Jaime Vitorino Azulay: ‘
A morte de uma criança às suas mãos na Ganda, em Benguela, não lhe saem da cabeça até hoje. E muito menos a de outro menino esventrado por uma rajada em 2002, na Baía Farta, que tinha quase a idade de um dos seus filhos. Essas são algumas das imagens que ainda permanecem na memória de Jaime Azulay, jornalista que se notabilizou na cobertura das guerras que este país viveu. Por isso, olha com alguma atenção política que se vive no país, incluindo a detenção dos jovens e greve de fome de Luaty Beirão. De fora não ficou a crise económica e o alerta para a existência de «empresários parasitas» que se incrustaram no próprio estado a pretexto da dita diversificação da economia.
Quem é, afinal, Jaime Azulay?
Chamo-me Jaime Vitorino Azulay, tenho 54 anos de idade, sou um cidadão angolano. Sou jornalista profissional, também jurista e advogado. Sobretudo um cidadão que sempre se preocupa com o seu país. E desde 1975, quando se integrou nas fileiras do MPLA, participou na segunda guerra de libertação nacional. Faz agora 40 anos que eu e outros camaradas estávamos a enfrentar a invasão sul-africana. Portanto, eu era um garoto. Acho que com toda essa trajectória de militância e de vivência, com uma disponibilidade total, não é de bom tom falarmos de nós, mas a falsa modéstia às vezes é uma forma de a vaidade se manifestar. Sempre me entreguei de corpo e alma e penso que nos momentos decisivos sempre procurei dar o meu melhor.
É muito conhecido pela sua faceta como jornalista, mas alguém que esteve sempre ligado à cobertura de actividades de guerra. Como é que isso se deu?
Eu pertenço àquele franja de jovens que quando chegou o 25 de Abril de 1974 já aspirava pelas conversas que tínhamos com os mais velhos. Por causa do sofrimento que nós tínhamos, uma vez que fui criado sem pai, tinha uma mãe que está aí neste fotografia, que era pai também, e teve uma vivência terrível no tempo colonial. A Câmara Municipal demoliu a nossa casa, prometeu outra, nunca deu e tivemos de construir a nossa casa de capim com as próprias mãos. Portanto, quando chegou o 25 de Abril nos engajamos logo, porque sentíamos este anseio de liberdade e de sermos donos da nossa própria terra. O meu presente antes de fazer os 15 anos foi uma arma de guerra.
Desde muito cedo estive engajado, porque já tinha o segundo ano do ciclo preparatório feito e falava francês razoavelmente bem. Algumas pessoas pensaram que podia ter utilidade e engajei-me na delegação do MPLA em Novo Redondo (actual Sumbe), naqueles movimentos estudantis, greves e revoltas contra aqueles resquícios do colonialismo. A primeira guerra entre os movimentos de libertação quando fracassaram os Acordos de Alvor, o recuo quando fomos para o Lôngua, em Porto Amboiom, onde fiquei ferido, fui a Luanda e regressei em 1976, onde voltamos a envolver-nos nas campanhas do café e de alfabetização. Portanto, tive toda esta vivência até retonar ao serviço militar activo, de onde sai em 1992. Com toda esta experiência que tive, através do Rui Vasco, ingressei no Jornal de Angola. Acho que estava numa posição privilegiada para poder reportar a guerra. E assim foi.
Como é que era o dia-a-dia de um repórter de guerra?
Tenho várias reflexões sobre isso.
Quem vê o seu blogue pensa que era um dos comandantes militares. O que se passava?
Primeiro é ter sempre uma premissa: não há reportagem alguma que valha a vida de um repórter. Há uma questão de preservação deste bem essencial que é a vida. Segundo, manter uma relação cordial com as pessoas que nos acolhem. Nós, conhecendo as causas profundas do nosso conflito armado, facilmente nos posicionávamos. No entanto, houve uma altura em que até fiz filmes para a RTP e reportagens para a Reuters, etc. em que se está a retratar toda essa miséria que as pessoas passavam e a dado passo cheguei à conclusão de que melhor que retratar o desenvolvimento cronológico da guerra, as acções passo a passo, era também dar a conhecer ao mundo o sofrimento do povo angolano.
Aquela massa de quase dois milhões de deslocados a andarem pelas matas, pessoas numa miséria indescritível. Tenho fotos de uma criança na Ganda que praticamente morreu nos meus braços por falta de assistência. Tudo isso ficou patente nestas reportagens. Penso que se alguém um dia procurar contar essa estória, esse drama humano, para já foi a imagem que ficou em mim até hoje. Mais do que os militares, os rebentamentos, bombardeamentos, conquistas ou derrotas, penso que esse drama humano me vai acompanhar pelo resto dos meus dias. Como um tributo ou uma responsabilidade é publicar o livro que sempre quis e que tenho escrito.
A morte da criança na Ganda foi o momento mais marcante que viveu ao longo da sua carreira como repórter de guerra?
