Pela integridade (1)
O Jaime Langa expôs-me recentemente ao confessar-se adepto da forma como ele acha que abordo o assunto da corrupção. Vaidoso que sou, fiquei contente. Houve depois, e continua, uma discussão no seu mural que me obriga, mais uma vez, a dizer o que eu penso sobre o assunto e como acho que ele devia ser abordado. Vou fazer isso numa mini-série de textos que quero apresentar como estratégia alternativa ao que se faz – ou pensa-se em fazer – no País.
Porque nessa discussão alguém colocou em causa a minha idoneidade para falar sobre o assunto dado que sou fã confesso daquele que é considerado o maior lesa-pátria que temos, gostaria de esclarecer duas coisas. A primeira é que sempre fui contra a maneira como esse “lesa-pátria” queria combater a corrupção e isso tudo está documentado em vários textos no jornal Notícias assim como aqui no Facebook. A segunda é que o texto em que me declarei “fã” dele foi acompanhado de dois outros em que manifestei a minha admiração pelos líderes da oposição, portanto, da Renamo e do MDM. A terceira é que em todos esses textos destaquei aspectos do perfil político dessas pessoas que é independente de possíveis defeitos de carácter.
Neste primeiro texto quero destacar uma questão retórica. Acho infeliz que neste assunto da corrupção enfatizemos mais o negativo. Falar sempre da corrupção parece-me contraproducente, pois um País não se define pelo que é negativo, mas sim pelo que é positivo. O CIP contém no seu nome aquilo que devia ser destacado: a integridade pública. É sobre isto que devemos falar. A questão não é como combater a corrupção, mas sim como promover e proteger a integridade pública.
Tenho em mim que a discussão seria outra. Iríamos sair do falso moralismo, da caça às bruxas e da indignação barata que caracterizam a actual discussão. O desafio é definir a integridade pública duma maneira que nos permita identificar áreas de intervenção política. A questão da intervenção política é importante, pois a promoção da integridade tem que ter como objectivo consolidar e preservar a política. Um País morre quando a política é substituída pela técnica. Uma boa parte do discurso anti-corrupção constitui-se como uma máquina anti-política, o que não surpreende, pois ele faz parte da lógica da indústria do desenvolvimento.
Podemos definir a integridade pública ao longo de três dimensões: ética, política e instrumental. A dimensão ética confunde-se com o que nos define como País. Quando se fala de integridade pública quer se dizer, essencialmente, que somos um País em que como cidadãos assumimos responsabilidade pelo bem-estar comum. Cada um de nós é responsável pela sua felicidade, claro, mas a responsabilidade colectiva reside na preocupação do Estado em promover a justiça social. Neste sentido, a integridade pública é uma questão ética, pois reflecte o compromisso do Estado com o bem colectivo. Servir é responder a este compromisso.
A dimensão política traduz a concepção que aquele que dirige (ou pretende dirigir) o Estado tem de como viabilizar esse compromisso. É neste ponto onde muita coisa se estraga entre nós. Não existe, dum modo geral, uma ideia clara de que fazer política consiste justamente nisto e que, por isso, definir um problema e propor a sua solução é essencialmente operacionalizar o compromisso. A Frelimo gloriosa tinha uma ideia clara disso. Depois dela foi Guebuza que também teve uma ideia clara disso. Chissano, talvez pela preocupação com a paz, nunca tornou clara a sua ideia de como queria responder ao compromisso. Na oposição não existe absolutamente ideia disto. É a miséria total.
A dimensão instrumental diz respeito ao tipo de instituições que precisam de ser criadas para que sejamos o País que queremos ser. Isso inclui também o perfil das pessoas que vão trabalhar nessas instituições, os meios ao seu dispôr e a relação que devem ter com as pessoas a quem servem. No nosso País temos a tendência de perverter o serviço público colocando o Estado acima dos cidadãos.
Se você não tem ideia destas três dimensões ou nunca pensou nelas (ou em aspectos relacionados) dificilmente vai ser um interlocutor válido na discussão sobre a corrupção. E mais. Uma estratégia anti-corrupção que não se pronuncie claramente sobre estas três dimensões não vale o papel em que está imprimido. Uma discussão que não se debruce sobre estas coisas é, em minha opinião, completamente inútil.
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