Angola Governada por Angolanos a Partir de 31 de Janeiro
Era este o título da primeira página do jornal a
Província de Angola, em 16 de Fevereiro de 1975, com as fotografia de Costa
Gomes, Jonas Savimbi, Agostinho Neto e Holden Roberto.
"Foi num ambiente de confiança mútua e de franca
cordialidade, que decorreu, esta noite, no Hotel da Penina, a cerimónia de
encerramento da conferência geral sobre Angola. Presidiu ao acto o Presidente da
República Portuguesa, general Costa Gomes, que se encontrava ladeado, à direita
pelos elementos da Delegação portuguesa e do FNLA, e à esquerda, pelos
representantes das Delegações do MPLA e da UNITA. Em lugar especial sentavam-se
o primeiro-ministro do Governo Provisório português, brigadeiro Vasco Gonçalves,
o ministro sem pasta, major Vítor Alves e o alto comissário de Angola, almirante
Rosa Coutinho.
Presidente Costa Gomes
(foto DN 1/8/2005)
Presentes à cerimónia, igualmente, todos os elementos
das Delegações de Libertação de angolanos, bem com o da Delegação portuguesa, e
os conselheiros do Alto Comissário de Angola, que se deslocaram a Lisboa. Também
assistiram à cerimónia todos os elementos dos órgãos de informação portugueses,
angolanos e estrangeiros, que desde o primeiro dia acompanharam a Cimeira do
Algarve.
Usou em primeiro lugar a palavra, o ministro Melo
Antunes, que leu o texto do Acordo, o qual foi depois assinado pelos presidentes
das três Delegações emancipalistas angolanas e pelos elementos da Delegação
portuguesa.(...)".
Rosa Coutinho ("almirante vermelho") falando aos jornalistas.
(foto Prov. Angola 16/01/1975)
O POVO ANGOLANO SENTE NA ALMA O BÁLSAMO DA
ESPERANÇA
Palavras do Presidente Costa Gomes
Palavras do Presidente Costa Gomes
"Senhores presidentes: As vossas assinaturas selaram
com Portugal um acordo de transcendente importância nos destinos dos povos de
Angola. Ficou assim encerrado um capítulo que forças retrógradas prolongaram
injustamente. Trabalhámos nesta reunião cimeira com uma geração de atraso nas
correntes da História. Compete-nos agora ser generosos quanto ao passado,
diligentes quanto ao futuro e presente e esclarecidos ao futuro.(...).
Senhores presidentes: O povo angolano, todos os homens
bons que em Angola desejam viver e trabalhar em clima de justiça social,
penosamente saturados por uma guerra sem grandeza, sentem na alma o bálsamo de
esperança. O seu desejo de paz e tranquilidade é tão forte que, estou certo,
todos darão o melhor do seu esforço e colaboração para que os seus sofrimentos e
esperanças não sejam vãos na história da grande pátria que vai
nascer.
Vós, angolanos, governantes e governados, sereis
capazes de dirigir e aplicar as potencialidades do território ao ritmo
trepidante de quem tem a construir um dos mais florescentes países do continente
africano. Repousará nas vossas mãos, homens de Angola, tudo quanto o destino vos
reservou para criardes uma pátria materialmente grande e rica, espiritualmente
fraterna e justa".
AGOSTINHO NETO AO POVO
ANGOLANO
Saibamos Reforçar e Consolidar as Conquistas Obtidas
Saibamos Reforçar e Consolidar as Conquistas Obtidas
"Agostinho Neto, presidente do Movimento Popular de
Libertação de Angola, dirigiu a seguinte mensagem ao povo angolano: "Povo
angolano, companheiros de luta, camaradas e simpatizantes do MPLA angolanos:
Falo-vos no momento de particular transcendência do processo já longo da luta de
libertação do nosso povo e do nosso país. Não interessa relembrar agora os
inúmeros sacrifícios, os incalculáveis sofrimentos por que passou o nosso povo,
pois o sangue derramado pelos nossos heróis, os sacrifícios consentidos pelo
nossos mártires, as humilhações dos vivos e dos mortos, constituem já,
historicamente, a argamassa indestrutível que construiu os alicerces da nossa
libertação. O que importa neste momento é que a grande e portentosa nação que já
se vai erguer, sobre as bases conquistadas, saiba trilhar o mesmo caminho de
dignidade e justiça e de humanidade que sempre caracterizaram a acção do
Movimento Popular de Libertação de Angola. (...).
