Elisio Macamo está a sentir-se furioso.
A Trégua do Senhor
A Pérola do Índico está feliz da vida. Finalmente, o país vai estar como sempre esteve. Não em paz, mas também não em guerra. Apenas a gozar duma trégua. Só que não é aquela trégua formal que consiste num acordo mútuo de intermissão de hostilidades. Esta tem dono: “Estou a anunciar a prorrogação da trégua, mas desta vez é diferente porque hoje anuncio a trégua sem prazo. A trégua sem prazo é diferente das anteriores porque se antes tinha 60 dias, agora mudei de estratégia”, disse Dhlakama segundo a AIM. Festa na aldeia. O nosso empregado trabalha a sério!
É a Trégua do Senhor, aquela que na Europa medieval proibia todas as hostilidades entre a Quaresma e o Advento sob pena de excomunhão. Diferente desta, porém, a nova, a sem prazo (de validade? O INAE não devia intervir?), é a resposta que o Deus Todo Poderoso dá à gente de boa vontade, para usar uma expressão feliz. A AIM escreve, e eu cito: “A medida, segundo o líder da oposição, é também resposta aos moçambicanos, empresários, até mesmo estrangeiros, que receavam o que viria a acontecer depois de 60 dias, até porque a trégua começou a 27 de Dezembro de 2016, ‘e agora estamos em Maio de 2017”. Pois. Quando as hostilidades começaram não houve nenhuma necessidade de responder a ninguém.
A palavra “trégua” tem origem germânica e já significou “fé”, “verdade”, “fidelidade”, “promessa”, etc. Na Pérola do Índico significa “fé”. Fé nas prioridades de quem sequestra a paz. Ei-lo em tom original: “Já não é prioritária [a nomeação dos governadores provisórios da Renamo]. Não posso dizer que está descartada, ou está esquecida, porque podia criar confusão nas cabeças dos membros e simpatizantes mesmo do sul [do país]”. Só por isso. E por isso que é trégua, não é paz.
A festa na aldeia continua. É a festa da síndrome de Estocolmo. Atenção, síndrome não é doença. É o encontro de vários sinais que, neste caso em particular, revelam lacunas na cidadania e no respeito por ela.
Ser cidadão, para recuar ao ideal republicano romano, é ser livre, isto é não ter um senhor. Os pérola-indianos têm um, ele que decide tréguas. Ser cidadão, ainda nesse ideal republicano, é viver num sistema político cuja principal função consiste em organizar as condições em que essa liberdade vai ser protegida. Os pérola-indianos vivem num sistema que coloca a sua liberdade refém de conversas telefónicas entre dois ilustres filhos da nação. Ser cidadão, ainda estamos no mesmo ideal republicano, é usufruir do direito de interpelar criticamente quem exerce poder sobre nós. Os pérola-indianos não podem interpelar nada nem ninguém porque não estão ao corrente das conversas telefónicas. O empregado do povo não tem que dar satisfações ao Parlamento, onde os representantes (i)legítimos dos pérola-indianos vão tirar soneca (pelos vistos) ou vão para abandonar a sala, ele não dá satisfações a ninguém. Não diz o que prometeu, se prometeu alguma coisa, não diz nada. Mas que ele trabalha, ah sim, o homem trabalha. Trégua, recordem-se, etimologicamente significa “fé”.
Não é a primeira vez que gritamos “paz”. Cidadãos verdadeiros perguntam “que tipo de paz?”. Cidadãos verdadeiros. Mas lá está. Não estamos em Roma. Estamos na Pérola do Índico. Aqui vale a cultura africana. Ideais republicanos é eurocentrismo. Lá no sul do país diz-se “Hosi i vanhu”. Chefe é o seu povo. É a versão xangan do ideal republicano romano: autoridade vem com o consentimento do povo. Se fosse assim na Pérola do Índico não haveria necessidade de trégua porque trégua é obra do Senhor. E o Senhor é Todo Poderoso.
Desde 1975 independentes e ainda apostados em adiar a liberdade. É obra. Olá trégua!
