De acordo com o professor Cortes, os gerentes hídricos paulistas não prestaram a devida atenção aos moradores do próprio estado:
“Pelo menos nos últimos dez anos, os investimentos que foram realizados pelo governo do estado, seja na ampliação dos mananciais, seja na captação de água desses mananciais ou no tratamento, não acompanharam o crescimento populacional. Então, há uma redução da disponibilidade de água para cada habitante. E o sistema de captação e distribuição de água por vezes opera muito próximo ao seu limite”.
O relativamente pequeno nível da água no Cantareira é devido também aos problemas do meio ambiente. O desmatamento, frisa o especialista, faz com que a tendência se incline à redução:
“[O sistema Cantareira] só depende das chuvas. E nas últimas décadas, embora o volume afluente, ou seja, a quantidade de água que chega nas represas que constituem o sistema, oscile conforme o período de chuva e outros fatores naturais, há uma tendência clara de redução desse volume. Isso se dá por conta do desmatamento no entorno das represas, fazendo com que o volume de água que chega às represas apresente uma tendência à redução. Uma represa hoje demora mais tempo para encher do que há alguns anos. Isso também é uma questão ambiental que compromete a recomposição do sistema”.
O desmatamento, problema importantíssimo para o Brasil e um tipo de ação humana que pode prejudicar não só o meio ambiente, mas também a qualidade de vida das pessoas, tem sido proposto para discussão várias vezes. Porém, não fez parte da seção de assuntos importantes, lamenta o professor Cortes:
“Todos aqueles conselhos que há vários anos são divulgados a respeito de uma correta gestão de mananciais, ou seja, você preservar as matas no entorno, preservar as matas nas nascentes, evitar a ocupação irregular, evitar despejar o esgoto não tratado e captações clandestinas e tal, tudo isso foi colocado pelos especialistas na área, mas eram questões que não eram consideradas importantes. Não entravam numa pauta mais frequente da discussão.
E hoje a gente verifica que o fato dessas questões terem sido desconsideradas comprometeu todo o sistema de abastecimento. Ali teve essa falta de investimento na ampliação desses mananciais ou mesmo na sua gestão mais efetiva, deixando o sistema de abastecimento da região metropolitana de São Paulo muito mais vulnerável a esses episódios de falta de chuva e aumento da temperatura”.
O próprio sistema Cantareira apresenta um dilema. O professor Cortes trouxe o exemplo da cidade de Piracicaba, que está situada na beira do rio homônimo. O rio Piracicaba contribui para o Cantareira, então quando São Paulo utiliza a água do reservatório ordinariamente, acaba reduzindo o abastecimento em Piracicaba.
Para o especialista, trata-se de um problema de governança hídrica, ainda não completamente resolvido pelas autoridades estaduais. E para este problema ser resolvido é preciso que a população participe da discussão, para também participar do gerenciamento e preservação desse recurso natural.
Comentando a situação atual com o racionamento de água em São Paulo, Pedro Luiz Cortes qualificou-a de “questão semântica”. “A gente já vive uma situação de racionamento desde o ano passado”, lembra o cientista. O governador do estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, chamou a medida realizada pela Sabesp de “restrição” hídrica; no entanto, é preciso ter em conta que a falta de água pode levar ao desemprego em vários setores que dependem da água pública.
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