O Marketing Político do Presidente do MDM, ou seja...
A “Obamanização” de Daviz Simango*
Por Milton Machel**
Facto: Daviz Simango não é o Obama de Moçambique. Todavia, a
presidencialização do provável candidato do MDM às eleições de Outubro
próximo tem-se revelado um processo de transformação do edil da Beira numa
marca política, à moda Obama. Questão: Irá Daviz Mbepo Simango colher na
“Primavera de Outubro” os desejados frutos dessa sua “Obamanização”?
Seria um erro do nível de crasso a pretensão de analogia dos fenómenos políticos
moçambicano Daviz Simango e americano Barack Obama.
No caso vertente, “Obamanização” é o processo de transformação de um candidato
político (Daviz Simango), como mero produto eleitoral, numa marca política (nacional e
internacional) com que os cidadãos se identifiquem, depositando nele os seus votos de
confiança e na qual percepcionem valores identitários positivos.
Em artigo publicado originalmente no “The Democratic Strategist – A Journal of Public
Opinion & Political Strategy”, Matt Compton considera que “Barack Obama como um
indivíduo não é a marca. Ele é apenas o seu mais poderoso símbolo e seu mais forte
advogado. Mas a marca é maior que o Presidente. É tanto um raciocínio sobre o que o
Governo deve ser, como um Movimento para tornar essa visão realidade”.1
A Marca Política Obama
- nascido a 4 de Agosto de 1961;
- investido pela primeira vez Senador Federal dos EUA a 4 de Janeiro de 2005;
- tendo visitado pela primeira vez a Casa Branca no “profético” ano de 1984
(George Orwell);
- eleito a 4 de Novembro de 2008 como 44o Presidente dos EUA;
- 40 anos após o assassinato de Martin Luther King Jr., a 4 de Abril de 1968…
…Barack Hussein Obama já se firmara uma Marca Política antes mesmo de ascender ao
cargo político mais importante do “Concerto das Nações”.
Na edição de Maio de 2008 a revista portuguesa Executive Digest publicou um trabalho
em que a sua autora (Ellen McGirt) procurava estudar o processo de construção da (bem
como teorizar a) Marca Obama.
Para McGirt: “O facto de Obama ter pegado no que pensávamos saber sobre política e
ter transformado isso num jogo diferente para uma geração diferente não é novidade.
Mas a extensão à qual o seu sucesso indica uma mudança sísmica no horizonte
empresarial mal foi analisada”.2
Argumenta Ellen que “A política, no fim de contas, está relacionada com o marketing:
com a projecção e venda de uma imagem, com o aumento de aspirações, com mover as
pessoas para identificarem, evangelizarem, consumirem. A promoção de uma marca
chamada Obama é um case study da direcção para a qual o mercado norte-americano (e
potencialmente o mercado global) se dirige.”
Em esforço de conceptualização da Marca Obama, ela cita Keith Reinhard, presidente
emérito da DDB Worlwide, uma das maiores firmas de marketing e publicidade a nível
mundial, para quem: “Barack Obama personifica três coisas que queremos numa marca
(...) Novo, diferente e atractivo. Não há melhor”.
Estratégias de Comunicação Obama
Ao longo do artigo de oito páginas, são arroladas as estratégias de comunicação e
desvendados os segredos do sucesso de Obama. Destaca-se como Obama “abraçou com
destreza a Internet”…
pelo aproveitamento do YouTube, do Facebook, com criação do website da campanha
BarackObama.com e da rede social mybarackobama.com, e exploração de outras
comunidades online
…e transformou a canção “Yes, We Can” ,de Will.I.Am (do grupo hip-hop Black Eyed
Peas), em slogan da sua campanha e elemento de fidelização/intimização com as
pessoas em geral e em particular – tendo-se tornado Obama o símbolo dessa Mudança
Possível.
Por sua vez, Matt Compton define como características da Marca Obama o facto de que:
• Consegue tanto ser direccionada para o futuro como compenetrada na história;
• Está profundamente vinculada à web – com cada programa não conectado à
rede a ter uma componente online; e
• Está directamente conectada a pessoas reais.
