CLAUDI PÉREZ Bruxelas 18 FEB 2015 - 09:03 BRST
A Grécia cede. As pressões do Eurogrupo, os sérios problemas de liquidez e as tensões em seu sistema financeiro levaram o Governo de Alexis Tsipras a anunciar na terça-feira que solicitará, na quarta, uma ampliação do resgate de até seis meses, com uma fórmula de compromisso para salvar o patrimônio, de acordo com a explicação do ministro grego das Finanças Yanis Varoufakis, feita à televisão alemã. Após algumas semanas de fortes pressões, incluindo um ultimato do Eurogrupo, Varoufakis admitiu que Atenas “precisa prolongar o programa de crédito” para negociar com mais folga um terceiro resgate completo. A partida, entretanto, está longe de terminar. A Grécia enviará uma carta ao Eurogrupo com sua oferta, e os membros do euro avaliarão se ela cumpre suficientemente as condições impostas. Somente então, se o pedido se aproximar das exigências europeias, será convocada uma reunião extraordinária na qual serão decididos os detalhes do acordo.
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Fontes do Governo grego explicaram que Atenas pensa em uma ampliação que se distinga claramente do memorando feito pelo troika (Comissão Europeia, FMI e o BCE) nos últimos anos. Atenas continua sendo deliberadamente ambígua: deve contentar os parceiros europeus, e ao mesmo tempo tem um claro mandado do eleitorado grego, que votou no Syriza com a promessa do fim da austeridade, do fim da troika e o fim do resgate. Varoufakis explicou que haverá, “evidentemente, três ou quatro condições”, que não especificou, mas o Eurogrupo falou alto e claro na segunda-feira: os parceiros europeus estão dispostos a conceder vitórias semânticas à Grécia, e até mesmo outorgar certa flexibilidade, mas querem uma vitória total: uma prorrogação do atual programa e da maioria de suas duras condições.
A ideia de Atenas é solicitar uma ampliação na linha do plano formulado pela Comissão Europeia nos últimos dias. Esse plano, entretanto, nem sequer foi debatido no Eurogrupo, cujo presidente, Jeroen Dijsselbloem, optou por outra proposta muito menos agradável que levou os gregos a recusar o pacto e o Eurogrupo a colocar um ultimato. Os membros do euro deveriam discutir a proposta na sexta-feira. Pois o tempo urge: vários parlamentos nacionais – o alemão e o finlandês, entre outros – devem votar para que o acordo esteja pronto em 28 de fevereiro, a data em que o resgate expira.
A jogada da Grécia veio após uma jornada recheada de declarações duras, de pressões de ambos os lados, de muita encenação: no final, a Grécia e a zona do euro sabiam que Atenas precisava do dinheiro; a única alternativa era romper com a Europa e entrar em um cenário de ruptura muito perigoso. A Grécia cede – resta saber quanto – e a partir de agora a Europa também está obrigada a ceder, a fazer concessões políticas e financeiras a um país que perdeu um quarto de seu PIB no último quinquênio e cujo resgate não impediu a disparada da dívida pública, o desemprego e a denúncia de uma situação de “emergência social” no país por parte do Governo. A Europa permitirá que Tsipras rebaixe o nível da austeridade. Aliviará o peso da dívida. Permitirá um pouco de gasto social para os problemas mais urgentes. E, dependendo do que a Alemanha decidir, deixará um respiro político para Tsipras, com o final – teórico – da troika. E, após uma negociação extenuante que muito provavelmente deixará uma sensação agridoce na Grécia, em apenas algumas semanas uma negociação ainda mais dura começará: a do terceiro resgate.
A Grécia e o Eurogrupo estão bem próximos de um compromisso na essência do programa interino, o acordo-ponte, o pacto da dívida ou como a ampliação do resgate acabar se chamando. Na falta dessa negociação de viés quase filológico, mas de enorme calado político, vários membros do euro enfatizaram, na terça-feira, a delicada situação da liquidez da Grécia. A recuperação volatizou-se. A fuga de depósitos aumenta. E Atenas admite que as finanças públicas se ressentem. Esse cenário pesou na decisão do Governo, mas a briga não acabou. Atenas ameaça com eleições antecipadas se o Eurogrupo recusar sua oferta nas próximas horas. A zona do euro mostrou um nível de dureza que não torna possível grandes concessões, em especial por uma liderança alemã que quer evitar surpresas no flanco político, e com aliados como a Espanha e Portugal, que temiam um contágio se o Syriza saísse fortalecido dessa batalha. Resta ver um último ato: a profundidade da oferta grega e os verdadeiros desejos de chegar a um acordo esta semana para garantir seis meses de tranquilidade, agora que a recuperação europeia começa a assentar e o BCE irá criar um programa de compra de bônus em grande escala que pode fazer diferença a respeito do último quinquênio de crise e outras misérias.
Guerra de documentos
A Grécia assegurou na terça-feira que estava disposta a concordar com um rascunho de conclusões elaborado pela Comissão Europeia. Esse texto não foi discutido no Eurogrupo, cujo presidente, Jeroen Djisselbloem, colocou sobre a mesa um segundo documento: Atenas recusou assiná-lo, ainda que circule até mesmo um terceiro texto. As diferenças são mais semânticas que de outra índole, o que faz pensar que o acordo não está longe.
- O Eurogrupo insiste em uma ampliação do programa. Advoga por “fazer o melhor uso da flexibilidade” se a ampliação acontecer, mas sempre “dentro do programa atual”, como etapa intermediária para um novo resgate. O texto que o Governo da Grécia estava disposto a aprovar aposta em um “programa intermediário” de até seis meses.
- O rascunho do Eurogrupo insiste que a Grécia deverá assegurar-se em conseguir superávits fiscais primários (antes do pagamento dos juros) “adequados”. O texto preferido por Atenas acrescenta que serão levadas em consideração as circunstâncias econômicas variáveis.
- O texto preparado pela Comissão enfatiza o impacto social do resgate diante da insistência da Grécia sobre uma crise humanitária. O Eurogrupo é mais ambíguo e refere-se à “melhora da justiça social”.
- O documento refere-se vagamente às reformas, a luta contra a corrupção e a fraude fiscal. O Eurogrupo pede esforços em política fiscal, privatizações e reforma trabalhista, do sistema financeiro e das aposentadorias.
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