Samora Machel: as raízes do homem do povo
Passados
30 anos da sua morte, Moçambique celebra a vida e obra de Samora
Machel, o primeiro Presidente de Moçambique, aquele que ergueu a
bandeira da independência do país, em 1975, e liderou a construção dos
fundamentos da nação. Hoje, se torna um mito. Sua memória é activada a
todos os níveis em Moçambique e além-fronteiras. Para entender como se
forma este homem revolucionário, o jornal O País foi a Chilembene, um
posto administrativo que fica no distrito de Chókwè, na provincia de
Gaza.
A
figura do avô paterno, Malengani, teve uma influência muito grande no
seu carácter. O curioso nisto é que este morreu 11 anos antes do
nascimento de Samora Machel, mas foram as suas memórias muito bem
passadas pelo pai, a ponto de o inspirarem desde a infância. Malengani,
que ganhou o nome de Maghivelane, foi guerreiro de Ngungunyane. Fez
parte de uma operação de transferência de 50.000 habitantes da zona
norte do Save para mais a sul e morreu em 1922.
Um
dos últimos filhos de Malengani era Moisés, pai de Samora Machel,
nascido quando já era de idade avançada, muito provavelmente 60 anos.
Moisés Mandhande Machel, pai de Samora, era um dos últimos filhos do
avô, nascido quando este já tinha uma idade avançada, provavelmente 60
anos. Moisés era membro da Compound Mission, fundada por um advogado
sul-africano, Custer, que actuava nos dormitórios das minas
sul-africanas e fundava comunidades de crentes nas suas zonas de origem
dos mineiros. Moisés foi baptizado e seguia princípios cristãos na
condução de sua família, nomeadamente, na educação, relações humanas e
código de ética. Sabia ler moderadamente Tsonga, pois tinha estudado até
segunda classe. Apesar de não ter prolongado os estudos, nas décadas de
30 e 40, Moisés era um homem abastado, que utilizava várias charruas.
Sua
esposa, Gugiye Thema Dzimba teve o primeiro filho na década de 1920.
Mas alguns dos seus filhos seguintes morreram cedo, entre eles um a quem
se tinha dado o nome de Samora. Gugiye, tenta e consegue ter
um filho a 29 de Setembro de 1933. O casal deu o nome do filho ora
falecido, Samora. Este era o terceiro de cinco irmãos, dos quais apenas
um está vivo - Orlando Machel - o mais novo. Reza a história que Samora
Machel tinha uma afeição especial por sua mãe. Alberto Mathonga Dzimba,
primo de Samora Machel, conta-nos, em Chilembene, que a ligação entre
Samora e Gugiye era muito forte. “Esta atenção manteve-se mesmo depois
da morte da mãe. Ele nunca nos abandonou, sempre veio cá visitar”
comentou o primo de Samora.
Antes
dos seus 8 anos Samora Machel era pastor de gado. Não escapou às
peripécias dos meninos da sua idade, na altura. Para chegar aos pastos
tinham de atravessar cursos de água. O régulo de Chilembe, Ernesto
Mutui, lembra-se de um insólito em que Samora atacou um crocodilo no
rio. “Ele já se mostrava um grande herói desde miúdo. Entrou na água
para salvar um boi do ataque de crocodilo, correndo enormes riscos.
Salvou o animal com um pau e saiu da água ileso”, confirma o régulo.
Em
1941, já com oito anos, Samora, começa a frequentar a escolar número 21
de Uamexinga, construída pelo Estado português e gerido mais tarde pela
missão de São Paulo de Messano. Depois de uma interrupção devido a
perseguição aos movimentos protestantes, Samora volta à escola. Em 1950,
com 17 anos, foi o único do grupo de quatro colegas, que tinha atingido
a quarta classe. Era o topo do que era o sistema escolar vigente para
os africanos na altura.
Numa
altura em que Eduardo Mondlane, dez anos mais velho, tinha seguido
caminho diferente, a universidade, Samora Machel escolhia a profissão de
enfermeiro. De 1951 a 1955 esteve na formação, onde os últimos dois
anos foram ministrados no Hospital Miguel Bombarda (hoje Hospital
Central de Maputo). Nessa altura conhece um colega e amigo, Albino
Maheche, que nos conta que “Samora era um colega de formação que sempre
nos mobilizava para discutir assuntos do país, numa altura em que estava
sob dominação do regime colonial.” A intolerância, a injustiça e a
desigualdade salarial entre profissionais de saúde da mesma área negros,
mulatos e brancos foi, seguramente – segundo Maheche – a primeira
manifestação pública contra o regime. Diz o amigo de Samora que “da
Administração do Conselho de Lourenço Marques veio a resposta de
pagamento de salários exigidos por Samora e alguns colegas, salaries
justos.
Depois
da formação foi destacado para Ilha de Inhaca, sede da Circunscrição de
Maputo (actual distrito de Matutuíne). É lá onde conhece Sorita
Chaiankomo, com quem teve quatro filhos: Joscelina, Edelson, Olívia e
Ntewane, os últimos dois nasceram depois do seu regresso a Lourenço
Marques, quando pediu transferência para poder estudar, três anos depois
de ter trabalhado em Inhaca.
Vive
numa casa de madeira e zinco na Mafalala, enquanto vai fazendo o
segundo até o quinto anos do liceu. Começou a construir uma casa própria
em Xipamanine. “Samora levou-me a conhecer a sua obra perto do Bairro
Indígena. Fomos ver a casinha dele e explicou-me como estava a aplicar
as suas poupanças que ganhava trabalhando na casa mortuária do Hospital
Miguel Bombarda”, disse Maheche, com o rosto alegre.
Além
de Joscelina, Edelson e Ntewane, Machel teve mais filhos. Do
relacionamento que teve com Irene Buque, nasce Ornila. Em 1969, casou-se
oficialmente com Josina Muthemba, uma guerrilheira de quem teve um
filho, Samora Machel Jr. Após a morte de Josina, casa-se oficialmente, em 1977, com Graça Simbine, com quem teve dois filhos: Josina Machel e Malenga.
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