Compatriotas camaradas: agora que os trabalhos da
cimeira estão concluídos, agora que o Mundo inteiro nos olha com a consideração
e o respeito que a nossa luta de libertação constituíram, saibamos reforçar e
consolidar as conquistas obtidas. Um só povo, uma só nação, defendendo
intransigentemente, sem subterfúgios ou ambiguidades a democracia e o direito
sagrado de podermos entrar no seio da comunidade mundial com as credenciais
conseguidas ao longo de 18 anos de luta. FNLA, UNITA e MPLA unidos, pretos,
mestiços e brancos unidos são a garantia para construirmos uma pátria
independente para o povo angolano. A vitória é certa".
HODEN ROBERTO
Acabou o Colonialismo que Oprimiu Angola
Acabou o Colonialismo que Oprimiu Angola
"Boa noite, angolanos. Como é do vosso conhecimento, a
cimeira de Alvor acaba de terminar. Foi à beira do Oceano Atlântico, nesta
distante província portuguesa do Algarve, que há cinco séculos as caravanas
portuguesas receberam ordem de partida para as distantes terra de África. Foi
desta terra que partiu Diogo Cão, desses conquistadores, desses colonizadores
para atracar no nosso país. Pois, meus irmãos, é com regozijo que vos anuncio
que nessa mesma terra onde nasceu o colonialismo, o colonialismo que oprimiu
Angola, acabou.
É o fim de uma época e a primeira de outra, e neste
momento solene em que os corações de todos os angolanos batem à uma, os meus
pensamentos estão dirigidos para vós. Ao mesmo tempo peço para celebrarem comigo
esta vitória que o nosso povo depois de catorze anos de luta sangrenta e
implacável acaba de alcançar, mas tendo em conta que essa vitória é alcançada
com sangue, com lágrimas e com o suor dos filhos mais queridos de Angola. E este
momento que celebramos esta vitória é nosso dever dirigir o nosso pensamento
para aqueles que se sacrificaram para que este dia tão glorioso nos anais da
história do nosso povo se torne uma realidade. 11 de Novembro de 1975 Angola
será independente para toda a eternidade. Regozijai-vos, cantai e dançai porque
a liberdade pela qual tanto sofremos, se torne uma realidade. Daqui a pouco
assumireis novas responsabilidades e não sereis homens sem pátria, meios
cidadãos. Pois sereis, doravante, verdadeiros cidadãos.(...)."
Jonas Sabimvi não falou. Passados que são 30 anos se
analisarmos bem estes discursos veremos que são eivados de pura hipocrisia.
Nenhum dos partidos conhecia a realidade angolana de 1974 porque os seus
dirigente estavam no estrangeiro. O MPLA até então, não tinha lutado no terreno
nem praticamente a UNITA. Estes discursos foram uma autêntica humilhação aos
portugueses permitida pelo então presidente da República Costa Gomes que
presidiu à conferência. De Vasco Gonçalves e de Rosa Coutinho podia esperar-se
tudo porque já tinham planos para a entrega incondicional de Angola aos
comunistas do MPLA.
Ninguém ali teve a coragem de dizer ao assassino Holden
Roberto que ele foi o principal responsável pelos horrendos crimes no Norte de
Angola em 1961 como anteriormente aqui foram descritos e ilustrados com
fotografias nunca antes vistas na Net.
Costa Gomes, Almeida Santos e Mário Soares foram os
principais responsáveis pela tragédia consequente da descolonização com milhares
de mortos numa guerra fraticida e destruição quase total de um país, porque
conheciam perfeitamente a situação. Angola, como já referimos antes, tinha todas
as condições para ser uma nação independente para todos sem excepção mas a
oportunidade certa não foi aproveitada por Marcello Caetano. Agora já era tarde
demais com os comunistas no poder. Mal sabiam a FNLA e a UNITA o que os
esperaria mais tarde. A guerra civil em Angola foi protagonizada pelo MPLA com o
beneplácito dos Judas portugueses Vasco Gonçalves e Rosa Coutinho e
auxiliares, com o apoio incondicional do PCP.
