Monday, November 2, 2015

Em Moçambique temos aparatos políticos e não partidos políticos”

O académico e filósofo moçambicano, Severino Ngoenha, disse esta segunda-feira, em Maputo, que em Moçambique “não existem partidos políticos, mas aparatos políticos”, pelo facto de os seus membros serem movidos de interesses pessoais e não pelos ideais do grupo e muito menos pelas preocupações da sociedade. Ngoenha, que falava na abertura da VI Semana da Comunicação, uma espécie de jornadas científicas, organizada pela Escola Superior de Jornalismo, que decorreu nesta segunda-feira, sob o lema “Comunicação e Formação como bases para a Paz, Democracia e Desenvolvimento em Moçambique”, afirmou que o país deve apostar seriamente na democracia, mas para tal deve repensar no modelo eleitoral, embora não tenha avançado o seu. “Constatei nas últimas eleições (gerais de 2014) que, em Moçambique, não temos partidos políticos, mas aparatos políticos. Os partidos políticos são um conjunto de indivíduos que partilham os mesmos princípios de ser e de estar na sociedade, que comungam dos mesmos ideais, assim como opiniões. Mas, em Moçambique verifica-se que os militantes dos nossos partidos políticos não partilham as mesmas ideias ou preocupações da comunidade. Eles entram nos partidos políticos para benefícios pessoais. Ajudam o partido a ganhar, por forma a “A primeira constante sociológica está relacionada aos candidatos à presidência da República. Em todas as eleições temos dois candidatos à presidência da República (Afonso Dhlakama e um candidato da Frelimo). Segundo, é que a cada pleito temos tido contestação dos resultados, alegando-se fraude eleitoral”, esclarece. Urge comunicar o país Estando numa escola de comunicação (a ESJ ministra cursos de Jornalismo; Relações Públicas; Publicidade e Marketing; e Biblioteconomia e Documentação), o reitor da UDM falou aos presentes da necessidade de se comunicar o país, pois esta é a única arma de termos um povo formado e preparado para os desafios da vida. Ngoenha conta que é com preocupação que, quando vê a televisão, ouve telespectadores a ligarem de diversos pontos do país, pois este facto traz a ideia de estarmos “num país coberto pela comunicação, enquanto não”. “Quando vejo a televisão é normal ouvir telespectadores a dizer que falo de Pemba ou Lichinga, mas se olharmos as estatísticas dizem que 20% da população é que tem acesso à televisão, que 70% não tem acesso à energia. Ou seja, a comunicação cobre o Moçambique geográfico e não humano, pois não chega a toda a popula- ção”, defende, acrescentado: “A maior parte dos jornais estão em português, língua que não está entre as mais faladas do país (Macua ou Changana). É preciso fazer chegar a informação ao cidadão na sua língua. Outro factor é que os mesmos jornais são vendidos da Julius Nyerere à Estátua de Eduardo Mondlane. Ou seja, é uma parcela da cidade que tem acesso a estes meios de comunica- ção”, sublinhou. Outro aspecto que deixa Severino Ngoenha preocupado é o facto de observar uma comunicação social movida por questões políticas e não ético-profissionais. Segundo este, as últimas eleições provaram esse facto: “tivemos dois pólos de debate. Os ‘macuacuinhas (o famigerado G40)’ e os ‘anti-macuacuinhas’, em que cada um defende uma ala. Para os ‘macuacuinhas’ todas as acções do governo estão correctas. Para os ‘anti-macuacuinhas’ é o contrário. Estes nunca vêem nada de positivo nas acções do Executivo”, disse. Recorrendo ao pensamento do fi- lósofo e sociólogo alemão, Jürgen Habermas, Severino Ngoenha afirma que “o grande perigo da comunicação é a sua ideologiza- ção”, pois “formata espíritos e não as forma, tornando as opiniões em verdades”. Portanto, “é preciso que trabalhem no sentido de buscar a letia (verdade) e não viver da doxa (opiniões)”, alertou aos aspirantes à área de jornalismo. Referir que, além de Severino Ngoenha, passaram da VI Semana da Comunicação, o historiador Egídio Vaz, os jornalistas Armando Nenane e Arsénio Manhice. Severino Ngoenha volta à carga: alcançar os seus objectivos. Isto é Aparatocracia”, desparrou. Dirigindo-se à uma plateia constituída por docentes e estudantes daquela instituição do ensino superior, o reitor da Universidade Técnica de Moçambique (UDM) criticou a política orçamental de- finida para os pleitos eleitorais e, particularmente, para a campanha eleitoral, a propósito dos 70 milhões de meticais disponibilizados pela Comissão Nacional de Elei- ções (CNE), no ano passado, para financiar a campanha eleitoral. Segundo Ngoenha, o custo das eleições é “maior que o custo de vida dos cidadãos”. “Durante as eleições, o país foi pintado por cores partidárias. Em 45 dias, gastamos o que é consumido por cinco províncias mais pobres do país, durante dois anos”, constata. Devido a este aspecto, Ngoenha explica que urge repensarmos no modelo eleitoral, pois o actual é oneroso, porém não avança o seu. Outra preocupação manifestada pelo académico prende-se com o facto de em cada pleito eleitoral verificar-se os mesmos problemas, ao que chama de “constantes sociológicas”.

No comments: