A decisão de Bento XVI apanhou o mundo de surpresa – apesar dos sinais que o próprio foi dando no último ano, desde que regressou ao Vaticano após a viagem ao México. Cansaço, saúde debilitada, incapacidade de responder aos inúmeros compromissos, foram os motivos apontados. Mas, no fundo, a opção de abdicar revela uma extrema lucidez por parte do Papa.
Aprender com os erros do passado é uma característica essencial de todos os líderes. E com esta decisão, Bento XVI prova que o fez. A certa altura, quando a sua doença já era visível, João Paulo II também quis abdicar por razões de saúde. Na altura foi convencido a ficar. Durante anos, enquanto muitos cristãos viam no sofrimento do então Papa um exemplo dos sacrificios que todos deveriam estar dispostos a suportar, muitos outros viam simplesmente um homem velho sem capacidade para gerir aquela que continua a ser a maior organização do mundo. Foi uma imagem ingrata, a do Papa mais importante do último século, figura importante na queda da União Soviética, ser obrigado a falar em público quando mal conseguia balbuciar algumas palavras. Bento XVI não quis cometer o mesmo erro.
Mais: mostra que compreende o mundo em que vive. O último papa a abdicar, Gregório XII, fê-lo em 1415. Para além de o mundo conhecido ser muito mais pequeno, as notícias demoravam espalhar-se. Em Portugal, a morte de um Papa ou a eleição de outro, podia demorar semanas ou meses até ser conhecida. As notícias viajavam de barco, em caravanas, de boca em boca. Os camponeses podiam ficar anos sem saber de alguma novidade. A esmagadora maioria nunca viu uma imagem do Papa. E as grandes novidades religiosas eram transmitidas… na missa.
O primeiro Papa a ter conta no Twitter e a utilizar um iPad, percebeu que neste mundo globalizado em que as notícias se espalham ao segundo, a Igreja Católica não pode dar ao luxo de ter um líder fraco. Veja-se o exemplo desta semana: segundos depois de a agência Ansa ter dado a notícia da abdicação, a história abria todos os telejornais e estava em destaque nos sites noticiosos de todo o mundo. As televisões enviaram equipas de reportagem para o Vaticano que por lá continuarão até que saia fumo branco da chaminé da capela sistina. É este o mundo em que Bento XVI vive. Em que o seu cansaço, a sua saúde seriam escrutinados. Com esta decisão, Bento XVI ficou na história. Pela decisão, e por ter a plena consciência das suas capacidades e fraquezas.
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