Sectores radicais fora da órbita de Nyusi comandam as operações
A acção armada em Amatongas
(Manica) contra a
comitiva da Renamo, na
qual se fazia transformar
Afonso Dhlakama é, talvez, deste o
ataque de Chibata (Macossa), a 12
de Setembro, o mais sério recuo à
possibilidade das partes voltarem à
mesa do diálogo e/ou um encontro
entre o líder da oposição e o Presidente
da República, Filipe Nyusi.
Ao que o SAVANA apurou, outros
factos recentes mostram que há
desnorte, nervosismo nos sectores
mais radicais da Frelimo e até
um perigoso plano para assassinar
Afonso Dhlakama.
Mas outras fontes ligadas às forças
armadas moçambicanas afiançaram-nos
que o ataque de Amatongas,
tipificado como uma emboscada,
foi minuciosamente em
Maputo e visava apenas acabar com
as caravanas de Afonso Dhlakama,
decapitar a sua escolta, fragilizá-lo
politicamente e reduzir o ânimo
das suas forças “residuais”, na terminologia
governamental.
Segundo informações recolhidas
pelo SAVANA, parece líquido que
a operação não tinha por objectivo
assassinar Dhlakama, dada a forma
como foi executada, mas mostrar
que a sua aniquilação física é
possível sem grandes dificuldades.
Obrigá-lo a retaliar é outro dos
objectivos que se pretendia alcan-
çar, justificação que alguns sectores
fundamentalistas da Frelimo
procuram para uma “ofensiva final”
tipo Angola.
Ao que o jornal apurou, Afonso
Dhlakama preparava-se para se
deslocar a Maputo e tomar parte
das celebrações do 4 de Outubro,
dia dos Acordos de Roma, que colocaram
fim a 16 anos de guerra.
Contudo, essa pretensão não caiu
bem junto de alguns círculos do
poder, com o argumento de que
o líder da Renamo somaria politicamente
pontos tal como o fez
quando apareceu junto de Joaquim
Chissano nas comemorações dos
20 anos da Universidade Católica
na cidade da Beira.
Embaraços
No entanto, sectores mais moderados
do regime acolheram com algum
embaraço as acusações acerca
da pretensa operação para assassinar
Dhlakama, acção que consideram
que pode empurrar o país para
uma confrontação armada de desfecho
imprevisível. Teodato Hunguana,
uma voz sensível no interior
na Frelimo, citado esta semana pelo
Magazine Independente, confessa
a sua perplexidade pelo curso actual
dos acontecimentos.
Os analistas políticos que acompanham
a situação desde o ataque
de Macossa (12 de Setembro) e a
operação de Amatongas (25 de
Setembro) são unânimes em que
a actual tensão política poderia ser
ultrapassada por via de um diálogo
directo entre o líder da Renamo e o
PR, Filipe Nyusi.
Contudo, esta ideia é rejeitada por
uma ala radical da Frelimo, que
nos últimos tempos tem defendido
uma “Solução Savimbi”. Quem nos
últimos dias tem estado em força a
defender uma acção vigorosa contra
a Renamo, são os “intelectuais”
do chamado G40, um grupo de
comentaristas seleccionados a dedo
para estuprarem a verdade e reduzir
a cinzas todas as ideias não vindas
do sector mais conservador e belicista
no partido do poder.
A rádio estatal (RM), por exemplo,
esta semana, no programa “café da
manhã”, foi usada para manipular
os acontecimentos de Amatongas.
No referido programa foram igualmente
ventilados sentimentos de
ódio em relação ao maior partido
da oposição e há acusações de que a
Renamo está ao serviço de interesses
estrangeiros, que estão interessados
numa situação de instabilidade
para melhor saquear os recursos
do país.
A União Europeia (UE), que se
reuniu com a Renamo logo após os
acontecimentos de Amatongas, fez
circular um comunicado a apelar
à contenção mas foi alvo de duras
críticas por parte de elementos da
ala mais boçal dos G40. No dia do
ataque, Armando Guebuza, a partir
da Praça dos Heróis chamou “marginal”
a Dhlakama e o chefe da polícia
na Zambézia, agastado com a
população de Morrumbala (Zambézia)
por reagir mal ao reforço da
presença de forças de segurança na
região, acusou-os de conviver bem
com a “cobra”, uma referência pejorativa
contra as simpatias para com
a Renamo naquele distrito.
