terça-feira, 24 de novembro de 2015

Acusação contra ativistas angolanos leva a tribunal vídeo de uma reunião do grupo

ANGOLA


Os 17 ativistas acusados de rebelião e tentativa de golpe de Estado em Angola foram confrontados, em julgamento, com um vídeo que mostra uma reunião do grupo. A defesa quer saber quem é o autor.
Segundo o advogado de defesa, David Mendes, a gravação do vídeo por um alegado agente infiltrado revela uma "intromissão na vida privada" dos cidadãos angolanos
PAULO JULIAO/EPA
 Os ativistas que estão a ser julgados em Luanda, por prepararem uma rebelião, foram esta segunda-feira confrontados, em julgamento, com um vídeo recolhido, alegadamente, por um agente infiltrado no grupo, com a defesa a querer identificar o autor.
O relato foi feito à Lusa pelo advogado David Mendes, no final da sexta sessão do julgamento, que está a decorrer desde 16 de novembro na 14.ª Secção do Tribunal Provincial de Luanda, em Benfica, – ao qual o acesso da imprensa continua proibido -, e que permitiu esta segunda-feira concluir a audição do terceiro de 17 arguidos.
De acordo com o advogado, o vídeo, de “longos minutos”, retrata como decorriam as reuniões do grupo, de “cariz pessoal”, e as imagens, “presumivelmente feitas com uma câmara escondida”, foram apresentadas aos arguidos, perante a crítica da defesa.
O vídeo terá sido apresentado como prova de uma denúncia feita em maio sobre as reuniões que o grupo fazia, num espaço privado em Luanda.
“Queremos saber a origem deste vídeo. Foi requerido ao tribunal que o denunciante venha a tribunal para que possa justificar como e em que circunstâncias foi gravado esse vídeo. Felizmente não tem nada de incitação à violência, nada que diga que estivessem a preparar ações violentas”, sublinha o advogado.
Além de desconhecer o autor – um alegado “agente infiltrado” no grupo -, a defesa quer saber como o mesmo vídeo foi obtido.
“Há uma intromissão na vida privada das pessoas. Porque as reuniões decorriam num sítio fechado, não havia autorização para que fossem filmados. Já que se diz que foi um dos participantes que filmou, então requereu-se que esse participante comparecesse para dizer em que circunstâncias filmou esse vídeo”, concluiu David Mendes.
Dos 17 arguidos em julgamento, acusados de serem coautores de atos preparatórios para uma rebelião e um atentado ao Presidente angolano, crime punível com até três anos de prisão, 15 estão em prisão preventiva desde junho.
Segundo a acusação, estes jovens ativistas reuniam-se aos sábados para discutir as estratégias e ensinamentos da obra “Ferramentas para destruir o ditador e evitar uma nova ditadura, filosofia da libertação para Angola”, do professor universitário Domingos da Cruz – um dos arguidos detidos -, adaptado do livro “From Dictatorship to Democracy”, do norte-americano Gene Sharp, inspirador das chamadas “Primaveras Árabes”.
Depois de inquirido na quinta-feira durante a manhã e na sexta-feira durante a tarde, o autor do livro (cujas 180 páginas foram lidas na íntegra por um oficial de justiça durante o julgamento), Domingos da Cruz, foi ainda hoje questionado pelo Ministério Público e pela defesa, perante as críticas dos advogados, que denunciam uma postura “dilatória” do tribunal.
A pedido da defesa, apenas os arguidos que já prestaram declarações e o que deverá ser inquirido no próprio dia são agora transportados da hospital-prisão de Luanda para o tribunal, para evitar o desgaste antes do testemunho.
Na terça-feira será ouvido Nuno Álvaro Dala, o quarto dos 17 arguidos.
Na origem deste processo esteve uma operação policial desencadeada a 20 de junho de 2015 – depois de uma denúncia sobre as reuniões que realizavam ainda no mês de maio e que terá envolvido o vídeo captado -, quando 13 ativistas angolanos foram detidos em Luanda, em flagrante delito, durante a sexta reunião semanal de um curso de formação de ativistas, para promover posteriormente a destituição do atual regime, diz a acusação.
Outros dois foram detidos nos dias seguintes, no âmbito do mesmo processo.
Duas jovens foram constituídas arguidas em agosto, mas encontram-se em liberdade provisória.
Os advogados de defesa insistem na libertação dos arguidos em prisão preventiva – conforme a lei prevê para este tipo de crime -, e afirmam que a ação destes jovens, com idades entre os 18 e os 33 anos, se enquadra na liberdade de expressão e reunião.

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