Dinheiro apreendido pelos sul-africanos no Lebombo
-Ministério do Interior despachou dois agentes para a África do Sul
- Nazir Lunat, maulana da mesquita “Masjid Taqwa”, em Maputo, sob investigação
Os serviços secretos sul-africanos
suspeitam que o dinheiro
apreendido no passado
dia 25 de Dezembro,
no posto fronteiriço de Lebombo,
de outro lado da fronteira de Ressano
Garcia, poderia estar a caminho
das redes do Estado Islâmico
disseminadas internacionalmente.
Embora as autoridades sul-africanas
não tenham evidências bastantes
da existência dessas redes dentro
da África do Sul, a secreta sul-africana
entende que, com o aperto do
cerco às suas bases no Iraque e Síria
pelas forças internacionais, o grupo
está a expandir-se para outros cantos
do planeta e a África do Sul não
pode ser considerada excepção.
Serviços de inteligência ocidentais
não descartam também a existência
de simpatizantes e elementos ligados
ao Estado Islâmico em Mo-
çambique, sobretudo a partir dos
seguidores do “wahhabismo”, uma
corrente radical dentro do islamismo
sunita.
Outra pista seguida pela Polícia é
que o valor poderia ter sido obtido
a partir de resgates dos vários sequestros
que têm assolado, desde
2011, as principais cidades moçambicanas,
com destaque para Maputo
e Matola.
As vítimas, na sua maioria, têm
sido empresários de origem asiática
ou seus parentes e enormes somas
em dinheiro foram exigidas em resgates.
Também aqui há divisões de
análise, uma vez que se acredita que
o dinheiro dos resgates pode estar
a funcionar como financiamento
político, uma forma de pressionar a
comunidade asiática acusada de “só
fazer negócios entre si”.
Segundo o porta-voz da Hawks,
um ramo do Serviço da Polícia
sul-africana (SAPS) especializado
em acções de combate ao crime
organizado, crimes económicos e
corrupção, o brigadeiro Hangwani
Mulaudzi, as investigações ora em curso vão determinar tudo, porém,
todas as hipóteses devem ser colocadas.
“Eles podem usá-lo para actividades
terroristas”, avançou Mulaudzi,
colocando, igualmente outras hipóteses.
“Onde e como eles conseguiram
isso é uma daquelas coisas que estamos
a tentar determinar”, disse
Mulaudzi, citado pela imprensa
sul-africana.
O dinheiro poderia ser usado em
território sul-africano, por exemplo,
para acções de recrutamento de
novos membros para as frentes de
combate em vários países, particularmente
do Golfo Pérsico e Ásia,
ou mesmo para actividades terroristas
dentro da região.
O dinheiro, recorde-se, estava a
ser ilegalmente transportado por
dois cidadãos de nacionalidade
moçambicana (e de origem asiática),
Assane Momad de 50 anos de
idade e de Abdul Ahmed, 37 anos,
numa Toyota Hilux, com chapa de
matrícula DJ 85 TK GP. A polícia
sul-africana interpelou os dois cidadãos
moçambicanos, após uma
denúncia anónima, que se supõe
que veio de grupos rivais em Moçambique.
Ao que o SAVANA apurou, um dos
detidos (Assane Momad) é cunhado
(irmão da mulher) do maulana
Nazir Lunat, líder da mesquita
“Masjid Taqwa”, na Avenida Eduardo
Mondlane, muito frequentada
por cidadãos de origem paquistanesa.
Abordado pelo SAVANA na
tarde desta quarta-feira, Nazir Lunat
declinou tecer qualquer tipo de
comentários.
Dada a sensibilidade do assunto, o
jornal insistiu e Lunat foi inflexível:
“Não. Prefiro não falar do assunto”,
sublinhou o maulana, que num passado
recente exercia formalmente
actividade numa casa de câmbios,
na Av. Samora Machel, próximo à
Pastelaria Continental.
