segunda-feira, 21 de setembro de 2015

A leitura e o debate



2 h · 


Por vezes é difícil debater no “facebook” da Pérola do Índico porque as pessoas têm algumas dificuldades na leitura e compreensão. Um indivíduo escreve uma coisa e as pessoas entendem outra. Reconheço que o autor tem sempre responsabilidade, mas por vezes cansa. Se alguém quer mesmo discutir tem que fazer o esforço de entender o que está escrito.

Entender o que está escrito não significa procurar por algum furo qualquer que nos permita descartar a posição defendida sem nenhum esforço de pensar. Significa procurar saber como é que o argumento apresentado pode ser entendido na sua versão mais forte possível para podermos ter um debate útil. Suponho que a dificuldade tenha a ver com o facto de que algumas pessoas olham para o debate como um exercício de proteção de crenças.

Tenho alguns exemplos suscitados pela discussão dum “post” recente sobre a Líbia. Vou dar a versão que vem no texto e depois o que algumas pessoas entenderam e o que eu queria dizer (e que toda a gente que consegue ler vai encontrar sem dificuldades na versão original):

Primeiro exemplo:
“Estamos a comparar um regime consolidado (o regime de Gadafi) com um momento (o caos actual na Líbia) que ainda vai produzir (ou não) aquilo que devia ser comparado com o regime de Gadafi, nomeadamente a democracia. Isto é, o que vemos hoje na Líbia não é (ainda) a democracia, mas o preço que os líbios estão a ter de pagar por ela (se vier)”. 
Leitura e interpretação pérola indiana: “O ocidente fez guerra contra a Líbia para introduzir a democracia”.
Sentido original: “o caos actual na Líbia não pode ser tido como a democracia que se supõe que o Ocidente queria instalar na Líbia; por essa razão, os termos da comparação não estão correctos”.

Segundo exemplo:
“O principal responsável por essa situação não é o Ocidente que incitou os rebeldes, nem são necessariamente os próprios rebeldes que tudo fazem para mostrarem que (tal como os nossos pais da democracia na Pérola do Índico) são tudo menos democratas. O principal responsável pelo caos na Líbia é o próprio Gadafi (…) Gadafi era um déspota que usou ao longo de toda a sua carreira política um discurso demagogo para impor aos líbios a sua própria versão do que é a boa vida. Foi implacável e cruel com todo aquele que discordasse dele e fez do seu próprio povo refém dos seus caprichos (…) É neste sentido que a ideia segundo a qual a morte de Gadafi teria levado o caos à Líbia não faz muito sentido. A opressão e a repressão têm estes resultados imprevisíveis. Em quase todo o lado onde um país foi gerido por um déspota quando ele sai o resultado é quase sempre este”
Leitura e interpretação pérola indiana: “Pode se destruir um país em nome da democracia ocidental”.
Sentido original: “para entender o caos actual na Líbia é preciso olhar para a responsabilidade do próprio Gadafi, sobretudo na forma como o sistema que ele instituiu foi capaz de permitir ou não a articulação da diferença; os rebeldes não são necessariamente combatentes pela democracia”.

Terceiro exemplo:
“A opressão e a repressão têm estes resultados imprevisíveis. Em quase todo o lado onde um país foi gerido por um déspota quando ele sai o resultado é quase sempre este [o caos]. Quando nós aparecemos aí a dizer que teria sido melhor deixar o déspota no poleiro estamos, efectivamente, a dizer aquilo que ele próprio dizia: sem mim será o caos total. Pior ainda, estamos a dar legitimidade a um sistema político que a longo prazo é insustentável e vai gerar necessariamente as razões do seu próprio desmoronamento. A opção na Líbia – ou noutro país qualquer onde reina o autoritarismo – não é entre o autoritarismo e o caos. É entre o caos latente do autoritarismo e a democracia, esta última entendida não simplesmente como processo técnico (eleições, competição política, etc.), mas sim entendida como criação de condições dentro das quais a articulação e expressão da diferença encontra espaço, as liberdades estão protegidas e a prerrogativa de criticar quem governa não constitui nem crime, nem falta de patriotismo…”
Leitura e compreensão pérola indiana: “o modelo ocidental de democracia é válido em todo o lado”.
Sentido original: “o caos é inerente ao autoritarismo; só um sistema político que protege o cidadão da arbitrariedade do estado é que é sustentável”.