Foi, porque o ser humano tem essa sensibilidade. Uma das coisas que sempre procurei é que essa brutalidade da guerra não afectasse de uma forma muito pronunciada a minha sensibilidade. Por isso, é que nós mesmo lá nas frentes tínhamos sempre aqueles momentos de lazer em que declamávamos poemas, tocávamos músicas e sempre foi possível manter estes valores humanos presentes. Porque a guerra tem essa vertente: para se criar a besta que faz guerra tem que se destruir o homem na sua fibra mais íntima. E acho que a guerra não conseguiu fazer isso comigo. Tive bons companheiros e amigos. Consegui encontrar neles aquele conforto humano que não me fizeram perder estes valores.
Nunca sentiu que narrava apenas parte da história da guerra angolana por estar do lado das Forças Armadas Angolanas?
Primeiro é que do ponto de vista material, físico, era impossível estar do outro lado. E há casos destes. O nosso conflito era uma guerra civil. Eu por acaso fui um dos primeiros jornalistas que em 1991 foi à Jamba e está aí a fotografia. Fomos com o actual presidente da Assembleia Nacional (Fernando da Piedade Dias dos Santos) na libertação dos prisioneiros. Mesmo a civil fui ameaçado de rapto. Portanto, eu conhecia bem o que era a UNITA naquele tempo. De forma alguma me seria permitido ir do outro lado fotografar.
A minha missão baseava-se no facto de estar deste lado e contar a estória que eu via. Quando a guerra atingiu a sua brutalidade máxima, o nosso anseio era de paz. E nós identificamos naquela altura que o factor guerra tinha um nome: que era o presidente da UNITA naquela altura, Dr. (Jonas) Savimbi. Portanto, seria impossível porque nós eramos rotulados. A própria VORGAN uma vez relatou que eu tinha sido morto num helicóptero abatido. Eu sempre soube que a UNITA distinguia o jornalista como sendo do MPLA.
Sentia-se um jornalista do MPLA?
Nunca. Houve uma altura em que nós trabalhamos para a Reuters. Fui correspondente do Jornal de Notícias de Portugal durante vários anos. Trabalhei para a Voz da América. Eu tinha que me portar como um profissional. Mas uma coisa é você chegar como nós chegamos em Balombo, primeiro em 1983, e depois em 1989, e encontrar 90 cadáveres civis espalhados pela cidade, pessoas a chorarem e a carregarem velhos e novos. Ficar indiferente a isso com medo de que te vão rotular que eras do MPLA, isso não! Alguns destes até são crimes contra a humanidade e pronto fez-se os acordos pelo bem paz, isso foi esquecido de certa forma. Foi relevado em função da preservação da paz neste país. Mas foi isso que nós encontramos.
Já conseguiu compreender a razão do conflito pós-eleitoral?
A nossa história contemporânea é uma história de conflitualidade quase permanente. Portanto, mais uma vez, todo o desenho que nós temos é de uma nova situação de conflito. Onde existem forças antagónicas existirá sempre conflito. Só que, por isso, existem regras que são as leis, onde os entes políticos, através dos programas de governação apresentam-se ao eleitorado e o povo vai sufragá-los nas urnas. Esse gene do conflito já vem da própria luta de libertação, em que, contrariamente ao que seria desejável numa luta contra o regime colonial, seria a unidade dos três movimentos.
Pelo contrário, guerreavam-se entre si. Isso fragilizou muito o efeito desta guerra de libertação e proporcionou vantagens ao próprio colonialismo português e perpetuar-se mais tempo aqui. Portanto, essa conflitualidade resultou de influências externas que são sempre muito presentes em todas etapas do conflito angolano. Isso revela-se outra vez aqui. Outras por situações internas, a ambição desmedida de alguns líderes políticos em quererem ser eles os detentores do poder, afastando os outros. Portanto, toda essa nossa história está repleta deste gene de conflitualidade que já vem desde os tempos da luta de libertação. Esses factores internos são sempre potenciados pela interferência externa e depois tem a ver também com a nossa realidade etnolinguística, aproveitando estas taras que o colonialismo também usou: o tribalismo e o racismo.
Pode explicar melhor?
São potenciais fragilidades que quando atiçadas resultam sempre em conflitualidade que pode causar retrocesso. Quando se assinou o Acordo de Bicesse, em Maio de 1991, em 1992 tivemos eleições, mas em 1992 rebenta a guerra. Aquela foi a oportunidade soberana que nós tivemos para nos guindarmos já para o concerto das Nações, com um horizonte de desenvolvimento e de progresso que hoje estaríamos num estágio totalmente diferente do que estamos hoje. Perdemos aquela oportunidade. Voltamos a tê-la em 1994 em Lusaka. Perdêmo-la.
Parece-me que essa conflitualidade é cíclica. Penso que nos dias de hoje o desafio dos angolanos conscientes é romper este ciclo. Estarmos todos numa nação que é de todos, alicerçada nos valores de democracia, de respeito pela condição e direitos humanos, de democraticidade do próprio sistema político, em que todos aceitem todos, desde que todos respeitem as leis que são feitas em nome de todos, porque o Parlamento é eleito por todos os angolanos. Se faz leis, aprovou uma Constituição, não há razão para que estejamos com um espírito de subverter as próprias leis que devem regular as nossas relações e então procurar estes famosos atalhos e não desequilibrar toda uma estrutura com consequências imprevisíveis.
