domingo, 3 de janeiro de 2016

Pacote poderia destinar-se ao Estado Islâmico - A suspeita é da contra-inteligência sul-africana

Dinheiro apreendido pelos sul-africanos no Lebombo  
-Ministério do Interior despachou dois agentes para a África do Sul 
- Nazir Lunat, maulana da mesquita “Masjid Taqwa”, em Maputo, sob investigação 

Os serviços secretos sul-africanos suspeitam que o dinheiro apreendido no passado dia 25 de Dezembro, no posto fronteiriço de Lebombo, de outro lado da fronteira de Ressano Garcia, poderia estar a caminho das redes do Estado Islâmico disseminadas internacionalmente. Embora as autoridades sul-africanas não tenham evidências bastantes da existência dessas redes dentro da África do Sul, a secreta sul-africana entende que, com o aperto do cerco às suas bases no Iraque e Síria pelas forças internacionais, o grupo está a expandir-se para outros cantos do planeta e a África do Sul não pode ser considerada excepção. Serviços de inteligência ocidentais não descartam também a existência de simpatizantes e elementos ligados ao Estado Islâmico em Mo- çambique, sobretudo a partir dos seguidores do “wahhabismo”, uma corrente radical dentro do islamismo sunita. Outra pista seguida pela Polícia é que o valor poderia ter sido obtido a partir de resgates dos vários sequestros que têm assolado, desde 2011, as principais cidades moçambicanas, com destaque para Maputo e Matola. As vítimas, na sua maioria, têm sido empresários de origem asiática ou seus parentes e enormes somas em dinheiro foram exigidas em resgates. Também aqui há divisões de análise, uma vez que se acredita que o dinheiro dos resgates pode estar a funcionar como financiamento político, uma forma de pressionar a comunidade asiática acusada de “só fazer negócios entre si”. Segundo o porta-voz da Hawks, um ramo do Serviço da Polícia sul-africana (SAPS) especializado em acções de combate ao crime organizado, crimes económicos e corrupção, o brigadeiro Hangwani Mulaudzi, as investigações ora em curso vão determinar tudo, porém, todas as hipóteses devem ser colocadas. “Eles podem usá-lo para actividades terroristas”, avançou Mulaudzi, colocando, igualmente outras hipóteses. “Onde e como eles conseguiram isso é uma daquelas coisas que estamos a tentar determinar”, disse Mulaudzi, citado pela imprensa sul-africana. O dinheiro poderia ser usado em território sul-africano, por exemplo, para acções de recrutamento de novos membros para as frentes de combate em vários países, particularmente do Golfo Pérsico e Ásia, ou mesmo para actividades terroristas dentro da região. O dinheiro, recorde-se, estava a ser ilegalmente transportado por dois cidadãos de nacionalidade moçambicana (e de origem asiática), Assane Momad de 50 anos de idade e de Abdul Ahmed, 37 anos, numa Toyota Hilux, com chapa de matrícula DJ 85 TK GP. A polícia sul-africana interpelou os dois cidadãos moçambicanos, após uma denúncia anónima, que se supõe que veio de grupos rivais em Moçambique. Ao que o SAVANA apurou, um dos detidos (Assane Momad) é cunhado (irmão da mulher) do maulana Nazir Lunat, líder da mesquita “Masjid Taqwa”, na Avenida Eduardo Mondlane, muito frequentada por cidadãos de origem paquistanesa. Abordado pelo SAVANA na tarde desta quarta-feira, Nazir Lunat declinou tecer qualquer tipo de comentários. Dada a sensibilidade do assunto, o jornal insistiu e Lunat foi inflexível: “Não. Prefiro não falar do assunto”, sublinhou o maulana, que num passado recente exercia formalmente actividade numa casa de câmbios, na Av. Samora Machel, próximo à Pastelaria Continental. O SAVANA soube também que os dois detidos são descritos como especialistas em transportar dinheiro para a África do Sul, uma actividade antiga e conhecida ao mais alto nível político-financeiro em Moçambique. Dinheiro a favor da África do Sul Concretamente, o dinheiro estava escondido e disfarçado no fundo falso da bagageira da viatura. Em relação à proveniência, Mulaudzi disse também que, nesta fase, não está ainda claro de onde veio o dinheiro, mas eles estão a investigar para se aferir se os homens estavam envolvidos em actividades criminosas graves, sindicatos, assaltos a caixas de transporte de valores ou não. Os dois homens estiveram presentes no início da semana num tribunal na zona de Barberton, na província de Mpumalanga, mas a sessão de audição foi adiada para o dia 4 de Janeiro próximo. A juíza ordenou que os dois homens permanecessem na prisão da esquadra policial de Komatipoort, junto à fronteira com Moçambique. Os dois homens vinham de Maputo e sem problemas passaram a fronteira moçambicana e só do lado sul-africano é que foi descoberto que transportavam ilegalmente cerca de 4.9 milhões de dólares americanos, 2.2 milhões de euros e 20 mil randes. A revista ao seu veículo aconteceu a partir de uma denúncia recebida pela polícia. A confirmação dos montantes só foi possível depois de cinco horas de contagem do dinheiro que vinha em sacos. A operação de contagem foi executada por funcionários do Standard Bank, solicitados pelas autoridades sul-africanas, que depois depositaram o valor naquela instituição bancária. As autoridades aduaneiras sul-africanas disseram que esta foi a maior apreensão de divisas registada este ano no país. Até ao momento, as autoridades moçambicanas ainda não se pronunciaram sobre o sucedido, supostamente para não perturbar as investigações que decorrem na África do Sul. O Ministério do Interior despachou dois agentes seniores para se juntarem às investigações. Alguns juristas moçambicanos ouvidos pelo SAVANA fazem notar que as autoridades sul-africanas deverão verificar se se trata de um crime (dinheiro obtido ilicitamente) ou é uma infracção administrativa (dinheiro acima do legalmente permitido). “O dinheiro deverá reverter a favor do Estado sul-africano, no caso de se provar que é resultante de uma actividade ilícita. Se for proveniente de uma actividade lícita, o seu proprietário deverá provar e explicar o porquê de não ter recorrido aos procedimentos legais, que é, por exemplo, colocar num banco em Moçambique e proceder a uma transferência bancária”, frisam. Sublinhar que esta não é a primeira vez que as autoridades sul-africanas detectam situações de entrada ilegal de elevadas somas monetárias depois de passarem da fronteira moçambicana. Em Agosto último, um grupo de homens que estava a viajar do Aeroporto Internacional Oliver Tambo, de Joanesburgo para Dubai, tinha escondido 23 milhões de randes e 3.77 milhões de dólares em 12 peças de bagagem, incluindo quatro mochilas. Relatos da época sugeriram que o dinheiro passou por Moçambique e estava a caminho do Paquistão para financiar as actividades terroristas naquele país e noutras partes do mundo. Em Dezembro de 2010, foi detido, na vizinha Swazilândia, Momed Ayoob, um outro empresário moçambicano, na posse de 18 milhões de randes, que pretendia levar para Dubai. O embaixador do Iraque na África do Sul, Hisham al-Alawi, disse na época que ele não ficaria surpreso se as investigações confirmassem que o dinheiro confiscado estava mesmo a caminho para financiar o Estado Islâmico. “Tem havido um aumento da actividade na África do Sul com relação ao recrutamento e angariação de fundos para o Estado Islâmico”, disse o embaixador do Iraque a propósito do assunto. 

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