Acordo de Alvor (foto Net)
ACORDOS DO ALVOR: UM FRACASSO
ANUNCIADO
"A 15 de Janeiro de 1975, no Hotel da Penina, sob a
chuva miudinha que caía no Algarve, representantes dos três movimentos de
libertação assinavam no Alvor os acordos para a independência de Angola. Mas, do
que foi assinado no Alvor, aos três só interessava a independência, o que
significava, para cada um, e sozinho, o exercício do Poder. O que ainda hoje se
revela impossível.
Na Guiné e em Moçambique, Portugal tinha sabido
exactamente com quem iria negociar os acertos para a independência: do outro
lado da mesa iriam estar só o PAIGC e a FRELIMO. Mas a existência de três
movimentos de libertação no caso de Angola tornava impossível qualquer tentativa
de uma rápida solução negociada. Foram necessários meses de cuidadosas
negociações. Primeiro, a Organização de Unidade Africana reconheceu a UNITA como
parte tão legítima como o MPLA ou a FNLA. Depois, em Mombaça, no Quénia, os
líderes dos três movimentos prepararam o terreno para as negociações com os
representantes de Portugal.
Finalmente, no Alvor, os três concertaram com o Governo
português um acordo sobre a fórmula pela qual Angola se tornaria independente.
No Alvor, os três movimentos foram reconhecidos como únicos e legítimos
representantes do povo angolano, e Angola como país indivisível, incluindo o
enclave de Cabinda. Seria estabelecido um governo de transição, baseado numa
fórmula de coligação. Um alto-comissário seria nomeado por Portugal, sob ordens
directas do presidente da República, Costa Gomes, e o Governo de transição seria
constituído por 12 ministros, três portugueses e os restantes nove distribuídos
igualmente pelos movimentos de libertação.
Um conselho presidencial, constituído por um
representante de cada movimento, presidiria ao Governo, rotativamente, até à
data marcada para a independência, 11 de Novembro.
O Governo devia tomar posse até ao fim de Janeiro,
marcar eleições no prazo de nove meses, e deveria ser constituído um exército
unificado. Na altura da independência, essas forças militares unificadas
deveriam ter 48 mil homens - 24 mil efectivos portugueses e oito mil de cada um
dos movimentos. Os militares portugueses em excesso seriam evacuados até 30 de
Abril, e todas as tropas portuguesas deveriam deixar Angola até Fevereiro de
76.
Os interesses dos portugueses residentes eram
assegurados, e os movimentos comprometiam-se a considerar angolanos todos os que
tivessem nascido em Angola, ou os que ali vivessem e se declarassem angolanos
por opção. Contudo, a concessão de cidadania aos não nascidos em Angola era
remetida para o que fosse estabelecido na futura Constituição.
Assinaram por baixo, por Portugal, o ministro sem pasta major Melo Antunes, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Mário Soares, o ministro da Coordenação Interterritorial, Almeida Santos, e, por Angola, os líderes do MPLA, da FNLA e da UNITA".
http://jn2.sapo.pt/secdiv/especial/angola4.htm
Assinaram por baixo, por Portugal, o ministro sem pasta major Melo Antunes, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Mário Soares, o ministro da Coordenação Interterritorial, Almeida Santos, e, por Angola, os líderes do MPLA, da FNLA e da UNITA".
http://jn2.sapo.pt/secdiv/especial/angola4.htm
Traição ao Acordo do
Alvor
"A ida de tropas cubanas para Angola antes de 11 de
Novembro, portanto antes da independência, pode ser considerada uma traição
ao Acordo. Até Melo Antunes aceitou essa traição ao concordar com a ida das
tropas cubanas para Angola. A tal ilusão, a tal cegueira em relação ao
«imperialismo sul-africano». Mas, de qualquer modo, considero que o Acordo de
Alvor foi um erro completo em face do que as superpotências haviam
acordado. Por isso Agostinho Neto me disse: «O Alvor é o
maior disparate histórico que se vai fazer sobre Angola». Estas palavras
mostram que ele já sabia tudo o que se iria passar.
Sabia o que estava assente nas altas esferas mundiais.
Sabia que Angola seria para o MPLA. Aliás, todas as personalidades angolanas - e
não angolanas - que posteriormente estiveram em Portugal, condenaram o Acordo de
Alvor. Todos afirmavam aquilo que os americanos já tinham percebido, isto é, que
não é possível governar um país africano a não ser com o sistema de partido
único. E diziam-me: «Vocês, portugueses, que conhecem a África como ninguém,
que têm em relação a África uma visão e uma vivência ímpares, estão a cometer um
erro político gravíssimo, que é querer inventar partidos políticos em África.