Qual foi para si o período mais negro: a fase pós-eleitoral ou a ponta final do conflito?
A parte mais negra acho que teria acontecido se a UNITA tivesse conseguido subverter a ordem política e institucional que o país tinha conseguido alcançar com as eleições de 1992.
Mas a UNITA chegou a ocupar 70 por cento do território angolano. O que pensava disso?
Teve 70 por cento do território e era detentora de recursos naturais que lhe permitia auto sustentar-se. A UNITA teve o maior exército rebelde de África e um dos maiores do mundo, com uma estrutura de comando altamente eficiente. Tinha logística e técnica combativa com meios blindados que não eram apanágio de forças rebeldes aqui no continente. Portanto, o que está escrito na história é que a batalha de Andulo, de Vila Nova, foi depois da segunda guerra mundial e a guerra contra os sul-africanos, o primeiro embate com meios blindados entre exércitos de um mesmo país. Isso está na história.
Como é que era a vida do repórter Jaime Azulay nesta altura?
Era vida por vida. Também tínhamos família. Lembro-me que um dos últimos ataques da UNITA foi no dia 4 de Fevereiro de 2002. Eu tinha vindo ao Luena, no Moxico, no dia 24 de Dezembro de 2001, após ter estado lá aquele tempo todo, o general (Geraldo Sachipengo) Nunda olhou para mim, acho que sentiu pena e disse: «oh, homem, vai lá passar o natal com a sua família». Então vim. Por coincidência, no dia 4 de Fevereiro de 2002, poucos dias antes da morte do Dr. (Jonas) Savimbi a UNITA atacou a Baía Farta, a 25 quilómetros daqui da cidade de Benguela. Quando fui chamado eram 4 da manhã. A minha mulher disse-me: «porque é que tens de ir outra vez? Chega, já não quero mais essa vida».
Eu quando me fui despedir dos meus filhos, uma coisa que fazia sempre, o meu filho Fábio, que hoje também já me deu um neto, estava deitado. Sonolento, dei-lhe um beijo e fui. Tenho este filme aí até hoje. Chegamos à Baía Farta de madrugada, no meio ainda dos últimos tiros, e a UNITA tinha feito um massacre. Fui fotografando, aquilo amanheceu, e próximo de uma casa estava uma senhora a chorar muito. Aproximo-me, entro, vou para o quarto e havia uma poça de sangue a sair debaixo da cama…. Estava uma criança com a idade do meu filho totalmente esventrada. Eu perguntei-me porque é que isso tinha que acontecer? O que é que essa criança fez de mal? Entrou um militar bruto, drogado com certeza, a família foge e o miúdo esconde-se debaixo da cama.
Ele abriu uma rajada e cortou o miúdo ao meio. Essas imagens todas carrego comigo e toda essa experiência faz-me hoje analisar as coisas de uma forma serena. Tenho formação especializada, estudei em Israel e consigo analisar quais são as dinâmicas de um conflito. Pode-se despoletar um conflito facilmente, ele auto-sustenta-se e depois pará-lo é quase impossível. Tenho ferramentas para não embarcar num romantismo de circunstância e estar a abraçar causas que sei que trazem no seu gene um sofrimento indiscritível.
Ontem ou anteontem estive a ver um documentário sobre o Paquistão, um país que tem armas nucleares, e o povo vive numa completa miséria, pior do que aqui em Angola. Portanto, toda essa conjuntura que vemos aqui em África, de países que se desmoronam, estados completamente falidos, então o pouco que conseguimos foi enquanto houve condições. Tivemos um dos maiores crescimentos do mundo. Agora precisamos de passar para uma etapa qualitativa em que este crescimento se efective na vida de todos e de cada um, mas há sequelas muito grandes que não se mudam de um momento para o outro. Não sei se vou fugir ao fio cronológico da conversa que tinhas falar comigo,mas nós conhecemos tudo isso.
O que se passava na cabeça dos chefes militares quando a UNITA tinha os 70 por cento do território, tendo em conta que privaste com os chefes de Estado-Maior General das FAA como João de Matos, Armando da Cruz Neto e outros?
Em algumas circunstâncias, em situações extremamente difíceis. Esses são grandes homens e em todas as oportunidades não deixo de exprimir o meu profundo respeito e admiração por estas pessoas.
Quais?
Estes que estiveram nos vários momentos como comandantes de topo da chefia do Estado-Maior General. Eu tenho a estória do brigadeiro José Amute, o homem que ficou ferido com o general Simione (Mukune). São homens valentes, que nos momentos difíceis, mais complicados quando tudo estava perdido, os grandes repórteres, Faria Horácio e Abel Abraão, o que eles fizeram é indiscritível. Houve um jornalismo estrangeiro que veio e o título da sua reportagem foi só: Kuito, a Sarajevo de África. Mas estes homens estavam lá a trabalhar. São pessoas que devem ser reconhecidas enquanto estão em vida e a Nação deve prestar-lhes tributo.
