Empresário derrotou o tucano João Leite, o que fragiliza posição do senador para concorrer à presidência pelo PSDB
Belo Horizonte
Com um forte discurso anti-político, o empresário e ex-presidente do Atlético Mineiro Alexandre Kalil (PHS), de 57 anos, foi eleito prefeito de Belo Horizonte, neste domingo, no segundo turno das eleições. Kalil conquistou 52,98% dos votos e derrotou o deputado estadual e ex-goleiro atleticano João Leite (PSDB) que teve 47,02%. “Vamos governar para todos e essa cidade vai ser melhor (...) estou muito satisfeito e orgulhoso porque as noites que eu chorei no meu quarto valeram a pena", afirmou o candidato eleito em seu discurso de vitória, que foi interrompido diversas vezes pelo barulho de fogos de artifício. “A partir de janeiro essa cidade será humanizada”, afirmou o prefeito eleito.
Desde o início da campanha à prefeitura de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, do inexpressivo partido PHS, que fez aliança com o PV e a REDE, adotou o discurso e a postura do antipolítico, à semelhança de João Doria que emplacou a imagem de gestor em São Paulo para vencer em primeiro turno. “Chega de político, é hora de Kalil”, foi o slogan adotado por ele, que repetiu exaustivamente que era contra a chamada “velha política”.
A estratégia de comunicação acertada conseguiu ‘esconder’ sua militância partidária pregressa. Ele começou na política justamente no PSDB, em 2001, e foi um dos apoiadores do Governo de Aécio Neves. Em 2010 também fez campanha para o sucessor do tucano, Antonio Anastasia. Em 2012, o empresário também endossou a campanha do atual prefeito Márcio Lacerda (PSB).
Sua vitória representa uma derrota dolorida não só para seu adversário tucano, mas para o padrinho político de João Leite, o senador mineiro Aécio Neves, que tinha planos de voltar a se candidatar a presidente em 2018 pelo partido. A vitória de Leite na capital mineira era prioritária para que Aécio mantivesse a influência no seu partido, uma vez que o seu principal oponente na disputa da candidatura presidencial, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), saiu bastante fortalecido com a eleição do tucano João Doria na capital paulista.
Trata-se de mais um desgaste para sua imagem, que vinha colecionando uma sucessão de fracassos no seu próprio reduto eleitoral. Nas eleições de 2014, o candidato do tucano ao Governo de Minas, Pimenta da Veiga, foi derrotado pelo petista Fernando Pimentel e sua adversária na disputa à presidência, Dilma Rousseff, conquistou mais votos em Minas, embora Aécio tenha conseguido vencer em Belo Horizonte.
O fato do senador tucano não ter aparecido muito na campanha de João Leite também já dava sinais da baixa popularidade de Aécio e da avaliação do próprio partido de que ele não somaria votos, segundo o cientista político Carlos Ranulfo, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “O Aécio está muito desgastado, foi alvo de delações na Lava Jato, é um político frágil. Na contabilidade interna do PSDB para 2018 isso obviamente tem peso e o coloca em ampla desvantagem contra Alckmin”, explica.
Ranulfo ressalta ainda que, no próprio processo de impeachement contra a presidenta Dilma, o senador tucano não foi uma figura de destaque. “Essa derrota aqui em Belo Horizonte é apenas mais um round para essa situação ruim e complicada para o Aécio”, completa. O cientista político acredita que o senador tem chance de recuperar sua influência política em Minas Gerais caso lance a candidatura do seu afilhado político Antonio Anastasia, que foi o relator do processo de impeachment no Senado - para o Governo do Estado em 2018.
Futebol e construção civil
Empresário da construção civil, famosos pela falta de “papas na língua” e colecionador de frases polêmicas, Alexandre Kalil nasceu em Belo Horizonte e disputou a prefeitura da capital pela primeira vez neste ano. Em 2014, já tinha se candidatado deputado federal pelo PHS, mas desistiu no meio do pleito. Fez fama como presidente do Clube Atlético Mineiro, entre 2011 e 2014 e estava à frente do clube na inédita conquista da Copa Libertadores, em 2013. Na época, fez um dos seus comentários mais polêmicos e afirmou que a taça da Libertadores era muito melhor que mulher, “até porque ela acorda calada. E mulher nunca acorda calada”.
No início deste ano, o novo prefeito de Belo Horizonte também causou mal-estar entre católicos e evangélicos ao afirmar que achava igreja um saco e preferia “bar e uísque”. “Não me chamam para igreja, não, porque é um saco ir para a igreja rezar. O pastor fala: ‘Vem cá, minha igreja é espetacular’. E ainda vai me tomar 10%”, disse em entrevista ao canal Fox.
Desde sua passagem pelo Atlético, ele se tornou tão conhecido na capital mineira, amado e odiado por muitos, que nem os vinte poucos segundos que dispunha no horário eleitoral no primeiro turno o impediram de passar pelo filtro do eleitor, e chegar ao segundo turno. A campanha na reta final foi marcada por ataques e ofensas mútuas dos dois concorrentes e também pela falta de debate de propostas.
Assim como o empresário, o tucano João Leite também se tornou famoso por causa do Atlético Mineiro. Ele foi goleiro do clube por 12 anos. Após encerrar o contrato com o Galo em 1993, tomou posse como vereador em Belo Horizonte. Formado em História, ele é deputado estadual há seis mandatos consecutivos pelo PSDB. Esta foi a terceira vez que concorreu ao cargo de prefeito. Ele já tinha perdido os pleitos de 2000 e 2004.
Tímido e de fala mais lenta, João Leite que liderou de forma discreta a disputa eleitoral no primeiro turno, adotou uma nova postura, mais agressiva, quando as pesquisas de intenção de votos para a segunda parte do pleito começaram a apontar Kalil como favorito.
O tucano começou a intensificar os ataques ao cartola enfatizando as pendências jurídicas de Kalil, como sua multa de 100.000 reais de IPTU, e a exibir comerciais nos quais ex-funcionários falavam sobre processos trabalhistas que eles estavam movendo contra empresa de Kalil, a empreiteira Erkal Engenharia, que teve falência decretada em setembro. O tucano também tentou relacionar seu adversário ao PT, citando seu vice, Paulo Lamac (Rede), ex-petista. Nada adiantou.
Ao tentar se defender de um dos ataques em um debate televisivo, Kalil acabou se enrolando na resposta. "Eu devo o seu Geraldo [ex-funcionário], sim, mas essa mão aqui é limpa. Falou que eu roubo... Eu roubo, mas não peço propina em Furnas", disse Kalil, em referência à chamada "Lista de Furnas", que apontaria as propinas pagas a uma série de políticos do PSDB. A frase polêmica acabou viralizando e fez com que Kalil divulgasse um vídeo no qual tentava se justificar, dizendo que a ideia era afirmar "eu devo, mas eu não recebo propina". Mesmo assim, o episódio não afetou o crescimento de Kalil na disputa.
Ao longo da campanha, o empresário detectou que Aécio Neves era o calcanhar de Aquiles do seu adversário, e lembrou ao todo instante que o senador era citado por delatores da Lava Jato.
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