“Apresentar isto a diplomatas como prova de acusação de golpe de Estado nem chega a ser ridículo”, disse Francisco Louçã.
Por REDE ANGOLA.
Quatro dos quinze presos políticos[ FB ]
Francisco Louçã, professor catedrático de Economia e ex-líder do partido português Bloco de Esquerda, esteve recentemente em Luanda para dar uma aula numa universidade e revelou ao Expresso que um diplomata lhe confessou que, a convite do governo angolano, viu um vídeo que será usado como prova contra os 15 activistas detidos desde Junho.
“Ele e os colegas sentiram vergonha do que viram, porque havia apenas um grupo de jovens a discutir como se organizava uma manifestação”, disse o ex-político. As imagens foram vistas por um grupo de diplomatas a convite do próprio governo. Louçã disse que “apresentar isto a diplomatas como prova de acusação de golpe de Estado nem chega a ser ridículo. Dá pena um governante pensar que convence alguém com uma coisa destas que nem tem sustentabilidade jurídica.”
Louçã acrescentou ainda que tem várias criticas a tecer ao governo português e a Rui Machete, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, mas prefere “não centrar aí a discussão”, não só porque apreciou a visita do embaixador João da Câmara a Luaty, mas porque “todas as atitudes que contribuem para melhorar esta situação são importantes”, disse.
O pedido de Mónica Almeida, a esposa de Luaty
“Amor, prefiro-te marido, pai e amigo a ter-te como mártir.” Começa assim a carta de Mónica Almeida dedicada ao marido, Luaty Beirão, publicada no jornal Expresso, este sábado.
A esposa do activista que hoje completa 35 dias em greve de fome, apela publicamente a Luaty que cesse o seu protesto. Quer que sejam os dois a influenciar a educação da filha porque sozinha não se sente capaz de incutir na pequena Luena a determinação, sensatez e humildade características do marido.
“Sempre te admirei enquanto pessoa, pela tua determinação, pela tua sensatez e humildade, pela tua força e pela fé nas coisas em que acreditas. Mesmo antes de te lançares para o “canhão” da luta de derrube das injustiças que vivemos no nosso país admirava-te! (…) Quero-te presente e bem vivo para que possas transmitir esses valores bem vincados à nossa pequena Luena, o nosso raio de sol, o nosso sweet life, porque sinto-me incapaz de os passar sozinha, porque não os tenho tão vincados”, escreveu Mónica Almeida.
A jovem sublinha que admira a forma como o marido sempre foi fiel às suas convicções. “Mesmo antes de te lançares para o “canhão” da luta de derrube das injustiças que vivemos no nosso país admirava-te!”
Ponto de não retorno
No 32.º dia sem se alimentar, o médico que acompanha Luaty avisou que o activista estava a entrar num ponto de não retorno. As consequências da longa privação de alimentos podem ser irreversíveis.
Sexta-feira, o representante Especial das Nações Nações Unidas sobre a Situação dos Defensores dos Direitos Humanos, Michel Forst, pediu ao governo angolano que descarte todas as acusações contra os activistas detidos desde 20 de Junho e os ponha imediatamente em liberdade.
“A privação de liberdade tendo como único fundamento o facto de terem promovido a boa governação e exercido os direitos de liberdade de expressão e reunião pacífica pode ser considerado como arbitrário”, advertiu Forst no comunicado enviado ao Rede Angola.
José Sócrates compara o seu caso com o dos activistas
Na sua primeira aparição num evento público, depois de ter sido libertado, o ex-primeiro ministro português, José Sócrates, comparou o seu caso ao dos activistas em Angola.
“Têm certamente reparado numa campanha pública em Portugal que me é muito simpática e à qual aderi imediatamente. Trata-se da campanha para defender um cidadão luso-angolano que está preso há quatro meses em Angola com acusação e à espera de julgamento”, disse, para acrescentar: “As autoridades angolanas parece que respondem a esta campanha da mesma forma que as autoridades portuguesas”, citou o Expresso. O político acrescentou ainda que “o Estado português não tem autoridade moral para reivindicar a libertação de ninguém sem acusação porque mantém cidadãos presos há mais de onze meses sem acusação.”
Alcides Sakala diz que o regime “continua insensível”
“Intolerância política” é como classifica a UNITA a posição do governo neste caso que tem mobilizado a comunidade internacional.
“Após 40 anos de independência, continua-se a trair os grandes ideais dos três movimentos que lutaram por essa grande conquista”, acusa Alcides Sakala, porta-voz do partido da oposição.
Em trânsito em Lisboa, após representar a UNITA no Congresso do Partido Popular Europeu (PPE), que decorreu em Madrid a 21 e 22 deste mês, Sakala defendeu que a “ditadura” do regime de Eduardo dos Santos “continua insensível”, numa altura em que se aproxima o “fim do ciclo” de poder do MPLA, com as eleições de 2017.
“É uma direção insensível, que viola os direitos humanos”, afirmou o também secretário para as Relações Internacionais da UNITA, garantindo que o partido está a preparar-se para as eleições gerais e que tudo fará para que a transição em Angola vá “ao encontro da democracia participativa”, disse.
Rafael Marques sublinha importância da sociedade portuguesa no caso
O activista de direitos humanos Rafael Marques sublinhou ontem a importância da sociedade portuguesa na denúncia do caso dos 15 activistas presos e sugeriu que o regime angolano esperava silenciar a população através do investimento na comunicação social nacional.
“Aqui em Portugal compraram os meios de comunicação social, os meios políticos, e esperavam que a sociedade se mantivesse silenciosa”, afirmou Rafael Marques, considerando que o governo angolano “não vai dialogar” e que os 15 activistas presos “vão ser condenados por coisas que não fizeram”.
“São cabeças duras”, afirmou, referindo-se ao governo que “não mudou a sua forma de pensar nos últimos 40 anos”, e que continua a prender pessoas “por causa de um título [do manifesto], sem se preocupar com o seu conteúdo”.
Rafael Marques, que na quarta-feira visitou os 14 presos e pediu ao rapper Luaty Beirão que termine a greve da fome, reafirmou que “não há razão para perder mais uma pessoa” quando “eles já conseguiram fazer o que nestes anos ninguém conseguiu: mobilizar a comunidade internacional”.
Durante o certame Folio, em Óbidos, Portugal, numa mesa de escritores, em que falou sobre os 40 anos da independência de Angola, Rafael Marques lembrou, no entanto, que este não é o único atropelo aos direitos humanos no país que tem “há 40 anos o mesmo partido no governo e há 36 anos o mesmo presidente”.
Lembrando a sua própria prisão ou a de um blogger “preso por tentar assistir a uma reunião da Assembleia Nacional”, o jornalista sublinhou que Angola “precisa de liberdade de expressão para que as pessoas possam discutir todas estas questões” e mudar o rumo do país que “seguiu o pior exemplo das leis portuguesas”.
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