Quando a UNITA tinha os 70 por cento do território nas suas mãos, o risco maior era a desintegração do país. Essas pessoas queriam dividir, mas nem critérios tinham para fazer esta divisão. Critério étnico? Caminho-de-ferro de Benguela? Com que consequências? Foi o valor destes homens que permitiu garantir a unidade nacional. E hoje quando se exige a transição, porque os velhos têm que dar os destinos do país à nova geração não se pode esquecer que estes homens foram gigantes. E vão entregar o país com o seu principal ganho que é a integridade. Não é fácil ter aos ombros a responsabilidade conforme a situação se punha naquela altura.
Todo o exército angolano tinha sido desmobilizado em 1991, por força dos Acordos de Bicesse. A UNITA como era vinda de uma guerrilha era mais coesa, manteve a sua estrutura de mando, conseguiu guardar as forças e rearmá-las à socapa da fiscalização das Nações Unidas. Isso ficou demonstrado no relatório do senhor Fowler em 1997-98. As Forças Armadas Angolanas que seriam formadas numa paridade de cada de 50 por cento, os membros das FAPLA praticamente ficaram atirados à sua sorte. Mesmo nós que já éramos oficiais ficamos abandonados. Fomos às nossas casas e a UNITA fazia passeatas a ameaçarem-nos que em Setembro teríamos que abandoná-las e que nos iriam matar. No Balombo, a UNITA foi procurar os antigos combatentes das FAPLA, amarrou-os e fuzilou-os. Portanto, todo o exército que o Governo tinha ficou praticamente desmembrado. Foi preciso recomeçar tudo. Nós acompanhamos isso.
A transferência do Posto Comando das FAA para a Catumbela facilitou o teu trabalho?
Por acaso facilitou bastante. Todas as condições militares que esta base tinha também facilitaram a própria luta. Eu não estou a ver todo o staff do Estado-Maior a ir para a sala do posto comando em Luanda e ter que discutir com o candongueiro no engarrafamento. Não sei como é que essa guerra seria ganha? Risos. Aqui era tudo paz e rápido. Foi um factor que de certa forma foi decisivo.
O que lhe diz o nome João Baptista de Matos?
O general João Baptista de Matos é um dos maiores cabos de guerra deste país. Ele faz parte da famosa escola do CIR Kassajne no Moxico, cujo primeiro comandante, o general Matos, está aqui em Benguela. Ele conta como é que estes homens foram formados aí. E toda a fina flor das Forças Armadas oriundas do Governo é deste núcleo de militares que em 1974 se concentra no CIR Kassanje. Há pessoas que nascem para brilhar nas áreas que abraçam.
Era uma pessoa próxima do general João de Matos?
Eu tenho um artigo escrito. Eu fui amigo dele o quanto um jornalista pode ser amigo de um general. Ele não permitiria, mas eu também sempre soube ter uma estratégia. Pelo facto de ter sido militar, eu sabia que nós vamos com armas diferentes. Enquanto o militar tem o dever e a obrigação de guardar a informação, um jornalista quer sempre publicá-la. Então há sempre esse antogonismo. Houve uma gestão de pessoas cultas e cada um podia fazer o seu trabalho. Vinham vários jornalistas a quem eu próprio ajudei, mas infelizmente também tínhamos pessoas que o assediavam permanentemente.
Houve realmente uma empatia que facilitou o meu trabalho por um lado e que foi baseado no respeito mútuo. Isso nunca foi ultrapassado. Se disser uma coisa, talvez pouca gente acredite: desde que a guerra acabou nuca vi o general Matos. Outros não, como agora neste nosso sistema de clientelismo, muitos pensam que podia tirar vantagem. Mas eu nunca mais vi o general João de Matos. Mas tenho um profundo respeito por ele e acho que pela sua juventude, mesmo retirado do activo, é quadro deste país com um potencial para dar o melhor de si onde quer que esteja.
Conheceu muitos generais e comandantes, mas também viu outros a caírem. O que pensa dos últimos momentos de vida do general Simione Mukune que teve a oportunidade de testemunhar, de acordo com fotos que tem publicadas no seu blogue?
Grande general! Essas fotografias que tenho circulam. Muitas pessoas pensam que deveria guardá-las. Estás a publicá-las no facebook, agora há partilhas e já não se sabe quem é o autor?As fotos foram feitas um dia antes da morte dele. Estávamos na ponte sobre o rio Membia. Ele (general Simione Mukune) era uma pessoa que irradiava qualquer coisa de espiritual quase. Ele tinha algo mais do que uma pessoa no estado corporal e físico. Depois estudei as suas origens e tudo se condensava nele como um homem com qualidade de mando. A sua altivez, o porte físico, o aprumo como homem. Notei o respeito que ele tinha pelos membros do Estado-Maior General quando estavam lá no Andulo. Lembro-me que quando fomos fazer a volta da vitória sobre o Andulo, quando se arreiou a bandeira da U NITA, ele quando subiu no camião onde viria a accionar a minha, tirou a pistola e entregou ao guarda. Não subiu para o camião onde estava os generais (João) Matos, Nunda, e Lúcio com a pistola dentro do coldre. Acho que aquilo foi um sinal de respeito pela herarquia e pelo mando militar. Isso mostrava as qualidades ímpares dele.
