quarta-feira, 14 de novembro de 2012

MORGAN TSVANGIRAI - O paladino da liberdade

Foi detido várias vezes e brutalmente espancado, mas não desistiu de lutar pela Democracia. Sem violência.
 
 
Por SABRINA HASSANALI
É o único político no Zimbabwe que tem coragem para enfrentar o presidente Robert Mugabe e a sua poderosa máquina de re­pressão. Foi várias vezes detido, bru­talmente espancado pela polícia e alvo de quatro tentativas de assassi­nato, mas nunca vergou. Nem desis­tiu do seu sonho: viver num país em liberdade. A luta de toda uma vida de Morgan Tsvangirai parece estar final­mente a quebrar o ditador. "Já se vis­lumbra a mudança democrática", co­mentou antes mesmo das eleições.
O carisma do líder do maior par­tido da oposição do Zimbabwe revelou-se cedo. Filho mais velho de uma família de nove irmãos, foi for­çado a abandonar os estudos aos vinte anos para ajudar os pais, de poucos recursos. Começou a traba­lhar como operário numa empresa têxtil e, dois anos mais tarde, ingres­sou nos quadros da Mina de Níquel Trojan, onde chegou a capataz. A aguçada consciência política come­çou a manifestar-se quando se tor­nou sindicalista.
Em 1989 tornou-se secretário-geral da poderosa Confederação dos Sindicatos do Zimbabwe (ZC-TU), que mantinha fortes vínculos com a União Nacional Africana do Zimbabwe-Frente Patriótica (Zanu-PF), o partido de Mugabe. Tsvangi­rai iniciou o combate político contra o ditador ao romper com esta suspeita aliança.
É a partir desta altura que come­ça a implacável perseguição política. Mas a repressão apenas reforçou a sua determinação. Em 1997 organi­zou a primeira greve geral da histó­ria do país e, dois anos mais tarde, fundou o Movimento para a Mudan­ça Democrática (MDC), que em ape­nas alguns meses conseguiu emergir como uma poderosa força de oposi­ção e derrotar o governo no referen­do sobre a reforma constitucional, que permitia nomeadamente a apreensão de propriedades de fazendeiros brancos sem compensação.
 
NÃO QUER SER MÁRTIR
 
Tsvangirai sobreviveu a quatro ten­tativas de assassinato, uma das quais em 1997, quando agentes da polícia secreta tentaram atirá-lo pela janela. Numa das vezes em que foi detido a polícia espancou-o bru­talmente numa esquadra perante apoiantes para o humilhar. Mas não conseguiu fazê-lo vergar. "Sim, brutalizaram a minha carne, mas jamais conseguirão esmagar o meu espírito. Vou lutar até o Zimbabwe ser livre" jurou.
A repressão vio­lenta do regime de Mugabe não ex­tremou os seus sentimentos. "Não acredito na violência. Sei que muitas ve­zes sou acusado de ser fraco porque prefiro evitar o confronto. Quando Mugabe me roubou a presi­dência em 2002 os meus apoiantes estavam prontos para o confronto nas ruas. Contive-os porque não acredito na violência. [...] Não procu­ro o martírio", garante. Esta posição pacifista nem sempre se reflecte, con­tudo, no seu discurso. Num comício, em Setembro de 2000, afirmou aos militantes: "Se Mugabe não sair paci­ficamente será retirado pela força."
As suas credênciais de democrata também já foram postas em causa. Em 2005 dividiu o partido após anu­lar uma decisão da liderança de parti­cipar nas eleições para a Câmara Alta e ordenar o boicote. Tsvangirai per­deu apoios depois deste episódio, mas regressou em força nestas eleições.
Apesar das contradições, o líder do MDC foi conseguindo corroer a resistência de Mugabe. Até aqui poucos acreditavam que o velho di­tador cedesse. Depois destas eleições o próprio partido de Mugabe está di­vidido, com muitos militantes a de­fenderem que a situação se tornou insustentável e que é preciso encon­trar uma forma menos humilhante de Mugabe sair de cena.»
 
O APOIO DOS FAZENDEIROS BRANCOS
 

A questão da distribuição de terras constitui um dos pontos quentes da agenda política no Zimbabwe. Morgan Tsvangirai garante que todos os fazen­deiros apoiam o manifesto político do seu partido, que inclui a redistribuição de terras aos negros. Mas alguns acusam-no de hipocrisia por ter concorda­do com o apoio financeiro deles. Aliás, a propaganda eleitoral de Mugabe tirou partido desta questão. Num dos cartazes via-se fazendeiros brancos em fila a passarem cheques sob o olhar atento de Tsvangirai. O líder da oposição não comenta, mas este apoio, embora vital para a recupe­ração da muita debilitada economia, pode comprometê-lo. Esta não é a úni­ca contradição ideológica de Tsvangi­rai. No passado costumava culpar o FMI pelos desaires económicos do país e agora parece ter mudado de posição ao manter ligações com industriais que apoiam as leis do mercado livre.
 
 
 
UM RIVAL "IGNORAMUS"
 
Filho de um carpinteiro e pedreiro da etnia maioritária shona, Morgan Richard Tsvangirai, de 56 anos, nasceu em Gutu. Teve de suspender os estudos aos vinte anos para ajudar a numerosa família. Mugabe costuma referir-se a ele como "ignoramus" pela falta de formação académica e origem humilde. Foi líder sin­dicalista e dirige o Movimento que transformou no maior partido da oposição. É cristão, casado e tem seis filhos.
 
CORREIO DA MANHÃ(Lisboa) – 05.04.2008

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