27.02.2015
AFONSO CAMÕES
A crise económica fraturou a sociedade e desfigurou a pirâmide social, ao romper a utopia de que todos éramos classe média. As estatísticas já nos tinham confirmado, em janeiro, que o risco de pobreza continua a aumentar, atingindo os dois milhões de portugueses. Desta vez, o retrato negativo vem da Comissão Europeia. Bruxelas diz que os cortes impostos pelo Governo de Lisboa nas prestações sociais tiveram um impacto desproporcionado sobre os já muito pobres, que o sistema de proteção é inadequado e não tem sido capaz de lidar com a subida do desemprego.
Ora, sabendo nós que a proximidade de eleições levanta sempre mais poeira do que uma manada em transumância, é crucial que os partidos se comprometam com o tema que mais interessa a portugueses e europeus: como voltar a criar riqueza e emprego.
Da esquerda à direita, as alternâncias entre PS e PSD sempre foram mais ou menos conflituais e desabridas, mas nunca esteve em causa o regime saído da revolução e da normalização democrática.
Acontece que, por toda a Europa, os anos de austeridade estão a implodir o centro, onde outrora se ganhavam as batalhas eleitorais, e a pulverizar os partidos do "arco do poder", incapazes de responder à desilusão.
Como se a crise não bastasse, os frequentes episódios de corrupção no sistema põem em evidência a promiscuidade entre a política e o dinheiro e romperam o vínculo de confiança com a cidadania. Isto, enquanto a fobia da insegurança está a fazer renascer os nacionalismos radicais.
A erupção de novos partidos desperta novas fantasias, mas agora à custa do colapso ou do esvaziamento dos partidos do centro, em especial os que se reclamam da social-democracia. Vejam-se os sinais que vêm da Grécia, de Espanha, de França......
Por cá, onde os ventos de mudança chegam quase sempre mais tarde, é tempo de os partidos do "arco da governação" se confrontarem com os seus destinos. São, como todos nós, livres para fazerem as suas escolhas, mas serão prisioneiros das consequências.
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