‘A dado momento o principal inimigo do Dr. Savimbi foi o próprio Dr. Savimbi’
Era possível fazer-se a paz em Angola com Jonas Savimbi?
Eu sempre acredito que o homem tem uma capacidade de reorientar a sua vida. De procurar diálogos para evitar o sofrimento. Depois de tudo que vi ali, acho que essas pessoas já tinham perdido essa noção. Há uma linha muito ténue que, nestas circunstâncias dramáticas, essas pessoas quando atingem esse limiar não conseguem destrinçar essa linha de racionalidade das coisas. Mesmo a própria guerra tem as suas leis, regras, fruto das convenções internacionais. Quando o homem se despe destas responsabilidades que não pode ser o meu eu individual a sobrepor-se ao clamor. Era o que existia, já não eram gritos.
Tudo pendurado num só homem e este de per si e pelas gentes que o rodeavam não foi capaz de atingir essa magnanimidade que os grandes líderes da história tiveram. Alguns que é para aliviar o sofrimento do seu povo. E acho que a dado momento o principal inimigo do Dr. Savimbi foi o próprio Dr. Savimbi. Porque ele cultivou um ódio muito profundo, transformou-se numa pessoa obcecada e transtornada. Isso tirou-lhe esta capacidade, que muitos apregoavam que ele tinha, de análise da situação e em prol da paz sacrificar-se.
Os mais sensatos que estavam ao lado dele, a dada altura desta paranoia, tentaram lhe fazer ver a razão, entre as quais a sua própria esposa Dona Ana Savimbi que pagou com a própria vida. Ela disse: «Mais Velho, vamos agora voltar para todo o sofrimento de onde já viemos? Fala com o Presidente José Eduardo dos Santos para parar isso». Depois foi aquele ponto de não retorno quando o Presidente da República explanou aqueles três cenários, quando ainda era possível. Foi pena para um homem com uma capacidade verdadeiramente impressionante.
Tornou-se uma constante os políticos dizerem que «é preciso preservar a paz». A paz em Angola está em perigo?
Posso dizer que está em perigo. Está em perigo se os angolanos meterem à frente aquilo que os separa e esquecerem o que os une. As transformações políticas quando se operam com esses radicalismos geralmente degeneram em caos.
Que tipo de radicalismos?
Todo radicalismo que resida numa tentativa de subversão ou com o objectivo de subverter a ordem legitimamente instituída. Portanto, o activismo e a oposição política se opera dentro de um quadro do Estado democrático e de direito. Claro que com todos os erros de governação, que os houve, de aspirações legítimas que não foram atendidas, de problemas que não foram resolvidos, mas isso tudo deve fazer parte de uma reivindicação que reside até nos desideratos dos direitos fundamentais dos cidadãos que estão respaldados na Constituição. Mas não se transforma um país vindo das trevas coloniais, com todas as assimetrias e a que se adicionam a esses erros alguns de própria estratégia de quem está no poder. Mas dentro destas limitações todas de erros, vitórias e derrotas, esse é o somatório que nos faz povo.
‘Há dois anos estive mais optimista com o país’
Angola que temos hoje é o país com que sonhou que tivéssemos 13 anos depois do alcance da paz?
Podia dizer que estive mais optimista. Há dois anos estava mais optimista. A mim preocupa-me ficar na sensação de ser um jogador que está a ver o jogo da bancada e vê o pessoal lá dentro a marcar golos na própria baliza e a desperdiçarem penaltis, quando existem pessoas que podem fazer isso da melhor forma.
O MPLA está a marcar golos na própria baliza?
E alguns tiros no pé.
Insisto, o MPLA está a marcar golos na própria baliza?
Marcou bastante. E dou o exemplo deste grande problema que foi a eurodeputada Ana Gomes ter vindo a Angola e lá no Parlamento Europeu fazer a proposta de uma decisão e ser aprovada com maioria. Sem que nós reagíssemos de uma forma inteligente primeiro e racional, agimos como patos que fossem a lagoa beber água e depois são abatidos um a um, sem que os outros consigam fugir.
Mandou-se posteriormente uma delegação a Bruxelas. O resultado não foi do seu agrado?
Em vez de irmos atrás do prejuízo há uma vertente que nisso não se compadece com amadorismos. Houve pessoas que se guindaram para funções com as quais não estavam minimamente preparadas. Isso exige preparação e não só um canudo universitário. Trabalhei muitas vezes directamente com o general Kundi Paihama. Quando o conheci ele nunca se tinha sentado no banco de uma universidade, mas posso dizer que o que vi do general Paihama é uma coisa incrível. É um homem inteligente, culto, respeitador. Tem que se saber falar com as pessoas.
