento que corre uma
das palavras mais ouvidas é
“diálogo”. O diálogo parece
ser a única solução para o
risco de uma nova guerra generalizada.
Eu acho que pode ser... ou pode não
ser.
Comecemos por ver o que é o diálogo.
Dou um exemplo:
“António: Eu proponho isto.
Luís: Não aceito!
António: Eu proponho aquilo.
Luís: Não aceito!
António: Eu proponho aquela outra
coisa.
Luís: Não aceito!”
Embora possa não parecer, isto é
uma forma de diálogo... que não leva
a lado nenhum. Pelo menos a lado
nenhum bom.
Embora eu não conheça detalhes,
muito provavelmente foi o que aconteceu
quando a Frelimo contactou o
Governo português para negociar
pacificamente a nossa Independência.
Os argumentos do Governo de
Lisboa terão sido que a proposta de
Independência contrariava a constituição
e as leis do Estado português.
Que a constituição falava das províncias
ultramarinas e isso não podia
ser alterado. O resultado foram
10 anos de guerra, a luta armada de
libertação nacional, e o fim da constituição
e das leis colonialistas portuguesas.
Aqui mesmo ao lado, o Congresso
Nacional Africano teve, dezenas de
anos, uma política de lutar pacifi-
camente contra o apartheid. O Governo
de Pretória respondia que o
sistema do apartheid estava na constituição
e nas leis do país e, portanto,
não podia ser abolido. Foi preciso o
ANC optar pela luta armada, através
do Umkhonto we Sizwe, para que a
constituição e as leis do apartheid
fossem abolidas.
A escravatura, que levou milhões de
africanos para longe do continente,
era perfeitamente legal nos paí-
ses que a praticavam. O facto de as
mulheres não poderem votar, ou ser
votadas, era legal e constitucional em
muitas partes do mundo. Ainda hoje
o é, por exemplo, na Arábia Saudita.
Entre nós a constituição e as leis,
elaboradas na altura da Independência,
consagravam um regime de
partido único. Mas quando se viu
que esse sistema já não correspondia
às necessidades do país, uma nova
constituição e novas leis adoptaram
o multi-partidarismo.
Portanto, a constituição e as leis não
são livros santos, inalteráveis. São
instrumentos que vão sendo melhorados
de acordo com o estágio da
vida do país.
Tudo isto para dizer que um encontro
entre Afonso Dhlakama e Filipe
Nyusi pode ser extremamente importante...
ou pode ser pura perda de
tempo.
Se o diálogo decorrer como o que
cito acima entre o António e o Luís,
com este último a invocar a constituição
e a lei, para dizer que não a
tudo, não vale a pena.
Se, pelo contrário, decorrer entre
duas pessoas que procuram soluções
políticas, cada uma aberta para dar
e receber, deixando para depois os
ajustamentos legais, pode ser uma
solução para a Paz definitiva no país.
Por isso penso que devemos exigir
um diálogo, sim, político e sem pré-
-condições constitucionais e legais
que o esvaziem de todo o seu conteúdo.
Se isso não acontecer, as possíveis
consequências assustam-me muito.
Há algum tempo que os desejos de
paz vêm sendo substituídos por
vários relatos de confrontos militares.
Relatos estes que acompanharam
a governação anterior, rompendo
com os vinte anos de relativa paz, e que
tinham como plataforma mister a necessidade
de um diálogo político entre o Governo
e a Renamo. De lá para cá nada de
substancial se alterou. Hoje, o mal-estar
político-militar agudizou-se. É como se o
debate e/ou diálogo sobre a paz estivesse
a mudar de perspectiva ao ponto de se
poder afirmar que o mesmo passou a ser
feito através de confrontos militares entre
as forças governamentais e da Renamo.
A par disso, uns e outros apelam a que
se façam discursos apaziguadores, que
se escreva e se fale em prol da promoReiterar
a paz
ção da concórdia. Mas, volta e meia, são os
mesmos que, usando a imprensa pública, vilipendiam
e diabolizam àqueles que julgam
merecer profundamente ser alimentados na
base desse menu. Chegam mesmo a desejar
uma imprensa “independente” acorrentada às
suas ordens e ao ainda forte efeito ruminante
da febre do monopartidarismo. Chantageiam
jogando com promessas de maior ou menor
pacote de publicidade consoante a aceitação
de maior ou menor obediência. O profissional
assim alienado passa a não discernir nitidamente
entre “notícia” e “informação”.
As notícias já retratam ataques armados ao
longo da EN1, sobretudo no troço Save-
-Muxúnguè. Conversa-se e diz-se: “isto está
mal, está muito mal mesmo!” Estas palavras
podem ter sido ditas por mais de cinco mil
refugiados moçambicanos, agora no Malawi.
Lá não estão preocupados com a discussão
sobre o seu rótulo: se são mesmo refugiados
ou deslocados; se foram ou não as forças governamentais
a causa da sua percepção de que
“isto está mal!”. Estão à espera que a guerra
termine para poderem regressar.
“Isto está mal” por uma série de razões que
se interpenetram entre si. O diálogo político
entre o Governo e a Renamo parece não ter
puxado para si a sinceridade e o desejo comum
de uma solução imediata e duradoura,
tendo-se usado para tal o “argumento Constituição”;
descartou-se a mediação internacional
acreditando-se que internamente
produziríamos uma solução sustentável e de
agrado geral; os mediadores nacionais foram
transformados em meros espectadores e, no
final, receberam como contraparte o rótulo
de oportunistas que “queriam dar nas vistas”;
a chamada “sociedade civil” foi igual a si
em termos de inoperância e fragilidade,
dando razão aos que defendem que
a qualidade de democracia depende da
qualidade de cidadania; a Assembleia da
República foi mais de vénia ao Governo,
enfraquecendo o seu papel fiscalizador.
Cá entre nós: não nos conformemos com a
actual situação político-militar. Há muito
mais espaço para a paz e convivência em
diversidade, do que para a guerra. O diálogo
político em si, no espírito e na letra, como
plataforma de entendimento, sempre foi
tido como saída. Há anos que se exige isso.
O problema é que o diálogo político nunca
foi assumido como tal. A acontecer, o diálogo
político terá de ser sério, terá de trazer soluções!
