Durante a sessão realizada depois de a entrevista de Dhlakama já ter sido divulgada, Mario Raffaelli estava perturbado.
Os mediadores internacionais nas negociações escaparam a uma emboscada no passado sábado, quando pretendiam ir ao encontro do presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, nas matas da Gorongosa. O encontro foi preparado de forma confidencial entre Filipe Nyusi, Afonso Dhlakama e o próprio Mario Raffaelli, e estava marcado para se realizar entre as 10h00 e as 11h00, próximo da base de Siwe, nas matas de Gorongosa.
Mario Raffaelli, chefe dos mediadores internacionais, e Jonathan Powell, representante de Tony Blair nas negociações, já estavam na Gorongosa e prestes a ir ao encontro de Dhlakama, quando as Forças de Segurança abriram fogo nas imediações do local onde o encontro deveria realizar-se. Afonso Dhlakama – que confirmou a ocorrência da emboscada ao semanário “Canal de Moçambique” [ler na edição de 26 de Outubro] – foi quem telefonou a Mario Raffaelli, para cancelar o encontro, por falta de condições de segurança, pois, na sua leitura, tratava-se de uma emboscada.
Mario Raffaelli e Jonathan Powell estavam acompanhados por dois oficiais do Exército e dois da Renamo e tiveram de regressar a Maputo.
Acontece que Mario Raffaelli foi pressionado para não falar na emboscada.
Na passada terça-feira, quando questionado por jornalistas, disse que se tratava de um boato. Mas Afonso Dhlakama confirmou, com detalhes, a ocorrência da emboscada, em entrevista ao “Canal de Moçambique”, na sua edição de ontem, quarta-feira.
Quando a entrevista chegou ao público, decorria mais uma sessão das negociações. Mario Raffaelli, incomodado com as declarações de Dhlakama, que o desmentiam, decidiu não falar à imprensa.
Durante a sessão, Mario Raffaelli mostrou-se perturbado. Contrariamente aos outros dias, na quarta-feira Mario Raffaelli foi o primeiro a sair da sala e não prestou qualquer declaração nem quis comentar as declarações de Afonso Dhlakama ao “Canal de Moçambique”, que confirmaram ocorrência da emboscada que Mario Raffaelli disse ser um boato.
O “Canalmoz” esteve de plantão no local das negociações para recolher a reacção de Mario Raffaelli, mas o seu ajudante-de-campo veio ameaçar o jornalista do “Canalmoz”, exigindo que devia retirar-se do local, porque tinha ordens para não permitir a presença de jornalistas nem a gravação de imagens ontem.
Quando o ajudante-de-campo de Mario Raffaelli viu que o repórter não abandonava o local, voltou a ameaçá-lo, afirmando: “Eu já disse que o senhor não está contado nesta sessão e, se insistir ficar aqui, há-de ver o que vai acontecer-lhe”.
No final da sessão, como Mario Raffaelli já tinha saído, o “Canalmoz” interpelou o padre Ângelo Romano, outro mediador da União Europeia, para tentar perceber se tinham emitido uma ordem para escorraçar jornalistas.
Ângelo Romano respondeu que não e acrescentou: “Vá perguntar à pessoa que lhe disse, para indicar quem o mandou”.
A Comissão Mista volta a reunir-se, na manhã de hoje, com a Renamo, para esta apresentar formalmente a sua proposta do “Modelo de integração nas Forças de Defesa e Segurança”. (Bernardo Álvaro)
CANALMOZ – 27.10.2016
NOTA: Ao Dr. Mario Raffaeli: Por favor, não seja mais um a enganar o povo de Moçambique. Custe o que custar, conte a verdade. E a ter acontecido, este facto só mostra que Filipe Nyusi não controla as FADS, ou então que tem mesmo duas caras.
Fernando Gil
MACUA DE MOÇAMBIQUE
Empresas não conseguem honrar compromissos
O Governo está a tentar ganhar tempo, para começar a exploração do gás, a fim de usar as receitas do gás para pagar as dívidas.
