Espero que o texto seja o mais breve possível. Trata-se da ilusão da força das armas. Mas começarei com um dado curioso, cínico e, provavelmente de mau gosto: o número total de mortes por acidentes de viação é de longe superior que o dos mortos em consequência deste conflito neste momento: a OMS reporta uma media de 8 mil mortes por ano vitimas de acidentes de viação na República de Moçambique. Só em Janeiro de 2016, morreram mais de 24 pessoas e 57 ficaram feridos. Comparativamente a esta guerra, para além dos 5 mil refugiados vivos, pouco menos de 15 civis são reportados como mortos nos últimos 60 dias. Para além disto, não parece haver nenhum avanço de tomada de posições de ambas as partes, apesar de tanto barulho na imprensa comum e redes sociais. Portanto, estamos perante um bluff de um conflito armado; um jogo de baixo jaez, com muita malcriadez à mistura. Alguém, como é de imaginar, está a enriquecer a custa disto.
Mas deixem-me voltar ao tema principal para discutir algumas ideias que pairam em algumas mentes. Muitos desesperados pensam que as armas são a única salvação. E nesta lógica, o Presidente da Renamo está mais uma vez a lutar pelo ideal democrático ainda incompleto. Quero nestas breves palavras desmentir três principais ideias ilusórias sobre o poder das armas. Espero que consiga ser convincente.
#1 - O ACTUAL CONFLITO É PELA DEMOCRACIA: Ele nasce da divergência sobre os resultados eleitorais. O presidente Dhlakama está a lutar por uma democracia genuína em Moçambique.
• Não. Não é verdade. Este conflito não tem nada parecido com a democracia. É pura desestabilização, fruto do desentendimento entre duas forças beligerantes que ao longo dos 20 anos não se encontraram sobre questões fundamentais em relação a reintegração das forças da Renamo.
• Não tem nada relacionado com o conflito pós-eleitoral pois a Renamo não conseguiu provar a fraude. Atenção, houve bastantes evidências de fraude e irregularidades que até poderiam levar a anulação dos resultados em certas zonas. Mas a Renamo não conseguiu reunir evidências concretas para reclamar a vitória: os editais. Ela limitou-se a exigir os editais da CNE, que também não foram apresentados. Todavia, a lei eleitoral estabelece que no âmbito do apuramento dos resultados, os representantes dos partidos políticos concorrentes obtenham cópias dos editais. Onde a Renamo esteve presente, os editais foram recolhidos para o seu partido. Onde a Renamo não esteve presente, os editais não foram recolhidos. Por causa disto a Renamo não conseguiu reunir provas materiais inquestionáveis para provar a sua vitória ou fraude. Contou com o bandido, na esperança que este lhe facultasse elementos para fundamentar o seu protesto. Este é um assunto com o qual venho batendo-me: #organização da #Renamo. Não existe.
• A luta pela democracia terminou em 1992. A guerra que ora surge, ou as movimentações militares que hoje surgem não têm enquadramento moral nem político. Já nem diria legal. O conflito armado dos 16 anos cumpriu o seu ideal. Democracia multipartidária. É verdade que é imperfeita; excludente e empobrecedora. SIM. Mas não será a guerra que irá aperfeiçoa-la. A fonte do poder democrático que é a lei; as bases do poder democrático que são as pessoas e os pilares do poder democrático que são as instituições, precisam de ser aperfeiçoadas. A guerra mata a lei, mata pessoas e fragiliza as instituições.
#2 - AS ARMAS SÃO O ÚNICO MEIO PARA NEGOCIAR COM A FRELIMO
Não. Não é verdade. A Frelimo não tem medo da Renamo armada. Tem medo é do povo, da comunidade internacional e de si mesma. Em teoria, não havia motivos para que o governo da Frelimo hesitasse em declarar caça ao líder da Renamo. Mas a comunidade internacional da qual depende em grande medida; o poder da opinião pública que é muito influente para a moral pública e a própria falta de consenso dentro da Frelimo contribuem em grande medida para esta moderação. E o mais importante ainda:
1. A diferença entre a Frelimo e a Renamo é que a Frelimo detém o poder do Estado e a Renamo não. Como tal é um ente responsabilizável pela guerra ou paz
2. Quem jurou manter a Paz em Moçambique é Filipe Nyusi e não Afonso Dhlakama
3. Nyusi e a Frelimo estão na cidade, alcançáveis pelos meios civis enquanto Dhlakama está em partes incertas comunicável através de emissários
4. O Estado Moçambicano tem interesses particulares, públicos e internacionais por preservar enquanto Afonso Dhlakama pode ameaçar estes interesses, usando-os como instrumento de pressão.