Com Moçambola-2016 à vista, os 16 clubes que tomarão parte da competição ainda encontram-se com a situação não regularizada. Segundo o Secretário-geral da Federação Moçambicana de Futebol (FMF), Filipe Johane, até este momento “nenhum clube está licenciado” para participar no Moçambola desta temporada, porém garante que este facto não coloca em causa o decurso normal da prova. Instituído pela Confederação Africana de Futebol (CAF), em 2010, o licenciamento de clubes passou a ser obrigatório, desde 2015, onde a entidade que gere o futebol africano considera obrigatório, fundamental e requisito número um para a participação nas competições por si organizadas. Entretanto, até hoje nenhum clube conseguiu acompanhar as novas exigências do futebol africano. Em entrevista concedida à nossa reportagem, à margem do Seminário de Licenciamento de Clubes, que se realizou esta semana, em Maputo, Filipe Johane revelou que até ao momento “nenhum clube está licenciado” e adianta que apenas três é que estão num processo avançado, tendo já reunido mais de 90% dos requisitos. Trata-se dos Ferroviários de Maputo e da Beira e a Liga Desportiva de Maputo. “Nenhum clube está licenciado para este ano. O processo está Seis anos depois da introdução do licenciamento dos clubes Nenhum clube está licenciado extremamente atrasado, porém, há clubes que estão com mais de 90% do processo concluído. A LDM e os Ferroviários da Beira e de Maputo. Estes respondem todos os requisitos e é só uma questão de pormenores”, disse a fonte. Para o licenciamento, cinco requisitos são exigidos pela CAF, onde destaca- -se os critérios desportivo; legal e das infra-estruturas. O critério desportivo corresponde à estrutura do clube no que tange aos escalões por ele movimentado; o seu corpo técnico; de saúde; entre outros. Segue-se o critério das Infra-estruturas, correspondente à existência ou não de uma sede própria do referido clube, de um campo próprio e suas características. Em terceiro lugar, está o critério legal, onde exige-se a certidão de equitação actualizada, estatutos, situação contratual dos funcionários regularizada, etc. O processo está divido em três etapas. A primeira consiste na submissão e avaliação dos documentos de candidatura fornecidos pelo clube à Comissão de Licenciamento, seguindo- -se a visita às instalações do mesmo e, em terceiro, a aprovação do processo e licenciamento do clube. Representantes moçambicanos “perdoados” Em 2015, a CAF exigiu o licenciamento dos clubes, como sendo a condição destes participarem nas provas por si organizadas (Liga dos Campe- ões e Taça CAF) e os representantes moçambicanos, LDM e Ferroviário da Beira, conseguiram cumprir com o recomendado. Entretanto, para este ano, o caso é diferente. Os representantes moçambicanos encontram-se em situação irregular. Porém, Johane garante que os dois clubes farão parte das competições, mas sublinha que será a última vez. “Continua sendo obrigatório licenciar os clubes, mas neste ano haverá uma ponderação. Mas, 2017 é o tempo limite para a implementação do licenciamento”, revela. “Este é o último curso que a CAF dá ao mais alto nível. Neste ano, todos devem estar devidamente licenciados para que em 2017 possam competir sem nenhuma restrição”, continua a fonte. Questionado o que estará a falhar para que de 2009 a esta parte, nenhum clubes esteja licenciado, Johane atirou: “Os clubes é que podem explicar o que estará a falhar para que até hoje não se consigam licenciar, porque estes é que não conseguem reunir os requisitos exigidos”, respondeu. Em 2015, o então Presidente da FMF, Feizal Sidat, afirmou que o Moçambola não ia ser disputado, enquanto os clubes não se licenciassem, mas o campeonato acabou rodando até à última jornada sem nenhuma interrupção. “Com a insistência da Federação, os clubes acabaram submetendo os processos, mas não foi possível concluí- -lo. O licenciamento é feito após reunião de todos os requisitos”, explica Johane. Para este ano, aquele dirigente afirma que não está prevista nenhuma sanção, mas reafirma que em 2017 nenhum clube será perdoado. “As exigências da CAF não estão ao nosso QtYHOµ 5DÀN6LGDW O presidente da LDM, Rafik Sidat, explica que a sua colectividade ainda não está licenciada porque falta entregar o relatório de contas (auditado), mas promete concluir o processo este mês. Sidat esclarece que em 2015 não foi preciso estarem licenciados para participarem das Afrota- ças, pois as exigências da CAF são difíceis de cumprir em curto período. “Este processo vai levar o seu tempo, porque as exigências que a CAF faz são muitas e é muito difícil que os nossos clubes satisfaçam as mesmas. Acredito que com estas exigências, se calhar nem 10 clubes no nosso país vão estar em condições de satisfaze- -las”, defende Sidat. Por sua vez, o vice-presidente do Clube do Chibuto para a Alta Competição, Junneid Lalgy, afirma que o seu clube está na fase conclusiva do processo e que até a próxima semana estará concluído. “Estamos a reunir todos os requisitos necessários para obtermos a licença”, diz Lalgy. Abílio Maolela.
O Movimento Literário Kuphaluxa lança no próximo dia 26 de Fevereiro, sexta-feira, pelas 17:30h, no Centro Cultural Brasil – Moçambique (CCBM), em Maputo, o livro “Para Uma Cartografia da Noite” da autoria de Álvaro Fausto Taruma, patrocinado pelo Fundo para o Desenvolvimento Artístico e Cultural (FUNDAC), e chancelado pela Literatas. A obra de estilo prosa poética com uma profunda abordagem existencial, do amor e dos afectos a outras preocupações do quotidiano que só na lavra do poeta podem ganhar liricidade e estética. Discípulo assumido do poeta Eduardo White, Taruma tem na prosa o caminho para o encontro da poesia. Com uma escrita desassossegada e lírica, encontra na metáfora o destino de muitas vidas. Álvaro Fausto Taruma, que já vem militando no exercício da palavra e da poesia, estreia-se assim como autor na literatura moçambicana. A obra “Para uma Cartografia da Noite” será apresentada pelo professor de literatura Lucí- lio Manjate e Tavares Cebola. No prefácio, o poeta moçambicano radicado em Portugal, Delmar Gonçalves, ao ler a poesia de Álvaro Fausto Taruma, conclui que este foi escolhido pela palavra. E clarifica: “O ofício da escrita definitivamente não é para todos. Podemos afirmá-lo com inteira convicção. Mas neste caso específico é claro o talento nato da poética deste jovem escritor que emerge das águas sagradas do Índico.” Delmar Gonçalves diz ainda sobre “Para uma Cartografia da Noite” que “para quem o coJuventude inconformada e por vezes rebelde nhece bem certamente perceberá que há uma fusão permanente do autor enquanto poeta, do país que o viu nascer e o retém e do homem que nele habita!” “Lê-lo é rever a grande massa da juventude inconformada e por vezes rebelde que sonha novos futuros sem deixar de navegar com a esperança como bússola.” Álvaro Fausto Taruma nasceu em Maputo no ano 1988. É formado em Sociologia e Antropologia, e possui outra formação em Ensino de Português, pela Universidade Pedagógica. Teve uma curta passagem pela área da Educação e actualmente exerce funções na área do empreendedorismo social. Ao longo do tempo, dedica-se ao cultivo do texto escrito, em vários géneros, possuindo uma publicação dispersa em jornais e revistas, sendo que esta obra marca a sua estreia em livro no campo da literatura. A.S Álvaro Fausto Taruma estreia-se na literatura com.
C erto de que nos estás a ver, não sei como dizer-te o que se está a passar. Não te leram, é isso, não te leram. Não perceberam nem as tâmaras amargas sobre Beirute, nem a Epístola Maconde, nem a Babalaze das Hienas. A guerra está aí outra vez. Melhor do que nós, tu sabes quem gosta dela e deixou apodrecer as tanjarinas de Inhambane. Continuam os olhos de farinha de milho e muitas bocas ficarão abertas e mudas, exalando o cheiro da morte. Há quem chame interesse nacional a isso mas o país que sonhaste é um corpo ferido. Tu nunca quiseste as regiões demarcadas que andam por aí e sabes que voltarão os massacres dos índios no cinema Império. Os outros, os do dólman vermelho do senhor capitão, pouco sabiam de metáforas mas não se eximiram a aprisionar-te, pelo sim, pelo não. Agora preocupa-se quem pode. Ainda há, ainda há…. Mas são logo apodados de apóstolos da desgraça, de alarmistas, de anti-patriotas, de pessimistas, no mínimo. A guerra sempre foi a jubilação última dos interesses escondidos e, quem a faz, traveste-a de grandes razões. O interesse nacional, é isso. O interesse nacional. A narrativa é tentadora porque a guerra é a melhor linha de montagem para produzir heróis, essa espécie de fraude, esse desespero e medo e obediência cega envolta em palavras espúrias, baba com que as aranhas tecem a sua teia. Não te leram, não querem, não sabem dos agónicos sentidos do amor que foi a tua grande palavra, os teus versos, a dádiva inteira com que afrontaste o sentido trágico que sabias haver em ti. Faltam agora as raízes salgadas dos espíritos, tu o sabes e tens o poder de as zurzir na gargalhada nocturna das hienas que deambulam preparando a carniça. Dizia o teu “anverso”, o Rui, que a um poeta pode cortar-se-lhe a cabeça mas que isso tem uma importância danada. Mas eles não percebem. Não sabem que o sangue de García Lorca continua a cair sobre Espanha e que a tua indignação amaldiçoará para todo o sempre os novos centuriões, os que querem a terra devastada e a isso dizem e repetem que é o interesse nacional. Não te leram. Puseram-te em todos os manuais escolares, há loas e protocolares louvações na Praça e eles julgam-te lá, enfarpelado da glória que é só tua e dádiva para nós. Nem imaginam que continuas a presidir às bodas do amor na tua Mafalala Mundo e que as mulheres, porque só elas sabem do fruto sagrado que geram nos seus ventres, assomam à janela do sonho e da recusa da morte e saúdam em ti o deus humano que passa, e cantam o eterno, sobrepondo as suas vozes ao estrondo dos obuses. São elas a Pátria e a Mátria. E saberão guardar a vida pelas muitas luas dos seus corpos que são a convulsionada beleza da terra. E esse é que é o interesse nacional.
