Que não fosse como em 1992(1)
Continuemos a ler o livro de John Hewlett, rezando, todavia, para que as semelhanças que possam existir com o actual processo em busca de paz não passem disso mesmo, semelhanças! Os actores são os mesmíssimos, tirando aquilo que parece produto da engenharia de Filipe Nyusi, que provavelmente não poderá admitir que se volte a brincadeiras com nome de acordo. Pelo menos tem-nos dito que quer algo efectivo, sério e não perecível.
Com efeito, diz Hewlett que, enquanto os convidados faziam fila para aquela cerimónia de Roma, recordou-se como cada um tinha participado nos eventos que os tinham trazido àquele momento. O CIO (a secreta da antiga Rodésia) tinha sido responsável por apoiar a Renamo como força desestabilizadora em Moçambique. O Zimbabwe do Presidente Mugabe tinha actuado como mediador para conseguir o cessar-fogo.
O Quénia foi igualmente importante ao tentar garantir os encontros iniciais a que Dhlakama se tinha esquivado. O Malawi tinha sido crucial ao permitir o avanço fundamental. Eram africanos que procuravam resolver os problemas africanos.
Quanto aos europeus eram uma estranha mistura, diz o autor, que prossegue: Portugal era vital como antiga potência colonizadora, mas de facto tinha feito pouco para trazer o fim da guerra. A Renamo tinha muitos simpatizantes em Portugal e lá mantinha escritórios. Embora os portugueses tivessem um papel oficial nas conversações de Roma, os italianos não apreciavam esta presença e tinham boas razões. Em todo o tempo os italianos foram mais proactivos e positivos.
O embaixador do Reino Unido beneficiava de uma relação especial com Moçambique, em parte, talvez, porque a Lonrho era o maior investidor, mas também porque Moçambique tinha dado apoio nas conversações de “Lancaster House” que conduziram o Zimbabwe à Independência.
Em Washington tinha havido uma substancial pressão da “Heritage Foundation” para apoiar a Renamo que era pintada como combatente para a democracia, que lutavam contra um mal que era o regime marxista. O Departamento de Estado tinha resistido a isto, o que se prolongou pelos primeiros anos de Chester Crocker. Os EUA tinham apoiado o Acordo de Nkomati em 1984. As Nações Unidas foram cruciais para que as assinaturas nos documentos se transformassem em acção.
A assinatura do cessar-fogo foi acolhida pelo Governo da Itália na sede do Ministério dos Negócios Estrangeiros. A relação da Sant´Egídio com Moçambique surgiu quando esta comunidade tentou melhorar os laços entre o Estado moçambicano e a Igreja Católica, nos anos 1980, e foi influenciada pelo bispo da Beira (ora falecido) Dom Jaime Gonçalves. As relações tensas ficaram desanuviadas quando o Papa João Paulo II visitou Moçambique a convite do Presidente Chissano, em 1988.
A Sant´Egídio tinha negociado com a Renamo a libertação de alguns missionários sequestrados em 1985. Este contacto levou-a a iniciar e acolher as conversações do cessar-fogo em Roma, conduzidas por Mário Rafaell.
PS: Está uma titânica luta movida pelos organizadores da marcha de sábado antepassado, rotulada de manifestação, para que a imprensa, principalmente a escrita, escreva algo. Até há quem ameaça que, caso não, poderá usar “outra” imprensa para lixar a que não publicar. Fica a ideia de que se realizou para que saísse na imprensa, na minha convicção sempre presente, de que as publicações servem de factura/recibo para justificar o “trabalho” a quem mandou fazer.
Pedro Nacuo
nacuo49nacuo@gmail.com
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Que não fosse como em 1992(3)
O livro que ainda estamos a ler foi escrito (lembrem-se) por quem, em determinada altura, fez parte da equipa empresarial que adquiriu o Hotel Cardoso, em Maputo. O que nos conta é, por isso e mais uma vez, de todo sério e verdadeiro:
A influência italiana no processo pré-eleitoral, depois do acordo de Roma, foi considerável, não só através da Comunidade de Sant´Egídio, mas oficialmente, através do governo italiano e do seu serviço diplomático. Estavam preparados para intermediar e ouvir pedidos fora do vulgar para garantir que a paz prevalecesse.
Para o autor, a Itália tinha assumido o papel de potência colonial, assegurando que o “novo” (aspas nossas” Estado pudesse estabelecer a sua democracia. A Itália, entrou, por assim dizer, onde Portugal falhou em preencher o vazio.
Apesar disto a Renamo ainda não tinha acomodação em Maputo. A União Europeia estava temporariamente sem representante na capital moçambicana e assim a casa que lhe tinha sido atribuída estava vaga. Como o embaixador da Itália, o elegante Incisa Di Camerana, era o decano entre os diplomatas e de longe o mais flexível, o autor do livro sugeriu que a casa da UE fosse disponibilizada.
Numa semana já se tinha o acordo. John Hewlett informou a Vicente Ululu (quadro sénior da Renamo já falecido), que o seu chefe (Afonso Dhlakama) tinha um sítio condigno para viver. Ao mesmo tempo descobriu-se que a casa do embaixador da Jugoslávia também estava vaga e como já aquele país não existia, ficou-se com a casa para o próprio Ululu, como secretário-geral da Renamo.