Quarto exemplo:
“Quanto ao segundo argumento, nomeadamente o argumento da conspiração ocidental, vale um pedaço de sabedoria popular, a saber, a ideia de que são membros da família que abrem a porta ao feiticeiro. E no caso da Líbia quem abriu as portas ao feiticeiro ocidental não foram os rebeldes, mas sim aquele que pela sua megalomania, intransigência e autoritarismo criou círculos eleitorais para a articulação do tipo de discursos articulados pelos rebeldes naquele país…”
Leitura e compreensão pérola indiana: “Não houve envolvimento externo na Líbia”.
Sentido original: “houve envolvimento externo na Líbia, mas esse envolvimento foi possível por causa da fragilização do sistema político pelo próprio Gadafi”.

Porque é assim tão difícil entender o que se escreve? Entender não é estar de acordo. É entender para poder discutir. Quem cozinha a sua própria versão do que os outros escrevem está numa viagem epiléptica de sua própria autoria; não está a discutir com ninguém.


Bayano Valy sva tika. não conseguimos manter a distância necessária para assim podermos ver o quadro todo. vamos com tudo: nossas crenças e crendices.

Elisio Macamo o pior é que algumas pessoas entram já a bater.

Bayano Valy o que não permite um engajamento intelectual honesto. olha-se para a árvore sem se ver a floresta.

Elisio Macamo aí está.


Mendes Mutenda Elisio Macamo, ler e interpretar doi. Não é tarefa fácil. As vezes corre o risco de ser linchado pelo título. um artigo só tem sentido lido do titulo até o ultimo ponto. A sociedade de "fast food" é assim mesmo. so porque é Macamo que escreveu, conclui que está a defender Guebuza kikikiki

Elisio Macamo com direito a citação no tribunal convocado para defender a liberdade de expressão.

Mendes Mutenda de facto! kikikiki


Juma Aiuba Eu acho que o segredo está todo aqui: "Suponho que a dificuldade tenha a ver com o facto de que algumas pessoas olham para o debate como um exercício de proteção de crenças." Ou seja, alguns até têm vontade de compreender, mas leem com muito preconceito. Isto é, as pessoas leem a pessoa que escreveu. Do tipo, "mais um texto de Elisio Macamo... este gajo não gosta da Renamo... deixe-me ver o que ele escreveu desta vez. Este gajo gosta muito das coisas do Ocidente, tipo homossexualidade, de certeza que este é um daqueles textos a favor do Ocidente. Esse gajo vive na Europa e pensa que conhece África (Mocambique) melhor do que nós que vivemos aqui." Quando voce vai ao texto com este preconceito, já comeca a insultar só no titulo. O pior é que o fulano não vai assumir humildemente que não entendeu. Vai insistir que entendeu para depois comecar a insultar. Agora, não podemos descartar também a qualidade de ensino. Nos meus tempos da 7a classe a minha professora nos obrigava a leitura silenciosa do texto durante uma semana, para depois comecar com leitura (em voz alta) e compreensao do texto. Acho que isso já não se faz hoje em dia.

Elisio Macamo é reflexo dum ambiente politicamente radicalizado. a qualidade do ensino também, claro, é só ver o comentário doGeraldo Mandlate. no texto falei da responsabilidade do autor, mas ele conseguiu o feito extraordinário de passar por cima disso e se expor ao ridículo aqui aos olhos de todo o mundo. está difícil isto.

Geraldo Mandlate Dr. Elisio Macamo reconhece a responsabilidade do autor, mas mais adiante determina: "Se alguém quer mesmo discutir tem que fazer o esforço de entender o que está escrito." e o AUTOR? Nao tendo visto em alguma linha vontade do autor de melhorar a sua escrita , coloquei como sugestao. Comentarios do ridiculizacao do Geraldo Mandlate , como: "conseguiu o feito extraordinário de passar por cima disso e se expor ao ridículo aqui aos olhos de todo o mundo" é inutil Dr. Elisio Macamo. Quem nao é entedido aqui na sua escrita é o Dr. e nao outra pessoa. Parabens pelo reconhecimento de que muitas vezes os seus escritos sao mal entendidos e mal interpretado. Abraco.

