Canal de Opinião por Noé Nhantumbo
Quando os contornos convenientes são chamados à mesa, tudo se torna mais claro. Não há como alterar a situação a partir da altura em que todo o aparato judicial joga a favor de um dos concorrentes.
Sistematicamente se construiu um edifício de negação, e os resultados “homologados” pelo CC referentes às eleições de Outubro de 2014 em Moçambique não deixam margens para dúvidas.
Moçambique perdeu uma oportunidade de avançar na via da democratização, da pacificação e do desenvolvimento.
Os números foram milimetricamente controlados, e a “vitória” anunciada corresponde plenamente ao planificado.
Agora o que se seguirá são vários cenários conjugados.
Na frente política interna, haverá reforço da opção militar, com o Governo a enveredar pelo rearmamento veloz e capacitação das suas forças para a eventual “dita” batalha final. Na frente diplomática, a escolha é continuar a recolher apoios e felicitações de Governos “amigos”, numa tentativa de consolidar ganhos políticos e económicos. Facilidades de intervenção e de concretização de projectos de vulto na arena económica serão utilizados como moeda de troca para eventuais apoios político-diplomáticos.
Ao nível da SADC, não se espera dificuldades, visto que o grupo é maioritariamente composto por “ex-camaradas”. Numa perspectiva de guerra total de aniquilação de um adversário político incómodo, não é de admirar que se recorra a forças militares amigas de países como Angola, Zimbabwe ou Tanzânia.
Com o carimbo antecipado e com uma oficialização já esperada e confirmada pelo anúncio do CC, urge trabalhar na gestão de todo o “dossier” pós-eleitoral.
A força ou alegada força de uns reside no controlo, em absoluto e em regime de exclusividade, dos órgãos judiciais, como foi uma vez mais visto. O veredicto popular foi outro, e disso a maioria dos moçambicanos não tem qualquer dúvida.
Esperam-se tempos difíceis e as saídas serão aquilo que os moçambicanos quiserem.
A governabilidade de um país requer que existam determinados consensos que não estão a ser equacionados pelos protagonistas. A rota de colisão ou uma colisão entre as partes é bem visível.
Podem estar criadas condições para que se repitam cenários dantescos de Luanda e do Sudão. Desestabilização político-militar antes da tomada de posse do PR anunciado, homologado, podem levar a que o actual PR continue no cargo sem prazo de saída.
Um hipotético sucesso da alternativa de “sudanização” do país destruiria os fundamentos da República de Moçambique e deitaria abaixo o Estado uno e indivisível.
Os recursos naturais serão utilizados como “almofada” para captar apoios políticos fundamentais para a sobrevivência de um regime que apostou forte na promiscuidade orgânica dos poderes democráticos.
Veremos” lobbies” fortes de Houston transpondo os corredores do poder em Washington a favor da manutenção do “status” em Moçambique. Afinal os investimentos efectuados são de vulto e é necessário manter uma presença que diminua a influência “amarela”.
Há estrategas que acreditam e continuam acreditando que não existem condições logísticas e de retaguarda segura que permitam que uma Renamo militarizada se lance num confronto directo contra as FADM. A corrida aos armamentos faz-se com objectivos concretos, e parece que a opção guerra e eliminação da oposição ainda continuam na mesa. Primeiro, obliterar a oposição armada, e depois avançar para o controlo da oposição política. Regresso ao passado, diriam uns.
Convenhamos que muitas leituras são possíveis, mas o que se mostra inegável é que venceu o formalismo legalista, venceu o jogo quem utilizou o “apito dourado”.
“Arrancar a vitória” tornou-se possível por uma concertação estratégica baseada no controlo efectivo e permanente dos órgãos eleitorais, judiciais e das Forças de Defesa e Segurança.
De maneira obtusa e irreverente, a “posição” continuará a recusar qualquer concessão fundamental que coloque em risco o controlo do poder. E sem uma clara vontade política de alterar o figurino político vislumbram-se tempos difíceis.
Quem tinha dúvidas de que sem separação efectiva dos poderes democráticos não há democracia terá ficado esclarecido pelo desenrolar do teatro ou carnaval eleitoral em Moçambique.
“Mas como a esperança é a ultima a morrer”…
A golpada eleitoral homologada pelo Conselho Constitucional encontrará resposta por parte dos moçambicanos.
Afinal “povo unido jamais será vencido”.
Resistir inteligentemente, preservar estoicamente, continuam a ser características dos moçambicanos.
Agora é que os verdadeiros líderes se afirmarão. (Noé Nhantumbo)
CANALMOZ – 05.01.2015