O diálogo é o caminho
indicado
Em comentários ao nosso jornal, o
director do Centro de Integridade
Pública (CIP), Adriano Nuvunga,
condenou com veemência os
ataques perpetrados contra comitiva
do líder da Renamo, Afonso
Dhlakama, considerando que numa
sociedade democraticamente organizada
não pode haver uso de armas
para silenciar o outro, mas sim,
deve prevalecer a troca de ideias.
Segundo Nuvunga, o diálogo é o
caminho indicado para se chegar ao
fim da tensão política pós eleitoral
que se vive no país “e custa acreditar
que corramos o risco de entrar em
mais um confronto armado”.
Disse que o futuro é imprevisível,
porque o líder da Renamo, Afonso
Dhlakama está uma vez mais em
parte incerta e armado, o que não
é bom para o crescimento do país,
que tanto necessita de produzir
para ganhar a estabilidade a vários
níveis.
No entanto, Nuvunga refere que o
discurso do Presidente da República,
Filipe Nyusi, sobre a manuten-
ção da paz, não sugere que tenha
sido ele a ordenar os ataques, e destacou
os dois encontros que manteve
com o líder da Renamo, logo
após a sua tomada de posse, como
sendo sinais de busca de paz.
No entender do académico, este
acto pode ter sido emanado por
sectores mais fundamentalistas do
partido no poder, que aproveitaram
a saída do PR para o exterior.
“Quando Samora Machel viajou
pela primeira vez para os Estados
Unidos de América (EUA) a fim
de se encontrar com Ronald Regan,
queimaram o paiol em Moçambique.
Agora Nyusi viajou para o
mesmo país e houve ataques à comitiva
da Dhlakama, “referiu.
Apesar desta situação, Nuvunga diz
ser preocupante o facto da Renamo
se manter armada duas décadas
após a assinatura dos Acordos de
Roma, mas avança que é preciso
olhar para isto como resultado do
difícil processo de reconciliação dos
moçambicanos.
Sectores da Renamo disseram ao
jornal que aquando do primeiro
ataque à comitiva de Dhlakama
“estava-se muito perto de um encontro
com Nyusi”, acrescentando
que o mesmo já tinha acontecido
quando um encontro tinha sido
agendado para Nhamatanda e foi
desmarcado à última hora. “Até
parece que os tiros são dirigidos a
Nyusi”, desabafou um analista polí-
tico que não quis ser citado.
Respeitar o desejo do povo
Quem também acredita que há
sectores influentes dentro da Frelimo,
que olham para eliminação
física de Afonso Dhlakama como a
via primordial para a resolução dos
problemas e não o diálogo, é Raul
Domingos, o antigo número dois
da Renamo e negociador-chefe
do maior partido da oposição em
Roma.
O actual presidente do Partido para
Paz Democracia e Desenvolvimento
(PDD) defende que a actual
situação entra em choque com o
discurso do presidente aquando da
tomada de posse, quando disse “em
alto e bom som que não iria permitir
que um moçambicano matasse
o outro”.
Com dois ataques em menos de 15
dias, Raul Domingos diz ser sufi-
ciente para concluir que o debate
sobre o desarmamento da Renamo
é falso.
Para Domingos, é preciso desarmar-se
também a Frelimo que está
a precipitar o país para um futuro
incerto.
“Estamos com 50% de probabilidade
de guerra e 50% de paz. Os
amantes da paz devem-se unir na
busca de soluções e deixar de lado
manifestações tendenciosas de culpar
uma parte e confortar outra,
que também tem seus pecados ”.
Raul Domingos diz que o país está
nesta situação, porque não se quer
respeitar o desejo do povo, que
tanto clama por ser governado por
quem elegeu.
A solução proposta por Domingos
para se evitar que o país resvale para
uma situação de derramamento de
sangue passa por aceitar a descentralização.
Explica que a democracia é o governo
do povo e as populações do
Centro e Norte votaram em alguém
que não os está a governar,
facto que gera descontentamento.
“A democracia não é um processo
acabado está sempre em reformas
pelo que é chegada a hora de mexer
no regime político vigente no país,
adequá-lo à realidade eleitoral, o
que significa respeitar a vontade do
povo nas urnas”.
“Podemos adiar o problema por um
ou dois anos, mas não será eternamente
e mais vale encarar a realidade
do que contorná-la”, recomenda
Raul Domingos. (Redacção)
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