quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Os caminhos para a paz


Por: JEREMIAS LANGA
As celebrações do 3 de Fevereiro deixaram-nos transparecer o quão a Frelimo e o seu Governo estão profundamente divididos na abordagem ao diálogo político com a Renamo. De um lado, o do Presidente da República e seu Primeiro-Ministro, temos a imagem da serenidade e abertura incondicional a conversar com Afonso Dhlakama. De outro, o do Presidente do Partido, seu Secretário-Geral e apaniguados mais próximos, a imagem sombria, nervosa, agressiva e impaciente.
Magnânimo, e alheio a todo o ruído que o seu próprio partido faz, em torno do assunto, Filipe Nyusi mantém-se fiel e coerente ao seu discurso de posse e continua a surpreender tudo e todos pela sua inesperada firmeza até perante aqueles que esperavam que lhes devesse vénias.
Há muito que tinha ficado evidente que o sucessor de Guebuza não teria vida fácil na direcção do Estado. Até 15 de Janeiro deste ano, e durante 50 anos, tinham sido os próprios fundadores da Frelimo a dar as cartas em tudo e, no momento de entregar o poder à nova geração, Nyusi parecera-lhes a escolha de menor risco, aquele que, pelo seu passado, não se configurava de encetar grandes mudanças ao rumo que elesachavam melhor ao país.
O problema é que Filipe Nyusi está a sair-se, precisamente, o oposto do que a Frelimo (ou apenas alguns dos seus mais proeminentes membros?) esperaria. A começar pelo apaziguador e messiânico discurso da posse. O novo Presidente entrou com estrondo, pela porta principal, quando em alguns guiões se lhe tinha reservado a porta das traseiras.
A mensagem de que “o meu patrão é o povo” é muito mais profunda do que alguns a interpretaram e destina- se mais para dentro do partido do que para fora.
Quando, em bloco, o partido mostra sinais de impaciência e responde com agressividade aos incendiários discursos de Dhlakama, como se viu, no dia 3 de Fevereiro com o ex-presidente Armando Guebuza, é sinal claro de que alguém na Frelimo “está-se nas tintas” com os desvarios do líder da Renamo e as consequências que deles podem advir para o país e estará a passar a ideia de que é necessário activar um Plano B para resolver o assunto. Como há cerca de ano e meio, quando se atacou, inesperadamente, Santugira.
Por ora, Filipe Nyusi mostrou que é incólume à pressão, que a sua estratégia é precisamente estender os braços ao líder da Renamo para o convencer a abandonar o caminho errático em que se meteu e a voltar à normalidade. A velha máxima “a alternativa ao diálogo é o próprio diálogo”. Uma posição que continua a valer pontos a Nyusi, um presidente que muitos supunham cordeiro, mas está a revelar-se um verdadeiro lobo. Pelo menos por ora.
Filipe Nyusi prometeu, na sua posse, construir consensos nos momentos difíceis, uma liderança onde em Moçambique, jamais, irmãos se voltem contra irmãos seja a que pretexto for; um permanente e verdadeiro dialogo. Prometeu buscar no Presidente Chissano o espírito de tolerância e de reconciliação da família moçambicana.
Em menos de um mês de chefia do Estado, Nyusi enfrenta o primeiro grande teste à sua liderança, enfrenta o primeiro momento difícil e a oportunidade de começar a pôr em prática estas suas promessas, mesmo que isso implique colocar-se nos antípodas das ideias do seu partido. Conseguir convencer os ultra-radicais do partido, sem ter a liderança do mesmo, é o primeiro passo.
PS:
Esta semana, a Ordem dos Advogados insinuou que a Procuradoria-geral da República devia intervir e autuar Afonso Dhlakama pelos seus pronunciamentos. Discordamos completamente desta ideia. Prender Dhlakama seria pior a emenda que o soneto. Todos somos iguais perante a lei, reza a Constituição. Mas como sabiamente nos lembra George Orwell, há uns mais iguais que os outros.
Afonso Dhalama não é António Muchanga. Olha-se para a enorme legião dos seus seguidores e percebe- se o potencial de instabilidade em que o país pode mergulhar se enveredar por este caminho. O problema de Dhlakama é político e por essa via deverá ser resolvido.
Fonte: O País online - 05.02.2014

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