20.03.2019 às 15h09
Ministro da Educação anunciou esta quarta-feira a demissão da docente, que foi considerada culpada pela fuga de informação no exame nacional de Português, em junho de 2017. Decisão tem efeitos imediatos. Edviges Ferreira fica impedida de dar aulas nas escolas do Estado pelo menos durante três anos
A antiga presidente da Associação de Professores de Português, Edviges Ferreira, foi considerada culpada pela fuga de informação que divulgou parte do conteúdo do exame nacional do 12º ano da disciplina, em 2017, tendo sido esta quarta-feira demitida pelo Ministério da Educação, na sequência do processo disciplinar que lhe tinha sido instaurado.
"O ministro da Educação determinou a aplicação da sanção disciplinar de demissão à docente que, em violação do dever de confidencialidade a que estava vinculada, deu a conhecer informação relativa a conteúdos do exame de Português 639, realizado em 19 de junho de 2017", refere em comunicado o Ministério da Educação, sem nunca referir o nome da professora.
"Todas as infrações constantes dos artigos da acusação foram consideradas provadas, concluindo-se que a docente terá agido de forma consciente e intencional, desrespeitando gravemente os seus deveres funcionais e o interesse público", frisa o Ministério, adiantando que a professora já foi notificada da decisão.
De acordo com a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, esta sanção disciplinar implica "a perda de todos os direitos do trabalhador, salvo quanto à reforma por velhice ou à aposentação". Edviges Ferreira ficará, assim, impedida de dar aulas no sistema de ensino público pelo menos durante três anos, período após o qual pode pedir a "reabilitação", um processo longo e complexo que não garante que volte a ter emprego nas escolas do Estado. A antiga presidente da Associação de Professores de Português não está, no entanto, proibida de dar aulas no ensino privado.
Segundo o Ministério da Educação, esta demissão tem efeitos imediatos, o que significa que Edviges Ferreira já não voltará à Secundária Rainha Dona Leonor, em Lisboa, onde lecionava há vários anos. O Expresso tentou contactar a docente, mas não obteve resposta.
Edviges Ferreira, que durante anos representou os professores de Português, enfrentava um processo disciplinar instaurado em 2017 pela Inspeção-Geral de Educação e Ciência (IGEC) por suspeita da autoria da fuga de informação.
Foi na qualidade de representante dos professores de Português que naquele ano Edviges Ferreira foi chamada pelo Instituto de Avaliação Educativa (IAVE), que elabora os exames nacionais, a participar na auditoria da prova, tendo tido acesso ao conteúdo do que ia sair.
Todos os que participam na elaboração e auditoria dos exames ficam sujeitos ao dever de reserva e confidencialidade e são obrigados a assinar uma declaração sob compromisso de honra em como não dão explicações, nem são familiares de nenhum aluno que vai fazer a prova.
Apesar disso, Edviges Ferreira dava explicações a vários estudantes, nomeadamente do ensino privado, tendo acabado por partilhar com estes parte do que ia sair na prova, uma das mais importantes para o acesso ao ensino superior.
Dias antes do exame de Português, realizado a 19 de junho de 2017, circulou no WhatsApp uma gravação feita por uma aluna que não se identificava e que revelava o conteúdo do teste. Segundo a estudante, a informação partia da "presidente de um sindicato de professores" que tinha tido acesso ao exame.
"Ó malta, falei com uma amiga minha cuja explicadora é presidente do sindicato de professores, uma comuna, e diz que ela precisa mesmo, mesmo, mesmo só de estudar Alberto Caeiro e contos e poesia do século XX. Ela sabe todos os anos o que sai e este ano inclusive. Pediu para ela treinar também uma composição sobre a importância da memória e outra sobre a importância dos vizinhos no combate à solidão", dizia a gravação.
No exame da 1ª fase acabou por sair, de facto, um poema de Alberto Caeiro e um excerto de Vergílio Ferreira, não havendo questões sobre nenhum outro autor. Mais estranho foi o facto de o tema da composição que os estudantes foram chamados a fazer no exame ter sido precisamente a memória.
Vários estudantes terão ouvido a gravação e tido, assim, acesso prévio ao que ia sair, comprometendo o princípio da igualdade no acesso ao ensino superior. No entanto, o Ministério da Educação considerou na altura que não era possível apurar se tinha havido ou não "benefício mensurável", tendo remetido a "aplicação de eventuais medidas" para depois da conclusão do processo disciplinar, que agora chegou ao fim.
Paralelamente ao inquérito conduzido pela Inspeção-Geral de Educação, foi aberta uma investigação a cargo do Ministério Público, tendo Edviges Ferreira sido já formalmente acusada, em maio de 2018, pelos crimes de violação de segredo por funcionário e abuso de poder.
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