Como foi possível de manhã a deputada Ana Gomes ser recebida pelas autoridades do país, pelos ministros da Administração do Território, da Justiça, onde recebeu informações das autoridades sobre a versão oficial dos factos que estavam a ocorrer aqui, e a noite virem pessoas a falarem em nome do MPLA e a achincalharem a deputada na nossa televisão, com uma linguagem imprópria e uns apresentaram-se como juristas? Tem que se utilizar uma linguagem adequada. Toda boa intenção, a colaboração que o Executivo prestou ao trabalho que a senhora fez. Durante o dia era um bom trabalho e a noite havia alguém a destruir todo o trabalho de diplomacia que tinham feito os nossos ministros.
Embora se diga que ela tenha vindo com uma agenda pré-estabelecida, o que depois podemos esmiuçar, uma vez que ela foi recebida pelas nossas autoridades de uma forma cordial, respeitosa, apesar de se dizer que tinha sido uma visita privada, nós não tínhamos o direito dentro das nossas tradições de acolher quem nos visita e achincalhar a senhora. Hoje teríamos a autoridade de lhe perguntar: minha senhora, recebi-a na minha casa, partilhei o pouco que tinha consigo, mas afinal vocês vem conspurcar? Aí levavam as gravações que a TPA fez. Aquilo foi um mau trabalho de diplomacia. Não se compra briga.
‘Não se potenciou aqueles que de facto poderiam criar riqueza’
O Presidente da República nomeou o jovem António Luvualu de Carvalho como uma espécie de porta-voz para algum fogo que vem do exterior. O que lhe parece?
Foi uma aposta boa. Para lhe ser sincero, porque às vezes as pessoas não gostam de realismo a mais, foi uma das grandes apostas que esse poder faz num jovem. Agora, conforme está a situação será que ele vai dar conta do recado? Não se esqueçam que quando nós atingimos esse estado de histeria de que os inimigos estão a vir de todo o lado, nós perdemos a razão que nos permite avaliar todos os perigos que rondam esse país.
Na política e sobretudo nas Relações Internacionais também existe a inveja. Isso pode ser fundamento que há sectores e actores internacionais que não gostam de ver os outros bem. Vou-lhe só recordar que o Dr. Chester Crocker disse uma coisa paradigmática e que muita gente no próprio MPLA esqueceu. Já lá vão trinta e tal anos. Ele disse que «a América nunca vai perdoar o MPLA pelo facto de ter sido comunista». Veja bem qual é a conjugação? Isso não foi uma traição feita por mim. E esses actores permanecem com essa agenda obstinada de mudar o regime deste país.
Não tenham dúvidas! Tudo aquilo que fizemos, irmos pela segunda vez para o Conselho de Segurança das Nações Unidas como membro não-permanente, aqui se diz aquele velho adágio popular: «pouco fel faz amargo muito mel». De repente vemos que o grande perigo e é o que me preocupa é que esta agenda que é levada por estes sectores, entre os quais agora se inclui a Dra. Ana Gomes, ainda que se tenha sentido achincalhada, despeitada nestes discursos que foram passados nos órgãos públicos, ela tem experiência política suficiente em dizer que não. Dizer que não ponho achas nesta fogueira que é para prejudicar o povo de Angola. Mas esse pretexto continua. O MPLA e os seus dirigentes têm que ter noção permanente que essas forças acham que este é o momento de atacar, por vários factores.
Que factores?
Segundo a visão deles – tenho ferramentas para analisar que isso se processa assim -, a idade do Presidente da República, 73 anos, da longevidade do Presidente da República, 36 anos, eles acham que este é o momento de atacar. O MPLA tem uma agenda histórica que é levar esse país para o progresso do seu povo e essa agenda tem que ser concretizada. Tem que estar permanentemente de sobreaviso e deve despoletar primeiro a sua defesa com os mecanismos que estão institucionalmente estabelecidos. Começa-se a pessoalizar as coisas, meter pessoas nos cargos para as quais não estão preparadas, a fazer borradas atrás de borradas, a páginas tantas há o risco de se perder o controlo da coisa. Mas tem quadros suficientemente capazes de encontrar respostas para os problemas que se põem.
Essas forças que nunca aceitaram o MPLA como força dirigente deste país viram agora uma oportunidade com as tais primaveras árabes e mudanças de regime que se operam revoltas populares, etc, que esse é o momento de derrubar. E qual é o principal pilar em que se alicerça o regime angolano? É o Presidente José Eduardo dos Santos. Algumas pessoas esquecem-se, porque lhes fazem esquecer e outras proporcionam que assim seja, todo o contributo que este homem deu para que nós hoje tenhamos atingido o estado de desenvolvimento económico e social que conseguimos. Essas forças quando atacam vão atacar esta figura. Nós notamos que esta envolvência agora se está a revelar. E eles acham que os alicerces que suportam este regime são as supostas riquezas cuja legitimidade é duvidosa e se encontram nestes países. Eles agora com a lupazinha estão a seguir essas fortunas e vão atacar aí.