Neste último aspecto, enfatiza-se como em três momentos se soube afirmar a Marca
Obama:
— durante a campanha, apoiantes foram convidados a juntar-se à rede social
MyBarackObama;
— durante a transição do poder de Bush a Obama, cidadãos foram convidados a
concorrer a postos no Governo, a examinar metas de políticas e a oferecer a sua visão à
nova administração;
— e com o site do programa de recuperação económica (Recovery.gov) as pessoas
são convidadas a verificar como são gastos os dólares dos seus impostos, e o Governo
faz o Accountability, ou seja, presta contas desta despesa.
“Obamanizando” Daviz Simango
Em Moçambique, após a vitória de Barack Obama nas eleições americanas de 4 de
Novembro de 2008, e num momento de mudança do cenário político na Beira, o
processo de “Obamanização” de Daviz Simango assumiu-se um must em alguns fóruns:
media e blogosfera.
Com uma linha editorial marcadamente pró-RENAMO antes do 28 de Agosto de 2008
(dia oficial da ruptura de Daviz com a “Perdiz”), o semanário Zambeze e o diário online
Canal de Moçambique (http://www.canalmoz.com) assumiram-se desde a primeira hora
apoiantes da ideia do surgimento do MDM, inspirados na ascensão e consagração de
Barack Obama nos EUA.
Em Editorial de 30 de Novembro de 2008 ("Venha o MDM! Está na hora! É preciso
avançar já!"), após a vitória de Daviz Simango no Município da Beira, o
Zambeze/Canal de Moçambique antecipava (propunha) a designação do novo partido,
quatro meses antes da oficialização do MDM.
Lia-se nesse Editorial: “O movimento que já está em curso, não pode parar. As bases da
Renamo provaram que são capazes de mudar o estado de coisas deste país (...) Ficou
provado nas últimas eleições autárquicas que (...) Onde houve trabalho, gente decidida e
motivada, venceu quem se opôs à Frelimo. Neste caso o líder chamou-se Daviz
Simango”.
Repare-se no apelo que o “Grande Rio” fazia ao futuro líder do então inexistente
Movimento Democrático de Moçambique: “O MDM não pode parar. O movimento já
saiu da inércia (...) Daviz Simango tem razão em não se querer assumir como líder
imprescindível, mas, nesta fase, não pode esperar mais para dizer SIM, ESTAMOS
JUNTOS PARA MUDAR MOÇAMBIQUE”.
A Blogosfera e o factor-Azagaia
Por outro lado, o blogue do sociólogo e politólogo Carlos Serra tem promovido, na
ressaca da vitória de Barack Obama uma série de postagens com o título genérico: “E se
Daviz se Obama?”.
Pretende o blogue Diário de Um Sociólogo3 discutir (ou sugerir?) se Daviz não será
essa Esperança da (verdadeira) Mudança almejada em Moçambique.
O Diário de Um Sociólogo é apenas o mais proeminente dos blogues moçambicanos
que assume, sem declarar, o seu apoio ao MDM e a Daviz Simango.
Como aponta o também bloguista, sociólogo e académico moçambicano, Patrício
Langa: “Em Moçambique, em ano eleitoral (...) Alguns bloguistas, declarada e
explicitamente, preferiram trocar o esforço da imaginação analítica pela participação
activa na campanha eleitoral de alguns partidos (...) O que se nota (...) nalguns blogs
(SIC), como o Diário de um sociólogo (...) é a presença de uma campanha política
(...)”4
O trabalho de transformação de Daviz Simango em uma marca política encontra
sustento (em paralelismo com o “Yes, We Can!” de Will.I.Am) na música do cantor
hip-hop moçambicano de forte intervenção política e crítica social veemente: Azagaia.
