O reaparecimento de Afonso Dhlakama começa a criar crispação entre os MDMistas. Entre os mais desesperados figura o seu líder, Daviz Simango (DS), habituado a colher onde não plantou. Na semana finda, em Nampula, depois de insultar os dois partidos que, por razões históricas negoceiam o desarmamento de uma das partes que teima em permanecer armada, veio dizer que gostaria de se fazer presente na mesa de negociações. É que como Dhlakama acenou ser possível de ser substituído na liderança da Renamo, DS começa a querer aproximar-se à Renamo de modo a ser o escolhido. Mas a ambição de 2008 vai pesar por longos anos e, quiçá, forever. Aparece mansinho como se este conflito lhe fosse alheio. Na verdade, esta guerra interessa mais a ele que deambula pelo país enquanto o outro se esconde nos arbustos da Gorongosa. Convinha recordar que antes do surgimento do MDM reinava a paz pelo país. Porém, antes de levantar o dedo acusador, seriam precisos estudos de caso para relacionar a actual violência da Renamo com o surgimento do MDM que, ao que tudo indica, criou mais nervosismo aos renamistas que se viram enfraquecidos ante uma Frelimo cada vez mais potente e robusta, adaptativa às circunstâncias do tempo.
Os pronunciamentos de DS segundo os quais ele «não deve nada à Renamo tornaram essencial uma tentativa de chamá-lo de ingrato. É evidente que ele odeia mais à Renamo do que odeia a Frelimo e aos poucos o seu partido virou oposição à Renamo. Agora que o Dhlakama manifestou o desejo de voltar para a cidade, DS aparece com apelo do tipo «que as autoridades o deixem livre» quando isto devia ser dito há bastante tempo. Por outras palavras, o MDM e seu líder agem irresponsavelmente com objectivo de levar a Renamo a uma situação intolerável e potencialmente catastrófica. Não me canso de repetir que, em 2012, quando a Renamo ameaçou boicotar as eleições caso a lei eleitoral por baixo da qual se encontram as causas imediatas do actual conflito fosse aprovada, o partido de DS, a mando deste, apressou-se a votá-la e, nos dias subsequentes, os seus oito deputados andavam de café em café a dizer que «as eleições devem ter lugar». E as eleições tiveram lugar, mas o sangue já corria pelo país. Mais tarde, em condições desfavoráveis àquelas de há dois anos, os mesmos deputados voltaram atrás acomodando as exigências da Renamo. Mas a Renamo, confiante no seu potencial militar, continua chantageando aqui e ali e nada nos leva a concluir que antes de 15 de Outubro ela se desarme na sua totalidade. Nos próximos dias, quando Afonso Dhlakama sair da gruta veremos a exibição marcial de um exército paralelo e sem igual a protege-lo. Até porque as armas que usa contra as Forças de Defesa e de Segurança poderão, caso se verifique a passagem do MDM para o segundo lugar, ser usadas contra este partido.
Quando nós nos manifestamos contra as regalias aos ex-isto, ex-aquilo, Daviz Simango fazia ouvido de mercador até que agora percebe que não poderá parar o vento com a mão e já se diz arrependido. Mas o objectivo desta astúcia é tirar dividendos políticos a todo o custo. Diz ele que pretende marcar uma audiência com o PR para ver se não aprova a lei que conta com 100% dos deputados a seu mando. Pareceu-me que ele estivesse ausente do país ou então ficou muito tempo distraído para perceber aonde vai o vento. Os moçambicanos já não são ingénuos. O pesado fardo de fazer com que seja o PR a tomar a decisão à favor do povo coube a sociedade civil esclarecida que, no dia 16 de Maio, manifestou o seu desagrado. E eu estive entre eles, ali na Estátua de Eduardo Mondlane (Mpt), não porque eu venha a ser directamente afectado, mas porque considero que não é preciso ser justo para ter noção de justiça. Nenhum DS apareceu para solidarizar-se. Hoje quer aparecer como bonzinho, ao lado daquelas forças vivas que, tendo uma causa justa, irão conseguir a vitória. Os seus deputados aprovaram a lei com o seu consentimento e provavelmente a seu mando. Só os incautos podem dormir na relva, a esta altura.
Para DS, se o PR a promulgar, há-de dizer «estão a ver, eu não queria isso». Se o PR devolvê-la para revisão, há-de vir dizer «graças a mim, ele vai rever». Eu gostaria de pedir ao Presidente da República para que não o receba, pois está claro que carrega consigo o beijo da traição. Traição ao povo moçambicano que luta nas estepes para manter viva a esperança de um Moçambique digno. Traição aos intelectuais que discernem as consequências absurdas que uma idêntica lei poderá trazer ao país. Traição aos eleitores que votam no MDM porque tinham acreditado em quem lhes representasse os interesses genuinamente justos. Uma traição aos simpatizantes da Renamo, que em vez de terem a Frelimo como único adversário, agora lutam com a oposição da oposição em que se transformou o MDM.
Assim, o actual pedido de desculpas sob a forma de arrependimento e os actuais gritos e lamentos de «cometemos um grave erro» sob a forma de clamor, são uma chacota à Sociedade Civil que se distanciou dos partidos políticos e representam, na realidade, uma passagem do MDM para o lado dos opressores e mentirosos modernos e a negação, à sociedade civil, do direito à sua própria revolução. DS agiu em defesa do reformismo partidário, no preciso momento em que este reformismo está em colapso por todo o pais e as suas palavras criaram uma situação revolucionária no MDM. Apercebe-se que as regalias que mandou aprovar não serão para ele porque nunca será um ex-PR.
Todos os que analisam o discurso de Daviz Simango, estão a expressar a ideia que Maquiavel expressou com maior exactidão científica quando disse que os fins justificam os meios. E gora, quando a sociedade civil começa a agir e movimentar-se para a destruição desta cumplicidade partidária, ele coloca a situação como se não contasse com a sua digna colaboração, como se os respectivos deputados agissem sozinhos, como se estivessem para abandonar as benesses e prontos a submeterem-se a pobreza do povo. Os moçambicanos sabem muito bem que este pedido de desculpas é uma frase vazia de sentido porque os seus deputados têm os melhores conselhos do chefe da bancada que, por sinal, é irmão do próprio. Mais uma vez, os factos revelam que ele é, na verdade, defensor dos interesses alheios aos moçambicanos, escondendo a fórmula de domínio dos ricos sobre os meios que facultariam a educação e a saúde das massas. Engana o povo com frases agradáveis, sonantes e bonitas mas totalmente falsas, tentando dissuadir a Sociedade Civil da tarefa histórica concreta de libertar o país dos políticos que assumiram o seu controlo. Mas tudo isso revela o estado desassossegado de espírito em que Daviz Simango se encontra, porque quando Dhlakama grita no mato, Daviz Simango treme na cidade.
Sem comentários:
Enviar um comentário