O Centro Cultural Franco-Moçambicano, com o apoio de Atelier Mondial, Pro Helvetia Johannesburg e FATC apresenta nesta sexta-feira, 19 de Fevereiro de 2016, às 19:00h espectáculo de dança contemporânea intitulado “Interim, em busca de uma consciência sensorial”. Interim é uma peça de dança sobre a rela- ção entre a percepção sensorial, a memória e o movimento. Remete-nos para a descoberta da relação entre o mundo interior e exterior, usando os sentidos como ponte de transmissão de informação expressa através do movimento. Busca de uma consciência sensorial Procura-se com este trabalho o regresso a uma interpretação instintiva e intuitiva na partilha de uma linguagem entre dois corpos dançantes em relação com o público e o seu torno, procurando encontrar experiências compartilhadas de engajamento para tecer diálogos em movimento. Para este espectáculo protagonizado pela su- íça Margarita Kennedy e pelo sul-africano Thamasanqa Majela, temos a seguinte ficha técnica: Conceito: Margarita Kennedy; Coreografia e interpretação: Margarita Kennedy e Sylvester Thamasanqua Majela; Iluminação: Mandla Mtshali e Thabo Pule. A.S O Centro Cultural Franco-Moçambicano acolheu recentemente a apresentação do filme Sur les chemins de la Rumba – “Sobre os caminhos da Rumba”, de David-Pierre Fila. Logo após a projecção do filme, realizou-se um debate em torno do mesmo, que contou com Fulgêncio Samo, representante da escola Tangueart e Frias Fumo, representante da escolar Sensações Tango. “Sobre os caminhos da Rumba” sagens que encarnam esta música carregada de histórias de viagens, de intercâmbios e de mensagens de paz. Trata-se de um documentário Francês & Espanhol (com legendas em Português), saído em 2015. A Realização e o cenário deste filme, cuja duração é de 126 minutos, estão a cargo do David-Pierre Fila, numa Produção Bantous Productions, Masai Productions, Gamboa y Gamboa Lda., Happygenio Lda., La Foundation Arte-Imagen ARIC. A.S Este filme transporta- -nos a uma viagem através da costa Africana, Congo, Cuba, Equador e Costa do Marfim, temperada por notas familiares ansiosas por encontrar a essência desta arte musical Africana com um olhar posto nos ritmos da Bacia do Congo, que foram efectivamente as origens que lhe deram forma e alma. O resultado é uma harmonia habitada pela beleza de homens, mulheres e pai-
O preço do petróleo terá de estabilizar nos 40 dó- lares/barril para a economia russa conseguir atingir dentro de quatro anos a dimensão equivalente ao PIB de 2014, segundo estimativa do Ministério das Finanças de Moscovo. Após uma quebra de 3,7% em 2015, a contracção do PIB será de 0,8% este ano, de acordo com previsões divulgadas segunda- -feira pelo jornal Vedomosti, considerando a variante mais positiva que possibilitaria, posteriormente, um crescimento anual de 1% - 1,3%. Todos os cenários advertem para a urgência de reformas estruturais, designadamente o aumento da produtividade laboral e do consumo interno, admitindo, na melhor das hipóteses um crescimento de 13% entre 2014-2030. Uma cartada longínqua Os salários reais sofreram uma queda de 13% nos últimos dois anos, algo de inédito desde o início da era Putin em 2000, e previsivelmente só em 2025 irão recuperar os valores de 2014. O acesso de empresas russas aos mercados financeiros internacionais e o investimento estrangeiro na modernização do sector dos hidrocarbonetos, responsável por cerca de metade das receitas orçamentais, surgem, também, como essenciais para a recuperação. Manter a produção petrolífera ao nível mais elevado possível e/ ou contrariar a queda dos preços são objectivos estratégicos para o Kremlin, independentemente de Vladimir Putin ter declarado em Outubro que já passara o pior da crise económica e financeira. Um compromisso com a Arábia Saudita é, portanto, uma opção possível, sobretudo numa altura em que o apoio militar ao regime de Bashar al-Assad se revela proveitoso para negociar em posição de força. A guerra da Síria oferece presentemente o maior leque de possibilidades negociais a Putin ao obrigar os sauditas a admitirem um acordo com os alauítas, deixando em aberto a hipótese de eventual afastamento de Assad, em troca de garantias de conten- ção do Irão. Moscovo visa, também, pressionar a União Europeia a tentar conter refugiados na Turquia para o que serão necessários os préstimos de Moscovo no conflito sírio. A resistência dos jihadistas sunitas na Síria e no Iraque é factor dificilmente controlável, mas Moscovo consegue insinuar-se no Médio Oriente como interlocutor necessário. Um acordo por insatisfatório e precário que salvaguarde os interesses essenciais dos principais contendores poderá até abrir caminho para negociar o levantamento de sanções pela anexação da Crimeia e invasão da Ucrânia. As viciosas e escandalosas crises políticas em Kiev levam água ao moinho do Kremlin nestes cená- rios optimistas. Poucos dólares por barril A extracção de 10,9 milhões barris/dia (b/d) em Janeiro deste ano, um recorde pós-soviético, foi negociado por Moscovo com a Arábia Saudita, Qatar e Venezuela, como limite à produção para encetar a recuperação dos preços do petróleo. O acordo de Doha está dependente do assentimento dos demais produtores e se o Iraque (4,37 milhões b/d) admitiu congelar ou mesmo reduzir a extrac- ção, o Irão, após o levantamento de sanções, pretende aumentar em 1 milhão b/d o nível de produção de Janeiro (2,86 milhões b/d). O excesso de oferta (1,8 milhões de b/d em 2015) torna difícil a estabilização de preços sem perda de quotas de mercado pretendida por sauditas e aceite condicionalmente por Moscovo, apesar do retorno às exportações do Irão, quinto maior produtor da OPEP. Um estudo divulgado este mês pela “Wood McKenzie”, considerando uma produção total de 97,07 milhões b/d em 2015, admite que abaixo dos 35 dólares (usd) apenas 3,4 milhões b/d sejam extraídos com prejuízo. A necessidade de manter operacionais investimentos de vulto, caso da extracção no Árctico ou do pré-sal brasileiro, a flexibilidade e o baixo custo do petróleo de xisto criam condições para a sobrevivência de produtores, incluindo boa parte dos 4% de concessionários de explorações presentemente não rentáveis, ameaçados pela estratégia de Riade. As explorações de petróleo de xisto (4 milhões b/d) deverão inclusivamente duplicar a extracção em duas décadas, o que corresponderá a cerca de 40% da produção dos Estados Unidos, de acordo com o “2035 Energy Outlook BP”. Fruste e imprevisível As reservas financeiras da Arábia Saudita (cerca de 630 mil milhões usd) oferecem folga para pressionar outros produtores, mas o risco de isolamento político de Riade faz-se sentir. Confrontos estratégicos, em particular entre sauditas e iranianos, guerras na Síria, Iraque e Iémen, apertos económicos em Moscovo, desesperos de desvairados em Caracas, turbulência financeira e política ante queda abrupta de preços levaram a um acordo fruste. A manobra é arriscada e o que daqui resultar dificilmente satisfará a maior parte dos interessados. *Jornalista