Acha que vai haver essa perseguição?
Essa perseguição não tem outro objectivo senão o congelamento destes bens para fragilizar o sistema político. Depois com estes mecanismos em que vem essa resolução da ONU, os pronunciamentos da Amnistia, há toda uma envolvência que deve preocupar as pessoas. Isso é tudo gradativo e mostram que agem segundo um plano pré-estabelecido. Depois virão as sanções, as tais proibições de viajar. E o risco de nos transformarmos num estado pária na comunidade internacional. O povo angolano não pode deixar-se levar assim. E quem está no poder, o próprio Presidente José Eduardo dos Santos, os quadros do MPLA dedicados têm que responder na justa medida, de uma forma inteligente, reformar onde têm que reformar, aceitar que o que está errado, e o errado tem que ser corrigido. Às vezes existem pessoas com boas intenções que fazem propostas, mas também existem outros que se auto-intitulam como os fiéis ou indefectíveis, e quebra-se esse elo que sempre foi a grande força do MPLA.
Como acha que se está a lidar com estes jovens supostamente revolucionários em que se encontra o Luaty Beirão, que está há mais de um mês em greve de fome?
Para mim, quando dois extremos chocam-se causam uma situação destas. É uma situação bastante complicada. Muitos, como se diz, preferem ficar em cima do muro porque é uma situação confortável. Se for para A não tenho nada a ver e se for para B também não. Eu por acaso não faço parte deste tipo de personagem porque sempre tive um engajamento explícito. Portanto, essa forma de dialogar com a juventude, com esses formalismos de JMPLA e comités de especialidades não é suficientemente abrangente para que outras sensibilidades também consigam fazer ouvir a sua voz.
A exclusão gera revolta. Mas também apesar da delicadeza da situação, Luaty Beirão é um jovem deste país com uma formação académica que teve fora e foi ao extremo de usar uma arma que parece que ninguém contava. Aquela imagem que hoje algumas pessoas ligam àquela figura icónica de Jesus Cristo a ser crucificado na cruz, de Che Guevara quando foi preso na Bolívia antes de ser executado, é uma imagem que mexe com a sensibilidade das pessoas. Mas essa situação está a ser usada como uma arma política. Não me quero pronunciar sobre o processo em si, mas já ouvi que o Tribunal já marcou o dia 16 de Novembro como data de início de audiências de julgamento.
Ora, são 16 detidos. Será que o Luaty vai continuar em greve de fome? Segundo os médicos, ele corre o risco de ter uma falência dos órgãos e falecer. Fisicamente será pouco provável que ele recupere para aparecer em juízo sobre as acusações de que ele é acusado. Se ele sobreviver até lá, e rezo para que sim, para que ele também pense que é apenas um jovem no meio de milhões de outros jovens. A sua visão do mundo, a sua crença nos seus ideais também não se podem sobrepor aos interesses da larga maioria dos jovens. Ele tem que deixar esse fanatismo residual que ele tem. Se realmente lhe foi dada a possibilidade de eles terem julgamento justo, com garantia de defesa e o julgamento está marcado, que ele também se assuma e não mantenha essa atitude irredutível como uma forma de chantagear.
Não é só hoje que ele diz que a vida dele está na mão do Presidente, mas todo o sistema de justiça desse país. Como estava a dizer, pergunto: o Luaty irá para as sessões de julgamento com rodas nas camas do hospital e soro ligado para responder? É essa exposição mediática que certamente ele vai pretender, como o Moubarak foi com com o soro ligado na da maca. Vai usar uma série de situações para criar impacto mediático. Acho que é altura do jovem Beirão aceitar estas pessoas que pedem que cesse essa greve de fome de uma formal real. Uma das coisas mais prejudiciais – e que só a idade é que ensina às pessoas – é que o que destrói pontes entre as pessoas é o ego.
Nós temos um ego exacerbado. E o jovem Luaty está a levar isso até às últimas consequências. Ele acha que ganha mais do que perde esticando a corda, até um ponto crítico. Não rebentando, ele saindo como o jovem que enfrentou o Presidente da República. Hoje já se põe numa balança Luaty de um lado e o Presidente Eduardo dos Santos do outro. O Presidente vai ceder e pôr em causa todo o sistema que está a funcionar? O tribunal já tem a data do julgamento marcada. Será um julgamento mediático, que as pessoas vão acompanhar, com juristas, e terão as suas opiniões. A própria soberania dos tribunais também não pode ultrapassar os limites da própria lei. Este é o princípio da legalidade do próprio Estado, a que não estão alheios os tribunais.
O que quer dizer isso?