Elisio Macamo se não entende o que foi escrito não pode discutir. tão simples quanto isso. o autor tem responsabilidade de ser claro, mas quem quer discutir tem que fazer o esforço de entender. esse é um princípio sagrado do debate. o princípio da caridade. o Geraldo Mandlate ridiculariza-se desnecessariamente aqui porque o meu texto cobre tudo isso. aprenda a ler, por favor, para saber discutir. caso contrário, procure outros lugares e outras pessoas com quem discutir.

Geraldo Mandlate Dr. Elisio Macamo , entendo e respeito o seu ponto. Mas eu tenho o meu. Isso nao faz ninguem de ridiculo. Mas se acha que quem diz que o autor tem que melhorar a sua escrita , torna se ridiculo é tambem sua forma de qualificar isso. Nao sou o unico a dizer isso. E estou de acordo que o leitor tem que fazer algum esforco. por tanto o esforco é de parte a parte. É isso que se recusa a aceitar.

Elisio Macamo eu acho ridículo levantar esse ponto num comentário a um texto que diz claramente que o autor tem essa responsabilidade. a questão que colocou sugere a ideia de que essa vertente não tenha sido considerada. foi. claramente. mas o post incide sobre os maus hábitos de leitura. está claro. faz parte da boa leitura saber qual é o tema que está a ser abordado. e discutir esse tema. portanto, insisto: está a ridicularizar-se porque está a discutir um assunto irrelevante e a demonstrar com isso precisamente o que critico.

Geraldo Mandlate Dr. Elisio Macamo, entendo perfeitamente que:" o post incide sobre os maus hábitos de leitura" que entre varias causas podem tambem ter como a origem a forma de abordagem. Embora tenha falado de responsabilidade do autor, o unico que deve melhorar é apenas o leitor? É aqui onde acrescento o melhoramento da escrita na forma de abordagem. Nao é só Geraldo Mandlate que diz isso. Entao, Dr. Elisio Macamo vai continuar a ter muitos a interpretar como o fazem por que "Se alguém quer mesmo discutir tem que fazer o esforço de entender o que está escrito" ou tenta abordar de uma forma diferente ( acho melhor e de alcance de Dr. Elisio).


Geraldo Mandlate Poe que é assim? Será apenas culpa do leitor.? Se fosse eu procurava respostas em todos lados, incluindo melhorar a minha escrita.

Buene Boaventura Paulo Bem explicado Professor. a crença da culpa de ocidente nas nossas desgraças por vezes nos atraiçoa, mesmo quando tentamos ser analistas sociais. Recordo - me, porque ainda é fresco o debate em volta do alegado ataque ao líder da Renamo, aonde eu fiquei decepcionado com a forma como o sr. professor procurou encontrar a mão externa no objecto do sucedido e esse tal foi o ocidente (Portugal e Usa). MAS o teu último post é claro e convivem te sobre análise de causa e efeito.

Elisio Macamo eu peço aos espíritos dos meus antepassados para me darem paciência! onde, por favor, nesse texto, procurei a mão externa do ocidente? onde, meu deus? e repare: este post não é sobre a culpa do ocidente. é sobre a má leitura que o seu comentário tão bem ilustra.

Buene Boaventura Paulo Calma Sr. Professor, pois nesse andar vai chamar de ... a toda gente. Vamos por partes. Eu acho que muita gente leu e compreendeu o teu post, na forma, mas não no conteúdo. Quero com isso dizer que a dissociação que faz sobre a causa da crise no Magrebe e nas outras regiões instaveis levantou o que julgas "falta de capacidade de interpretação". Os seus sublinhados neste post sobre como foi interpretado revelam isso, que as pessoas ficaram por suas crenças e não na análise do objecto. até aqui eu alinho com o sr. professor, mas se isso é uma deficiência que o professor anotou, quero reafirmar que exporadicamente os analistas sociais, tal como é o professor por vezes caem nesta fronteira ténue, para tal fui buscar o exemplo recente do teu post sobre o incidente de Manica. Se isso é motivo para apelar aos seus deuses que se sinta livre de o fazer, Ademais são apenas seus e não meus.


Buene Boaventura Paulo Digo convicente.

Carlos Viegas Nunes Meu caro amigo Elisio Macamo , deixo este video para ajudar ao debate : https://www.youtube.com/watch?t=31&v=GuqZfaj34nc



Elisio Macamo para qualquer ideia, por mais tola que seja, existe montes de "provas". o segredo é formar um argumento a partir daí, não é procurar pelas coisas que confirmam as nossas crenças. socorro!

