Dicas sobre quando fazer ataques à pessoa
Parecendo que não, mesmo a má retórica precisa de ser aprendida para ser bem empregue. Há método no erro. Por exemplo, um dos maiores problemas no debate público é a recusa de discutir assuntos, sobretudo os méritos dos assuntos, e a paixão pela discussão das pessoas. Trata-se duma falácia (na lógica) e tem o nome de “ad hominem”, isto é ataque à pessoa. É o principal instrumento de trabalho na política, sobretudo onde não há muita substância. No debate público é a bomba atómica dos que são intelectualmente limitados, mas não sabem que são ou simplesmente não têm a capacidade de saber que são. Este tipo de pessoa é tóxica porque envenena o debate obrigando as pessoas a perderem tempo com coisas irrelevantes. O ataque à pessoa não é completamente “proibido”, mas é preciso saber quando ele é útil ao debate. Eis algumas dicas:
1. Se um conhecido membro da Renamo, formado em estatística, disser que a contabilização dos resultados eleitorais é estatísticamente defeituosa, o que importa num primeiro momento é analisar a afirmação. Ela constitui um argumento em si e, por isso, tem o direito de ser julgada de acordo com os seus próprios méritos. O facto de a pessoa que disse isso ser da Renamo (partido afectado pelos resultados eleitorais) é num primeiro momento irrelevante;
2. Essa pessoa colocou o seu domínio de estatística sob teste. É isso que deve ser reflectido e discutido. O único que podemos fazer é pedir para que ele explique em que medida os resultados são defeituosos do ponto de vista estatístico. Recordar que ele é da Renamo, que tem algum interesse em transmitir essa ideia, etc. é completamente irrelevante;
3. Já não seria irrelevante se, por exemplo, soubéssemos que o seu trabalho como técnico de estatística é fraco. É de interesse, para a avaliação do que ele afirma, saber se ele tem a autoridade técnica para fazer afirmações fiáveis. Só que lá está, nem todos somos capazes de avaliar isso, pois temos especialidades diferentes, não conhecemos o trabalho das pessoas e, pior, nós próprios não temos nem especialidade, nem conhecemos o trabalho dos outros. Infelizmente, há muita gente no Facebook que sem nenhuma autoridade sobre o assunto em questão acha-se no direito de pôr em causa a competência de quem sabe;
4. Se o conhecido membro da Renamo formado em estatística disser que a contabilização dos resultados eleitorais é estatísticamente defeituosa porque foi feita por pessoas ligadas à Frelimo, ele próprio estaria a fazer um ataque à pessoa. O valor da sua afirmação sai do campo da estatística para o campo dos interesses. Efectivamente, o que ele estaria a dizer é que não é possível fazer a contagem de forma objectiva quando quem a faz é membro de algum partido. Não se responde a essa pessoa dizendo que ele está a dizer isso porque é da Renamo. Responde-se-lhe interpelando a própria ideia de que objectividade não é possível nessas circunstâncias;
5. Se o conhecido membro da Renamo formado em estatística disser seja o que for num português mal falado, ele continua imune à crítica com base no seu mau português. O que conta é se o que ele disse sobre estatística faz sentido ou não. Infelizmente, há entre nós pessoas que acham que podem julgar a inteligência ou competência de alguém na base do seu domínio do português ou do inglês. Existe uma geração de académicos e técnicos que fez os seus estudos superiores fora do país, noutras línguas;
6. Dizer coisas como “fulano de tal fala mal inglês ou português”, “beltrano é burro”, “sincrano é intelectual guebuzista” não constitui falácia ad hominem. É insulto gratuito e reles. Deixa de ser insulto gratuito e reles para ser ataque à pessoa (ad hominem) quando isso é dito como razão para alguma conclusão qualquer. Por exemplo, se alguém disser que fulano de tal é intelectual guebuzista, por isso não é verdade o que ele diz sobre a importância de não deixar que Chang seja extraditado para os EUA, essa pessoa estará a cometer a falácia ad hominem. Ele trouxe um argumento irrelevante para a discussão. Vai ser necessário avaliar os méritos da questão que se colocou se ela for passível de análise objectiva;