Raul Domingos encontrou alojamento numa casa da embaixada da Itália, na Avenida Keneth Kaunda, ao lado da casa do embaixador transalpino. Tudo o que se precisava a seguir era um local para ficarem 250 quadros da Renamo. Era um problema muito mais complicado.
Começaram a chegar mais contingentes das Nações Unidas. O batalhão italiano foi mandado para a província de Manica onde não tardaram a surgir escândalos entre raparigas locais. A principal tarefa era a recolha de armas, mas o acesso às áreas significava conduzir por estradas que tinham sido minadas.
Aldo Ajello pediu à divisão das Nações Unidas ligada a operações com minas para falar com o autor deste livro sobre a desminagem. John Hewlett voou para os Estados Unidos da América e fez contratos para remover as minas. Era óbvio que se precisava, então, de uma equipa de desminagem. Uff! Vamos prosseguir, nas próximas edições, com estes textos que falam do que não gostaríamos que desta vez “ não fosse como em 1992”.
Pedro Nacuo
nacuo49nacuo@gmail.com
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SOBRE A NOSSA AUTOESTIMA: LUZ NO FUNDO DO TÚNEL
“Ai dos que ao mal chamam bem, e ao bem mal; que fazem da escuridade luz, e da luz escuridade…” – Isaías 5:20
Finalmente e embora de forma “entaramelada”, mas já se vislumbra a “luz no fundo do túnel”,quanto à recuperação ou redefinição da nossa auto-estima e individualidade pessoal. Tal como disse um dia Confúcio, (Kung-fu-tzu), sábio pensador e filósofo chinês do Período das Primaveras e Outonos, (século VI a.C.): “É melhor acender uma pequena vela do que maldizer a escuridão”. E Confúcio disse mais: “desde que se eduque o delinquente, desde que lhe façam ver os seus erros, ele será necessariamente levado a emendar-se”. É que, durante muitos anos, nós, moçambicana/os, mantivemo-nos irreconhecíveis, enrolados em amarras de princípios, que de nada nos aumentava a nossa auto-estima, enxovalhando-nos e humilhando-nos brutalmente pelo simples facto de não estarmos vestidos à maneira dos nossos antigos “patrões”, numa África em que as temperaturas rondam muitas vezes os quase cinquentas graus centígrados. Muitos de nós estamos lembrados que, logo após a nossa preciosa Independência Nacional, as moçambicanas só vestidas de “maxi-saia”, e os moçambicanos, só quando trajados de calça e balalaica à maneira “gola da china”, é que eram verdadeiros revolucionários. O tempo,essa coisa que, quando é ruim, demora a passar; e quando é boa, passa num instante, elerolou e tudo caiu em desuso, cada um podendo apresentar-se como verdadeiros herdeiros de “Adão e Eva”, daí presenciarmos as nossas mulheres e filhas de tanguinhas e ou com saias exageradamente apertadas, com rachas lascivamente provocantes e escandalosas colocando as partes íntimas à exposição de quem tem olhos para ver. Aos homens, foi-lhes decretado para os eventos oficiais apresentarem-se de fato e gravata, não importa a qualidade do tecido e a época do ano, modelo esse de vestir lançado na França por volta do século XVII, por membros da elite que adoptavam no seu modo de vestir inspiração eminentemente militar. Ou seja, dentro ou fora do país, tirando a língua portuguesa, impossível seria identificar, “a priori”, um/a moçambicano/a através da indumentária, muitas vezes incómoda: fatos e gravatas. Assim como as malcheirosas perucas e cumpridas mechas, a gravata também nunca teve qualquer função prática para a nossa identidade e ou auto-estima, mas mesmo assim o seu uso espalhou-se rapidamente. Mas finalmente já começou a vislumbrar-se uma “luz no fundo do túnel”, no que tange à nossa auto-estima e personalidade individual e colectivamente. Não sei de quem foi a iniciativa, mas de uma noite para o dia, começa-se a notar que, nas recepções ao Chefe de Estado durante as suas visitas de trabalho nos distritos, momentos esses na prática em que ele convive com o Povo no “Moçambique real”, óptima oportunidade para o Povo extravasar a sua alegria, vendo-se livre de quaisquer amarras, agora veste-se de modo espaventosamente desinibida, numa verdadeira festa à moda africana e[...],os dirigentes também já não são obrigados a asfixiarem o seu pescoço com uma tira de tecido, estreita e longa, presa por um nó na parte da frente chamada gravata, muito menos “mumificarem” os corpos com incómodos fatos e vestidos “Pierre Cardam”. A kapulana, esse traje tradicional, que une Moçambique do Rovuma ao Maputo, e que amarrada ou vestido com o jeito do povo moçambicano, ao mundo encanta. Acredito que com este andar, a breve trecho, akapulana será um dos nossos importantes meios de afirmação política, social, religiosa e cultural. Viva a kapulana!
Kandiyane Wa Matuva Kandiya
nyangatane@gmail.com
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