Se vocês, portugueses, têm em Angola e Moçambique
fortes movimentos nacionalistas, e um fortíssimo na Guiné, como não procuram
impedir que eles caiam no bolso dos comunistas?». Na realidade, devíamos ter
tentado aproximar-nos desses movimentos. Mas a ambição soviética foi mais forte
e com certeza mais hábil. E do nosso lado não houve um estadista com dimensão e
capacidade para resolver o problema. Anteriormente, os assassínios de Amílcar
Cabral e Eduardo Mondlane, decretados pela estratégia soviética,
dificultaram-nos essa possibilidade porque, com esses homens, teria sido
possível haver entendimento.
E com Agostinho Neto também, se tivéssemos sabido
dominar o assalto comunista. Agora temos de esperar que as experiências
marxistas ali em curso falhem e cedam o lugar a sociedades livres, com economias
que admitam a iniciativa privada, única forma de os portugueses poderem
regressar como irmãos e ajudar a construir os novos estados africanos.
O VI Governo e a descolonização
Quando assumi o cargo de Primeiro-Ministro, formando o
VI Governo em Setembro de 1975, a descolonização era assunto arrumado. Por isso
mesmo o general Vasco Gonçalves perdeu o apoio do PC por a este já não
interessar manter essa figura que -cumprida a «missão»- se tornava antipática e
perigosa aos olhos da população. Mas a descolonização ainda influiu nos
acontecimentos, em especial pela existência e acção do MDLP (Movimento
Democrático de Libertação de Portugal). Afastado do País depois do malogro do 11
de Março, bem como os seus mais próximos colaboradores, o general Spínola não
desistiu de lutar. E organizou esse «Movimento Democrático para a Libertação de
Portugal», procurando obter o apoio da CIA. Mas a CIA, conforme a decisão
assente superiormente, só teve interesse em desmobilizar o MDLP. Aos americanos,
a hipótese de confrontação violenta do movimento de Spínola com os comunistas
não interessava de forma alguma: não tinha objectivos estratégicos.
A CIA poderá ter ajudado os spinolistas a tentar um
golpe, mas se o fez foi com a certeza de que a KGB providenciaria o contra-golpe
- que sairia vitorioso pois o importante era que o V Governo efectuasse a
descolonização. E isso, sim, tinha objectivos estratégicos. O mais provável,
porém, é que a CIA não tenha sequer encorajado o MDLP a tentar qualquer golpe.
Mas esteve com certeza a entreter os spinolistas durante meses, a ganhar tempo.
Pediu-lhes um programa de intervenção armada em Portugal, que o MDLP orçamentou
em vários milhões de contos.
E a CIA levou imenso tempo a dar uma resposta, se é que
a chegou a dar. Entretanto, o MDLP interferia como podia na evolução política,
por intermédio dos elementos militares que simpatizavam com os objectivos de
Spínola. Na Assembleia de Tancos, por exemplo, a 5 de Setembro de 1975, o MDLP
actuou na sombra, como eminência parda. Actuação directa não teve. Mas noutras
oportunidades teve: a 9 de Novembro de 1975, por exemplo, promoveu uma
manifestação contra a independência de Angola, com o fim de agitar a opinião
pública e criar ambiente para a execução de um plano audacioso que consistia em
prender os Conselheiros da Revolução que queriam precipitar o reconhecimento do
Governo do MPLA em Angola. Esse plano abortou porque os Conselheiros, avisados a
tempo (há sempre agentes-duplos nestas acções... ) dispersaram : uns foram para
o Funchal, outros para o Norte .
Os USA recusam auxílio
De qualquer modo o reconhecimento do MPLA como governo
legítimo de Angola não se fez sem problemas. Pelo menos não foi imediato, como
seria natural, porque a isso me opus, como Primeiro-Ministro - o que alguns
estranharam porque no 25 de Abril manifestei simpatia pelo MPLA. A explicação é
simples: entendi que o Acordo de Alvor era para ser cumprido e que faltava a
necessária legitimidade democrática ao MPLA para governar Angola, obrigando
milhares de portugueses a fugir da terra onde tinham nascido.