O SAVANA soube também que os
dois detidos são descritos como especialistas
em transportar dinheiro
para a África do Sul, uma actividade
antiga e conhecida ao mais alto
nível político-financeiro em Moçambique.
Dinheiro a favor da África
do Sul
Concretamente, o dinheiro estava
escondido e disfarçado no fundo
falso da bagageira da viatura. Em
relação à proveniência, Mulaudzi
disse também que, nesta fase, não
está ainda claro de onde veio o dinheiro,
mas eles estão a investigar
para se aferir se os homens estavam
envolvidos em actividades criminosas
graves, sindicatos, assaltos a caixas
de transporte de valores ou não.
Os dois homens estiveram presentes
no início da semana num
tribunal na zona de Barberton, na
província de Mpumalanga, mas a
sessão de audição foi adiada para o
dia 4 de Janeiro próximo. A juíza
ordenou que os dois homens permanecessem
na prisão da esquadra
policial de Komatipoort, junto à
fronteira com Moçambique.
Os dois homens vinham de Maputo
e sem problemas passaram a
fronteira moçambicana e só do lado
sul-africano é que foi descoberto
que transportavam ilegalmente cerca
de 4.9 milhões de dólares americanos,
2.2 milhões de euros e 20
mil randes. A revista ao seu veículo
aconteceu a partir de uma denúncia
recebida pela polícia.
A confirmação dos montantes só
foi possível depois de cinco horas
de contagem do dinheiro que vinha
em sacos. A operação de contagem
foi executada por funcionários do
Standard Bank, solicitados pelas
autoridades sul-africanas, que depois
depositaram o valor naquela
instituição bancária. As autoridades
aduaneiras sul-africanas disseram
que esta foi a maior apreensão de
divisas registada este ano no país.
Até ao momento, as autoridades
moçambicanas ainda não se pronunciaram
sobre o sucedido, supostamente
para não perturbar as investigações
que decorrem na África
do Sul. O Ministério do Interior
despachou dois agentes seniores
para se juntarem às investigações.
Alguns juristas moçambicanos ouvidos
pelo SAVANA fazem notar
que as autoridades sul-africanas
deverão verificar se se trata de um
crime (dinheiro obtido ilicitamente)
ou é uma infracção administrativa
(dinheiro acima do legalmente
permitido).
“O dinheiro deverá reverter a favor
do Estado sul-africano, no caso de
se provar que é resultante de uma
actividade ilícita. Se for proveniente
de uma actividade lícita, o seu
proprietário deverá provar e explicar
o porquê de não ter recorrido
aos procedimentos legais, que é,
por exemplo, colocar num banco
em Moçambique e proceder a uma
transferência bancária”, frisam.
Sublinhar que esta não é a primeira
vez que as autoridades sul-africanas
detectam situações de entrada
ilegal de elevadas somas monetárias
depois de passarem da fronteira
moçambicana.
Em Agosto último, um grupo
de homens que estava a viajar do
Aeroporto Internacional Oliver
Tambo, de Joanesburgo para Dubai,
tinha escondido 23 milhões de
randes e 3.77 milhões de dólares
em 12 peças de bagagem, incluindo
quatro mochilas.
Relatos da época sugeriram que o
dinheiro passou por Moçambique
e estava a caminho do Paquistão
para financiar as actividades terroristas
naquele país e noutras partes
do mundo.
Em Dezembro de 2010, foi detido,
na vizinha Swazilândia, Momed
Ayoob, um outro empresário moçambicano, na posse de 18 milhões
de randes, que pretendia levar para
Dubai.
O embaixador do Iraque na África
do Sul, Hisham al-Alawi, disse na
época que ele não ficaria surpreso
se as investigações confirmassem
que o dinheiro confiscado estava
mesmo a caminho para financiar o
Estado Islâmico.
“Tem havido um aumento da actividade
na África do Sul com relação ao recrutamento e angariação
de fundos para o Estado Islâmico”,
disse o embaixador do Iraque a
propósito do assunto.
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