ESTANDO-SE prestes a atingir o cume da íngreme e escabrosa ladeira da vida, para alguns atapetada de flores, para outros semeada de abrolhos, não se pode deixar de sentir um grato prazer, ao recordar-se dos factos mais importantes, relacionados com as pessoas suas conhecidas, que deste mundo foram desaparecendo, a pouco e pouco.
Basta
para isso uma curta concentração de espírito, fechar os olhos, e ver
passar, na memória, uma a uma, mais ou menos nítidas, essas imagens
agradáveis, tristes, inolvidáveis.
A
evocação do passado é, por assim dizer, uma segunda vida. A pessoa que
se dedicar a coligir ou anotar essas recordações não deve focar apenas
as pessoas ilustres, pelo seu talento, pelos actos políticos,
diplomáticos ou heróicos; esses são destinados à posteridade, são os
eleitos da glória; não lhes faltando os elementos de apreço, espalhados
aos ventos, nas conhecidas trombetas da fama.
E,
não tendo nós a estulta veleidade, nem a disposição natural dum
historiador, que os pudesse imortalizar, com a nossa modesta pena,
ficarão, no entanto, na lembrança dos que lerem estas modestas e
despretenciosas linhas.
A
maior parte desses obscuros portugueses foram nossos companheiros nas
campanhas de África, outros conhecidos, com os quais estivemos em mais
ou menos contacto, todos porém ali trabalharam, e morreram, esquecidos,
senão abandonados, mas garantimos que na medida dos seus esforços,
trabalharam para edificação dum Portugal Maior.
Almas
grandes, corpos sãos e robustos, para poderem resistir ao mortífero
clima africano, para lá foram como nós, arrastados por um sonho,
acalentados por uma fixa ideia de conhecerem, verem aquela África até
então quási misteriosa, só conhecida para depósito de degredados. O seu
esforço, só poderá ser deprimido, apoucado, e não respeitado, por
aquele que, movido por uma facciosa ambição política, ou mesquinha
inveja, desconheça por completo, quão colossal, titânico mesmo, tem sido
o ressurgimento da nossa epopeia colonial, de há meio século até hoje.
Verdadeiros Pioneiros da nossa ocupação e civilização, (ninguém com mais
justiça merece esse nome), os que, além a milhares de milhas de
distância, sem comodidades e conforto algum, lutando contra tudo, mas
nunca perdendo a esperança acalentadora de melhores dias, sempre com a
imagem dos entes queridos, e da Pátria tão distante, na sua mente
gravadas, jazem além, sepultados, ignorados, esquecidos, mas que foram a
pedra basilar do nosso hoje tão Grande Império Colonial.
Em sinal de admiração, de saudade eterna, lhes dedica esta humilíssima obra o autor.
Lisboa, Novembro de 1943
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