Para impedir a entrega de Angola ao MPLA, pedi auxílio
aos Estados Unidos por intermédio das ligações que tinha com elementos do
Pentágono. Mas a resposta que obtive dos meus antigos companheiros dos cursos
militares que fiz na América e na Inglaterra, foi inteiramente desencorajadora.
Reconheciam que eu tinha razão mas nada havia a fazer : estava decidido que
Angola seria entregue ao MPLA e Moçambique à Frelimo. A política americana não
se faz com a clareza e a lógica que muitos supõem, até primeiros-ministros de
outros países.. Se a resposta do Pentágono tivesse sido outra, a minha intenção
era fazer cumprir integralmente o Acordo de Alvor e organizar rapidamente um
quarto movimento com os brancos e os africanos dos quadros de Angola. Esses
angolanos das duas etnias eram milhares, eram os mais fortes."
25 de Novembro sem Máscaras, Pinheiro de
Azevedo, Editorial Intervenção.
DN, 22 de Agosto de 2005. 1975 Verão Quente.
Agostinho Neto, Rosa Coutinho e Jonas Savimbi (foto DN 25/8/2005.
PORTUGAL SUSPENDEU ALVOR PARA JUNTAR MPLA E UNITA
Em pleno Verão Quente de 1975, Portugal suspendeu a aplicação
dos Acordos de Alvor em Angola, assumindo, assim, a sua impotência para travar a
escalada do conflito que opunha MPLA, FNLA e UNITA. E que levara já o movimento
de Agostinho Neto a expulsar de Luanda as restantes formações.
Estava-se a 22 de Agosto. Em Lisboa, Vasco Gonçalves vivia os
últimos dias como primeiro-ministro e Carlos Fabião (que chefiava o Estado-Maior
do Exército) tentava, com o apoio de Costa Gomes, formar um executivo que lhe
sucedesse, evitando o braço-de-ferro que já se anunciava entre a Esquerda
Militar e o Grupo dos Nove, tendo Otelo Saraiva de Carvalho pelo meio.
Excessivamente absorvido pelas suas próprias contradições,
Portugal ainda tentou, in extremis, impulsionar um acordo que juntasse
MPLA e UNITA, alargando a base de apoio de Agostinho Neto e enfraquecendo a
aliança que já se desenhava entre a FNLA, Zaire e África do Sul e que contava
com o beneplácito dos EUA.
Inicialmente, tal acordo ainda chegou a parecer possível, como
Melo Antunes [em O Sonhador Pragmático] e Pezarat Correia (em A
Descolonização de Angola) admitiram, retomando o projecto que Rosa Coutinho
tanto acalentara. Uma ilusão que duraria apenas alguns dias. O tempo suficiente
para que os EUA percebessem o que estava a ser a negociado, pondo termo às
veleidades de Jonas Savimbi, como John Stockwell, o operacional que Washington
destacara para Angola, revelou em Search of Enemies-A CIA Story.
"Savimbi causou um pequeno embaraço aos EUA, quando (...)
enviou elementos para sondarem o MPLA para uma solução negociada. A CIA soube
disso (...), e Savimbi foi, de imediato, interrogado por um elemento da
"estação" de Kinshasa. Não queríamos aliados que fossem "moles" na nossa guerra
contra o MPLA." Na tese de doutoramento que dedica aos anos do processo
revolucionário (A,RevoluçãoPortuguesa e a sua influência na transição
espanhola), o historiador catalão Josep Sánchez Cervelló avança com outra
explicação.
Segundo Cervelló, MPLA e UNITA chegaram a firmar um acordo
entre si, que seria depois posto em causa pelos apoiantes de Neto, que
consideraram excessivas algumas das concessões feitas a Savimbi.
Seja como for, o facto é que, nessa altura, Savimbi já era um
reincidente na matéria, tendo beneficiado da ajuda que as estruturas do MFA em
Angola lhe tinham dado durante o "consulado" de Rosa Coutinho. Sempre com a
ideia de o catapultar para uma dimensão que a UNITA não tinha no quadro da luta
de libertação, esperando que eles viessem a alinhar pelo diapasão de Neto, que
então deparava com a forte oposição da Revolta Activa e, em especial,
da Revolta de Leste, que reunia grande parte da força militar do MPLA. Recursos
que Daniel Chipenda ameaçava colocar à disposição de Holden Roberto e da FNLA,
deixando Neto totalmente dependente dos guerrilheiros da região dos Dembos,
que Nito Alves já mandara avançar para os musseques de Luanda.