Os princípios elementares do Direito dizem que «nullum crime sine lege». A medida da pena não pode ser superior à medida da culpa. Que eles estavam a ler um livro, é uma realidade. Que desejavam partir para uma situação de desobediência civil, isso é praticamente um dado adquirido. Por isso, é que a acusação diz que foram actos preparatórios para uma rebelião contra o poder instituído. Portanto, criou-se toda esta complexidade porque também as pessoas, umas porque são adversárias deste sistema, porque aproveitaram-se disso para lançar a confusão. Não um golpe de estado clássico com forças militares, que tradicionalmente parte de dentro para fora. É uma rebelião criando uma situação caótica, inviabilizava o funcionamento regular das instituições do Estado, arregimentava sectores da população descontente fazendo-os crer que era hora desta ruptura e pôr em causa o funcionamento da instituição presidencial, que é o principal alvo.
O país vive uma crise económica que alguns já consideram sem precedentes. Como se explica isso num Estado como o nosso que nos últimos três anos foi um dos que mais cresceu no mundo?
Houve erros de estratégia. Isso não tem como não se assumir. Há bastante literatura técnica sobre isso. Caímos na tal maldição dos recursos naturais. Por um lado, com o petróleo em alta tivemos um ingresso massivo de divisas: dólares norte-americanos. O nosso Kuanza tinha um valor fictício. Vivendo as custas do petróleo nós não diversificamos a agricultura, não montamos uma indústria consistente, não industrializamos o país. Dormimos à sombra da bananeira. Toda a gente sabe e pode perguntar-se aos experts porque existe o Paradigma de Nauru.
Pode-se ver como é que aquele povo se deu mal querendo viver exclusivamente dos recursos naturais. Há essa maldição que nós de certa forma descuramos pelos benefícios imediatos que o petróleo teve. Agora com esta crise é posta à prova a capacidade de os angolanos em mudar o nosso paradigma ou na visão de desenvolvimento dentro destes três eixos: ambiental, social e económico. Económico baseado numa agricultura forte porque temos terras férteis. Temos água em abundância, polígonos que rapidamente nos podem guindar para uma posição de exportadores de alimentos, em vez de importarmos tudo. Recuperar de facto toda a infra-estrutura rodoviária e ferroviária e criar indústrias. Benguela é o principal produtor de tomate que abastece Luanda, mas até hoje não há uma fábrica de concentrado de tomate.
Isso já se vem a falar há 10 ou 20 anos. Em também desarticular um certo empresariado nacional que nada mais faz do que se incrustar no Estado e parasitar o próprio Estado e as instituições bancárias. O nosso crédito mal parado é altamente astronómico. Não podem ser empresários parasitas do Estado que aproveitam as linhas de crédito e as oportunidades que são dadas que é para exibirem uma vida de luxo e na actividade produtiva não têm nada. Não dão emprego nem fazem coisa nenhuma. Vimos que prometeram grandes fazendas no Moxico, mas foram descarregar meia dúzia de cabeças de bois em cima de montes de salalé, dizendo que seria um dos maiores projectos agro-pecuários de África. Isso passou na nossa televisão. Esse empresariado é parasita.
Não produz e prejudica, debilita as reservas do Estado. Portanto, é preciso criar um ambiente competitivo que valorize o mérito das pessoas. E não as suas influências para conseguirem dividendos. Todo o dinheiro que foi posto à disposição do empresariado, através de bancos como o BPC e outros, saíram pela porta do cavalo. Não saíram com a transparência que era devida. Não se potenciou aqueles que de facto poderiam criar riqueza e rapidamente criar alternativas dentro dessa palavra bonita que hoje toda a gente fala: a diversificação da economia. Isso já se fala há mais de 20 anos, aqui ninguém está a inventar nada.
Mas hoje, mais uma vez, essa que seria a classe média, mas que se assume como uma pequena burguesia parasita do próprio Estado vem com esse cliché que para tentar sugar estas parcas reservas, pondo em risco que o próprio Estado sucumba por falta de financiamentos para obras públicas, porque muitas vão ficar a meio. Isso terá a sua repercussão social. Aqui em Benguela, a caneca de fuba, que é o principal alimento, estava 75 kwanzas, foi para 100, 125 e em certos sítios já está a 200 Kwanzas. Quer dizer mais do que o dobro do que estava há relativamente pouco tempo. Isso está-se a reflectir na vida das pessoas porque o Estado é o maior empregador. O salário perdeu o seu poder de compra.
Quais são as consequências?
Isso vai aumentar o descontentamento das pessoas. Quando as pessoas estão descontentes vão reclamar. E se este histerismo que alguns sectores querem que todos alinhemos, daqui a pouco estaremos todos contra todos. Eu posso reclamar que o meu salário hoje não me permite sustentar a minha família. Mas o facto de dizer isso não significa que queira derrubar as instituições legalmente instituídas. Não podemos permitir que agora se meta toda a gente no mesmo saco. Portanto, o meu desejo é que de facto se arranjem soluções credíveis. E também pede-se aos nossos governantes mais responsabilidade de Estado. Quando um ministro vai apresentar algo, que o faça de uma forma clara. Não venha com subterfúgio ou com invenções de programas que não é nada. Vamos ser realistas para construirmos aquele país que toda a geração de angolanos sonha.
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