Publicado: Quinta, 08 Setembro 2016
AO longo de anos da minha juventude cresci a ouvir que quem cala perante um grande mal consente.
Hoje, já na casa dos 70 anos, vi tanta coisa horrível, como foi a guerra que a Renamo moveu durante 16 anos e que se saldou em mais de um milhão de mortos e sofrimento indescritível de todos os vivos naquele período. Há mesmo consenso quanto ao facto de que, tirando o período colonial, aquela guerra foi o momento mais trágico que os moçambicanos conheceram depois da conquista da independência em 1975.
Infelizmente, a Renamo está de novo a tentar mover uma outra guerra com as mesmas características da dos 16 anos. O que mais me espanta é ver que alguns embaixadores, cuja condenação ao belicismo de Dhlakama funcionaria certamente como inibidora, optando pelo mutismo total, senão mesmo sepulcral. Porque será? Sinceramente, não consigo compreender porque se calam perante esta grave violação dos direitos humanos. Condenam os que cometeram alguns erros de procedimento, como os que contraíram dívidas sem o aval do Parlamento, mas já não condenam as matanças da Renamo. Como? Lembro-me de ter visto o embaixador da União Europeia, Sven Kuhn Von Burgsdorff, ir às correrias à PGR exigir uma auditoria forense internacional, como vi também o dos Estados Unidos fazer o mesmo, mas, infelizmente, já não os vos vejo a exigirem que a Renamo e o seu líder Afonso Dhlakama ponham termo às matanças indiscriminadas, sem poupança mesmo dos doentes que se encontram internados em hospitais. Todo este calar dos embaixadores atenta-nos fortemente, a acreditar nos vários comentários que têm sido feitos nos jornais e nas redes sociais sobre o triste e vergonhoso envolvimento de alguns embaixadores, com destaque para Dean Pittman dos EUA, de Joana Kuensberg, da Grã-Bretanha, Roberto Vellano da Itália, Sven Kuhn Von Burgsdorff, da União Europeia, como sendo alguns dos que pelo menos se mostram cúmplices do apoio às atrocidades da Renamo.
O que me dá indicações de efectivamente serem cúmplices é que, para além do seu silêncio em relação a essas atrocidades, impõem como única saída para o Governo de Moçambique a aceitação de uma solução pacífica face às hostilidades no país. Exigem acriticamente o diálogo com uma Renamo belicista. Todavia, nos seus países quando surgem grupos que levam a cabo massacres de cidadãos inocentes chamam-nos terroristas e contra eles movem uma cruzada de perseguição e morte. Não há espaço para o diálogo com estes nem a busca de soluções pacíficas, tal como apregoam em Moçambique e, quiçá, noutros países africanos em igual conflito.
Onde é que está a diferença entre os actos praticados pela Renamo em Moçambique e os praticados por grupos que na Europa e América massacram cidadãos? Esses apelidados de terroristas?
Estas são algumas, dentre várias, as perguntas que qualquer moçambicano faria num eventual contacto com os embaixadores. É que, na verdade, o silêncio assusta.
Tudo indica que enquanto os embaixadores não virem em Moçambique desencadeadas as fatídicas "primaveras" idênticas às do Iraque, da Líbia, da Ucrânia e por aí em diante, onde os povos desses países ainda hoje vivem numa sangrenta carnificina, este povo sofredor continuará vítima das mais macabras maquinações.
Vemo-los a movimentarem-se para instigar a Renamo a radicalizar as suas posições. E enquanto decorre o diálogo instigam a mesma Renamo, sentada com o Governo em busca de uma solução pacífica, a multiplicar os ataques, massacres, destruições e pilhagens, num cenário em que não escapam até os postos de saúde, onde se encontram internados alguns doentes.
A pretexto de dívidas ocultas, congelam desembolsos orçamentais voluntariamente prometidos ao Governo, como outra forma de pressão, que, combinados com as acções criminosas da Renamo, tê como objectivo final levar o povo moçambicano a revoltar-se contra o seu próprio Governo. E porque não derrubá-lo para que seja substituído por outro necessariamente dócil em relação aos seus propósitos? Este congelamento de fundos que haviam prometido ao Governo em apoio ao orçamento prova a validade da secular tese balzaquiana que reza que os interesses se sobrepõem aos sentimentos.Congelando os fundos condenam o povo moçambicano a não ter medicamentos e outros bens e serviços imprescindíveis para as suas vidas, e a falta de alguns deles, como os remédios, podem e causam sofrimento e mesmo morte. Serão estes congelamentos pró-direitos humanos? Claro que não são.
Uma coisa é certa, senhores embaixadores: o povo moçambicano é bem diferente do povo iraquiano ou do líbio. Se alguém pretende levar este nosso povo seja para que "primavera" for, terá que se preparar convenientemente.
Se são falsas as insinuações que gravitam à volta destas chancelarias, por que razão não vêm a público desmenti-las, e através de um debate público e televisivo talvez fosse melhor ainda.
Não subestimem este povo, senhores embaixadores. Uma coisa é o Governo, outra coisa é o povo!
Bartolomeu Timane
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