O PROGRAMA DE HABITAÇÃO PRÓPRIA COMO IMPERATIVO PARA O DESENVOLVIMENTO DA CIDADE DE MAPUTO.
“Todos os cidadãos têm direito à habitação condigna, sendo dever do Estado, de acordo com o desenvolvimento económico nacional, criar as adequadas condições institucionais, normativas e infra-estruturais” – artigo 91 da Constituição da República de Moçambique.
Com o advento da independência nacional e o processo de nacionalizações dos imóveis de rendimento, decretado pelo governo moçambicano, muitas famílias moçambicanas passaram a dispor de habitação condigna, e o Estado ilibou-se, em parte, durante muitos anos, da sua responsabilidade social em providenciar serviços e facilidades de acesso, em condições bonificadas, à habitação.
Já diz o ditado: “Quem casa quer casa”. A habitação constitui, desde há alguns anos, um dos principais dilemas de milhões de cidadãos, particularmente jovens que após concluir os estudos ou após contraírem matrimónio desejam um lugar para morar, de resto, este constitui um direito de todo o Moçambicano.
Em muitos países, os governos centrais ou até mesmo municipais concebem programas que visam essencialmente assegurar o acesso dos seus cidadãos à habitação. Estes programas contemplam variadas modalidades que vão desde o crédito bancário com juros bonificados e com reembolsos de longos prazos, lotes de terrenos infra-estruturados, parcerias público-privada com o intuito de requalificar alguns bairros e ou solos urbanos de modo a conferir maior dignidade as pessoas que neles moram e permitir que o mercado imobiliário e a modernização das cidades se torne num sonho mas dentro de um perspectiva de inclusão e de maior participação do cidadão na redistribuição da riqueza nacional.
Ao longo dos anos verificamos que, em Moçambique, alguns exemplos foram ensaiados mas, quase todos, sem muito sucesso. Estou aqui a referir-me às casas construídas pelo Fundo de Fomento Habitação e, mais recentemente, as casas da Vila Olímpica (embora seja, ainda, muito cedo para fazermos algum juízo de valor). Portanto, pensando neste dilema e buscando dar o meu modesto contributo na busca de possíveis soluções, peguei no caso específico da Cidade de Maputo e gostaria de partilhar algumas ideias e propostas concretas.
Não é segredo para ninguém que o negócio do solo urbano é uma realidade incontornável e que contribui negativamente para a especulação imobiliária nesta Cidade, enriquecendo ilegalmente alguns grupos organizados sob o olhar cúmplice das nossas autoridades e em nada contribuindo para a arrecadação das receitas dos cofres do Estado. Todos fingem que nada sabem mas de facto este negócio existe e prospera aos olhos de todos e ninguém tem a coragem de pôr o dedo na ferida.
É exactamente pensando neste negócio que perguntei a mim mesmo o que impede de ser o Estado a realizar estas transacções arrecadando receitas e ao mesmo tempo propiciando facilidades para que os cidadãos mais carenciados, particularmente os jovens, recém-casados, jovens recém-formados, entre outros, possam ter acesso à habitação ou um terreno infra-estruturado onde possa iniciar a construção da sua casa própria e de forma faseada dependendo dos seus rendimentos mensais? Muitos dirão: mas a terra não pode ser vendida e a nossa Constituição é muito clara nesse aspecto. Concordo mas penso existirem mecanismos jurídicos para contornarmos essa proibição, sem prejudicar, de facto e de direito, esta disposição constitucional e beneficiar a muitos concidadãos nossos.
Por exemplo nada impede ao Município de Maputo que reserve, desde já, as áreas nas proximidades de onde está-se a construir a Circular de Maputo, que todos sabemos estar hoje subaproveitados, revertendo os mesmos a favor do Estado e, no âmbito da parceria público-privado negociar com o sector privado a concessão de parte destes espaços obtendo em contra partida o financiamento para urbanização das áreas ainda não urbanizadas as quais poderiam ser concedidas aos cidadãos em geral que desejem construir as suas casas próprias. Certamente que o cidadão que recebesse do Município um terreno infra-estruturado com o acesso a água, energia eléctrica, saneamento, estradas, iluminação pública e com escola, centro de saúde e esquadra da polícia por perto, estaria muito mais motivado para iniciar com a construção da sua casa de forma faseada. Por outro lado, o Município poderia ainda negociar com a banca comercial, as construtoras, as imobiliárias e o governo central e parceiros da cooperação com o intuito de se criar um programa de construção de condomínios que tivessem como grupo alvo a classe média emergente de modo a baratear os custos de produção e facilitar o acesso a casa própria a este extracto social que pode pagar um pouco mais e pode ainda contribuir para o financiamento do programa de habitação das casas sociais que o Município em parceria com o Fundo de Habitação poderia implementar para aqueles extractos sociais mais carenciados e que também necessitam de casa própria.
Ainda, na minha opinião, o facto de hoje estar-se a descobrir, em Moçambique, grandes depósitos de gás natural e jazigos de carvão mineral, torna-se mais fácil o governo negociar financiamentos com juros bonificados e com reembolsos de longos prazos, com variadas instituições financeiras e que permitam ao Estado e aos Municípios a criação de um fundo de financiamento da casa própria e com juros que possam ser suportados por um largo extracto da nossa sociedade e particularmente pelos jovens.
Uma outra questão associada à habitação, tem a ver com a requalificação de alguns bairros onde a parceria público-privada também poderia contribuir para resolver os problemas do acesso às infra-estruturas básicas de saneamento e conferir uma melhor imagem a cidade e menos problemas de saúde pública. É provável que muitas pessoas que hoje habitam alguns bairros periféricos sem nenhumas condições de saneamento e com a ausência de quase todas as infra-estruturas necessárias, estejam interessadas em trocar o seu talhão ou a sua casa precária e mudar-se para novos bairros desde que lhes fosse assegurada uma casa condigna com acesso a saneamento, água, energia eléctrica, iluminação pública, posto de saúde, escola, posto policial e outros recursos. O sector privado poderia ser o grande financiador deste programa de requalificação dos bairros periféricos degradados em troca dos espaços para erguerem as suas infra-estruturas comerciais desde que toda a transacção fosse realizada sob a égide do Estado (Município). Em última instância, ganhavam os moradores dos bairros degradados, ganhava o sector privado, ganhava o Estado, pois muitos problemas de saúde pública seriam minorados e ganhávamos todos nós, cidadãos, porque teríamos uma cidade mais moderna, menos exclusão social, pois toda esta movimentação iria naturalmente implicar novas e mais oportunidades de emprego e novas construções seriam erguidas em ambos os bairros (os requalificados e os novos). Os únicos perdedores seriam naturalmente, os especuladores das vendas de talhões que hoje operam e transaccionam ilegalmente e de forma desordenada parte destes talhões.
Uma outra iniciativa que de forma determinante poderia também contribuir para a redução dos custos de construção da casa própria em Moçambique e no Município de Maputo em específico, seria a concessão de facilidades aduaneiras, espaços infra estruturados e outras facilidades para atrair unidades produtoras de materiais de construção que pretendam instalar-se em nosso território. É que não se justifica que tenhamos de pagar valores elevados para a compra de material de construção e muitas vezes de péssima qualidade quando ao atravessarmos a fronteira com a vizinha África do Sul, constatamos com espanto e admiração de que afinal de contas é possível produzir-se o mesmo material mas de qualidade superior e com preços mais competitivos e acessíveis bastando que haja vontade para tal. Então, que haja também vontade da parte do nosso Governo e do nosso Município para que o propalado discurso do combate a pobreza absoluta passe do papel à acção.
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