Símbolo de um espírito de irreverência, iconoclasta e temerário pouco comum na
juventude urbana moçambicana, Azagaia não só foi cantar no showmício de
encerramento da campanha de (re)eleição de Daviz Simango para edil da Beira. Ele fez
ainda uma música em homenagem a este e seu povo: será o tema “Corre e Avisa” o
hino-chamamento de uma provável campanha presidencial de Daviz?
“Não foram só os jovens da Beira que levaram Daviz à vitória nas autárquicas. Foram
jovens de todo o país que de uma ou de outra forma contribuíram. Até Azagaia esteve
lá. Foi de Maputo até lá ajudar a vencer uma batalha que os jovens abraçaram e já têm
como sua”, sublinhava o Zambeze no seu Editorial de 30 de Novembro, como que a
potenciar o factor-Azagaia.
Daviz nas redes sociais
Assumindo uma postura “obamiana” de fazer seu Marketing Político, Daviz alojou em
um dos maiores sites globais de relacionamento (Hi5) uma página5 em que se
proclama: Daviz Simango – A Mudança que você confia!
Para “obamaníacos” soa a familiar, não? Querem a prova? A projecção da Campanha
Obama dizia: Change We Can Believe In (Mudança Em Que Podemos Acreditar).
Na sua coluna semanal “Espinhos da Micaia” no jornal SAVANA do dia 14 de Abril
(“Um Sismo chamado MDM”) Fernando Lima ressaltava que na Assembleia
Constituinte do MDM “Um Daviz magnânimo encerrou o conclave com um discurso de
moderação e ramos de oliveiras lançados em várias direcções”.
Destacando a mediatização dos “trabalhos de Daviz”, Lima referia que “No momento
seguinte aconteceu o périplo europeu. Todos os dias houve notícias da agenda
Simango. Entrevistas em profundidade aconteceram em todas as capitais europeias
por onde passou (...) A internet e os blogues, fizeram a complementaridade da visita”.
Poder-se-á questionar legitimamente se a Web e a Web 2.0 terão o poder de
mobilização dos eleitores em Moçambique. Efectivamente, Moçambique tem pelo
menos 8 milhões de eleitores mas em contrapartida porventura apenas 200 mil pessoas
acessam permanentemente a Internet, a nos fiarmos nas e extrapolarmos as projecções
do Index Mundi6 .
Não será a Web 2.0 apenas um canal de activação de cidadania política, em que se
mobilizaria jovens urbanos, no País e na diáspora, como pivots de criação de um
movimento de reais (em contraponto às virtuais) redes sociais, em favor dos ideais e
objectivos políticos de Daviz?
Quiçá a responder a esta pergunta por nós feita em finais de Abril de 2009, diz,
astutamente, Daviz Mbepo Simango, no parágrafo de fecho do seu discurso de
encerramento da Assembleia Constituinte do MDM, a 7 de Março último:
- “Vamos usar o poder da comunicação BOCA-A-BOCA. Esse será o nosso MSN
principal, em apoio aos que tiverem telemóvel. Nosso MSN, que significa Mensagem
Sem Número do MDM. Este MSN pode ser usado, tanto pelos que têm como pelos que
não têm telemóvel”.
O MSN que Daviz alude é uma das redes sociais - do provedor global de email
Hotmail - de bate-papo instantâneo mais famosas mundialmente.
O que a campanha Daviz se propõe fazer é aquilo que os “gurus” do Marketing
consideram uma das mais poderosas ferramentas deste campo da comunicação e
apelidam de Marketing Viral.
Seja como for, por imitação ou adaptação, as ferramentas e estratégias de comunicação
à moda Obama estão lá. Fica a incógnita se o processo de “Obamanização” de Daviz
Simango terá o mesmo impacto, dadas as diferenças de universo eleitoral entre
Moçambique e EUA e particularidades do campo político e mediático de cada País.
Mas o “efeito Obama” está lá, na forma de fazer política e de fazer Marketing Político.
1-url:
http://www.thedemocraticstrategist.org/strategist/2009/03/continuing_to_build_the_oba
ma.php
2 - McGIRT, Ellen.”A Marca Obama” in Executive Digest, No. 26, II Série, Lisboa,
Maio 2008.
