quinta-feira, 5 de julho de 2018

Marcha-a-rè eleitoral


ESTA manhã já não haverá o arranque da submissão de candidaturas para as eleições autárquicas de 10 de Outubro, junto aos órgãos de administração eleitoral. 
A Comissão Nacional de Eleições (CNE) argumenta que tal se deve à ausência, até ontem, de uma lei que suporte o novo modelo de eleição dos presidentes dos conselhos autárquicos. O início do processo não está definido, de acordo com a CNE, ontem. 
Em finais de Junho, a maioria Frelimo inviabilizou debate e aprovação parlamentar da lei em causa, apontando dedos acusadores à contraparte negocial da paz, pela suposta inércia no desarmamento do braço armado da Renamo. A organização riposta sugerindo a integração dos homens a desarmar, nos quadros de decisão no seio das forças de defesa e segurança, algo que a Frelimo-governo declina, defendendo precisamente o contrário. 
Na altura da nega frelimista, a União Europeia veio a público repudiar esse tipo de moeda de troca, posição corroborada por outros parceiros, embora a ‘meia-voz’. De nada valeram tais tomadas de posição, continuando a Frelimo-governo e a Renamo a fincarem-pé, embora a organização rebelde já tenha vindo dizer que num curto espaço de tempo é possível desarmar os seus homens. 
Mas sem convencer a contraparte frelimista, cujo presidente é refém dos ditames da Comissão Política. Aliás, a Comissão Política, semana passada, reforçou as posições de Nyusi e da bancada parlamentar, sobre nesta matéria. 
Quando da ONUMOZ, início da década 90, o desarmamento e a desmobilização foi de um balanço paupérrimo, uma vez que a Renamo não desmobilizou nem desarmou na sua plenitude, movida por desconfianças. Hoje esse espírito, está claro, continua patente em ambos os contendores. O governo-Frelimo desconfia, a Renamo também desconfia, fazendo com que o processo encalhe. 
Em termos técnicos, os homens a desmobilizar – aparentemente já identificados – teriam de estar em áreas de acantonamento, para onde os peritos se deslocariam para o processo de recepção do material bélico, ao mesmo tempo que iam sendo desmobilizados para a vida civil e outros para a tal integração nas forças de defesa e segurança. Ora, quando da ONUMOZ, nem todos os da Renamo estavam nos centros de acantonamento e os que lá se encontravam, não só entregaram armas obsoletas, como eles próprios não davam mostras de terem sido os responsáveis directos por encostar o exército nacional à parede.


Sinais de desconfiança que anos mais tarde se confirmaram com o retorno da Renamo às matas, surpreendendo tudo e todos pela performance guerrilheira demonstrada. O pior de tudo é que as armas a serem confiscadas (?) à Renamo serão entregues ao Estado moçambicano, muitas vezes confundido com cores partidárias frelimistas, aos olhos dos da Renamo. 
Perante este cenário de desconfiança, a Frelimo-governo teme a reedição de um passado ainda fresco, idem no que toca à Renamo, que não se farta de apontar dedos acusadores à contraparte de ter, sistematicamente, recorrido à batota em todas as vitórias eleitorais. 
Daí não surpreender que o governo-Frelimo e a Renamo andem de corda esticada o suficiente para ver se esta rebenta de um ou de outro lado da barricada. Os órgãos de administração eleitoral, esses, continuam na expectativa, à espera que haja entendimento político entre o executivo e a nova liderança da Renamo, para depois correr contra o relógio. 
Por ora, marcha-a-rè eleitoral. 
EXPRESSO – 05.07.2018

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