Há um mês do início do campeonato nacional de futebol, a Liga Moçambicana de Futebol (LMF) anunciou o cancelamento do concurso público para a cedência dos direitos de transmissão televisiva dos jogos desta competição, lançado em Mar- ço de 2015 pela anterior direcção daquele organismo, liderada por Alberto Simango Júnior, actual presidente da Federação Moçambicana da modalidade (FMF). Num curto comunicado e sem avan- çar as razões, a entidade liderada por Ananias Couane limita-se a informar que cancelou o concurso pú- blico para a cedência dos direitos de transmissão televisiva dos jogos do Moçambola, lançado a 10 de Março de 2015. O concurso foi lançado, após expirar o contrato da Televisão de Moçambique (TVM) que, entretanto, a sua renovação não é consensual, devido às dívidas que aquela estação emissora acumulou. Na Assembleia-Geral havida em Fevereiro de 2015, a última na era de Alberto Simango Júnior, a LMF anunciou uma dívida da TVM de cerca de 30 milhões de meticais referentes ao período entre 2012 e 2014. Tema com “barba rija”, mas que nunca teve uma solução plausível. Por exemplo, o Incomati de Xinavane, que está fora do Moçambola desde 2012, espera receber um valor de 700 mil meticais deste processo. Estando há um mês do início do Moçambola, o SAVANA saiu à rua para ouvir os clubes e estes rejubilam-se com a atitude da LMF, mas dividem-se quanto ao futuro do negócio. Junneid Lalgy, vice-presidente para Alta Competição no Clube do Chibuto, felicita a LMF pela atitude, mas espera que o cancelamento do concurso tenha em vista melhores propostas. “Espero que o concurso tenha sido cancelado para propostas melhores, porque os clubes precisam do dinheiro das transmissões televisivas. A nível mundial, os clubes sobrevivem através desse dinheiro”, afirma aquele dirigente, revelando que o seu clube está à espera de mais de 300 mil meticais deste negócio. Para este, a melhor proposta seria procurar soluções externas, como é o caso do canal sul-africano, SuperSport, que transmite campeonatos de quase toda a África e, em particular, dos países vizinhos. “O Moçambola já tem condições para passar na SuperSport. Temos um campeonato competitivo e que está ao nível de alguns campeonatos da região que passa naquele canal. É só uma questão de apostarmos”, considera. À semelhança do Clube de Chibuto e Incomati de Xinavane, tantos clubes estão com valores branqueados na televisão pública e a Liga Desportiva de Maputo é um dos exemplos. Segundo Rafik Sidat, a TVM deve à LDM mais de três milhões e quinhentos mil meticais, desde 2012. Por isso, Sidat considera tardia a decisão tomada pela direcção da LMF. “Penso que este cancelamento já vai muito tarde, porque em qualquer Debate sobre as transmissões televisivas volta à ribalta Por Abílio Maolela contrato existem cláusulas de incumprimento e logo que a TVM incumpriu devia ter sido cancelado”, disse, reconhecendo a atitude da LMF com o ditado popular: “vale mais tarde do que nunca”. Cancelado o concurso e com o Mo- çambola à vista, Rafik Sidat diz esperar pela Assembleia-Geral da pró- xima segunda-feira para ver o que acontece, porque “haver transmissão de jogos, os clubes devem receber dinheiro”. Questionado se o mercado internacional seria alternativo, Rafik Sidat mostrou-se céptico quanto à opção avançada por Lalgy. “Não acredito que a SuperSport esteja interessada no nosso campeonato. O nosso campeonato não tem expressão para ser transmitido na SuperSport. É preciso abrirmos as portas para os jogadores estrangeiros como acontece nos outros países”, considera. Se uns foram informados, outros não, como é o caso do Maxaquene. O vice-presidente do clube para a área do futebol, Samuel Maibasse, revelou que tomou conhecimento da decisão, através da comunicação social. “A direcção da LMF tem competência para tomar qualquer decisão, mas tratando-se de um assunto de interesse dos clubes é preciso que se trate directamente com os clubes e de forma transparente”, disse, manifestando o interesse do assunto ser clarificado nesta Assembleia-geral. Maibasse conta que, ao Maxaquene, a TVM deve cerca de cinco milhões de meticais, valor imprescindível para a vida do clube. Entretanto, aquele dirigente mostra- -se cauteloso quanto às opções a serem tomadas nos próximos passos, porque a escolha de uma operadora internacional deixa-nos numa “situação delicada e complexa”. “Qualquer compromisso assumido nesse sentido deve garantir que os moçambicanos possam ter acesso aos jogos. É preciso que os jogos sejam transmitidos dentro dos canais nacionais, mesmo que a produção seja internacional ou por parceria”, come- çou por dizer. “Não vejo que estejamos suficientemente preparados para trabalhar com cadeias internacionais, porque a organização do nosso campeonato está para além do desejado e nem estabilidade necessária como acontece no estrangeiro, em que os jogos são publicitados com muita antecedência. Se a ideia for trabalhar com cadeias televisivas internacionais, exige-se mais da nossa organização”, concluiu. “Os candidatos não reuniam os requisitos”, Ananias Couane O presidente da LMF, Ananias Couane, afirma que a sua direcção cancelou o concurso “porque os candidatos não reuniam os requisitos necessários para a transmissão dos jogos”, entretanto, não os revelou. Questionado qual seria o passo a seguir, Couane respondeu que a LMF está a estudar uma solução interna, que passa por um operador que garanta o reembolso do dinheiro aos clubes. Aliás, o timoneiro da LMF adianta que não vai recorrer ao mercado estrageiro para suprir as necessidades. Esta segunda-feira, a LMF vai a sua XXI sessão da Assembleia-Geral Ordinária e este assunto é um dos que estará em debate, para além do relatório de contas e das actividades de 2015.
Uma guerra injusta,
para um povo sofrido
No meio da euforia que marcou as primeiras eleições multipartidárias
em Moçambique, naquele mês de Outubro
de 1994, provavelmente poucos teriam imaginado que o
país voltasse a passar pelos momentos de miséria vividos
durante os 16 anos de guerra que transformaram este país num
dos cantos mais pobres do planeta.
Mas tão remota era essa ideia, que ela hoje é tão real. Um país de
novo mergulhado numa guerra estúpida, e um povo a ser chamado
mais uma vez a consentir sacrifícios perfeitamente evitáveis, ao
mesmo tempo que tem de lutar pela sua própria sobrevivência. A
história repete-se, e o homem, esse animal supostamente racional,
tem a temeridade de nunca querer aprender do seu próprio
passado.
Deve ser uma grande vergonha que passados mais de vinte anos
depois do Acordo Geral de Paz, os dois protagonistas desse trá-
gico conflito não tenham conseguido se reconciliar, ao ponto de
novamente estarem a arrastar o povo para uma outra guerra.
Chegamos a este ponto porque embora os acordos de Roma
fossem um ponto de partida numa longa caminhada para que
os intervenientes da guerra dos 16 anos iniciassem um processo
de reconciliação, eles desperdiçaram todo este tempo, cada um
procurando mostrar melhor o quanto odeia o outro. O seu único
denominador comum passou a ser a sua vontade partilhada do
mútuo extermínio.
Vimo-las a exteriorizar esse sentimento mútuo de ódio ao nível
do parlamento onde, por supostamente estarem em representação
do povo, se exigia que pautassem por uma postura de solenidade
e de respeito recíproco.
Agora que já entornaram o caldo, recorrem à mais infantil das
propagandas, acreditando que o povo não tem capacidade de discernimento.
Mas o povo não quer consumir propaganda, que se
resume em cada uma das partes tentar provar que é a outra o responsável
pela situação de guerra em que o país se encontra.
O povo quer é que não haja guerra, porque pela sua longa experi-
ência, sabe que esta só traz a morte e a miséria, e atrasa o desenvolvimento
do país. Se há algo que deve ser motivo de orgulho
para os líderes políticos deste país deve ser a sua capacidade de
encontrar uma solução que ponha fim a este estado de coisas.
A situação em que o país se encontra é extremamente delicada.
Mas não significa que seja impossível sair-se dela. Com um posicionamento
claro sobre o que se pretende fazer, com uma definição
clara de objectivos e, acima de tudo, com um engajamento genu-
íno e honesto entre o governo e a Renamo, é possível alcançar-se
um entendimento que traga de volta a paz para Moçambique.
Honestidade num processo negocial significa realismo nas exigências
que cada uma das partes faz em relação à outra. A estratégia
de exigir coisas impossíveis, com a antevisão de que a outra
parte irá certamente recusar, e como resultado disso justificar a
continuação do conflito é uma faceta que denota desonestidade
no processo negocial.
No processo negocial é preciso dar todo o tipo de concessões que
forem necessárias para que haja progressos, mas é importante salvaguardar
o princípio de que Moçambique não pertence nem à
Frelimo nem à Renamo. Por isso, qualquer acomodação que seja
necessária para a solução de uma crise resultante do desentendimento
entre forças políticas deve sempre ter em conta a necessidade
de salvaguardar o princípio de que a soberania reside no
povo.
A ideia de que a Constituição é “um papel escrito pelo próprio
homem”, e como tal pode a qualquer momento ser alterada para
satisfazer os caprichos de uma formação política é totalmente errada,
e não deve ser entretida numa sociedade que se considera
democrática. Assim como é errado recorrer à violência como meio
para a obtenção de concessões políticas.
