by José Belmiro on Wednesday, 26 September 2012 at 11:25 ·
Contrariamente ao que Edson Macuácua, secretário do Comité Central, com auxílio dos órgãos de comunicação social controlados directa ou indirectamente pela Frelimo, a questão da sucessão de Armando Guebuza está a ser amplamente discutida e já existem militantes da Frelimo disponíveis para avançar.
Um deles é o antigo presidente da Assembleia da República, Eduardo Mulémbwè, que de uma forma corajosa e digna de registo se lançou na corrida. Foi um acto de coragem num partido onde o secretismo e o medo impera. Mulémbwè mostrou ter uma virtude indispensável para um líder: A CORAGEM DE ASSUMIR AS SUAS IDEIAS.
Sim, coragem. Muitos militantes da Frelimo já vieram a público - mesmo neste congresso - queixar-se da falta de liberdade e debate interno no partido. Ou seja, ter coragem para apresentar as suas ideias mesmo contra a opinião do o líder e seus acólitos transformou-se, dentro da Frelimo, num acto de resistência comparável à contestação travada por vários nacionalistas moçambicanos contra o regime colonial.
Por isso, não admira que a Frelimo só permita transmissões em directo do Congresso apenas nos momentos de saudações à visão clarividente do Presidente do Partido, nos momentos culturais e nos discursos de pessoas alinhadas com o Chefe, que se sabe de antemão que não vão embaraçar o grande líder! Que o diga o militante Jorge Rebelo.
Voltando à questão da sucessão. Sei que há muitos militantes da Frelimo que gostariam de suceder Guebuza, mas nunca admitem esse desejo justamente por temerem represálias políticas, sociais e até económicas. Ou seja, não têm coragem suficiente e, portanto, não são elegíveis a presidenciáveis! Estão amarrados aos restos que o Grande Líder vai deixando cair em baixo da mesa. Por temer perder o pouco não arriscam. Jogam pelo seguro.
Uma dessas pessoas é o primeiro-ministro, Aires Ali. É apontado por vários quadrantes como sendo um dos preferidos do Presidente da Frelimo para o suceder. Aliás, a sua presença permanente nos órgãos de comunicação social (principalmente a TVM), o seu desdobramento em actos públicos como inaugurações, viagens e comícios pelas províncias denuncia que está a ser posicionado por alguém para avançar. Aliás, nunca veio a público distanciar-se daqueles que o colocam como o presidenciável preferido do Presidente Guebuza. Ou seja, não tem coragem para assumir os seus propósitos. Os outros tidos como presidenciáveis, como Tomaz Salomão e Luísa Diogo, não assumiram nada até este momento. Aliás, a antiga primeira-ministra, Luísa Diogo, desdobra-se em declarações e entrevistas ambíguas, dizendo o dito pelo não dito.
Por isso, estou positivamente surpreendido com Eduardo Mulémbwè, porque, contrariamente a Aires Ali, não está a usar meios do Estado ou a sua posição para promover a sua imagem. Pelo contrário, Mulémbwè escolheu o fórum, e porque não, o órgão apropriado, no caso vertente o Congresso, para manifestar a sua disponibilidade. É que o Congresso é o órgão indicado para qualquer militante expressar as suas ideias e ideais. Por outro lado, Mulémbwè mostrou, também, ter um programa e projecto político. Disse, ao ser entrevistado pelos jornalistas deste jornal, e passo a citar: “Espero que este congresso seja capaz de pôr, à frente da sua máquina, pessoas que estejam comprometidas com a causa do povo, pessoas que vão servir este povo, pessoas que ponham os seus interesses pessoais não acima dos interesses populares.”
Ao ser perguntado se era presidenciável, respondeu: “Eu disse-vos sempre, eu tive o privilégio de participar na Frelimo já de há algum tempo para cá. Eu julgo, modéstia à parte, que devo ser conhecedor, embora modesto, de como as coisas acontecem. Essas percepções são ideias ou de uma pessoa ou de algumas pessoas. Mas têm que estar sob regra, têm de surgir de propostas dentro do partido”.
Mulémbwè acrescentou, ainda, que “tudo o que pude tentar fazer ao longo da minha vida não foi porque me achei que era capaz de fazer. Até pode, mas os meus companheiros podem não julgar que seja capaz. Até pode ser que seja julgado capaz, mas os meus companheiros acharem que não é oportuno.”
Mais taxativo, Mulémbwè disse que “quando me perguntam o que é que acho (da candidatura à liderança do partido), eu deixo à liberdade das pessoas que digam o que pensam sobre mim”.
Ao afirmar publicamente estar disponível para avançar, Mulémbwè apresenta-se como uma pessoa consequente e consciente das suas decisões e que não recebe comandos “superiores”. É dono da sua consciência. Por outro lado, ao afirmar que “Espero que este congresso seja capaz de pôr, à frente da sua máquina, pessoas que estejam comprometidas com a causa do povo, pessoas que vão servir este povo, pessoas que ponham os seus interesses pessoais não acima dos interesses populares”, está claramente a dizer que a actual liderança corporizada por Armando Guebuza e Aires Ali coloca os seus interesses pessoais acima dos do povo. Está a dizer que estes governantes não estão a servir o povo, mas sim a servir-se do povo para as suas agendas privadas. E para se chegar a esta constatação não precisa de se ser um grande politólogo. Basta ler o artigo do jornalista investigador do Centro de Integridade Pública, Milton Machel, que destapou as teias de interesses do Presidente Guebuza com o capital chinês e não só. Mostrou a todos nós que todos os grandes projectos do Estado, com especial enfoque para as financiadas com o capital chinês, como as pontes, as circulares, estradas, etc., o Presidente da República, Armando Guebuza - com conhecimento óbvio do primeiro-ministro, Aires Ali - beneficia a si, a sua família e os seus sócios no mundo de negócios. Ou seja, enquanto o pobre povo saúda os tais empreendimentos, o Presidente da República enche os seus bolsos, da sua família e associados à custa do endividamento do Estado.
Mulémbwè, ao atacar este modus operandi actual, mostra ter um projecto político diferente. Contrariamente aos governantes actuais, defende que o povo e o interesse público devem estar acima dos interesses individuais ou de grupo como acontece agora.
São posições como as de Mulémbwè, de Rebelo, e já agora do professor Lourenço do Rosário, que nos fazem acreditar que ainda é possível um Moçambique melhor de todos, para todos e de cada um de nós.n
Jose Belmiro, artigo publicado hoje na pagina de Opiniao do Jornal O Pais do grupo SOICO
1 comentário:
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