10/05/2018
Xicara de café por Salvador Raimundo
BOA parte da infância decorreu na Rua T do bairro de Infulene, a escassos 50 metros do arame farpado do quartel militar especializado em comunicações.
Estávamos na década de 70 e para lá se trocavam militares em pequenos grupos, maioritariamente de raça branca e entre os negros, alguns caboverdianos, angolanos e de Moçambique.
Aquilo era mato, embora em determinadas áreas do quartel, algumas mamanas autorizadas a desenvolver o campesinato, algo possível mediante aval dos comandantes. Mesmo assim, eram poucas as mulheres que tinham acesso ao quartel. De quando em vez os militares se passeavam pelo bairro e raramente se ouviam queixas das populações contra o comportamento dos tipos. Nos pouquíssimos casos em que tal acontecia, e uma vez ao conhecimento dos comandantes, os militares apontados a dedo eram copiosamente punidos. Neste quartel, existia a Carreira de Tiro, feito por máquinas que removeram a areia, criando uma duna enorme, para onde as balas, quando disparadas, perdiam a força até “morrerem” na areia. Isto muito longe das populações.
A malta sabia dos treinos, na Carreira de Tiro, ao som dos disparos e nunca em presença. No intervalo entre os treinos de aperfeiçoamento dos disparos, nomeadamente aos domingos, o local servia para acolher jogos de futebol organizados pela malta dos bairros circunvizinhos do quartel, sob autorização dos comandantes.
Do bairro vizinho, ‘matalhawene’, apareciam indivíduos de baixíssima renda, com acesso fácil ao quartel, em busca de refeições, a troco de lavarem a loiça utilizada pelos militares. A loiça era devidamente limpa e organizado o refeitório dos militares portugueses, a troco de comida que até dava algum jeito para o resto da família lá em casa. E assim se desenvolveu uma relação amistosa entre o pequeno grupo de ‘matalhawene’ e os militares, de tal modo que todos os soldados passavam a palavra aos colegas em serviço.
BOA parte da infância decorreu na Rua T do bairro de Infulene, a escassos 50 metros do arame farpado do quartel militar especializado em comunicações.
Estávamos na década de 70 e para lá se trocavam militares em pequenos grupos, maioritariamente de raça branca e entre os negros, alguns caboverdianos, angolanos e de Moçambique.
Aquilo era mato, embora em determinadas áreas do quartel, algumas mamanas autorizadas a desenvolver o campesinato, algo possível mediante aval dos comandantes. Mesmo assim, eram poucas as mulheres que tinham acesso ao quartel. De quando em vez os militares se passeavam pelo bairro e raramente se ouviam queixas das populações contra o comportamento dos tipos. Nos pouquíssimos casos em que tal acontecia, e uma vez ao conhecimento dos comandantes, os militares apontados a dedo eram copiosamente punidos. Neste quartel, existia a Carreira de Tiro, feito por máquinas que removeram a areia, criando uma duna enorme, para onde as balas, quando disparadas, perdiam a força até “morrerem” na areia. Isto muito longe das populações.
A malta sabia dos treinos, na Carreira de Tiro, ao som dos disparos e nunca em presença. No intervalo entre os treinos de aperfeiçoamento dos disparos, nomeadamente aos domingos, o local servia para acolher jogos de futebol organizados pela malta dos bairros circunvizinhos do quartel, sob autorização dos comandantes.
Do bairro vizinho, ‘matalhawene’, apareciam indivíduos de baixíssima renda, com acesso fácil ao quartel, em busca de refeições, a troco de lavarem a loiça utilizada pelos militares. A loiça era devidamente limpa e organizado o refeitório dos militares portugueses, a troco de comida que até dava algum jeito para o resto da família lá em casa. E assim se desenvolveu uma relação amistosa entre o pequeno grupo de ‘matalhawene’ e os militares, de tal modo que todos os soldados passavam a palavra aos colegas em serviço.
Tudo isto vem a-propósito do conflito, hoje, existente entre os militares e as populações em zonas onde estão implantados os quartéis. Há dias, uma bala perdida pôs termo a vida de um menor, dando azo a um debate que divide opiniões, entre os que defendem a saída das famílias que circundam os quartéis, em benefício dos militares, e os que entendem o contrário. Certo é que os militares, hoje, não têm respeito pelas famílias vizinhas, ao contrário do relatado nos parágrafos acima.
Isso não tem nada a ver com o alegado facto de os nossos militares não fazerem nada, criando o ócio. Porque os do antigamente também não pegavam em enxadas a caminho das machambas, entretanto eram disciplinados o suficiente para respeitarem as populações vizinhas.
Os nossos militares gozam da máxima: quem tem arma, tem acesso à comida, à mulher, enfim, a tudo. Essa máxima pode estar por detrás da tamanha falta de respeito para com os civis.
EXPRESSO – 09.05.2018
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