Fernando Chiconela E há um virus que popula na praça, de que "só escreve assim porque está fora do País...ele se acha dono do conhecimento". Devo concordar consigo Mendes Mutenda pensar dói e não é para todos. Prof.Elisio Macamo, brinda-nos com a outra forma de ver e ler os fenómenos, coisa que muitos não conseguem fazer. É um exercício dificil. Aprender a aprender seria o primeiro passo para entrar em qualquer que seja o debate. O mal que "nos" enferma, é irmos ao (s) debate (s) com pedras na mão e se não percebemos do que se trata, partimos para ignorância (assim dizem os brasileiros). Exibimos nossas lacunas, que em algum momento deviam ter sido limadas nas fases elementares de aprendizagem (Ler, compreender e responder). Apreço-me a dizer que este é um maiores males que nos atormenta. NÃO SABEMOS LER, COMPREENDER, PIOR.

Joaquim Sérgio Inácio Manhique Mas é assim, mpoiombo, meu conterrâneo, Elisio Macamo:

1. De facto, tem havido muita dificuldade em "descrutinar" o que os nossos pensadores, nossos fazedores de opinião, nossos painelistas dizem/escrevem. Por exemplo, muitas vezes assistimos/ouvimos/lemos intervenções desses opinion-makers a nós informar com linguagem altamente técnica tipo "acariacao" "sui generis" "falência terapêutica" "trauma encéfalo cardiorrespiratoria" "impugnação dos resultados bla bla bla" entre outras apresentações que até exclui boa parte da nossa pérola indiana.

2. Não quero aqui tirar o mérito e utilidade dessa gíria técnica, mas não é sensato ao articulista proferir tal gíria e esperar que seja compreendido. 

3. A si, meu irmão Gazense, nili pumba ama bhele, hikussa Nambi mina natsuka ninga kutwi. 

Bom trabalho mano aí.


Elisio Macamo está a ver o problema, Joaquim Sérgio Inácio Manhique? levanta dois problemas. um é de admitir que provavelmente não entenda, por mais que se esforce. pois bem, se não entende, não pode participar na discussão. se quiser participar, certifique-se que entendeu. o que acontece muitas vezes é que muita gente, sem perceber o texto, entra já a bater. o outro problema é de que o nível da discussão nâo seja para si. tem que reconhecer que eu não estou a prestar um serviço público, mas sim a conversar com os meus amigos. não pode esperar de mim que fale de modo a que toda a gente me entenda. quem quer discutir comigo tem que fazer o esforço de acompanhar o passo. ou calar-se e ir conversar com aqueles que melhor entende.


Então, também os articulistas devem saber conviver com os tais que comentam mesmo sem o entendimento. 

Claro que não estará a prestar um serviço público, mas ao conviver com os seus arrisca - se a prestar um serviço popular, com todos os condimentos característicos.

Mas foi bom saber que afinal escreve para um grupo restrito.

Elisio Macamo não, não "devem" saber nada. devem livrar-se deles. é claro que escrevo para um grupo restrito. quem entra aqui fá-lo por risco próprio e tem a obrigação de acompanhar o passo. se não consegue, ou não quer, tem outras opções.


Mário João Francisco Francisco Geraldo Mandlate muito condundente. Deita a pedra.

Elisio Macamo não percebi o seu comentário.

Geraldo Mandlate Mario Joao Francisco Francisco, mencionaGeraldo Mandlate e fala de pedra. Mas nao entedindi. Peco para clarificar. Pelos vistos nem Dr. e

Alcídes André de Amaral Li algures um conjunto de "Falacias logicas" que alguem alistou. E uma delas o autor designou por "Espantalho" - que consiste em distorcer um certo argumento, disvirtua-lo e tirar o verdadeiro sentido do argumento para atacar... e isso por vezes tem-se feito conscientemente! Principalmente quando ja temos uma imagem ja rotulada!

Elisio Macamo se fosse isso só! o problema é que algumas pessoas não entendem mesmo e não sabem que não entendem.

Alcídes André de Amaral Ai o trabalho sera a dobrar... talvez a.melhor medida sera simplesmente curtir o texto. Isto enquanto o FACEBOOK nao desponibiliza o "Do't like"!

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