O primeiro-ministro, Carlos Agostinho do Rosário, disse ontem, quarta-feira, na Assembleia da República que o Governo está a trabalhar com os credores das dívidas para negociar a sua reestruturação. As duas empresas têm até 2023 para pagar as dívidas.
Não se sabe ao certo o que o Governo leva para as negociações com os credores. Uma coisa é certa, a reestruturação inclui a prorrogação do prazo de pagamento e a subida das taxas. A medida é vista como um plano do Governo que visa ganhar tempo até ao início da exploração do gás, a fim de usar as receitas do gás para pagar as dívidas.
“O Governo está a trabalhar com os credores das dívidas contraídas pelas empresas ‘ProIndicus’ e MAM, com vista a iniciar a negociação da reestruturação destas dívidas”, disse o primeiro-ministro, Carlos Agostinho do Rosário, explicando que a medida vai permitir a criação de “espaço fiscal para financiar as acções prioritárias do Governo e estimular o crescimento da economia”.
O que há por detrás da reestruturação da dívida
A argumentação de que a reestruturação da dívida vai permitir a criação de um “espaço fiscal para financiar as acções prioritárias do Governo e estimular o crescimento da economia” pode de ser uma farsa. O “Canalmoz” sabe que o Governo fez uma apresentação aos credores, que está disponível no “site” do Ministério da Economia e Finanças, indicando que só a partir de 2021 e com as receitas do gás é que o país estará em condições de pagar a dívida. Esse compromisso ou declaração coloca questões de legalidade e de legitimidade, porque o mandato do actual Governo termina em 2019, e o gás só começará a ser produzido em 2021 (segundo ano do próximo mandato), questionando-se como é que o Governo se compromete a usar essas receitas para a dívida. Outra questão é que o Governo está a pressupor que a Frelimo vai ganhar as eleições de 2019 e que o próximo Governo poderá concordar com o uso das receitas do gás para pagar a dívida.
Os primeiros sinais de que as empresas não iam pagar as dívidas
No dia 18 de Maio do corrente ano, o ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, esteve perante a Comissão do Plano e Orçamento e a Comissão da Defesa e Segurança da Assembleia da República, para prestar esclarecimentos sobre os empréstimos contraídos com garantia soberana. Foi nesse encontro que o ministro Maleiane disse que a empresa “Mozambique Asset Management” (MAM) não estava em condições de pagar a primeira parcela, o que se confirmou.
A primeira parcela, avaliada em 178 milhões de dólares, devia ser paga até 23 de Maio, mas a empresa não conseguiu pagar, por falta de capacidade.
Os 535 milhões de dólares da MAM foram avalizados em 2014.
O estudo de viabilidade que a empresa apresentou ao Governo e aos credores indicava que a mesma poderia gerar, em oito anos, uma receita média bruta de 0,49 biliões de dólares, com custos operacionais de 0,26 biliões. Isto resulta em receitas livres de 0,23 biliões de dólares.
Em relação à “ProIndicus”, o primeiro sinal de que aquela empresa não estava em condições de honrar os seus compromissos foi também emitido por Maleiane, quando, em Maio deste ano, disse que a empresa ainda não celebrou nenhum contrato, sobretudo com os grandes projectos que vão operar na área do gás (estes projectos não tinham acordos com o Governo), o que faz com que ela não tenha receitas. A primeira prestação, de 24 milhões, venceu ano dia 21 de Março de 2016 e, segundo Maleiane, foi paga pela empresa. Só não disse como, visto que a mesma ainda não tem contratos assinados. A próxima prestação será no dia 23 de Março de 2017, no valor 119 milhões de dólares. Já se sabe que não vai pagar.
A dívida total da “ProIndicus” é avaliada em 950 milhões de dólares.