O Problema
a. O artigo 540 do Código de Processo
Penal (CPP) que determina que “Só poderá
interpor-se recurso da sentença para
a respectiva Relação, quando os representantes
da acusação ou da defesa expressamente
declararem que não prescindem
dele, antes de se proceder ao interrogatório
do réu.”
b. O artigo 561 do CPP determina que
“(…) Só pode recorrer-se da sentença fi-
nal, se a acusação ou a defesa declararem
antes do interrogatório do réu que não
prescindem do recurso e o interpuserem
logo em seguida à leitura da sentença.”
c. O parágrafo único do artigo 651 do
CPP que determina que “No processo
sumário, o recurso da sentença final só
pode interpor-se em seguida à sua leitura,
nos termos do artigo 561.
A obrigatoriedade legal da declaração
prévia e expressa de não prescindir de
recurso antes do interrogatório do réu
no julgamento em processos Sumário-
-Crime e Polícia Correccional é condição
processual essencial para admissibilidade
de recurso e consequente reapreciação
das sentenças proferidas nestes
processos-crimes.
Ora, em caso de prescindir-se de recurso,
de forma expressa ou tácita, pelo
silêncio neste caso, as normas do CPP
supra privam o exercício do direito
fundamental ao recurso, à impugna-
ção e à defesa. Com efeito, a garantia
da justiça e/ou da liberdade do réu
ficam em risco nas mãos do juiz que
tem absoluta certeza de que a sua decisão
não será objecto de apreciação
por instância superior, se não por meio
de recurso extraordinário. Este apresenta
especificidades de tramitação de
extrema complexidade e que constitui
um outro debate que não se pretende
aqui explorar ao detalhe. Assim, certo
de que a sentença não é passível de recurso
ordinário, o juiz pode, por isso ou
por incompetência ou incúria decidir à
margem da lei e do Estado de Direito
e em violação aos direitos e liberdades
fundamentais. Igualmente, fica em risco
a garantia da justiça se semelhante
Fundamentos da reflexão sobre
inconstitucionalidade de normas do CPP
Por João Nhampossa*
conduta do juiz perverso ou incompetente
culminar numa decisão de libertar
o réu, quando há elementos bastantes
para a sua condenação e dignos de
recurso em instância superior.
O problema de inconstitucionalidade
das normas do CPP em questão resulta
da obrigatoriedade legal da declaração
prévia e expressa de não prescindir de
recurso, a qual se mostra em desconformidade
com as seguintes disposi-
ções constitucionais: Nº 1 do artigo
62 da Constituição que determina que
“O Estado garante o acesso dos cidadãos
aos tribunais e garante aos arguidos o
direito de defesa e o direito à assistência
jurídica e patrocínio judiciário.” Artigo
70 da Constituição que determina que
“O cidadão tem o direito de recorrer aos
tribunais contra os actos que violem os
seus direitos e interesses reconhecidos pela
constituição e pela lei.” E, por sua vez, o
artigo 69 que determina que: O cidadão
pode impugnar os actos que violam os seus
direitos estabelecidos na Constituição e
nas demais leis. Estas disposições não
são objecto de renúncia e constituem
a garantia constitucional da extensão
do direito à defesa e direito de acesso
aos tribunais, considerando ainda a natureza
suprema da Constituição sobre
todas as restantes normas na ordem
jurídica nacional, conforme resulta do
disposto no nº 4 do artigo 2 da Constituição,
se não vejamos:
O direito à defesa e o direito à impugnação
são incontestavelmente de
natureza fundamental, dos quais não
é possível, nos termos dos princípios
constitucionais, prescindir ou renunciar,
tão-somente por serem direitos
fundamentais. A irrenunciabilidade é
uma das características essenciais dos
direitos e liberdades fundamentais,
sendo inexistente e inconstitucional
qualquer norma legal que permita tal
renúncia.
Logicamente, não deve, pois, o CPP
permitir a renúncia de direitos fundamentais
como é o caso do direito à
defesa, a impugnação e ao recurso aos
tribunais, neste caso para os tribunais
de instância superior àquela que proferiu
a decisão. A obrigatoriedade legal
da declaração expressa de não prescindir
de recurso constitui um evidente
comando legal que promove e permite
ao réu, a defesa e Ministério Público a
renúncia de direitos e liberdades fundamentais
em clara contradição com a
Constituição.
Com a excepção dos processos Sumá-
rio-Crime e Polícia Correccional, nos
outros processos crimes, os intervenientes
tem a liberdade, nos termos da
lei, de corrigir ou clarificar os registos
dos factos relatados em sede de discussão
e julgamento. Até aqui, o juiz não
tem poder absoluto ou total monopólio
sobre o que deve ser registado como
produção da prova, ainda que venha a
ignorar o registo de tais factos quando
proferir a sentença do caso. Porém, as
partes, querendo, podem recorrer desta
sentença para tribunal superior no prazo
legal. Caso contrário, perdem o direito
de recurso por caducidade ou por
decurso do prazo, o que não se traduz
na renúncia de direito. Pois, quem perde
prazo para o exercício de um direito
não significa que tenha renunciado esse
direito. Aquele que prescinde do direito
do recurso de forma expressa ou tá-
cita, não tem prazo nenhum para o seu
exercício porque renunciou tal direito e
o tribunal aceita privar o exercício do
mesmo com o fundamento no conteú-
do das normas objecto desta reflexão de
inconstitucionalidade.
Importa notar que os casos de privação
ou limitação do exercício de direitos
e liberdades fundamentais apenas são
admitidos nos casos expressamente
previstos na Constituição, em conformidade
com o disposto no artigo 56
desta lei suprema, o que não se confi-
gura no caso da limitação ou condicionalismo
processual essencial previsto
nas normas do CPP em apreço.
Concluindo
O conteúdo das normas do CPP supra
fere a extensão do direito à defesa por
via de recurso ou do direito fundamental
à impugnação por permitir a sua
renúncia em prejuízo da salvaguarda da
garantia constitucional destes direitos.
*Advogado
Heitor Alves Tembe, meu
companheiro de viagem
Por Eugénio Lisboa*
A verdade da guerra
No dia-a-dia damos curso
a múltiplas ideias e categorias
de análise como
se fossem naturais,
como se tivessem uma origem
genética.
Porém, ideias e categorias de
análise são produto social da
vida, da realidade do que e do
como fazemos, da educação que
recebemos, das relações que entabulamos
com outros, das rela-
ções que temos com a natureza.
Por outras palavras, ideias e categorias
de análise não são produtos
naturais, não tem origem
genética, não nascem por gera-
ção espontânea.
As mudanças sociais não ocorrem
apenas porque mudamos
de ideias e de categorias analíticas,
é preciso que as relações de
produção e distribuição também
mudem.
Mas temos de evitar a visão
mecanicista das coisas e ter em
conta que muitas vezes ideias
e categorias analíticas permanecem
apesar de as relações de
produção e distribuição terem
mudado.
Sobre ideias e categorias de análise
C
omo companheiro de viagem
nesta fase terminal da
vida, o Heitor Tembe é um
verdadeiro achado. Conseguimos
até fazer que a nossa rotina
se casasse de tal forma que nos
podemos considerar também nesse
aspecto gémeos, como gémeos somos
quando comparamos o nosso
passado, vivemos o nosso presente
e olhamos com serenidade para o
futuro, que acreditamos já não ter
nada por nos oferecer. Não é que vivamos
resignados: simplesmente a
vida e as suas vicissitudes cercearam
de raiz todas as nossas veleidades da
juventude e pretensões de alimentar
sonhos sem alicerces.
É meu vizinho na zona do Kape-
-Kape, no Chamanculo. Ele vive na
casa ancestral onde nasceu e da qual
saiu aos 20 anos, para a ela retornar
cerca de 30 anos depois, vencido,
mesmo que temporariamente, por
aquilo que a vida lhe foi oferecendo.
Levamos esta rotina encontrando-
-nos a meio de cada manhã na barbearia
Thandavantu para jogar damas
até ao princípio da tarde, altura
em que nos dirigimos ao quintal
da velha Elsie, que ainda continua
a ser fiel aos seus melhores clientes
vendendo-lhes aguardente autêntica
de cana ou de massala ou de caju,
contra as zurrapadas com que vai
alimentado a sede voraz dos clientes
mais jovens e menos avisados.
Metemos então profundamente as
nossas mãos e mentes nos nossos
sacos de recordações e memórias,
que parecem nunca mais ter fim.
Eu, que sou menos fluente na narrativa,
passo na verdade a maior
parte do tempo a ouvi-lo.