Estes elementos conjugados fazem com que o Estado aja de forma mais ponderada comparado com um movimento em fuga e de guerrilha.
Todas as vezes que a Renamo chegou a consensos com a Frelimo não foi por causa da força das armas. Quem pensar assim está a pensar mal. As armas são para a Renamo, a causa primeira do seu subdesenvolvimento político.
#3 - O CONFLITO ARMADO PRESSIONA MAIS OS QUE ESTÃO NAS CIDADES DO QUE NECESSARIAMENTE OS QUE ESTÃO NO CAMPO
É mentira. O conflito afecta mais as pessoas que se identificam com a Renamo do que com qualquer outro alguém. A base social e política da Renamo é o campo. E é contra estas pessoas que Afonso Dhlakama age.
• Primeiro, porque as pessoas no campo vivem quase que totalmente dependentes da natureza. Tem que buscar água, pastar e dar de beber os animais nos rios e lagos ou em pequenos sistemas de abastecimento da água. EM situação de guerra, tudo para.
• Têm que cortar a lenha, ir à machamba ou a caça. EM situação de guerra tudo fica conturbado
• Têm que dar parto, ir a escola ou fazer compras; são longas distâncias que se tornam cada vez perigosas por causa do conflito armado.
• E o mais importante ainda, o governo, nesta situação só manda soldados e armas. A comida, os medicamentos, o salário, os mantimentos, tudo fica guardadinho nos armazéns, na cidade. Afonso Dhlakama deve saber que ao provocar uma guerra justamente nas regiões onde tem a maioria do seio apoio, prometendo o difícil e impossível, não só está a faltar a verdade como está a prejudicar severamente o repositório do seu poder. Se em Chibabava, Machanga, Gorongosa, Mutarara, Dondo ou Nhamatanda; Vanduzi ou Gondola as crianças não vão a escola; em Chinuto, Chissano, Morrumbene, Boane ou Manhiça as crianças em idade similar não param de estudar. Dentro de dez anos, a diferença de gerações em termos de instrução será notória. E os seus seguidores terão o mesmo padrão de hoje: vitimas do conflito e por isso incapazes de terem tido uma boa educação em tempo útil. O que estou a dizer pode parecer simplista. Todavia, se pegarmos no atlas da educação veremos que AS ALTAS TAXAS DE ANALFABETISMO COINCIDEM COM AS REGIÕES ONDE A GUERRA DOS 16 ANOS CAMPEOU! Em única palavra, Afonso Dhlakama está a prejudicar os que mais o ama.
PS: Não vão faltar epítetos do tipo Egidio “já recebeu” ou é historiador de meia-tigela. Porém, era importante que tivesse feito este texto.
• Fui refugiado de guerra dos 16 anos e sei perfeitamente o que as pessoas hoje em Muanza, Malawi estão a passar.
• Melhor do que isso, conheço perfeitamente as alternativas pacíficas que existem de ambos os lados para evitar a guerra
• Sou um resulto crente no poder da negociação e em que pode resultar se o Presidente Dhlakama decidir encontrar-se com Presidente Nyusi
• E não gosto de estar envolvido em assuntos que não entendo. Eu como a maioria dos cidadãos civis, não entendo nada da guerra e muito dificilmente consigo ver algo útil nela, logo no momento em que nos encontramos.
• A guerra é coisa de fracos e cobardes. Existem outros países que estão a passar por situações difíceis mas que nunca recorreram a guerra. Eles não são superiores nem inferiores que nós: Zimbabwe, Malawi ou Zâmbia todos países vizinhos, passaram por momentos conturbados como nós. Mas têm conseguido resolver seus assuntos pacificamente.
Se existe vontade para Paz, que se dê o primeiro passo; que se busque apoio popular e que se resolvam os assuntos de forma transparente.
Agora é que a palavra que tanto hesitava escrever me chega à cabeça. VONTADE e INICIATIVA.
Ao Presidente Nyusi: Excelência, mostre uma iniciativa apenas para a Paz e divulgue-a
Ao Presidente Dhlakama: Deve decidir e fazer chegar ao conhecimento público se o facto de lhe terem tentado três vezes (não se esquece que também lhe perseguiram 17 anos!) em 2015 já não quer a Paz para o seu povo. Se quer PAZ, mostre iniciativa concreta por via dos seus emissários. Os discursos retóricos e belicistas não nos ajudam avançar muito menos sustentar por muito tempo a incoerência.
Abraços.
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