3 - Diário de Um Sociólogo, url: http://www.oficinadesociologia.blogspot.com
4 - In blogue B’andhla,l“Análise (eleitoral) social e campanha eleitoral”, 16 de Abril
de 2009 - http://www.circulodesociologia.blogspot.com/
5 - http://davizsimango2009.hi5.com/friend/p403734883—Daviz_Simango—html
6 – Index Mundi,
url: http://indexmundi.com/pt/mocambique/numero_de_usuarios_do_internet.html
O legado político de Obama vs a herança política de Daviz:
Em Nome do Pai
As distâncias entre Barack Obama e Daviz Simango são por demais evidentes e
inelutáveis para se tentar “quixotescamente” compará-los. Obama é o actual Presidente
dos EUA, Daviz é Presidente do Município da Beira.
Contudo, se tentarmos colocar na balança a herança política de cada um deles, pelo
menos segundo o que ambos assumem, vamos encontrar paralelos interessantes:
- Se na sua primeira biografia, A Minha Herança (título original Dreams From My
Father), Barack Hussein Obama faz o relato de um jovem (político) à procura do seu
pai, e de como através dessa busca encontrou um significado prático para a sua vida;
já em The Audacity of Hope Obama revela os seus “Pensamentos Reivindicando O
Sonho Americano”;
- No primeiro discurso de Daviz Simango como Presidente do MDM ele declarase
tributário do “Sonho Moçambicano” da FRELIMO (Frente de Libertação de
Moçambique), justificando o lema fundamental do seu MDM “Moçambique Para
Todos”: “Esse Moçambique para Todos que idealizámos vem sendo edificado, há
várias décadas...”
Nascido precisamente na década das grandes lutas dos negros americanos e de
movimentos pelos direitos cívicos, liberdades fundamentais e mesmo liberdade sexual
de todos os cidadãos americanos, Barack Hussein Obama exalta em The Audacity of
Hope os “Pais Fundadores” (Benjamin Franklin, Abraham Lincoln) e Estadistas
(Franklin Delano Roosevelt) que marcaram a América e que são seus modelos.
Porém, os pensamentos de Obama desnudam como seu verdadeiro “pai político” o
Reverendo Martin Luther King Jr., autor do famoso discurso I Have A Dream (Eu
Tenho Um Sonho), Prémio Nobel da Paz de 1964 e herdeiro de “Mahatma” (A Grande
Alma) Gandhi e sua doutrina da “Acção Não-Violenta”.
Segundo filho de um dos fundadores da FRELIMO de 1962/64 e após o Assassinato de
Eduardo Mondlane proscrito como “O Traidor” da Causa Nacional, Daviz Simango
assume-se “herdeiro político” de Mondlane e Uria Simango.
Reivindicando o ideal “Lutar por Moçambique”, teorizado pelo “Pai da Unidade
Nacional” em sua obra homónima, Daviz disse no seu discurso primeiro de Presidente
do MDM:
“Há quatro décadas atrás, quando a Frente de Libertação de Moçambique era
liderada pelo Dr. Eduardo Mondlane e seu Vice-Presidente Uria Simango, Lutar por
Moçambique significava lutar por uma independência nacional, em que todos os
cidadãos pudessem desfrutar da liberdade, para desenvolverem suas vidas e
enriquecerem Moçambique, de acordo com suas capacidades, talentos e iniciativas.”
Veremos como, Em Nome do Pai, biológico e/ou político, Daviz Mbepo Simango
transformará o seu discurso político em acção que devolva esse almejado
MOÇAMBIQUE PARA TODOS, Moçambique do Futuro Cidadão...
Dizia Júlio César, o Imperador Romano, “Alea Jacta Est”. Nós traduzimos: Os Dados
Estão Lançados...
*Adaptado da comunicação apresentada a 29 de Abril de 2009, nas Jornadas
Científicas de Ciências da Comunicação da Universidade Politécnica
** Jornalista freelancer e estudante de Ciências da Comunicação n’A Politécnica
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