Heitor Tembe era, à entrada da
década de ‘80, o responsável pelo
departamento de compras daquela
pequena rede de estabelecimentos
comerciais da nomenklatura, como
sejam o restaurante 3 de Novembro,
no Alto-Maé, a Casa de Refeições,
no Bairro do Aeroporto, e o Restaurante
Matchedje, na Mao Tse Tung.
É fácil compreender que, embora
na altura a esmagadora maioria da
população da Cidade de Maputo,
como, aliás, de todo o resto do país,
enfrentasse problemas de abastecimento,
ele gozava de uma situação
de folgança total.
O Heitor tinha, então, uma das
despensas mais bem abastecidas da
cidade, para quem, como ele, não tinha
o nível de ministro ou secretá-
rio, porque para esses havia as chamadas
lojas dos responsáveis, onde
era possível obter absolutamente
de tudo. Como é bom de imaginar,
era o filho querido da sua família e
a sua casa estava quase sempre literalmente
abarrotada de gente. Ele,
homem generoso por natureza e de
mãos largas, não se fazia rogado. E
todos viviam assim à volta dele, felizes
da vida.
Mas há malhas que o império tece.
Como se veio a saber mais tarde, a
sua cara-metade, Evangelina Tamele,
andava amantizada com um ofi-
cial superior do SNASP, que queria
a todo o custo afastar o Heitor do
seu caminho. E o Heitor tinha, na
verdade, uma fraqueza: era consumidor
de soruma. Para além do
pequeno círculo de amigos que sabia
disso, a sua esposa, mais do que
ninguém, detinha esse segredo. E
numa manhã, quando, como habitualmente,
ainda estava à mesa com
o café, bateram-lhe à porta. Eram
dois agentes da PIC com mandado
de busca. Nem fizeram cerimónias:
dirigiram-se directamente à casa de
banho, onde o Heitor tinha um armário
fechado à chave, mandaram-
-no abrir e lá dentro, sem grande
esforço, descobriram duas bananas
de soruma. Levaram-no directamente
para a BO e a vontade era,
de facto, de que semanas mais tarde
fosse deportado para o Niassa, onde
desapareceria nos campos de reeducação.
Mas o Heitor tinha também as
suas influências um pouco acima,
o que não era de admirar dado o
seu cargo. Safou-se da reeducação,
mas não se safou dos três meses de
cadeia. Quando saiu, a flat espaçosa
que ocupava na Julius Nyerere
em frente ao restaurante Canoa já
tinha sido mais que vendida, com
os documentos falsificados e postos
em nome da senhora sua esposa.
Viu-se forçado a regressar para o
Chamanculo, onde passou a viver
com a mãe e onde vive até hoje, sem
grandes recursos, depois de ao fim
de dois ou três anos ter depauperado
as poucas economias que tinha
feito durante o período de abastan-
ça.
O Heitor Tembe é, mais do que
um companheiro de infortúnio, um
sábio companheiro de viagem nesta
fase terminal das nossas vidas, e
mais ainda porque frequentemente
me confessa que ainda acalenta um
sonho: o de traduzir a obra “Escuta
Zé-Ninguém”, de Wilhelm Reich,
para ronga e bitonga. Por uma razão:
ele é ronga pelo lado paterno,
mas bitonga pelo materno. E é este,
talvez, o que lhe pende mais. Sendo
eu bitonga, ajudo-o a acalentar esse
sonho, e é esse que nos alimenta a
esperança e alivia as agruras no seio
das quais a vida insiste em envolver-nos.
Tornou-se marca da sua governação
e, em entrevista
ao SAVANA, Tagir Carimo,
o edil de Pemba, diz que
desde logo apostou na governação
participativa porque “não podemos
fazer apenas aquilo que nos agrada
fazer. É preciso fazer aquilo que é o
consenso, aquilo que realmente é o
problema ao nível da comunidade”.
Os investimentos que lá convergem
motivados pela indústria de hidrocarbonetos
foram incontornáveis
na entrevista e neles Carimo vê uma
janela de oportunidades para os munícipes.
Tem vários sonhos, mas um
deles é tornar a capital provincial
de Cabo Delgado numa verdadeira
espinha dorsal para a economia do
país e um melhor sítio para se viver.
Os dissabores e conquistas de dois
anos de um segundo mandato na
presidência da autarquia são a seguir
descritos em discurso directo pelo
edil que fala ainda do ano e meio
que preside a Associação Nacional
dos Municípios de Moçambique
(ANAMM).
Com muitas e ambiciosas promessas,
em Fevereiro de 2014, tomou posse
como edil de Pemba. Como foram
os dois anos do segundo mandato a
dirigir os destinos de uma cidade estratégica
como Pemba?
Foram anos de muitos desafios, mas
nós tínhamos como agenda a introdu-
ção de uma governação participativa,
a reabilitação de algumas infra-estruturas
e a construção de outras. Foi
neste período que Pemba teve uma
situação que não se verificava há cerca
de 40 anos. Tivemos chuvas acima
de 150 mililitros que fizeram com que
redesenhássemos a nossa estratégia e
virássemos mais para a reabilitação de
infra-estruturas e posso garantir que
conseguimos virar-nos. Reabilitamos
as principais estradas que estavam danificadas.
Muitos municípios e não só, que foram
afectados por cheias, continuam
com zonas intransitáveis ou com outros
vestígios dos danos das chuvas
intensas. Qual foi o segredo da vossa
reviravolta?
Não foi fácil porque se olharmos para
o potencial de receitas cobradas naquela
altura estavam muito aquém
do nosso desafio. Basta só olhar que
a reabilitação que fizemos custou-nos
qualquer coisa como 240 milhões de
meticais e só foi possível porque o
governo central, através do fundo de
estradas, abraçou o nosso desafio.
Está a dizer que todas as estradas que
haviam sido danificadas em Pemba
já estão repostas?
Não estamos a dizer que todas foram
repostas. Continua o desafio, mas seguramente
nós conseguimos superarmo-nos
nessa questão de reabilitação
de estradas. O desafio agora é abranger
a zona da expansão, termos estradas
pavimentadas e reabilitar a zona
Edil de Pemba e a governação participativa
Por Armando Nhantumbo
baixa para trazer mais investimentos
olhando para a área de petróleo e gás,
basta dizer que é a parte onde temos o
porto, então, todas as grandes empresas
olham para a baixa como uma zona
a ser investida.
Com a experiência do passado, como
é que a edilidade está preparada para
fazer face à actual época chuvosa?
Aprovamos o nosso Plano de Contingência.
Estamos a trabalhar em estreita
colaboração com o Governo do
distrito e Provincial. Somos membros
do Comité Operativo de Emergência
(COE) e já mapeamos ao nível da
nossa cidade quais são as zonas mais
vulneráveis e nesta altura, por exemplo,
estamos a trabalhar fortemente
nos bairros de Muxara e do Alto
Gingone para reverter uma situação
calamitosa. As escolas que constru-
ímos no passado já estavam a correr
risco de ruir, incluindo em algumas
zonas do Bairro Eduardo Mondlane.
Estamos a trabalhar primeiro para
mitigar. Temos os dois conceitos, afastar
o perigo das pessoas ou afastar as
pessoas do perigo, então, mediante a
situação real, temos a consciência de
que algumas pessoas precisam de ser
transferidas de zonas iminentemente
de perigo para evitar a perca de vidas.
Até semana passada, o registo que tí-
nhamos era de cerca de 60 pessoas que
deviam ser transferidas em diversos
bairros para zonas seguras, e estamos
a trabalhar com os distritos vizinhos
de Mecufi e Metuge para alocação de
alguns espaços em que as pessoas podem
construir as suas infra-estruturas
com mais segurança. Então, estamos
preparados à medida das nossas capacidades
locais.
Há compromisso entre eleitor
e eleito
O que mais foi feito nestes dois anos,
tendo em conta aquele seu ambicioso
manifesto eleitoral?
Nós organizamo-nos bastante na arrecadação
de receitas próprias e melhoramos
a gestão de resíduos sólidos.
Basta só dizer que passamos dos anteriores
125 milhões de meticais como
receita anual para 247. Ainda não é
o suficiente olhando para o potencial
de Pemba em arrecadar receitas, mas
isso passa necessariamente de uma
organização interna que é o que estamos
a fazer. Não menos importante
também era potenciar o próprio Conselho
Municipal em termos de meios
e já ano passado adquirimos cerca de
22 meios circulantes dentre camiões
e viaturas para o nosso pessoal poder
trabalhar ao nível das comunidades.