7. Se alguém sugere no seu mural a discussão do tema “[A] opinião é o mais baixo escalão do conhecimento” e um dos intervenientes escreve “[D]eve ser por isso que não atribuo valor algum às opiniões do Elísio Macamo. Lol” e cinco imbecis curtem isso, essa pessoa não está a fazer um ataque ad hominem. Revela má educação e sentido de humor grosseiro. Deixaria de ser isso se acrescentasse a essa afirmação alguns exemplos de opiniões emitidas por Elísio Macamo que estão aquém de seja qual for o critério fixado para determinar os diferentes níveis de conhecimento e mostrar, claro, que as opiniões em causa não satisfazem os critérios;
8. Se alguém no calor da abordagem dum assunto qualquer diz coisas que possam ser entendidas como insultos (por exemplo, fazer uma generalização a partir duma experiência individual em que a má conduta dum ou dois moçambicanos é vista como a má conduta de todos os moçambicanos), constitui ad hominem recordar a essa pessoa que é estrangeira, branca, tuga e que se não se sente bem no nosso país pode ir embora. É completamente irrelevante, em princípio, para o assunto que ela apresentou. Infelizmente, muito do que passa por discussão entre nós situa-se a este nível. Muitas pessoas exaltam-se por ninharias, gastam energia com o supérfluo e sentem-se intelectualmente superiores por corrigir o óbvio;
9. Constitui ad hominem pôr em causa a qualidade de algum debate simplesmente porque os assuntos que você acha importantes não foram considerados da maneira como você acha que eles deviam ser abordados. Tenho visto muito disso. Alguém assiste um debate qualquer na televisão e põe em causa a idoneidade de quem nele participa por não estar a falar dos assuntos como gostaria que fossem tratados. Acontece também achar que certos assuntos não deviam ser tratados por certas pessoas ou em certos foruns. É tudo completamente irrelevante para a avaliação dos méritos da discussão;
10. É também ad hominem rejeitar uma crítica porque quem a formula está sempre a criticar certa instituição. Digo isto de experiência própria. Porque tenho sido crítico em relação a certas organizações da sociedade civil há gente que parte do princípio de que constitui refutação da minha crítica dizer que estou sempre em cima dessa organização. Não é. O que precisa de ser avaliado é a minha crítica, se tem mérito ou não.
2. Essa pessoa colocou o seu domínio de estatística sob teste. É isso que deve ser reflectido e discutido. O único que podemos fazer é pedir para que ele explique em que medida os resultados são defeituosos do ponto de vista estatístico. Recordar que ele é da Renamo, que tem algum interesse em transmitir essa ideia, etc. é completamente irrelevante;
3. Já não seria irrelevante se, por exemplo, soubéssemos que o seu trabalho como técnico de estatística é fraco. É de interesse, para a avaliação do que ele afirma, saber se ele tem a autoridade técnica para fazer afirmações fiáveis. Só que lá está, nem todos somos capazes de avaliar isso, pois temos especialidades diferentes, não conhecemos o trabalho das pessoas e, pior, nós próprios não temos nem especialidade, nem conhecemos o trabalho dos outros. Infelizmente, há muita gente no Facebook que sem nenhuma autoridade sobre o assunto em questão acha-se no direito de pôr em causa a competência de quem sabe;
4. Se o conhecido membro da Renamo formado em estatística disser que a contabilização dos resultados eleitorais é estatísticamente defeituosa porque foi feita por pessoas ligadas à Frelimo, ele próprio estaria a fazer um ataque à pessoa. O valor da sua afirmação sai do campo da estatística para o campo dos interesses. Efectivamente, o que ele estaria a dizer é que não é possível fazer a contagem de forma objectiva quando quem a faz é membro de algum partido. Não se responde a essa pessoa dizendo que ele está a dizer isso porque é da Renamo. Responde-se-lhe interpelando a própria ideia de que objectividade não é possível nessas circunstâncias;
5. Se o conhecido membro da Renamo formado em estatística disser seja o que for num português mal falado, ele continua imune à crítica com base no seu mau português. O que conta é se o que ele disse sobre estatística faz sentido ou não. Infelizmente, há entre nós pessoas que acham que podem julgar a inteligência ou competência de alguém na base do seu domínio do português ou do inglês. Existe uma geração de académicos e técnicos que fez os seus estudos superiores fora do país, noutras línguas;