A Pérola do Índico está feliz da vida. Finalmente, o país vai estar como sempre esteve. Não em paz, mas também não em guerra. Apenas a gozar duma trégua. Só que não é aquela trégua formal que consiste num acordo mútuo de intermissão de hostilidades. Esta tem dono: “Estou a anunciar a prorrogação da trégua, mas desta vez é diferente porque hoje anuncio a trégua sem prazo. A trégua sem prazo é diferente das anteriores porque se antes tinha 60 dias, agora mudei de estratégia”, disse Dhlakama segundo a AIM. Festa na aldeia. O nosso empregado trabalha a sério!
É a Trégua do Senhor, aquela que na Europa medieval proibia todas as hostilidades entre a Quaresma e o Advento sob pena de excomunhão. Diferente desta, porém, a nova, a sem prazo (de validade? O INAE não devia intervir?), é a resposta que o Deus Todo Poderoso dá à gente de boa vontade, para usar uma expressão feliz. A AIM escreve, e eu cito: “A medida, segundo o líder da oposição, é também resposta aos moçambicanos, empresários, até mesmo estrangeiros, que receavam o que viria a acontecer depois de 60 dias, até porque a trégua começou a 27 de Dezembro de 2016, ‘e agora estamos em Maio de 2017”. Pois. Quando as hostilidades começaram não houve nenhuma necessidade de responder a ninguém.
A palavra “trégua” tem origem germânica e já significou “fé”, “verdade”, “fidelidade”, “promessa”, etc. Na Pérola do Índico significa “fé”. Fé nas prioridades de quem sequestra a paz. Ei-lo em tom original: “Já não é prioritária [a nomeação dos governadores provisórios da Renamo]. Não posso dizer que está descartada, ou está esquecida, porque podia criar confusão nas cabeças dos membros e simpatizantes mesmo do sul [do país]”. Só por isso. E por isso que é trégua, não é paz.
A festa na aldeia continua. É a festa da síndrome de Estocolmo. Atenção, síndrome não é doença. É o encontro de vários sinais que, neste caso em particular, revelam lacunas na cidadania e no respeito por ela.
Ser cidadão, para recuar ao ideal republicano romano, é ser livre, isto é não ter um senhor. Os pérola-indianos têm um, ele que decide tréguas. Ser cidadão, ainda nesse ideal republicano, é viver num sistema político cuja principal função consiste em organizar as condições em que essa liberdade vai ser protegida. Os pérola-indianos vivem num sistema que coloca a sua liberdade refém de conversas telefónicas entre dois ilustres filhos da nação. Ser cidadão, ainda estamos no mesmo ideal republicano, é usufruir do direito de interpelar criticamente quem exerce poder sobre nós. Os pérola-indianos não podem interpelar nada nem ninguém porque não estão ao corrente das conversas telefónicas. O empregado do povo não tem que dar satisfações ao Parlamento, onde os representantes (i)legítimos dos pérola-indianos vão tirar soneca (pelos vistos) ou vão para abandonar a sala, ele não dá satisfações a ninguém. Não diz o que prometeu, se prometeu alguma coisa, não diz nada. Mas que ele trabalha, ah sim, o homem trabalha. Trégua, recordem-se, etimologicamente significa “fé”.
Não é a primeira vez que gritamos “paz”. Cidadãos verdadeiros perguntam “que tipo de paz?”. Cidadãos verdadeiros. Mas lá está. Não estamos em Roma. Estamos na Pérola do Índico. Aqui vale a cultura africana. Ideais republicanos é eurocentrismo. Lá no sul do país diz-se “Hosi i vanhu”. Chefe é o seu povo. É a versão xangan do ideal republicano romano: autoridade vem com o consentimento do povo. Se fosse assim na Pérola do Índico não haveria necessidade de trégua porque trégua é obra do Senhor. E o Senhor é Todo Poderoso.
Desde 1975 independentes e ainda apostados em adiar a liberdade. É obra. Olá trégua!
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