Conseguimos também descer às bases
para discutir aquilo que é o nosso Plano
porque um dos desafios que nós,
como Municípios temos, é esse compromisso
que deve ser assinado entre
as pessoas que nos elegeram e nós que
somos executivos. Não podemos fazer
apenas aquilo que nos agrada fazer. É
preciso fazer aquilo que é o consenso,
chegam apenas num sítio, então, por
sua vez, os táxi-mota levam os munícipes
desses sítios para locais mais
próximos das suas residências.
São taxistas licenciados?
Agora abrimos uma fase para eles poderem
licenciar-se, demos como prazo
até finais de Março, não só para poderem
se licenciar, mas também para
discutirem connosco a regulamenta-
ção desta nova actividade. A primeira
coisa que defendemos é a protecção
das suas próprias vidas. Devem ter a
noção de algumas regras de trânsito e
já temos um consenso com o INATTER
(Instituto Nacional de Transportes
Terrestres) de formar algumas
turmas desses jovens para serem formados
e exercerem as suas actividades
com alguma segurança.
Crise de água refém de 350
milhões de euros
O Município de Pemba de há dois
anos, quando tomou posse, era uma
cidade com problemas no fornecimento
de água que era uma das suas
promessas a atacar caso vencesse as
eleições. A situação prevalece e a
pergunta que se impõe é: o que está
a falhar?
Infelizmente é uma situação que ainda
continua, apesar de reconhecermos
que há um esforço enorme dos colegas
do FIPAG (Fundo de Património e
Abastecimento de Água), há um outro
esforço enorme de pessoas singulares
e do Conselho Municipal. Nesta altura,
por exemplo, nós como Conselho
Municipal, abrimos cerca de seis furos
de água nos bairros e estamos agora a
reabilitar um sistema que esteve parado
há cerca de 20 anos e vai cobrir
parte do bairro do Alto Gingone e
uma parte do bairro de Cariacô, numa
zona complexa chamada Chibuabuara,
que tem um relevo geográfico bastante
deficiente. Não vamos terminar
o problema da água, mas julgamos que
vamos de alguma forma aliviar. O antigo
sistema de fornecimento de água
tinha sido desenhando para servir cerca
de 60 mil pessoas e hoje Pemba tem
250 mil habitantes, é só imaginar o
esforço que isso representa. Então, há
um trabalho que está sendo feito com
algumas soluções locais, a solução passa
necessariamente pela construção de
uma barragem que vai abastecer não
só a cidade de Pemba, mas para alguns
distritos circunvizinhos.
Até quando uma barragem?
Já está na carteira, estamos a discutir
com o Governo distrital e provincial e
há alguns avanços encorajadores, tanto
é que já começam a surgir alguns
números.
Que números?
Para a construção desta barragem no
mínimo leva cinco anos em termos
de execução e/ou prazos, em termos
de custos estamos a falar aproximadamente
de 350 milhões de euros que é
preciso buscar em algum sítio.
Por aquilo que Pemba vai ser nos
próximos anos, não só precisa de
água, precisa também de energia de
qualidade e hoje nas horas de ponta,
costuma-se sentir já uma flutuação.
Estão atentos a essa demanda?
Isso já é do conhecimento do próprio
ministério. Já há ideias positivas para
corrigir essa situação. Basta só lembrar
que em Metoro está a ser construída
uma subestação para poder alimentar
com maior qualidade a cidade
de Pemba. Então, há aqui um esforço
a partir do governo provincial até ao
central.
A par do crescimento dos centros
urbanos moçambicanos, está a surgir
um problema grave chamado ordenamento
territorial e, pelos vistos,
Pemba não é excepção, presidente…
Pemba já teve problemas gravíssimos
em relação ao ordenamento territorial.
Basta só recordar que temos
duas zonas de ocupação espontânea
que são um verdadeiro calcanhar de
Aquiles. Estamos a falar de Chibuabuara
que hoje tem aproximadamente
25 mil pessoas a residir, estamos a
falar de uma zona denominada Josina
Machel que também foi de ocupação
espontânea com cerca de 12 mil habitantes.
São as zonas que efectivamente
não seguiram nenhuma regra de
ordenamento, mas pelo trabalho que
fizemos, há novas zonas de expansão,
onde não há problemas graves, o que
temos de fazer é implantar algumas
infra-estruturas como sistema de esgoto,
abastecimento de água, energia.
E Pemba avançou um pouco mais,
para além do reordenamento temos
um sistema de alerta da vulnerabilidade
de todo o nosso solo urbano. Hoje
se alguém pede um terreno em Pemba
estamos em condições de aconselhá-lo
que estilo de material deve usar para
construir, que perigos existem naquela
zona, que potencialidades existem,
fruto de um trabalho que estamos a
fazer com o governo central, nomeadamente
com o Ministério da Terra,
Ambiente e Desenvolvimento Rural.
Temos outro desafio que é aquele em
que alguns bairros, os mais antigos,
acabaram sendo muito superlotados.
Nesses precisamos de fazer reordenamento
e tirar algumas pessoas para
outros locais, sempre com o desafio de
prover infra-estruturas básicas porque
as pessoas querem estar mais perto do
hospital, escola, emprego, etc.
Há cidades moçambicanas que, praticamente,
já se renderam ao comércio
informal. Quer falar de Pemba?
Sinceramente falando não estamos
contra a actividade informal, desde
que ela seja bem organizada. Hoje o
que se verifica em Pemba é que algumas
ruas estão sendo ocupadas pelos
praticantes da actividade informal.
Sabemos que a actividade informal
conta em alguma percentagem para
a economia local. Para responder essa
questão, o Município foi construindo
alguns mercados dotados de infra-
-estruturas básicas, como sanitários,
energia e água e o grande problema
hoje é como convencer esses vendedores
informais a ocupar os mercados
com condições suficientemente boas
para praticar qualquer que seja o negócio.
Houve tempos em que o fecalismo a
céu aberto foi uma marca em Pemba.
Que saídas encontraram?
Pemba já teve esse problema. De facto
um problema terrível. Se olharmos
há cinco ou seis anos, Pemba tinha
problemas graves de fecalismo a céu
aberto. O que fomos fazendo é que,
para além de incentivar a constru-
ção de latrinas melhoradas na zona
da orla marítima, fomos trabalhando
com uma associação de ambiente local
para a consciencialização porque havia
muitos mitos em relação ao problema.
Desmistificar isso e construir até alguns
sanitários públicos e incentivar
para que as pessoas usassem foi uma
das ferramentas que usamos, para
além da fiscalização da comunidade
para desencorajar esse acto, porque
além de ser um problema de saúde
pública, era um atentado ao pudor.
Está a dizer que o problema já ficou
nas páginas da história?
Não estamos a dizer que ultrapassamos,
mas podemos seguramente afirmar
que essa problemática tem dias
contados, a olhar para aquilo que foi
Pemba ontem. Há zonas onde para se
poder passar, mesmo com viatura, tinha
aquele odor, mas as pessoas hoje
estão lá, a fazer a sua ginástica matinal,
vão à praia, sem absolutamente encontrar
alguém que pratica fecalismo
a céu aberto. Então, é um desafio que
fomos combatendo e julgamos que
mais dias menos dias vai ter o seu fim.
É em Pemba onde estão a convergir
os grandes investimentos nacionais
na área de hidrocarbonetos. Como
é que a edilidade garante que esse
encontro de homens de negócios,
esse encontro de milionárias multinacionais,
se reflicta no dia-a-dia do
pacato munícipe? Não esqueça que
Pemba é hoje uma das mais caras cidades
de Moçambique…
Sobre o custo de vida, Pemba foi considerada
sempre como uma cidade
cara, senão a primeira do país. Mas
com a vinda desses projectos, abre-se
grandes oportunidades e desafios para
os munícipes de Pemba. Oportunidades
de criar até pequenas empresas
para servir as médias e essas, por sua
vez, servirem as grandes empresas.
Uma outra oportunidade é as pessoas
se especializarem em algumas actividades.