6. Dizer coisas como “fulano de tal fala mal inglês ou português”, “beltrano é burro”, “sincrano é intelectual guebuzista” não constitui falácia ad hominem. É insulto gratuito e reles. Deixa de ser insulto gratuito e reles para ser ataque à pessoa (ad hominem) quando isso é dito como razão para alguma conclusão qualquer. Por exemplo, se alguém disser que fulano de tal é intelectual guebuzista, por isso não é verdade o que ele diz sobre a importância de não deixar que Chang seja extraditado para os EUA, essa pessoa estará a cometer a falácia ad hominem. Ele trouxe um argumento irrelevante para a discussão. Vai ser necessário avaliar os méritos da questão que se colocou se ela for passível de análise objectiva;
7. Se alguém sugere no seu mural a discussão do tema “[A] opinião é o mais baixo escalão do conhecimento” e um dos intervenientes escreve “[D]eve ser por isso que não atribuo valor algum às opiniões do Elísio Macamo. Lol” e cinco imbecis curtem isso, essa pessoa não está a fazer um ataque ad hominem. Revela má educação e sentido de humor grosseiro. Deixaria de ser isso se acrescentasse a essa afirmação alguns exemplos de opiniões emitidas por Elísio Macamo que estão aquém de seja qual for o critério fixado para determinar os diferentes níveis de conhecimento e mostrar, claro, que as opiniões em causa não satisfazem os critérios;
8. Se alguém no calor da abordagem dum assunto qualquer diz coisas que possam ser entendidas como insultos (por exemplo, fazer uma generalização a partir duma experiência individual em que a má conduta dum ou dois moçambicanos é vista como a má conduta de todos os moçambicanos), constitui ad hominem recordar a essa pessoa que é estrangeira, branca, tuga e que se não se sente bem no nosso país pode ir embora. É completamente irrelevante, em princípio, para o assunto que ela apresentou. Infelizmente, muito do que passa por discussão entre nós situa-se a este nível. Muitas pessoas exaltam-se por ninharias, gastam energia com o supérfluo e sentem-se intelectualmente superiores por corrigir o óbvio;
9. Constitui ad hominem pôr em causa a qualidade de algum debate simplesmente porque os assuntos que você acha importantes não foram considerados da maneira como você acha que eles deviam ser abordados. Tenho visto muito disso. Alguém assiste um debate qualquer na televisão e põe em causa a idoneidade de quem nele participa por não estar a falar dos assuntos como gostaria que fossem tratados. Acontece também achar que certos assuntos não deviam ser tratados por certas pessoas ou em certos foruns. É tudo completamente irrelevante para a avaliação dos méritos da discussão;
10. É também ad hominem rejeitar uma crítica porque quem a formula está sempre a criticar certa instituição. Digo isto de experiência própria. Porque tenho sido crítico em relação a certas organizações da sociedade civil há gente que parte do princípio de que constitui refutação da minha crítica dizer que estou sempre em cima dessa organização. Não é. O que precisa de ser avaliado é a minha crítica, se tem mérito ou não.
O ataque à pessoa marca, infelizmente, forte presença na nossa esfera pública. O problema não é simplesmente o facto de isso impedir a discussão dos méritos das questões, o que em si é bem grave. O problema é que polariza o ambiente desnecessariamente. Há gente que desenvolve ódios reais contra pessoas que não conhece e cujas ideias nunca avaliou objectivamente. O perigo com a polarização é que as pessoas nunca vão saber o que os seus adversários pensam, pois o que estes dizem ou é filtrado por pessoas que pensam como elas ou entao os seus próprios preconceitos fazem essa filtragem. De novo, falo por experiência própria. Tenho regularmente lido coisas escritas por pessoas que não têm acesso aos meus textos, não interagem comigo de nenhuma forma sistemática, não conhecem o meu trabalho académico, não conhecem os meus princípios políticos, etc., mas distilam um ódio visceral totalmente descabido. Aplaudem textos que me criticam sem se darem à maçada de verificar se a versão do que eu disse e que eles recebem é correcta ou não.
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