Se não houver entendimento na negociação da reestruturação da dívida entre o Governo e os credores, e se os credores exigirem o pagamento pelo Estado, a dívida será paga por cada um dos moçambicanos. (André Mulungo)
CANALMOZ – 27.10.2016
Moçambique não está em condições de amortizar toda a dívida do Estado e pretende a sua reestruturação, para já limitada à chamada dívida oculta. Há analistas que apelam para um perdão parcial da dívida pública.
Ouça aqui
Esta semana, o Governo de Moçambique anunciou oficialmente a sua incapacidade para pagar as próximas prestações das dívidas das empresas públicas com empréstimos ocultos. Maputo defende a necessidade de reestruturar os pagamentos. Para o especialista alemão Jürgen Kaiser, coordenador da aliança de organizações não-governamentais erlassjahr.de, o caso é claro: "O país está insolvente e, nessa perspectiva esta a bancarrota. A reconversão da dívida é inevitável, porque o Estado não vai poder amortizar todas as dívidas. Mais interessante é a pergunta: quais são os credores que não vão receber mais pagamentos?"
O especialista alemão Jürgen Kaiser defende um perdão parcial da dívida moçambicana
De momento, diz Kaiser tudo indica que o Governo moçambicano tende a limitar a suspensão do pagamento às chamadas dívidas ocultas, contraídas pelas três empresas moçambicanas Ematum, Proindicus e MAM e assumidas pelo Estado. Trata-se de uma soma de 1,28 mil milhões de euros que Maputo durante muito tempo ocultou do povo moçambicano e das instituições internacionais que apoiam financeiramente o país. A divulgação da existência destas dívidas agravou a profunda crise económica resultante da quebra dos preços das matérias primas e da desvalorização galopante do metical.
Moçambique precisa de um perdão das dívidas
O Fundo Monetário Internacional (FMI) suspendeu as suas ajudas ao país e forçou a instauração de uma investigação independente da dívida oculta. Um passo importante em frente, diz Kaiser, que ressalva no entanto: "Tenho grandes dúvidas que o não pagamento dos empréstimos escondidos seja o bastante, tendo em conta o elevadíssimo nível de endividamento do Estado mesmo antes da divulgação destes créditos. De modo que me parece poder ser uma boa ocasião para reconsiderar o pagamento de todas as dívidas no âmbito de um processo de reconversão coerente. Mas essa decisão obviamente cabe ao Governo de Moçambique tomar."
Segundo uma apresentação aos credores do Ministério das Finanças de Moçambique, a dívida pública vai chegar a 130% do PIB (Produto Interno Bruto) este ano. O que torna incontornável a revisão em baixa do crescimento económico para 3,7%. E torna ainda mais insustentável o pagamento de uma dívida que disparou devido à depreciação da moeda nacional, o metical.
Jürgen Kaiser, cuja organização erlassjahr.de defende que os países pobres devem ter maior autonomia nas decisões sobre a reconversão das suas dívidas e no processamento de insolvências, diz que uma solução para crise moçambicana é possível: "Moçambique precisa de um plano de insolvência coerente, talvez sob a égide das Nações Unidas, que produza um perdão parcial das dívidas. Mas não pode caber aos credores decidir quais são as dívidas sustentáveis ou não. O resultado disso no passado foi que alguns países não conseguiram sair da crise de dívidas durante trinta anos."
Perdão da dívida não afasta investidores
Kaiser não vê o perigo da renegociação da dívida colocar em causa futuros investimentos externos. Um perdão parcial das dívidas torna sempre o devedor mais interessante para novos investimentos. Foi o caso também em Moçambique, aquando da reconversão da dívida entre 2001 e 2005, o que lhe abriu o acesso aos mercados de capital, diz o especialista: "Esse argumento de que um perdão das dívidas fecha a torneira dos investimentos é muito popular entre os credores, mas do ponto de vista económico é um perfeito disparate”.
DW – 26.10.2016
FUNGULANI MASSO
A LUTA É CONTÍNUA