quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Nyusi: humildade e simplicidade

A N Á L I S E - 
Quinta, 31 Dezembro 2015
HÁ uma tese que reza que se queres saber o verdadeiro carácter de uma certa pessoa, dá-lhe o poder. De facto, há uma de duas consequências que podem ocorrer quando se outorga poder a alguém: ou mantém-se imutavelmente boa pessoa, ou torna-se de um dia para outro um arrogante e de trato difícil, mesmo para com os seus velhos amigos.
Depois de ter conhecido a humildade e simplicidade de Filipe Nyusi, mais quando cobria a recta final da sua campanha eleitoral, ano passado, antes, portanto, de ser eleito Presidente da Republica, a 15 de Outubro de 2014, noto, com crescente satisfação, que o poder que detém há 11 meses, não o fez descambar na arrogância nem na mania de sabe-tudo que, regra geral, se apossa da maioria dos que ascendem ao poder, seja ele político, económico, religioso ou de qualquer outra natureza.
Sem querer cair na bajulação, Nyusi está a revelar-se, por isso mesmo, um grande homem, porque se mantém a mesma pessoa de antes do poder. Ainda não perdeu “o seu coração de criança” que, no dizer da sapiência milenar humana, é o que engradece e faz dos homens, grandes homens, e que só muito poucos conseguem mantê-la quando chegam à idade adulta. Mesmo os que o conheceram bem nos tempos da sua juventude e de idade adulta, têm-me asseverado que Nyusi sofre de facto, pela pobreza dos outros, incluindo a que ainda esmaga a maioria de nós, seus compatriotas. Asseguram que quando diz que quer lutar contra a pobreza, não está a dizer isso só de boca para fora, como é comum entre os políticos que muitas vezes só cantam o que não os vai na alma, para que os pobres os encarem como seus salvadores, e assim possam se manter no poder.
Há quem diz que Nyusi é prova evidente da tese do grande escritor suíço, Stefan Zweig, que reza que, regra geral, todo o homem que cresce no meio de grandes dificuldades e sofrimento, torna-se num grande homem e defensor dos outros sôfregos. O indulto que acaba de conceder este mês de Dezembro, a mil compatriotas nossos que estavam nas cadeias é para mim uma das provas de que encarna, ele próprio, o sofrimento dos outros. O mesmo se pode ver na sua ida, nas vésperas desta quadra festiva, ao Mercado Grossista do Zimpeto, em Maputo, para, a partir de lá, instar todos os vendedores do país a não elevarem gananciosamente os preços dos produtos, para que possam ser acessíveis a todos ou pelo menos à maioria dos menos abastados.
Para os de grandes posses que não passam fome, ou que nunca experimentaram na vida o quão dói a fome e a pobreza, podem ver nestas idas de Nyusi aos mercados como prova de que não sabe o que deve fazer como Chefe do Estado. Mas longe disso, são para mim a revelação de que este Presidente da República sabe, ele próprio, o que é ir à cama sem ter comido o suficiente ou mesmo nada. Há que se ter em conta que mais de 60 por cento dos cerca de 24 milhões de moçambicanos não comem o suficiente e há muitos de entre estes que chegam a passar um ou mais dias sem comer nada. Há muitos que passarão a transição do ano sem ter o que comer. Por isso, é muito importante e louvável que Nyusi dedique parte da sua agenda a assegurar que esta maioria de moçambicanos coma algo. Não é por acaso que o então presidente brasileiro, Lula da Silva, dedicou grande parte da sua acção governativa a lutar contra a fome e hoje é tido como tendo sido um bom presidente pela maioria dos brasileiros. Se Nyusi conseguir acabar com a fome, terá feito uma grande obra aos seus compatriotas, tão importante quanto a dos que nos libertaram do colonialismo que já nos negava o direito à própria alimentação, o que era de “per si”, o mesmo que nos negar a própria vida, porque quem não come, morre.
Nyusi sabe quão é duro e trágico não comer nada ou ser pobre, porque ele próprio passou por isso na sua vida. Não é um dos que imagina o que é fome e pobreza. Do pouco que sei da trajectória da vida de Nyusi, convence-me que não ouviu falar da pobreza – ele próprio sofreu da pobreza, e uma das provas disso é ter feito os seus TPCs iluminando-se de xiphefu, que neste caso é um candeeiro improvisado, ou às vezes mesmo debaixo duma iluminação pública quando fazia o seu ensino médio na cidade da Beira. Ele próprio não se cansa de recordar que esses é que foram de facto tempos difíceis, quando se refere a esse capítulo porque passou juntamente com outros colegas de então, como o actual Ministro dos Transportes e Comunicações, Carlos Mesquita.
