Tuesday, July 4, 2017

À espera de uma surpresa agradável

Quando em Dezembro do ano passado, o Presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, apareceu inesperadamente a anunciar a suspensão das hostilidades militares, a questão que se colocava era sobre o que de extraordinário teria acontecido nas conversas entre ele e o Presidente Filipe Nyusi para tão repentina postura reconciliatória. Na véspera do anúncio, Nyusi, em visita à província de Nampula, havia feito uma declaração dando conta de que Dhlakama iria se pronunciar no dia seguinte. Desde então, a suspensão foi sendo renovada sempre que os prazos estivessem prestes a chegar ao fim, até que muito recentemente, passou a ser por tempo indeterminado. Não se pode exagerar sobre a importância de Moçambique voltar a conquistar a paz que se tornou ilusiva 20 anos depois dos acordos de Roma. O entusiasmo com que foi recebido o anúncio da suspensão ilimitada das hostilidades, e a reanimação económica que daí resultou são testemunhas inequívocas do quão o país está desejoso que o governo e a Renamo voltem a entender-se. Mas a questão que desde o início se colocou sobre os entendimentos entre Nyusi e Dhlakama foi, até que ponto os dois líderes estão neste projecto de mãos dadas com as respectivas chefias militares, focalizados, como se deve esperar, sobre um objectivo comum. Lidos nas entrelinhas, os últimos pronunciamentos de Dhlakama, quase seis meses após a primeira declaração de suspensão das hostilidades, criam a imagem de um processo muito longe de garantir que o país tenha ainda a ilusão de alguma solução à vista. Ao mesmo tempo que reclama lentidão nas negociações, também acusa a forças governamentais de se manterem nas suas posições, mesmo depois de à luz dos entendimentos entre os dois, Nyusi ter dado ordens para a sua retirada. Num regime republicano, onde deve prevalecer o princípio da obediência dos militares ao poder civil, só uma condição excepcional poderá explicar as razões porque os comandantes militares se furtam a dar fé aos compromissos políticos assumidos pelo seu Comandante-em-Chefe. Como, por exemplo, que a evolução das coisas no terreno lhes seja suficientemente vantajosa que qualquer recuo pode ser contraproducente. Do lado da Renamo, porém, não estão claras as vantagens que poderá obter na mesa das negociações, com a abdicação do único instrumento de pressão que possui à sua disposição. Dada esta conjuntura toda, começa a formar-se a ideia de um Dhlakama cujos pronunciamentos não estão ser feitos num ambiente de liberdade, de um líder militar sem mais opções para alcançar os seus objectivos. Desde o princípio que se tornou evidente que a opção armada para resolver os problemas políticos que constituíam o caderno reivindicativo da Renamo era uma perigosa aventura. Moçambique tem condições naturais para qualquer indivíduo iniciar uma guerra de guerrilha e manter-se no mato o tempo que quiser. Desestabilizar militarmente o governo do dia não é um empreendimento de difícil alcance. Mas se é para obter resultados políticos, essa deve ser a via menos aconselhável. Como dizia um antigo Primeiro-Ministro indiano, Atal Vajpayee, num alerta contra os apetites dos militares para uma guerra com o Paquistão, “o problema com a guerra é, como iniciá-la, quando e onde iniciá-la, está nas nossas mãos. Mas como e quando é que ela vai terminar, nunca é do nosso controlo. É por isso que a decisão de ir à guerra nunca deve ser tomada de ânimo leve ou como resultado de uma zanga”. A derrota militar da Unita em Angola, incluindo a morte do seu lí- der, Jonas Savimbi, depois de mais de 27 anos de guerra, pode ser o testemunho mais evidente deste facto. Apesar de estar dotada de uma formidável estrutura política e militar, suportada por uma teia de respeitáveis contactos diplomáticos pelo mundo fora, a Unita nunca conseguiu derrotar o governo do MPLA, muito embora tenha sido capaz de desestabilizar o país e de certo modo inviabilizar os seus planos de desenvolvimento económico e social. No actual processo de paz em Moçambique, a ausência de documentos formais escritos sobre o decorrer das negociações torna impossível formar qualquer juízo sobre o que está realmente a acontecer, e só se pode esperar que qualquer surpresa seja de facto agradável.

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