Por exemplo, no fornecimento
de alimentos, os munícipes de Pemba,
organizados, podem muito bem cobrir
essa questão. Podem não ser especialidades
em algumas actividades que
envolvam engenharias ou consultorias
grandes, mas questões como fornecimento
de alimentos, sim. E é isto
que temos encorajado. Mas também
olhamos para isso como uma oportunidade
principalmente para a camada
juvenil ter emprego e aqui temos um
memorando de entendimento assinado
com o INEFP (Instituto Nacional
de Emprego e Formação Profissional)
para a formação de jovens em diversas
áreas como carpintaria, serralharia,
mecânica e culinária porque julgamos
que seria inconcebível que uma empresa
tenha de contratar um cozinheiro,
pedreiro ou pintor fora de Pemba
quando temos uma massa laboral activa
que pode ser contratada talvez mais
um pouco reciclada para responder à
qualidade. Pode se contratar de fora
grandes engenheiros porque não há
dúvidas em afirmar que Pemba pode
ainda não ter essa capacidade de responder
esse desafio de termos grandes
engenheiros e projectistas, mas a
esse nível de serviços básicos, nós já
temos. Então vimos isso como uma
grande oportunidade. E temos dito
que Pemba é uma cidade de oportunidades.
Qualquer negócio, qualquer
actividade bem pensada, em Pemba
pode prosperar porque o boom de desenvolvimento
que temos pela frente
vai ser bastante grande.
Mas já houve reclamações de muní-
cipes que se diziam excluídos dessas
oportunidades de fornecimento
de pequenos serviços de suporte na
construção da base logística de Pemba.
Nunca acompanhou essas reclamações?
Bom, ainda está-se no processo da
construção da base logística, as grandes
obras ainda não aconteceram e
tudo quanto temos conhecimento é
que no que se está a fazer agora foi
empregue massa laboral local. Mas
naturalmente, como estamos numa
economia de mercado não podemos
dizer que todo o mundo tem de ser de
Pemba, o que é preciso é formar com
qualidade o pessoal local para aguentar
com esse embate porque não nos
passa pela cabeça que as pessoas por
mais boas que sejam não podem ser
contratadas de outras províncias e até
de outros países quando for necessá-
rio. O que é importante e que tem de
ser aposta é a formação do pessoal local
com qualidade para responder essa
demanda.
aquilo que realmente é o problema ao
nível da comunidade e, quando olhamos
esses anos todos, de 2013 para
hoje, olhamos com satisfação. Basta
só referenciar que construímos duas
escolas, uma já estamos a terminar
agora, são escolas de raiz, construímos
também dois centros de saúde e há um
outro grande centro de saúde com fi-
nanciamento do governo central que
está a ser construído na unidade residencial
de Maringanha para aproximar
os serviços básicos à comunidade.
Então, olhando para trás, vemos que
fizemos algo que não só nos satisfaz,
mas também nos impõe algum desafio
porque sempre que a gente faz alguma
coisa temos de olhar para as respostas
do futuro.
Respostas do futuro! Com que Pemba
sonha?
Queremos construir uma cidade de
Pemba sustentável, uma cidade que,
olhando para os recursos naturais e
locais, possa ser o melhor sítio para
se viver e se investir porque temos
essas potencialidades, mas também
queremos ser uma verdadeira espinha
dorsal na área económica do nosso
país, olhando para aquilo que são as
grandes descobertas de hidrocarbonetos
na zona norte. Sem dúvidas nenhumas,
é para lá onde todos vamos
gravitar e vamos juntar a parte turística
que a natureza nos ofereceu, mas
também vamos ter serviços diversos e
julgamos que, juntando a beleza natural
que Pemba tem e aquilo que vão
ser os grandes serviços para servir as
grandes empresas que vão aportar a
Pemba, teremos uma cidade de Pemba
sustentável.
A construção e reabilitação de estradas
que destacou no início desta entrevista
só faz sentido com a provisão
de transporte que, em cidades como
Maputo e Matola, é uma autêntica
dor de cabeça. Como está Pemba?
Não foge à regra de quase grandes
cidades que temos, mas nós não estamos
mal. O grande problema que
hoje temos é ainda o não consenso
entre os transportadores e o Conselho
Municipal. O que havia antes é que
os trabalhadores reclamavam muito o
estado das vias de acesso e hoje esse
problema está quase ultrapassado, já
temos as principais vias de acesso reabilitadas.
A questão hoje é a tarifa que
julgamos que está a sair demais para
o bolso do munícipe. Então, é por aí
onde estamos a nos organizar, trabalhando
com a Associação de Transportadores
para criar consensos. Mas
como Conselho Municipal também
temos alguns meios de transporte dos
munícipes e esses não só cumprem as
rotas, como fazem a vazão de grande
número dos munícipes que se queiram
transportar ao nível da nossa cidade.
Um facto novo na nossa cidade que
temos encorajado é o surgimento de
táxi-mota. É um novo negócio que
vale a pena potenciar porque tem a
vantagem de complementar o transporte,
visto que os grandes autocarros.
Em Julho de 2014 era eleito Presidente da Associação
Nacional dos Municípios de Moçambique.
Na hora de tomar posse, garantiu melhor
servir e lutar para a sustentabilidade da organização,
desenhando acções de impacto a curto e longo
prazos. De lá para cá, o que de concreto já foi feito em
prol de uma ANAMM de resto pouco visível?
Uma delas é a reestruturação interna da própria Associação.
É o desenho de um Plano Estratégico que possa
responder àquilo que são os nossos desafios e quando
falo do Plano Estratégico falo da potenciação interna
dos Recursos Humanos que temos, da assistência
técnica aos nossos membros que são os municípios e
também falo da questão da Comunicação. Os nossos
municípios devem saber cada um deles o que um outro
faz e como ANAMM estamos agora a liderar um processo
de mapeamento daquilo que são as boas práticas
de governação, por exemplo, na área de gestão de receitas,
gestão de resíduos sólidos que é para internamente
sabermos quais são as fraquezas e potencialidades de
cada um. E uma das promessas que fizemos naquela
altura é que tínhamos de encontrar formas de estar
representados a nível regional. Felizmente estamos a
adiantar agora, temos um espaço para construir uma
infra-estrutura em Nampula, estamos a trabalhar com
o próprio edil para encontrarmos parceiros, felizmente
já existe uma luz no fundo do túnel e temos a mesma
pretensão em Chimoio porque a decisão do Conselho
Directivo foi de que a sede regional norte estará em
Nampula, Centro estará no Chimoio e em Xai-xai estará
a sede regional Sul.
Desafios?
Temos ainda grandes desafios. O primeiro é de fazer
compreender o papel da Associação Nacional dos
Municípios ao nível dos próprios municípios. O outro
é fazer compreender que os municípios devem contar
com a ANAMM para encontrar a solução dos entraves.
O outro é encontrarmos uma sustentabilidade financeira
da própria ANAMM para podermos responder a
tempo e hora aquilo que é a grande demanda dos nossos
membros. Posso afirmar com tanta segurança que
a pujança e a visibilidade que a ANAMM hoje tem a
nível do Governo, a nível dos parceiros de cooperação, é
totalmente diferente e positiva. Hoje, não há nada que
se passa ao nível dos municípios em que o Governo
não solicita a ANAMM para ouvir a sua posição. Não
há nada que se passe nos nossos municípios em que os
principais actores não se sentem com a ANAMM para
poderem encontrar soluções conjuntas. Precisamos de
ter uma única forma de abordar as questões, uma polí-
tica comum e há consenso em que precisamos de actuar
de uma forma linear em cada um dos municípios porque
o que acontecia é que tínhamos muitos parceiros
que quase faziam o mesmo tipo de trabalho, mas de
forma diferenciada.
Defende o que chama de actuar de forma linear.
Como é a convivência na ANAMM tendo em conta
a diversidade política interna?
A nossa associação é apartidária. Nós temos todos os
membros, basta recordar que, dos 53 municípios, há alguns
que são do partido Frelimo e outros do Movimento
Democrático de Moçambique. A convivência interna
é bastante positiva. Sabemos separar os momentos,
nunca foi problema, nunca levantamos cores políticas
na nossa Associação, assistimos uns e outros, sempre
que nos abordam com qualquer questão. A gente desenha
encontros e vai passando por todos os municípios,
independentemente da sua ideologia política. Então,
dentro da ANAMM temos a nossa visão e missão claras
e nunca fizemos confusão em relação a esse assunto.
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