Apesar de que 11 meses é bastante pouco tempo para avaliarmos este homem que o destino o catapultou à posição de terceiro estadista moçambicano depois de Samora MachelJoaquim Chissano e Armando Emílio Guebuza, há consenso que ele continua tão humilde, simples e amigo dos seus amigos, e que ferve de querer ver erradicada de vez a pobreza que ainda afecta a maioria dos seus compatriotas. Uma das provas de que está mais do que nunca predisposto a ajudar os seus compatriotas a lutar contra a fome e pobreza é ter já começado a criar condições materiais para que os camponeses moçambicanos possam fazer uma produção com meios mais adequados em relação aos que até aqui usavam. Refiro-me aos parques de máquinas que por ordem de Nyusi estão sendo implantados em todo o país que tem um potencial agrícola.
Creio ser esta uma fervorosa prova da sua vontade de querer ver a fome e pobreza que grassam nas zonas rurais moçambicanas eliminada. Creio que são estes problemas que o entristecem e que o levaram a dar ao seu primeiro Informe à Nação, um desfecho atípico de que estava orgulhoso pelo que se fez nestes 11 meses, mas que ao mesmo tempo não está ainda satisfeito. Para mim, foi um desfecho feliz e coerente com a realidade, não obstante possa dar a ideia de contradição, como já ouvi certas pessoas assim alegarem. Isto é, que não se pode estar orgulhoso de algo que não nos satisfaz. É possível sim senhor estar-se orgulhoso do que se fez ou está-se fazendo ainda, mas ao mesmo tempo não estar satisfeito ou totalmente satisfeito.
Para que o caro leitor entenda como é possível estar-se orgulho de algo que se fez ou que se está a fazer, e não estar mesmo assim satisfeito, posso dar o exemplo do tempo em que a Frelimo estava a lutar contra o colonialismo português. De facto, à medida que a luta avançava, e se ia somando mais zonas libertadas, tais feitos enchiam de orgulho os combatentes, mas ao mesmo tempo não podiam eles estar plenamente satisfeitos, porque ainda não tinham alcançado o objectivo final - que era a libertação do país e do povo do colonialismo português. Ora, tudo o que se fez ao longo destes 11 meses em que Nyusi está a liderar, visa, em última instância, a libertação dos moçambicanos da pobreza em que quase todos ainda vivem. Assim faz sentido que apesar dos avanços que se conseguiram nestes 11 meses, e mesmo ao longo dos 40 anos da nossa independência, não o pode deixar satisfeito, enquanto a maioria dos seus compatriotas padecerem da pobreza.
Creio que não há nenhuma contradição neste seu desfecho. Tudo o que alguém faz de heróico, pode causar-lhe orgulho mesmo que tenha alguns ganhos ou fracasse, porque ao menos logrou tentar fazer, se bem que não foi bem-sucedido ou totalmente bem-sucedido. Quando evocamos as memórias dos nossos compatriotas que heroicamente morreram a lutar pela nossa independência, como o Dr. Eduardo Chivambo Mondlane e muitos outros, o fazemos porque eles nos orgulham pelo que fizeram de bom, mas acima de tudo porque são a prova viva de que não somos um povo cobarde mas heróico, não obstante não tenham logrado em vida vencer os nossos inimigos.
Uma das evidências mais importantes deste coração de criança de Nyusi é o seu empenho abnegado na busca da paz definitiva para nosso país. Pouco depois de assumir o leme do país, Nyusi tudo fez para se reunir com o líder da Renamo, e fê-lo durante dois dias consecutivos. Infelizmente, apesar da sua boa vontade em chegar a um desfecho com Dhlakama, este tem-se revelado não predisposto ao diálogo. Infelizmente ainda, apesar desta predisposição de Nyusi em se reunir com Dhlakama para acabarem de vez com o espectro de crise política aparente, há os que tudo fazem para apresentar a ideia de que quem não esta a colaborar é mesmo Presidente Nyusi. É lamentável que haja este mau julgamento de Nyusi, mas não me surpreende que seja acusado do que não é culpado. Já antes se fez a muitos inocentes, entre os quais destaco Nelson Mandela que foi mantido na cadeia durante 27 longos anos. Ele foi a prova de que neste mundo há santos na cadeia e criminosos nas igrejas. Mas o certo é que Nyusi merece mais para ser a nossa “Figura do Ano” e não Dhlakama como já o elegeram alguns meios de comunicação social.

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