Savimbi já tinha, contudo, ensaiado outras aproximações. Uma
delas, ocorrida ainda em 1974, só não teve maiores repercussões porque o líder
da UNTTA recuou no último momento, deixando de apoiar ó projecto que o general
António de Spínola e o líder zairense Mobutu tinham negociado na Iha do Sal,
visando barrar os caminhos do poder a Neto, contrapondo-lhe uma plataforma
alternativa liderada por Holden Roberto e pela FNLA.
RECUSAS. Quando Portugal suspendeu os Acordos de Alvor já o
general Silva Cardoso - que sucedera a RosaCoutínho em Janeiro de 1975 - tinha
deixado Luanda, criando um certo vazio de poder que se prolongaria por várias
semanas.
Este impasse só viria a ser desbloqueado no final de Agosto,
quando o Presidente da República conseguiu, finalmente, convencer o almirante
Leonel Cardoso - que integrava a equipa de Silva Cardoso e trabalhara já com
Rosa Coutinho - a aceitar uma incumbência que seis pessoas já tinham recusado:
levar o território até à independência (11 de Novembro), custasse o que
custasse.
Na origem da suspensão dos Acordos de Alvor, que fixavam os
termos e o calendário pelo qual tanto Portugal, como o MPLA, a FNLA e a UNITA
deviam reger-se durante o período de transição, estava o conflito armado entre
os três movimentos, que se espalhara a todo o território, tornando evidente toda
a desagregação do dispositivo militar português em Angola.
Numa altura em que Portugal assistia igualmente às sucessivas
contradições no seio do MFA, onde gonçalvistas (Esquerda Militar), moderados
(Grupo dos Nove) e revolucionários (Otelo) se combatiam entre si. Com o apoio e
a cumplicidade mais ou menos activa dos diferentes partidos políticos e o
crescente envolvimento de países como os EUA e a URSS, que em plena Guerra Fria
não tinham deixado de acompanhar com particular interesse tudo o que dizia
respeito ao processo de descolonizacão que Lisboa estava a efectuar.
Designadamente o de Angola, que tinha dado origem a uma das primeiras fracturas
do MFA, levando o general Spínola a renunciar ao cargo de Presidente da
República no final de Setembro de 1974, ao não conseguir impor a sua tese
federalista a quem tinha derrubado uma ditadura em nome da descolonizacão.
VIOLAÇÕES. Sinais contraditórios que Portugal reflectia, quando
as tropas sul-africanas já tinham entrado em Angola, e as forcas regulares do
Zaire, apoiadas pelos comandos do coronel Santos e Castro, assumiam o grosso das
colunas da FNLA.
Independência de Angola a 11/11/75.
O MPLA, que vencera a batalha de Luanda no início de Agosto,
expulsando os seus adversários, contava, por sua vez, com a ajuda que lhe fora
proporcionada pelos instrutores cubanos que tinham chegados a Angola com a
conivência de certos sectores do MFA. O que lhes permitiu garantir o controlo da
capital até à data da independência. Beneficiando sempre da "neutralidade
activa" de Portugal, um eufemismo para quem já não dispunha ali das forças
necessárias para fazer valer os seus pontos de vista e, muito menos, para impor
os compromissos alcançados na Cimeira do Algarve.
DESENLACE. Com uma parte substancial do jogo aberto em cima da
mesa, as forcas militares portuguesas que ainda se encontravam em Angola
aguardavam apenas pelo seu regresso, enquanto garantiam a segurança da ponte
aérea que transportaria os retornados. Algumas dessas forças, como os
páraquedistas que estavam sob o comando de Heitor Almendra, e que escapavam às
influências do processo revolucionário, acabariam por ser decisivas para o
desfecho do 25 de Novembro.
Mas, nessa altura, já Angola se tornara num Estado independente
e já Vasco Gonçalves tinha saído de cena com a queda do V Governo
Provisório.
Um Executivo que só viria a durar escassas cinco semanas,
levando Josep Sánchez Cervelló a contemplar a hipótese de esse Governo só ter
sido empossado - quando a sua fragilidade já era por demais evidente - para
garantir que Angola seria "entregue" ao MPLA e a Agostinho Neto, e não à FNLA e
a Holden Roberto, nem à UNITA e a JonasSavimbi.
1 comentário:
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